sábado, 2 de maio de 2009

Alfred de Musset (Teia de Poemas)


Tristeza

Eu perdi minha vida e o alento,
E os amigos, e a intrepidez,
E até mesmo aquela altivez
Que me fez crer no meu talento.

Vi na Verdade, certa vez,
A amiga do meu pensamento;
Mas, ao senti-la, num momento
O seu encanto se desfez.

Entretanto, ela é eterna, e aqueles
Que a desprezaram - pobres deles! -
Ignoraram tudo talvez.

Por ela Deus se manifesta.
O único bem que ainda me resta
É ter chorado uma ou outra vez.
(Tradução Guilherme de Almeida)
=========================

Chanson

Disse a meu peito, a meu pobre peito:
- Não te contentas co'uma só amante?
Pois tu não vês que este mudar constante
Gasta em desejos o prazer do amor?

Ele respondeu: - Não! não me contento;
Não me contento com uma só amante.
Pois tu não vês que este mudar constante
Empresta aos gozos um melhor sabor?

Disse a meu peito, a me pobre peito:
- Não te contentas desta dor errante?
Pois tu não vês que este mudar constante
A cada passo só nos traz a dor?

Ele respondeu: - Não! não me contento,
Não me contento desta dor errante...
Pois tu não vês que este mudar constante
Empresta às mágoas um melhor sabor?

(Tradução de Castro Alves)
========================

Vida não Vivida

Era bela, como a estátua
Em mortuária capela,
Dormindo em leito de pedra,
Imóvel, pode ser bela.

Tinha bondade, se basta
Dar, ao acaso, sem dó,
Sem que Deus enxergue a esmola,
Se a esmola é dinheiro só.

Pensava, se o vão ruído
De um falar suave e lento,
Como gemido de arroio,
Denuncia o Pensamento.

Orava, se os olhos negros
Uma vez fitos no chão,
Outra vez ao céu erguidos,
Podem chamar-se oração.

Sorrira, se o refrigério
De uma brisa, na alvorada,
Chegasse a expandir a flor
Que se conserva fechada.

Chorava, se, argila inerte,
Seu coração ressequido
Gotas de celeste orvalho
Pudesse haver recolhido.

Amara, se no seu peito
Não velasse orgulho fútil,
Como em cima de um sepulcro
Se entretém lâmpada inútil.

Aparentava viver...
Sem ter vivido morreu...
Cai-lhe das mãos o livro...
Nesse livro nada leu!

(Tradução de Francisco Otaviano)

Nenhum comentário: