sábado, 10 de dezembro de 2011

Francisco Córdula (Poesias Avulsos)


TALVEZ UM DIA

Marca, que fica no destino, sem futuro
Obscuro murmúrio, do medo intacto
Tácito cálice de veneno mortífero
Esperando que mais sangue, seja derramado.

Marca, força reprimida, estopim do latifúndio
Vidas exauridas sem dor, nem prantos
Na carnificina que se tornou o campo
Quantas Margaridas serão necessárias?
Para acabar as sucessivas batalhas?

Marca, facultada, na ponta da navalha e nos tiros da doze.
Grilhões da covardia descambada
Quantos Chico Mendes, serão necessários?
Para dar um basta a estas Chacinas?

PEDAÇOS DE MIM

Quero chegar ao infinito!
Driblar os aflitos,
Tropeçar nos obstáculos
Cair, me levantar
E tentar tudo de novo.
Equilibrar-me como um trapezista
No picadeiro da vida.

Desfrutar da energia
Que sempre carrego comigo, em algum lugar de mim
Encontrar meu espaço no universo
Sempre sendo eclético
Para não definhar e morrer..

OS LADOS DA VIDA

Que elevem a mentira ao quadrado!
E deixem, a vida se tornar um teatro
Teatro mascarado e mentiroso em cada ato
Usando maquiagem exagerada e sem graça
Para uma platéia, com expectativa de gargalhada
Mas será uma comédia ou tragédia?

Nem o autor sabe, vai escrevendo de improviso
Um roteiro patético e cínico
Levando ao ódio e ao riso
Mas sempre na falsidade, sem medo
Ou receio de atropelar alguns atos
Nem receber nenhum ultimato
Que o faça parar, em seu triste espetáculo.

O que o encheria de orgulho?
As palmas ou as vaias?
Isto ninguém sabe.
Constatado apenas o mergulho no delírio
Onde a mentira se torna fato aceitável
E ainda que após, baixada a cortina.
Sem estrelato, ou brilho em cada ato
A realidade se mistura ao teatro
Fazendo de fatos, um grande espetáculo
Sem separação do teatro ou do real
Tudo surrealista, entre sonho e abismo.

Mas num repente cai o pano
Mostrando a nua e crua realidade
Sem volta para lugar algum
Com apenas um caminho a ser seguido
Sempre em frente, sem volta, pra sempre
Entre a loucura e a morte.

O AVESSO

Por trás de cada gesto
Se apresenta uma intenção
Gesto que pode ser leve ou brusco.

Por trás de cada intenção
Existe um dilema
Intenção que pode ser boa ou má.

Por trás de todo dilema
Existe uma sombra
Dilema que pode ter muitas faces.

Por trás de toda sombra
Existe possibilidade de dor
Sombra produzida por pequenos fragmentos.

Por trás de toda dor
Existe a esperança
Dor que se dilui com o tempo.

Por trás de toda esperança
Existe uma vida
Esperança, que nunca deve se esvair.

Por trás de toda vida
Existe um espírito.
Vida, significado maior de todo ser!

NOUTROS TEMPOS

Horizonte revelado, elevando a existência
Do ser, que deplorável, sobreviveu a sua sina
No inexorável final dos tempos
Sem mais lembrar, a profundidade da vida.

Quais não serão as descobertas de tal época
Ou revelações, alarmantes no futuro
Num furo de reportagem de um matutino
Levando o desespero, ao que resta do mundo.

O eclipse ocular, a cegar visões, menos realistas
E as previsões, assim se confirmando
Como num filme, velho e mofado
Passado em um projetor de igual teor e valor.

Restarão, filósofos e visionários
Num sofrimento vislumbrando, o que restou do mundo
Como se tudo acabasse na véspera
Deixando a surpresa e a perplexidade…

CÁLICE DE SANGUE

Entrando em transe a cada instante
Rompante de loucura assola sua alma
Transloucada, livre e solta em sua jornada.
Sem noção do estrago permanente (evidente)
Sente a demência como sua companhia
Já não se importa em ser mais que indecente
Pouco se recorda de sua antiga vida
Se entregando aos delírios viciantes normalmente.

Em seu corpo jovem padece, esmorece.
O pouco da dignidade que ainda lhe resta
Com a capa de ódio que agora se reveste
Investe apenas em sua perversão (se ilude)
E não se envergonha em ser corrompida
E prostituida sem qualquer barganha
Morando na rua ou em qualquer beco
De sentimento “seco”, não se emociona.

Fantoche, fantasma ou zumbi humano.
Farrapo em trapos sem qualquer barreira
Vivendo a beira de um precipício (vicio)
Consumindo, cheirando a sua maneira.
Sem chances de albergue até porque negue
Ou qualquer suplicio indicio de final inglório
Sem noção, tácito “acido” que lhe consome.
Cambaleando e se arrastando para seu velório.

ROTA DO ADEUS

Seguindo o nominado nas placas percorridas
Emplacando uma viagem terrestre solitária
Destino ignorado solo a ser seguido
Instinto do que a vida ainda lhe prepara.

Fatos não vividos e que serão lembrados
Por certo repassado cada sentido em vida
Eufórica alegria de momentos aguardados
Castrada com a depressão atroz em outros dias.

Bom seria se tudo fosse mais afável
Retórica que se esgota e não faz sentido,
Somente assim justificaria o fato, ato.
De ser a vida tão trágica como um tango
Ou tão sofrida como um fado vai saber!

Mas seria de tudo um pouco validado
Se tivesse de fato algo de sensitivo no destino
Ao menos uma chegada
Talvez menos amarga
Embalada de certo alivio momentâneo
Esboçado em um ultimo suspiro titânico
Pra tudo terminar em cinzas
Numa quarta feira de carnaval.

MOSAICO

Um dia,
Somente talvez um dia
Viverei novamente aquela alegria
Que conhecestes comigo
Em um passado recente.

Releve cada momento infeliz
Afinal, muitas vezes por um triz, fomos felizes.
Revivamos aquele matiz de lampejos
E tentaremos num sacolejo
Colocarmos os pingos nos is.

Tudo muito natural
Nada mais do que normal
Em se tratando de nós e nossos nós
Mesmo tentando outra vida
Continuamos “palafitas”
Em nossos sonhos ao largo
Na completa rabeira desta estreita vivencia.

Mas ainda há com que se encante
Nem que seja num rompante
De um otimismo desigual
Ou atitude irrefletida, te colocando.
Em outra vida, não seria nada mal!

Temos ainda outra opção
De enganarmos os infortúnios
E quem sabe a lua em saturno
Poderá nos ajudar
E numa atitude surpreendente
Muito menos exigentes
Voltaremos a nos encontrar.

AINDA TEMOS O AMANHÃ!

Que lenda se pode buscar
Em uma noite a divagar
Com bruma em poucas fadigas
Escutando-se umas cantigas
E exibindo visões dissonantes
E figuras arrogantes
Tentando nos hipnotizar.

Será inicio de pesadelo?
Em se buscando um segredo
Este bem escondido, não se pode achar
Estamos sofrendo um bocado
Sortilégio este danado, não faz o tempo passar
Esperança reduzida dos primeiros raios a brilhar.

Escuridão, paralelo de medo
Escola de bocejos tentando nos dominar
Será esta tortura o bastante?
Para nossa moral rastejante
Em tudo e todos nos derrotar?

Talvez quando tudo pareça perdido
Renasçamos por algum motivo
E voltemos à outra batalha travar.
Já sem medos ou fobias desgastantes
Enfrentando um novo dia radiante
Ai sim, poderemos festejar.

MADRIGAL, VINHO E PAIXÃO

As velas ainda não se apagaram
Duas taças de vinho caídas ao lado
Espalhando líquidos avermelhados
Encharcando o tapete da sala.

Dois corpos nele esparramados
Igualmente encharcados pelo vinho
Inertes enquanto o relógio na parede badala
Anunciando o avançar da madrugada.

Um madrigal no ambiente ainda entoado
Num ritmo para lá de funesto
Que decerto testemunhou tudo em volta
Acontecimento intimista onde restou o sossego.

Que depois de muitos goles, muitas taças viradas
Juras de amor, entremeadas de promessas
Beijos e carícias apaixonadas
Restando somente os dois seres em todo o universo.

E a cada minuto deste momento vivido
Intensamente, insanamente descortinado
A cada peça de roupa ao chão jogado
Novas promessas ambas as bocas murmuravam.

E num erudito de um erotismo exacerbado
Já não havia mais o que dizer ou prometer
Apenas a luxuria como forma de linguagem
E o bailado dos corpos sem palavras, só entrega.

E no “gran finale” a explosão em paixão momentânea
De tão eterna enquanto dure porque não?
E finalmente, após tudo isto o que resta?
Aqueles corpos abandonados, inertes, ao chão.

E O PALHAÇO DISSE ADEUS

Quando o palhaço pisou no picadeiro
para seu espetáculo derradeiro
uma torrente de emoções e visões
invadiu-lhe a mente e a alma.

Transportando-lhe na máquina do tempo
para outros momentos, vasculhados no passado
e o velho palhaço então emocionado
debruçou-se em lagrimas e fincou silencio.

Como que orando neste particular cenário
revivendo tantos espetáculos e movimentos
de uma trajetória que marcou seu tempo
e que a memória, insiste em homenagear.

E dentre tantas agruras relembradas
tantos arroubos e eletrizantes palhaçadas
veio a imagem de sua companheira,
sua paixão da vida inteira, trapezista faceira.

Que um dia ganhou seu coração,
e sua predileção em forma de amor
mas enfim, numa destas incompreensões da vida
ainda na flor da juventude, a trapezista partiu
chamada que foi por Deus para sua companhia.

Mas, a vida prosseguiu apesar da dor dilacerante
e o palhaço continuou naquele picadeiro
não como antes em seu intimo,
pois já não sentia-se completo.

Porém, o espetáculo não pode parar,
e como nas brumas de Brunel, revivendo o papel
que um dia Deus lhe concedeu:
o de palhaço de circo, continuou seu picadeiro.

Na tradução mais altruísta que um artista pode ter
tal qual um Chaplin em grandes filões
de “Grande Ditador” a Vagabundo
o palhaço reacendeu em segundos,
tantas lembranças, tão intensas,
tão verdadeiras e densas,
que o velho coração não resistiu.

E do centro daquele picadeiro
o palhaço embarcou inteiro
para seu espetáculo definitivo
o encontro com a sua trapezista,
seu amor, da vida inteira.

BAILE NEGRO

O Pierrô em um canto do salão cabisbaixo
Enquanto uma lagrima em sua face desliza
E o baile em câmera lenta passa avivado
Cada cena quadro a quadro repassa em sua vista
A Colombina deixando o salão acompanhada
Do Arlequim que a corteja, sua sombra incontinenti
E um clima sombrio contrasta com a alegre musica vigente

O Arlequim tentando soturno consolar a Colombina
Que desolada em um canto soluça amarga
E a cada investida o Arlequim se aguça exalta
Em sua ânsia obsessiva de conquistar a Colombina
E na insistência indecência que lhe embute e nutre
Num rompante de abutre um beijo ele lhe rouba
Desencadeando um abraço envolvendo-a pétrea

O Pierrô em meio à multidão tudo acompanha
E se determina em sua ira de vingança desforra
Surge uma adaga de onde ninguém alcança
E o Pierrô mais que depressa avança destemido
Com o sangue a explodir-lhe as veias artérias
Na intenção de golpear o Arlequim bandido
Avança golpeia em cheio num lance errante
A Colombina sua amada de toda a vida

A Colombina ensangüentada vai ao solo no salão
O Pierrô percebendo em sua mão a adaga indigna
Barbariza-se com o burburinho a sua volta comoção
E não nota o Arlequim em fuga covarde desatina
O Pierrô desaba em choro compulsivo inconformado
E repulsivo se joga no corpo de sua amada morta
O desamparo e o destempero nele são visíveis
E a adaga espetada no próprio peito sofrido
Invoca seu ultimo ato nesta vida sem sentido.

Fontes:
http://www.gargantadaserpente.com/toca/poetas/franciscocordula.php
http://www.novaordemdapoesia.com/2011_04_01_archive.html

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