sexta-feira, 12 de junho de 2009

Guilherme IX de Aquitânia (Poemas)


(as notas que estão entre chaves, estão ao final de cada poema)

Poema I

I.
Companheiro, farei um verso conveniente
que terá mais loucura, não sensatez,
e será todo mesclado de amor, de gozo [2] e de juventude.

II.
Tenhais por vilão quem não o entender, [3]
quem em seu coração com vontade não o aprender,
pois grave é partir aquele que encontra no amor prazer.

III.
Dois cavalos há para selar, e isso está bem.
São bons, corajosos em armas e valentes,
mas não posso tê-los juntos, pois um não suporta o outro.

IV.
Se eu pudesse domesticá-los do meu jeito,
não desejaria ter outros em minha guarnição,
pois, enquanto vivesse, estaria melhor cavalgado que qualquer homem. [4]

V.
Um deles foi o mais rápido dentre os cavalos montanheses,
mas há tanto tempo que está selvagemente fugitivo,
E é tão selvagem e feroz que se defende do comando.

VI.
O outro foi educado lá abaixo, próximo de Confolens. [5]
Nunca houve mais belo, em minha opinião;
este eu não trocaria nem por ouro, nem por prata.

VII.
Quando foi dado a seu senhor, era um potrinho que pastava,
mas eu o retive tão convenientemente,
que, se o tivesse por um ano, tê-lo-ai mais de cem.

VIII.
Cavaleiro, dai-me conselho de um pensamento,
nunca fui tão indeciso em uma escolha,
não sei qual ter, se Dona Agnes ou Dona Arsênia. [6]

IX.
Em Gimel eu tenho o castelo e o domínio,
e por Nieul tenho orgulho diante de todas as gentes,
pois ambos me são jurados e prometidos em sangue. [7]

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Notas

[1] Tradução feita a partir da edição Guillermo IX. Duque de Aquitania y Jaufré Rudel. Canciones completas (edicion bilingue preparada por Luis Alberto de Cuenca y Miguel Angel Elvira). Madrid: Editora Nacional, 1978, p. 26-29.

[2] Joy – Palavra que significa o êxtase do amor, alegria suprema, estado de espírito que elevava o trovador acima de si mesmo, resultado do amor sensual, sentimento novo desconhecido dos antigos e da Cristandade da Idade Média até então.

[3] Na poesia cavaleiresca, toda alusão ao camponês é sempre injuriosa. Aqui, a passagem sugere que todo camponês é ignorante e, pior, grosseiro, pois não é capaz de perceber as sutilezas dos versos de amor.

[4] “...estaria melhor cavalgado que qualquer homem”, expressão que representa o domínio da mulher (domina) sobre o homem. Posteriormente, o ato de ser cavalgado seria maravilhosamente narrado na lenda de Aristóteles e Phillys (Lai de Aristóteles, c. 1223, poema composto pelo clérigo e trovador normando Henri de Andeli [c. 1220-1240]). Ver COUTINHO, Priscilla Lauret e COSTA, Ricardo da. “Entre a Pintura e a Poesia: o nascimento do Amor e a elevação da Condição Feminina na Idade Média”. In: GUGLIELMI, Nilda (dir.). Apuntes sobre familia, matrimonio y sexualidad en la Edad Media. Colección Fuentes y Estudios Medievales 12. Mar del Plata: GIEM (Grupo de Investigaciones y Estudios Medievales), Universidad Nacional de Mar del Plata (UNMdP), diciembre de 2003, p. 4-28 (ISBN 987-544-029-9).

[5] Confolens – Cidade francesa localizada na região de Poitou-Charentes.

[6] Nesse momento, o poeta revela seu segredo - e a tensão do poema finda: os cavalos são duas damas, e ele só pode ficar com uma delas, pois ambas se odeiam!

[7] Após a revelação, o poema termina com um auto-elogio: apesar de sua indecisão no amor, Guilherme não quer deixar uma má impressão: embora hesitante, ele é poderoso, pois é estimado por todos, já que possui castelos e domínios.
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Poema IV

I.
Farei um verso do nada,
não será de mim, nem de outra gente,
não será do amor, nem da juventude,
nem de nada.
A trova foi feita dormindo
sobre um cavalo.

II.
Não sei em qual hora nasci,
não estou alegre, nem irado,
não sou rude, nem amigável,
nem tenho culpa,
pois assim fui de noite fadado,
em um monte elevado.

III.
Não sei quando durmo
nem quando velo, se alguém não me diz.
Por pouco não me parte o coração
uma dor lancinante,
mas não me troco por uma formiga,
por São Marcial! [2]

IV.
Doente estou e creio morrer,
e nada sei além do que ouço dizer.
Um médico buscarei por minha vontade,
mas não conheço tal.
Bom médico será se me puder curar,
mas não, se piorar!

V.
Amiga tenho, mas não sei quem é,
pois nunca a vi, se me tens fé,
nada fez que me agrade ou me pese,
e não me importo,
pois nunca houve normando ou francês
dentro de minha casa.

VI.
Nunca a vi e fortemente a amo,
nunca me fez favor ou desfavor,
quando não a vejo, não me divirto,
mas não me troco por um galo, [3]
que seja mais gentil e formosa,
e que valha mais.

VII.
Não sei o lugar onde está,
se é no monte ou no plano,
não me atrevo a dizer a injustiça que me faz,
antes me calo,
ou me pesa muito quando fica aqui,
portanto vou.

VIII.
Feito está o verso, não sei do que,
e envio-o àquele
que o envie através de outro
a Poitou,
e que de seu estojo me traga
a aduela. [4]
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Notas

[1] Tradução feita a partir da edição Guillermo IX. Duque de Aquitania y Jaufré Rudel. Canciones completas (edicion bilingue preparada por Luis Alberto de Cuenca y Miguel Angel Elvira). Madrid: Editora Nacional, 1978, p. 70-73.

[2] Um dos sete filhos de uma nobre romana chamada Felicidade. Todos foram martirizados no tempo do imperador Antonino (86-161). Na passagem, o poeta, mesmo sofrendo muito de amor, afirma que não trocaria de lugar com ninguém, nem mesmo com uma formiga.

[3] Uma vez mais o poeta sofre, mas não troca seu lugar por nada, nem por ninguém. Essa segunda alusão ao bestiário é muito interessante.

[4] "...me traga a aduela", isto é, o conhecimento do lugar onde entrar para se encontrar com a dama.

Fonte:
Trad. e notas: Prof. Dr. Ricardo da Costa (Ufes)

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