sábado, 8 de novembro de 2008

Jefferson Luiz Maleski (Escritores sem Fronteiras)

Pintura de J. P. Martins Barata
O escritor é o ser livre mais humano que existe. Para ele pouco importa localização física, familiar ou financeira. Ele mesmo constrói a sua geografia, os amigos e amores e a riqueza. O escritor é escritor, não importa se está preso ou se vive na dinastia Ming. Mas ele é incompreendido por quem não é igual a ele. Não o entenderão quando o virem exausto e cambaleante depois de uma árdua batalha com as muitas faces de si que resolveu criar, misturando um sótão e um raio catalizador, nem tampouco a sua negativa em se aposentar de vez no próximo livro. O seu corpo pode definhar, mas o seu espírito incendeia.

O escritor é o cara mais narcisista e generoso que existe. Nega precisar de leitores, mas causa alegrias e tristezas em muitos quando chega ao ponto final. Não importa o que leiam, pois ele mesmo é o primeiro e maior leitor, assim como o mais violento crítico. Ele escreve para suprir a sua dose de heroína diária, de chicotadas, de orações. E o escritor ainda é doador universal de alma tipo O positivo. Que exijam toda a sua vitalidade e ele a dará. Sacrificará a vida pelas letras. Deixará como herança ecoando pelas eras o som das penas arranhando o papiro, do grafite sujando o Moleskine, dos toques na máquina de escrever pela madrugada afora ou das batidas frenéticas nas teclas do computador que não devolve o ultimo manuscrito, pois o quer ler sozinho.

O escritor é uma criança que brinca de Deus. Depois cansa, e passa para mocinho e bandido, cabra-cega e adedonha. Para ele, o que importa é imaginar. Criar mundos cheios de monstros, fazer o mocinho subir na torre enquanto a mocinha foge com o ogro, vencer guerras onde um encara e vence zilhões e viver se apaixonando pela pessoa errada. O escritor rejuvenesce e se eterniza a cada linha escrita. A vida pulula dentro dele. Os seus olhos são portais que, se olhados bem de perto, revelariam outra dimensão: a que só ele vê mas quer mostrar aos outros que existe. Qual delas é a real não se sabe ainda, somente que ele passeia pelas duas. Se um escritor sumir por algumas horas, pode saber que ele não está neste Universo.

O escritor é o filósofo das diferenças. Quando fala sobre algo não emite uma opinião própria. Mostra tudo o que já foi dito e o que ainda não disseram. Mas se escreve “Eu quero voar”, é ambíguo, deixa o leitor decidir se quem fala é o escritor, a personagem, o contexto ou se é uma fala do próprio leitor predita pelo escritor.

O escritor, antes de tudo, vive mais, mesmo que morra jovem. Não vive um pouquinho de cada vez, vive tudo e um pouco mais sempre que ilumina palavras pelo horizonte escuro. Deixa um rastro para os bebês que engatinham, mas que já olha o que será o tal do be-a-bá. Por isso, pouco importa a vida física do escritor. O que importa é o seu legado. Quantos Kafka’s desconhecidos não terão enterrado tesouros com eles na morte por não terem um amigo infiel a quem confiar? Quantas epopéias escritas em papiro, couro, madeira, pedra, papel que tal qual poemas escritos na areia não foram lavados pelas ondas do tempo? Quantos não tiveram sótãos para se esconder enquanto todos ao seu redor eram dizimados? Quantos não terão computador nem acesso à internet para ler uma boba e simples homenagem ao dia do escritor?

Fonte:
http://www.jefferson.blog.br

Um comentário:

Unknown disse...

Eu, sinceramente, me emocionei com o texto, e a homenagem aos escritores.

Cordialmente,
Gregorio Borges.