sábado, 28 de abril de 2012

Fernando Sabino (O Agrônomo Suíço)


O poeta estava calmamente no bar, tomando um aperitivo, quando lhe telefonaram.

Quem o chamava era eu. O poeta não tem telefone em casa e há dias que eu o vinha procurando: a menos que me tivesse enganado, ele sabia de um amigo seu que conhecia um agrônomo suíço, interessado em administrar fazendas. Ora, outro amigo meu, a quem dei conhecimento da existência desse suíço, me disse que estava precisando exatamente de uma pessoa assim. E me pediu que conseguisse maiores informações com o poeta.

No bar, àquela hora, fazia um barulho infernal. O poeta veio ao telefone e mal conseguiu ouvir o meu nome:

- Quem?

- Eu, rapaz! Então não está conhecendo a minha voz?

- Eu quem?

Levou uns bons cinco minutos para descobrir com quem estava falando. Talvez já tivesse tomado mais de um aperitivo, é possível.

- Que houve? Aconteceu alguma coisa?

Eu mal conseguia escutá-lo e ele não me ouvia de todo:

- Você se lembra daquele agrônomo que um conhecido seu…

- Daquele o quê?

- Daquele AGRÔNOMO!

- Você está enganado, não conheço ninguém com esse nome.

- Eu nem falei ainda o nome dele! É um suíço.

- Luís?

- SUÍÇO! Você um dia me falou...

- Não conheço nenhum Luís. Eu estava pensando que ...

- Fale mais alto! Sua voz está sumindo.

- Não, estou por aí mesmo... Você é que anda sumido.

Respirei fundo e voltei à carga:

- Eu sei que você não conhece o suíço. Um conhecido seu é que conhece.

- Escuta, que brincadeira é essa? Eu estava aqui tomando o meu uísque...

- Desculpe incomodá-lo no bar, mas você não tem telefone em casa...

- Não tem importância. Só que está parecendo brincadeira. Entendi você falar num suíço...

- Isso!

- Isso? Ah, eu tinha entendido suíço, imagine.

- Pois é isso mesmo, quer dizer: é suíço mesmo. O homem está em cima de mim para arranjar...

- Que homem? Não estou entendendo nada, muito barulho aqui.

- Um amigo meu, você não conhece. Está precisando de um agrônomo para a fazenda dele.

- Fazendo o quê?

Perdi a paciência:

- Olha, telefona para minha casa amanhã de manhã, está bem?

Mas o poeta agora estava interessado:

- Não precisa se zangar! Aconteceu alguma coisa com você?

- Conversar com bêbado dá é nisso.

- Você está bêbado?

- Bêbado está você, essa é boa!

- Espera! Entendi direitinho você falar que estava bêbado. Deve ser o barulho. Espera um pouco. Ouvi pelo fone sua voz para os que o rodeavam:

- Vocês aí, querem fazer o favor de falar um pouco mais baixo? Um amigo meu está em dificuldades, e eu não escuto nada.

De novo para mim:

- Alô! Pode falar agora que estou ouvindo perfeitamente. Você está precisando de alguma coisa?

- Estou: que você me telefone amanhã de manhã. E desliguei. No dia seguinte era ele quem me procurava:

- Você talvez não se lembre, mas ontem eu estava calmamente no bar, tomando um aperitivo, quando você me telefonou no maior pileque para me contar que estava sendo perseguido por um sujeito chamado Luís. Que você quis dizer com isso?

- Isso, não: suíço - arrematei.

Fonte:
Para gostar de ler. Vol. 3. SP: Ed. Ática, 1978.

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