quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Nívea Martins (Maringá Poético)


Nívea Martins – Nome artístico de Maria Nívea Cerqueira Cezar Pereira Martins. É atriz de teatro e poeta. Quando residia em Santos, atuou sob a direção de Plínio Marcos em A balada de um palhaço, da autoria do referido dramaturgo. Entre as diversas peças em que atuou em Maringá, sempre sob a direção de Newdemar de Souza (Grupo Quilombo), estão Ternura e sol (baseada no livro homônimo de Ary Jacomossy), E agora Drummond? e A dança do caos (criação coletiva).
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SEPARAÇÃO 

Desnudo-me
Proponho que me esqueças
Eu pararei nos portos da vida
Tu prosseguirás sem razăo
Então, vou cuspir ao vento
Minha fragilidade
Que se faz poesia
Rasgando o solo frio desse chão

ORGISOFIA

Quando te encontro
nada mais penso
quando te quero
de tudo me desfaço
quando me solto
seus lábios estremecem
quando desnudo-me
seu corpo enlouquece

Quando năo me encontro
vocę declama poesia
quando tento e penso
vocę cheira ressaca de maresia
quando eu mesma me faço
vocę me toca com olhar de magia
quando me visto e insisto
vocę me lembra de sua ideologia
pensa năo ter mais nada a falar
se encolhe 
me escolhe
e é só filosofia!

SER-VEJA 

Brinco em cada palavra
que na minha voz 
é pronome perfeito
meio sem jeito pulo o verbo
que de todo ato repulsa a fala
sem particípio
e participo do encontro em que foge a consoante
consciência que sei que tudo se fez.
Hiato, talvez um desacato ao sujeito eleito!
Ah! Tantos encontros consonantais que já não sei
se encaro ou páro!
Se corro com dois ou um r só 
esse desespero de regras!
Se já não posso decifrar
sílabas tônicas
verbalizo então
ser-veja 

ALGUM ALGUÉM 

Saiu de sua terra. Tão cedo!
Comeu o pão do diabo...
Tão inocente!

Amou o pecado... De leve!
Pisou nesse chão... Foi breve!
Deixou nada pra ninguém,
não queria marcas incuráveis,
não desejaria mal algum, mas... Foi a vida,
a vida que tão vivida não tinha nenhuma constância.
foi mais um sem fé!
Digo até que com muita razão...
não saboreou o pão, engoliu seco, sem sentidos!
Não bebeu o vinho,
não existia cálice, muito menos palavras!
Passou despercebido,
nada conta a sua existência!
Levou a pressa consigo
e devagar, sem nenhuma dor, desconheceu o amor...
desbravou a si mesmo
perfurou suas entranhas
quis a morte,
que de sorte estava por perto, 
deu-lhe um sinal aberto...
e se foi, sem biografia. 
Só uma poesia sem intenção,
só de passagem, sem ilusão!
Não me pergunte quando, 
como nem porquê.
É uma psicografia.

SAUDADES DE MIM!

Sou vida enlouquecida!
Sou lua ferida!

Sou ave incontida!
Sou nenhuma razão
sou sua fome de pão
sou cada passo no chão!

Ser o que nada pensa
e nunca existe

Ser o que desequilibra
fera enfurecida
orgástica saliva!

Nem eu mesma lembro!

Talvez fada esquecida...
orquídea amortecida
em um jardim
com cheiro de fim...

do princípio ao meio...
a saudade de mim

MUTAÇÃO 

em cada dose
de sentimentos...
pulsa sangue quente
ausência...
reencontro
notas suaves...
contam estrelas no firmamento
minha intuição aflorada
desabrocha pétalas indecisas
orquídeas desenfreadas
até que o mundo se cale
talvez ...

DEIXEI O VENTO ME LEVAR

Não quis voltar!

provei de uma fruta
e ninguém mais vai saborear...
conheci o segredo
não ouso desvendar...
trago comigo o paraíso
me viciei em sabores
me deliciei nos sumos
me embriaguei
estourei os cadeados
desfiz as correntes
parei nas esquinas...
é minha sina
amores irreais...
é alma menina
desse destino imortal
é essência cristalina
despir-se dos valores
ficar de bem com o mal

TUDO QUE SE PLANTA, DÁ.

Psicose, neurose, cirrose
no gole nosso de cada dia
distorção frontal
colhe-se delírios
hare, assim seja namstê
fim da massa cerebral.
Os pontos que interrogam...
cobram um porquê.
O grito não sai...
a fala tremida
a boca maldita!
É vácuo
o espaço da inerte criatura.
É assim que se fez o relatório humano.
No engano da história
a falta de memória!
Nenhuma saída...
voto obrigatório...
seja eleito então
vazio.

PROFILAXIA

Anoitece.

O vulto alegre se entristece. De pavor!
Imutáveis monstros,
delinquentes civis!
Voltando de onde quis...
com o horror que nunca quis!
E lá no fundo desse poço imundo... Mundo!
jazem os crânios
arânios
com suas minas de urânio
a pedir perdão!
Inteligentes,
comoventes como só eles são,
a ditar e interditar,
os atos loucos. 
entre muitos,
poucos com o coração!
Anoitece.
O corpo marcado de pus que se reduz!
E o sol?
O sol com seu brilho,
move no canto do espartilho.
a força esmagadora de amar com prazer!
O que fazer?
Se a noite beneficia...
e o golpe asfixia,
um nó...
sem profilaxia,
com marcas de bem estar!
É, no duro,
hoje...
eu já não pulo o muro 
pois eles se curvam 
com o meu olhar!

LOGOS EU?

Sem razão...
sem rótulos...

sem definições...
ou decretos...
sem sentido
ou lógica de tempo!

nenhuma ordem
ou articulação...

sem previsões
tato, olfato, paladar!

Sem previsões!
Meras especulações.
Irreparável...
irreconhecível...
sem divisão
nem subtração!

Nenhuma religião...
nada cronológico
sem código de DNA 

fora de linguagem
nunca posta em leitura!

Fora de padrão!
Nada que se cobre
nada que se pague!

Nunca...
sem tentativas...

nada retrata minha passagem pela vida...
tão absurda!
Algo informal demais
E?
Logos eu?

É SOFRIDA NOSSA AFINIDADE

É sofrida nossa afinidade.
Basta-me 
Os sonhos,

As lembranças
As lagrimas derramadas
Como sofri quando você se foi
Os meus olhos se entristeceram 
Minha alma adoeceu
O meu corpo 
Virou deserto 
E seco se tornou, sem nenhuma reação
Se antes estremava com o teu toque
Agora dormente jamais será explorado novamente.
Passada esta relação

Acordo para outra vida
Sacrifícios se fazem necessários
E as mudanças 
Promovem em mim
Aquilo que mais me renova

Um amor 
Sem sonhos
Idealizados nas mesmas nuvens 
Sem promessas de chuvas
Estou climatizado nas esperanças futuras
Terei uma longa viajem por outros universos
De você não espero retorno
O passado será demarcado como única saudade
Para ti minhas poucas lembranças
Nada mais...

DESPIDO DE CONCEITOS E ÉTICAS SENDO SIMPLESMENTE EU

sem ilusões pra fugas
espasmos 
tento pensar coerentemente
mas a mente melindrosa
remete-me constantemente a
sonhos mirabolantes
acordando recentemente
recordando sonolentamente
de sonhos reais da alma real
e o que acontece realmente
é que entre o real e o incerto
a linha fina e tênue
separa-nos insanamente
entre o real e a mente que mente

colocando-nos a máscara da incerteza
na loucura da vida bela
neste mundo paralelo
que me criei nesta vida
entre o certo e o errado
no dia que as máscaras caírem
e me mostrar limpo, inteiro
despido de conceitos e éticas
sendo simplesmente eu
nu, cru, despojado de tudo

despojado do deus que criaram
para eu crer no ser eterno
esqueço do presente que é dádiva
do eu natureza vivendo
eternamente no já...

agarrando-me às ideias
de eterno ser.

Fonte:
Revista JIOP (Jornada Interartes Outras Palavras). n.1. Maringá : Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Letras, 2010.

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