segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Varal de Trovas n. 47 – Dáguima Veronica (Santa Juliana/ MG) e Manoel Cavalcante (Pau dos Ferros/RN)

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Stanislaw Ponte Preta (Certas esperanças)

É preciso - é mais do que preciso, é forçoso - dar boas festas, trocar embrulhinhos, querer mais intensamente, oferecer com mais prodigalidade, manter o sorriso e, acima de tudo, esquecer tristezas e saudades.

Façamos um supremo esforço para lembrar e sermos lembrados, porque assim manda a tradição e é difícil esquecer à tradição. Enviemos cartões e telegramas de felicitações àqueles que amamos e também àqueles que - sabemos perfeitamente - não gostam da gente. O Correio, nesta época do ano, finge-se de eficiente e já lá tem prontos impressos para que desejemos coisas boas aos outros, nivelando a todos em nossos augúrios.

Depois de abraçar e ser abraçado, desejar sincera e indiferentemente, embrulhar e desembrulhar presentes, cada um poderá fazer votos a si mesmo, desejar para si o que bem entender. Subindo na escala das idades, este sonhou todo o mês com um trenzinho elétrico, aquele com uma bicicleta (com farol e tudo), o outro certa moça, mais além um quarto sonhador esteve a remoer a idéia de ser ministro e o rico... bem, o rico só pensa em ser mais rico. O rico detesta amistosamente os ministros, já não tem olhos para a graça da moça, pernas para pedalar uma bicicleta e, muito menos, tempo para brincar com um trenzinho.

Dos planos de cada um, pouquíssimos serão transformados em realidade. Alguns hão de abandoná-los por desleixo e a maioria, mal o ano de 56 começar, não pensará mais nele, por pura desesperança. O melhor, portanto, é não fazer planos. Desejar somente, posto que isso sim, é humano e acalentador.

De minha parte estou disposto a esquecer todas as passadas amarguras, tudo que o destino me arranjou de ruim neste ano que finda. Ficarei somente com as lembranças do que me foi grato e me foi bom.

No mais, desejarei ficar como estou porque, se não é o que há de melhor, também não é tão ruim assim e, tudo somado, ficaram gratas alegrias. Que Deus me proporcione as coisas que sempre me foram gratas e que - Ele sabe - não chegam a fazer de mim um ambicioso.

Que não me falte aquele almoço honesto dos sábados (único almoço comível na semana), com aquele feijão que só a negra Almira sabe fazer; que não me falte o arroz e a cerveja - é muito importante a cerveja, meu Deus! -, como é importante manter em dia o ordenado da Almira.

Se não me for dado comparecer às grandes noites de gala, que fazer? Resta-me o melhor, afinal, que é esticar de vez em quando por aí, transformando em festa uma noite que poderia ser de sono.

E para os pequenos gostos pessoais, que me reste sensibilidade bastante para entretê-las. Ai de mim se começo a não achar mais graça nos pequenos gostos pessoais. Que o perfume do sabonete, no banho matinal, seja sempre violeta; que haja um cigarro forte para depois do café; uma camisa limpa para vestir; um terno que pode não ser novo, mas que também não esteja amarrotado. Uma vez ou outra, acredito que não me fará mal um filme da Lollobrigida, nem um uísque com gelo ou - digamos - uma valsa.

Nada de coisas impossíveis para que a vida possa ser mais bem vivida. Apenas uma praia para janeiro, uma fantasia para fevereiro, um conhaque para junho, um livro para agosto e as mesmas vontades para dezembro.

No mais, continuarei a manter certas esperanças inconfessáveis porém passíveis - e quanto - de acontecerem.

Rafael Galiza de Azevedo (Poesias Avulsas)

Minha inspiração

Mesmo que o mar continue a grande valsa de suas ondas
Mesmo que o sol continue a sorrir com a intensidade de sua luz
Mesmo que o céu continue a cobrir e descobrir nossos destinos
Ainda assim continuarei soletrando meu amor, contigo em meu peito
Mesmo que as estrelas sigam seu perfeito brilho pelo universo
Mesmo que a lua siga penetrando a alma de todos os amantes
Mesmo que os cometas ainda sigam seus rastros pelas galáxias
Ainda assim seguirei lembrando teus olhos ao escrever meus sonhos
Mesmo que as florestas permaneçam a ocultar seus mistérios
Mesmo que as plantas permaneçam a esconder seus segredos
Mesmo que as flores permaneçam a espalhar sua beleza pelo mundo
Ainda assim permanecerei cantando a alegria de teu sorriso.
Mesmo que o mundo venha a viver o pico das inspirações de poetas e romancistas
Ainda assim será de ti que virão minhas mais expressivas palavras.
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Quero ser mais
Quero mais, ser mais, muito mais.
Mais que as mãos que acariciam seus pêlos,
Que desenham teu corpo

Que aquecem teu desejo
Que calam teu silêncio
Que despertam seu prazer.
Quero mais, ser mais, muito mais.
Mais que estes lábios que te beijam
Que suam em tua presença
Que sugam o sedoso tecido de tua pele
Que percorrem o sabor doce e arrebatado de teu ser
Que penetram seus sentidos mais íntimos.
Quero mais, ser mais, muito mais.
Mais que os olhos que a ti penetram
Que se segam no desejo que me aflige
Que te buscam a cada segundo de tua ausência
Que te encontram no cair da noite, no erguer de um novo dia.
Quero mais, ser mais, muito mais.
Mais que posso ser, mais que imaginei, mais que um dia sonhei ser,
mais que poderia alcançar.
Quero mais, ser mais, muito mais.
Mais que o destino permite, mais que nele esteja escrito, para que
possa ser um pouco do tudo que mereces.
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Rio... meu paraíso

Rio que encanta no correr de seu leito
De passarelas de praias
De um dourado nativo
Inesgotável em sua beleza
Janeiro casa do calor, da cor
De uma cidade país abrigada pelo atlântico
Banhada pelos mares da beleza
Pelo sorriso da morena
Ah se eu pudesse...
Me banharia nas peles douradas deste mar
Me sufocaria nas ondas deste paraíso de mulheres
Me afogaria na vida de simplesmente ser...
...Carioca!
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Se um dia

Se o mundo não mais se abrir
Se a vida deixar de sorrir
Se a felicidade não mais estiver presente
Lembre-se que jamais estarei ausente.

Se um dia o soberano mundo te excluir
Se um dia a bela vida se extinguir
Se em algum momento se sentires sós
Lembre-se que jamais serás tu e sempre seremos nós.
Se a cada passo sentires o caminhar contrário
Se a cada mergulho sentires a correnteza te levar
Se a cada vôo sentires o vento a te desviar
Lembre-se que onde quer que estejas, eu estarei lá.
Lembre-se simplesmente,
que o que nos une é algo maior que a própria existência,
e que essa se eliminará se um dia vier a nos separar.
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Talvez

Não sei dizer
Talvez um dia
Talvez nunca saiba
Talvez a vida diga
Talvez o coração conte
Talvez seja sempre talvez
Talvez o mundo te mostre
Talvez ele mesmo te esconda
Talvez ele fale, talvez se cale
Talvez o céu traduza
Talvez o mar sussurre
Talvez a terra faça brotar
Um simples dizer
Que diga
Que fale
Que sinta
Que expresse
Que mostre...
...que eu te amo.
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Te busquei

Por quanto tempo te procurei
Sem sequer saber que te buscava
Sem sequer saber quem eras tu
Sem saber do tempo
Sem saber do lugar
Te amava sem saber
Te desejava e não sabia
Admirava e não sabia quem
Me orgulhava e não sabia de que
Me perdia e não te encontrava
Me achava mas não a ti
Longe deste amor vivi
Longe dele me escondi da vida
Longe dele me senti vazio
Me senti sozinho
Me senti como que um
Quando queria que fôssemos dois
Me senti limitado
Quando queria ser eterno
Me senti louco e insano pelo que sentia
Mas um dia te encontrei:
Percebi que te buscava
Percebi que te encontrara
Percebi que não era insano
Apenas apaixonado
Percebi que meus limites se eternizavam
Percebi que existia sim uma vida
Percebi que nunca estive vazio
Pois buscava um sonho
Percebi que sempre fomos dois
E nunca estive só
Me encontrei em ti

E em meus braços te alcancei
Pude me ver em teu olhar
Pude me sentir em teu sorriso
POR ISSO AMOR, TE AMO!

Fonte:

Ciranda da Primavera (Seleção por Simone Borba Pinheiro) Parte 7

ÓGUI LOURENÇO MAURI
Minha Catanduva Florida!

As flores chegam à "Cidade-Feitiço"...
Até que, enfim, termina a longa espera!
Setembro agoniza, já é Primavera
Com seus novos ares que não desperdiço.

Que linda, minha Catanduva florida!
Fascinam-me os matizes de seus ipês,
Uma pictorial paisagem que Deus fez
Em todo o traçado da longa avenida.

Catanduva se refaz na Primavera...
Cada ângulo é um cartão-postal,
A cidade é uma pintura natural,
Seu colorido ganha a ionosfera.

A brisa que respiro na Primavera
Coloca-me na fronteira do delírio;
Nos jardins, suas flores são um colírio
Saído de onde a Natureza impera

Reina de novo a "Estação das Flores!
Valeu aguardar... É a felicidade!
Novos fluídos envolvem a cidade;
Nos romances, beijos com outros sabores!
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REGINA BERTOCCELLI
O Sol da Primavera


Chegou radiante e esplendoroso
nesta manhã primaveril
Iluminando com seus raios de luz,
aquece a terra molhada
pelo sereno da madrugada
Flores desabrocham na cumplicidade
do dia, enfeitando nosso caminho,
perfumando nossa vida
Traz o sol da primavera calor e cor
aos corações apaixonados
Infinitas são as mãos que se entrelaçam,
caminhando felizes pelas alamedas,
pelos parques floridos
Ao entardecer, somos presenteados
com um deslumbrante espetáculo
de luzes e matizes variadas
Amanhã ele ressurgirá intenso,
majestoso, brilhante...
E nos brindará novamente com
sua luz e calor, neste fantástico
ciclo da mãe Natureza
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RENATE EMANUELE
É Primavera


O céu que amanhece tão rosa
O sol que esquenta nosso solo
A vida torna-se mais prazerosa
É a natureza que nos põe no colo

São as gotas de orvalho nas flores
Cheiro bom da grama verde molhada
A alegria pintada em todas as cores
Doce som no gorgeio da passarinhada

Vida renovada em cada coração
Na esperança dos dias mais felizes
O amor presente em cada canção
O cenário em todos seus matizes

A vida tem um especial sabor
Um novo começo uma nova era
De todo ramo nasce uma nova flor
E chega com ela a primavera
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ROSENNA
Sedienta de flores


Te esperé,
sedienta de flores...
de esos aromas tibios...
mezcla de azahares, miel y canela.
Quiero navegar...
entre lirios!..
ver inundado el espacio de colores...
...de mariposas el cielo...
quiero beberme el aire que huela
a hierba recién cortada...
miles de golondrinas en vuelo
alegres en bandada...
ver los naranjos en flor,
en suave brisa adormecerme...
y sentir del sol el calor.
Quiero que todo florezca...
también... el amor,
que se palpe en el aire...
...que se sienta...
que la primavera llegó !..
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SCHYRLEI PINHEIRO
Bem Vinda Primavera


Sonhando, desperta a sensibilidade
ao lado do amor.
Juntos, caminham pelas alamedas da vida,
deixando no ar o perfume colhido
nas lágrimas doces do tempo,
que secaram no calor do vento.
São sementes de carinho,
plantadas no coração da humanidade,
que irão reflorestar o vasto deserto
das estações vencidas.
Onde havia solidão,
renasce a esperança.
Tudo é festa, e a alegria canta o verbo amar;
o mundo amanheceu encantado,
a magia está presente e o futuro nos sorri.
Que felicidade!
Bem vinda, Primavera.
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SUELI DO ESPÍRITO SANTO
É Festa...É Primavera


Todos jardins estão em festa
e a passarada faz um seresta
para a primavera que acorda
na manhã de um sol brilhante
com um sorriso no semblante
pela beleza que se transborda

É a primavera que é toda cores
espalhando-se com tantas flores
cada qual com o seu deslumbre
já desabrochadas... tão formosas
surgindo lindas, todas cheirosas
dando-nos o mais belo vislumbre
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TERE PENHABE
Soneto à Primavera


Abrem-se as flores, no caramanchão!
Passarinhos festejam seus floridos ninhos
vem a Primavera, faz bem ao coração
a paixão repousa, afagada por carinhos.

Cantam os poetas, a magia do florir
nas verdes avencas, espalha-se a fé
e a esperança, põe o medo pra dormir.
É Primavera! Encante-se quem puder!

A borboleta azul, quiçá envelhecida
insiste no seu vôo, pousando na janela
trazendo novo sonho, para se crer ainda.

Quem ousa um sorriso, sua tristeza finda
é prenda preciosa, em toda Primavera
reduto colorido, que torna a terra linda!

Fonte:
Seleção por Simone Borba Pinheiro. in http://www.familiaborbapinheiro.com

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 6: Reformas na Europa e nas pulgas

Depois falaram da viagem de Dona Benta à Europa. A Rã acliou que ela não conseguiria nada porque os homens são errados de nascença. Emília discordou.

- Eu conheço as idéias de "vovó" - disse ela. - A primeira coisa que vai fazer na Conferência é transformar o mundo numa Confederação Universal. Todos os países ficarão fazendo parte dessa confederação, como os Estados dos Estados Unidos. E vai acabar com os exércitos e as marinhas, com os canhões e as metralhadoras.

A Rã, que entendia um pouco de política, achou que as grandes nações eram muito orgulhosas para se sujeitarem a ser simples Estados dum grande Estados Unidos.

- Pois se não se sujeitarem, pior para elas - declarou Emília. - Dona Benta acha que os homens devem formar no mundo uma coisa assim como as formigas. Elas são de muitas raças, ruivas, pretas, saúvas, sará-sarás, quenquéns, etc. mas vivem perfeitamente lado a lado umas das outras, sem se guerrearem, sem se destruírem. Se as formigas conseguem isso, porque os homens não conseguirão o mesmo - Mas acha que os grandes de lá - os reis, os ditadores, os homens importantes - vão seguir os conselhos de Dona Benta e tia Nastácia?

- E que remédio? - respondeu Emília. - Enquanto eles se guiaram pelas suas próprias cabeças só saiu piolho: desgraças e mais desgraças, destruições sem fim. Eles devem estar convencidos de que, apesar de toda a importância, não passam duns tremendos pedaços de asnos.

A Rã concordou.

À noite, quando foram dormir, ficaram as duas na mesma cama conversando até tarde da noite. O assunto era sempre o mesmo: reformas e mais reformas. Em certo momento uma pulga mordeu Emília. Ela acendeu a luz e pôs-se a caçá-la na brancura do lençol. Pegou-a, afinal. Enrolou-a bem enrolada entre os dedos e largou-a "para ver." E o que viu foi a pulga reviver e escapar aos pulos.

Emília danou.

- É sempre o que me acontece! Esfrego, enrolo as pulgas e elas se desesfregam, se desenrolam e saem pulando.

Tenho também de reformar as pulgas.

- Como?

- Poderei fazê-las molinhas como qualquer mosca. Já reparou que, para o tamanho que têm, as pulgas são a coisa mais rija que existe no mundo? Mais rijas que borracha... E também vou mudar a velocidade do pulo das pulgas. Paço pulos em câmara lenta, de modo que a gente possa pegá-las no ar com a maior facilidade, como se estivéssemos colhendo uma bolotinha.

A Rã lembrou um "melhoramento" ainda melhor.

- E se cortássemos o pulo das pulgas pelo meio? - disse ela.

Emília não entendeu.

- Cortar, como?

- A pulga pula. Quando chega no ponto mais alto do pulo, pára. Fica paradinha no ar, como um ponto final. E a gente, sossegadamente, a pega e a estala entre as unhas. Gosto muito de ouvir o estalinho das pulgas. É o único inseto que tem essa habilidade.

- As baratas também sabem estalar - lembrou Emília.

- Cada vez que Narizinho pisa numa, ela estala. É a linguagem das pulgas e das baratas. E também dos chicotes.

Pedrinho tem um chicote que é mestre em estalos.
––––––––––––––––
continua…

Guilherme de Azevedo (Alma Nova) X

foi mantida a grafia original.
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À NOITE
Eu gosto de velar a percorrer os mundos
Ó noite dos bons cânticos,
Aos lívidos clarões dos astros vagabundos
Nos êxtases românticos,

Enquanto a vil cidade, a cortesã devassa
Dos falsos ouropéis,
Com seus famintos cães, a sua lua baça
E os seus negros bordéis,

Ressona torpemente aos beijos deletérios
Dalguns velhos amantes;
— os longos hospitais e os tristes cemitérios
Que a afagam delirantes!

Contudo eu também sei que existe muito instante
De gelos, em que tu,
Feroz, cravas o dente agudo e penetrante
No pobre seio nu!

Que há horas em que vens, nas húmidas cidades,
Nas choças, nos esgotos,
Cuspir cinicamente as frias tempestades
No seio vil dos rotos,

Sem ter pena, sequer, da pobre mãe que passa
Um dia sem ter pão,
Nem dessa esfarrapada e velha populaça
Que rosna como um cão!...

Mas em breve deixando as tenebrosas vestes,
O manto dos horrores,
E o gládio vingador das cóleras celestes
Ó noite dos amores,

Retomas o tom puro e santo do mistério
Da pálida mulher
Que vai colher, cismando, um lírio ao cemitério
E ao campo um malmequer!

Em horas de tormenta és a mulher colérica!
Até cospes na cruz!
E formam-te espirais na coma atmosférica
As víboras de luz!

Porém no teu regaço, altivo, casto, enorme,
Em doce e plena paz,
É que a virtude sonha e que a desgraça dorme
Depois das horas más,

E em lúcidos cristais há cintilantes vinhos;
Os casos mais galantes;
As lânguidas canções; os belos desalinhos
E os gestos provocantes!

Ó filha do silêncio! Aos puros alabastros
Dos ombros ideais,
Se Deus arremessasse a quantidade de astros
Que em ti brilham a mais,

As pálidas visões que passam doloridas,
E um tanto contristadas,
Haviam de surgir de estrelas revestidas
Em trajos de alvoradas!

Em ti cuida escutar uns sons inexprimíveis
De lânguidas canções,
O pobre sonhador de coisas impossíveis
Que adora as solidões!

E quando o resplendor de mundos luminosos
Na tua fronte cinges,
Os gatos sensuais, elétricos, nervosos
Repousam como esfinges;

Enquanto as combustões dos lívidos cometas,
Errantes e fatais,
Consomem lentamente as grandes borboletas
Dos nossos ideais!

A VALA

Trazei mortos à vala; a hidra está com fome
E deve ser-lhe longa a hora em que não come!
Olhai como ela mostra àqueles que a vão ver,
Inerte, sem pudor, de fauce escancarada,
A amargura cruel da boca desdentada
Que pede de comer!

Lançai ao monstro informe algum repasto novo!
Trazei-lhe carne humana; arremessai-lhe o povo,
Transido pelo frio ou morto pelo sol!
E visto haver na fera abismos insondáveis
Mandai-lhe as legiões dos grandes miseráveis
Que morrem sem lençol!
Eu quero vê-la farta, a lúgubre pantera,
Que, na sombra agachada, olhando em roda, espera
A presa que lhe inveja a gula dos chacais.
Começa a ouvir-se ao longe a marcha vagarosa
Da triste procissão cruel e dolorosa
Que vem dos hospitais.

Um velho esquife chega: em duas tábuas toscas
Um pobre seminu coberto já de moscas,
Num riso deixa ver não sei que tons cruéis!
Enquanto nos sorria a luz das noites belas,
Talvez que ele varresse a lama das vielas
E o lixo dos bordéis!

E pôde, enfim, dormir no seio bom da morte!
Após, como se fora a lívida consorte
Daquele vil despojo, às mesmas horas vem,
Trazendo por sudário os seus vestidos rotos,
Uma triste mulher caída nos esgotos
Sem bênçãos de ninguém!

Devora-os ambos fera! Engole-os juntamente:
Reúne-os em consórcio e dá-os de presente
À larva que partilha as ânsias do teu ser!
Aguça o teu desejo! — A garra infecta lança
Ao corpo tenro e nu duma gentil criança
Que a mãe te vem trazer!

Redobra de apetite! Alonga-se a teu lado
A fila tenebrosa! O espectro do soldado
A par do que vergou cansado de cavar:
E o mineiro sem luz, o mártir legendário;
E amparando-se a custo ao velho proletário
A flor do lupanar!

Mastiga a turba vil e alonga essa goela!
Bem vês que vem chegando um corpo de donzela
Que pela candidez recorda uma vestal!
Voou-lhe, num sorriso, o derradeiro arranco
E traz viçoso ainda um grande lírio branco
No seio virginal!

O monstro sensual na sombra tripudia!
Celebra no silêncio a tenebrosa orgia,
Que as Deusas vêm chegando ao lúbrico festim!
Num beijo os lábios cola à frígida epiderme
E o D. Juan da morte, o cavalheiro Verme,
Que viva e goze enfim!

Eu quero ver-te farta, em hálitos profundos,
Dormindo o sono vil dos animais imundos,
De ventre para o ar, serpente infecta e má!
E amanhã, na estação dos cândidos amores,
Veremos rebentar num tapete de flores
O lixo que em ti há!

E a santa mocidade; as lânguidas mulheres,
Virão depois colher os gratos malmequeres,
Pisando-te sem medo e cheias de desdém,
Em danças sensuais; o fato em desalinho;
Compondo-te canções; regando-te de vinho;
Sem pena de ninguém!

E tu que és monstruosa, infame, vil, medonha;
Que não mostras pudor; que não sentes vergonha;
Que és a campa-monturo e não podes ser mais;
Cingida enfim, também, de rosas orvalhadas,
Terás dado um perfume às almas namoradas,
E pasto aos animais!

Ó vultos ideais, fantásticos e belos,
Que às vezes revoais nas salas deslumbrantes,
Num grande mar de tule, etéreas, flutuantes,
Aos suspiros fatais dos meigos violoncelos;

Que bom que era sonhar nos pálidos castelos,
À noite, à beira-mar, nas solidões distantes,
Nos tempos em que a flor dos tímidos amantes
À lua confiava os íntimos anelos! ...

Agora sois gentis, dispépticas, vistosas;
Pagais por alto preço as esquisitas rosas;
Nos rápidos wagons correis o mundo em roda;
Mas prostradas do baile, amarrotando a luva,
Enquanto cai na rua a sonolenta chuva,
Cismais no Deus-Milhão — no Criador da moda!

Eu vejo em tua boca as pétalas vermelhas
Duma rosa de Logo aonde vão libar
O mel das ilusões, quais tímidas abelhas,
Uns velhos ideais que em vão tento expulsar.

Dizer-me podes tu de que óvulo espontâneo,
Tocado pelo sol, em mim pôde nascer
Este bando cruel que dentro do meu crânio
Não faz há muito já senão roer, roer?!

Às vezes voa ao largo; às serras, às campinas;
Remonta aos astros bons; torna a descer dos céus;
E volta a demolir as trémulas ruínas
Do templo onde crepita a luz dos dias meus!

Ó grande flor suave! E nisto se resume
A constante batalha, o sempiterno afã!
Aspira a minha essência ao teu grato perfume;
Soçobra o dia de hoje ao dia de amanhã!

Oh, volvamos à terra; aos plácidos lugares,
Aonde os himeneus fecundos e reais
Produzem, dia a dia, os fetos singulares
E as sãs vegetações dos cândidos rosais!

E o que há de etéreo em nós, que siga as breves fases
Dum fluido transitório, erguendo-se nos céus,
Nas grandes expansões dos fugitivos gases
Onde em línguas de fogo às vezes fala Deus.

Forçoso é separar os dois rivais antigos,
Na batalha cruel que em nós se reproduz.
Sorria o que é da terra aos vegetais amigos;
Rebrilhe o que é do céu nas refrações da luz!

Folclore dos Estados Unidos (Wendigo, O Espírito Canibal)

Parte da mitologia algonquina, principalmente das tribos Cree e Ojibua, o wendigo tem muitas aparências segundo as lendas, tanto pode ser um tipo de pé-grande canibal, com longos dentes e um silvo perturbador que pode ser ouvida à distância, quanto pode ser um esqueleto ambulante, com pele cinza, olhos fundos de cadáver, e que às vezes só pode ser visto de lado, porque de frente ele aparenta ser apenas uma linha fina. Outro aspecto é sua fome incontrolável, quanto mais se alimento mais tem fome… Pode comer dezenas, centenas mas sempre terá fome… Por isso o wendigo é símbolo de ganância e insaciedade. Outra característica é seu odor. Quando um wendigo está perto se sente um odor de podridão sem igual, como se carcaças estivessem ao seu redor.

No conto de Algernon Blackwood, o wendigo aparentemente toma conto do corpo do guia, e o faz desaparecer na mata. Contemporâneo de Lovercraft, ele cria um clima de imenso terror onde não se descobre se tudo é real ou alucinação coletiva… O guia começa a ouvir uma voz sibilante e cavernosa o chamando, sente um cheiro ruim e estranho e desaparece na mata. O conto descreve o que se chama “febre das matas”, quando tudo aquilo (silêncio, mata, solidão) engloba o homem de tal maneira que ele corre para a floresta de onde não mais retorna, vítima da febre.

    Outro aspecto é sua fome incontrolável, quanto mais se alimento mais tem fome… Pode comer dezenas, centenas mas sempre terá fome… Por isso o wendigo é símbolo de ganância e insaciedade. Outra característica é seu odor. Quando um wendigo está perto se sente um odor de podridão sem igual, como se carcaças estivessem ao seu redor.

Parece ser o que acontece como guia, mas depois de muito procurar, o restante do grupo, senta ao redor da fogueira e ouve um som vindo do alto das árvores… Chamado por um deles, uma coisa cai no acampamento. É o guia, mas totalmente transfigurado… Pele pendurada no corpo, olhar feroz e alucinando, olhos esbugalhados, voz vinda das profundezas….O wendigo dele se apoderou.

O mito do wendigo está relacionado à prática do canibalismo. Muitas vezes, devido a fome e frio, principalmente durante o inverno, alguém recorria ao canibalismo para sobreviver. Fazendo isso, ele seria possuído pelo espírito do wendigo e se tornaria um.

Então tanto existe o wendigo enquanto criatura, peluda ou não, como também existe a possessão do espírito demoníaco do wendigo.

Em algumas lendas desse povo, alguém também pode se tornar um wendigo se necessário para proteger seu povo ou lar de algum perigo. A pessoa se torna um gigante e depois de passado o perigo ele pode retornar à forma humana ou se embrenhar no mato para nunca mais aparecer.

    Chamado por um deles, uma coisa cai no acampamento. É o guia, mas totalmente transfigurado… Pele pendurada no corpo, olhar feroz e alucinando, olhos esbugalhados, voz vinda das profundezas….O wendigo dele se apoderou.

Em um conto lido por mim, também podem se apresentar wendigos bons e maus… Como no caso do casal que vivia com o filho e foi visitado pelo wendigo. Ele nada fez ao casal, apenas ficou se servindo da caça trazida pelo homem e foi embora dando de presente um arco e flechas mágicos…. Porém tempos depois, a mulher estava sozinha e vendo outro wendigo se aproximando, não teve medo. Este ao chegar perto se mostra hostil e ela é morta quando tenta fugir.

    (…)O próprio índio reconheceu os sintomas e admitiu que iria se tornar o monstro, pedindo que alguém o matasse antes disso… Então deixaram o irmão dele para a tarefa, ficando por perto para ajudá-lo se necessário. Ele acertou o coração do “wendigo”, mas não houve sangue(…)

Também na literatura encontramos a “psicose do wendigo”, quando mesmo com comida à disposição, a pessoa come carne humana. Um dos casos mais famosos é o de Swift Runner, um caçador de Alberta, que comeu sua mulher e cinco filhos, mesmo a uma distância relativamente curta do posto de abastecimento. Ele foi julgado e condenado em Fort Saskatchewan.

Outro caso famoso é do chefe Cree e xamã Jack Fiddler, que entre seu povo era respeitado por localizar e exorcizar wendigos, matando alguns índios no processo. Ele e seu irmão foram julgados culpados por um tribunal, mas ele até o fim insistiu que estava livrando o povo de um mal maior e que poderia se espalhar se nada fosse feito.

Porém, para essas tribos é aceitável matar um wendigo. Casos foram julgados em que índios eram réus por esse motivo. Como Machekequonabe, uma índia que matou o seu pai adotivo, que estava possuído pelo espírito do wendigo.

Em outro caso índios Cree observaram que um membro do grupo estava se tornando um wendigo. O próprio índio reconheceu os sintomas e admitiu que iria se tornar o monstro, pedindo que alguém o matasse antes disso… Então deixaram o irmão dele para a tarefa, ficando por perto para ajudá-lo se necessário. Ele acertou o coração do “wendigo”, mas não houve sangue, então os outros vieram e acertaram o moribundo com pedaços de pau e queimaram o corpo em uma estaca. Para matar o wendigo é designado sempre um parente, assim se evita que a família queira vingança contra o carrasco.

Também um índio de nome Abisahibs matou uma família inteira em Yor Factory. Ele foi posto a ferros por um comerciante de Hudson´Bay. Ele foi solto porque gerou uma comoção entre os índios do local, que temiam caçar com ele por perto, mesmo preso. Mas mesmo solto ele não deixou o local e foi preso novamente, talvez pela própria segurança. Então os índios Cree resolveram fazer sua própria justiça, tiraram ele da prisão, o mataram com um machado e queimaram o corpo para que o espírito não os assombrassem.

O wendigo é contado em lendas e documentos oficiais. Espírito da floresta ou simplesmente faminto por carne humana, ele não mais assombra como antes. Porém, nos primórdios da colonização quando a floresta ainda “chamava” pelos incautos penso como seria estar só naquela imensidão solitária ouvindo os ruídos da mata sem saber exatamente o que seriam….

Só, naquele local o homem deveria ser possuído por algum mal ancestral que o faria novamente ser o caçador bestial de outras épocas, predando até mesmo a seus semelhantes.

Esse é chamado demoníaco do wendigo, o espírito canibal.

Fontes:
http://books.google.com.br/books?id=MJTuqyabJTgC&pg=PA75&dq=wendigo&as_brr=0#v=onepage&q=wendigo&f=false
Texto em português http://casadecha.wordpress.com
Imagem: http://www.shipoffools.wikia.com

Vocabulário de termos e expressões regionais e populares do Centro Oeste (Mato Grosso e Goiás) Frases e Locuções

A BESTUNTO — Comprar "a bestunto": sem reflexão.

A SECO — Contratar um trabalhador "a seco": sem fornecimento de comida.

ARREAR UM BEZERRO — Amarrá-lo à perna da vaca, para se fazer a ordenha.

CANTA BOM, EM VEZ DE CANTAR BEM — O galo canta bom.

CAPAZ — "É capaz que": é possível, é provável. E’ capaz que isso aconteça…"

CARREIRA — Fazer carreira; fazer favor.

CHEGUEI "DE CHORAR" — Cheguei a chorar… acabar de chorar. Também: "chegar de fazer alguma coisa", isto é, acabar de fazer…

COMER GAMBÁ ERRADO — O mesmo que "comer gato por lebre".

CORPO, "LAVAR O CORPO" — Tomar banho.

DAR A SOCA — A sobra do fósforo aceso, depois de usado uma ou mais vezes.

DAR FÉ — Perceber: F… nem deu fé do que acontecia…

DE BANDA — De lado.

DÔ…IDO! — Tá dô…ido! Exclamação, muito comum, de admiração, de contradição etc.

EM RIBA, PRA RIBA — Em cima, para cima.

ENFIAR ATRÁS DE ALGUÉM — Seguir-lhe os passos; ir ao encalço.

ESTUMAR O TIU — Atiçar o cachorro. "Estume o tiu, para espantar o gado!

EU SEI QUE NÃO FAÇO! — Resposta irônica, equivalente a: farei o que me aprouver, ou então, sou muito capaz de fazer.

FEIJÃO PAGÃO — Feijão cozido em água, sem sal nem tempero algum.

FICAR INTEIRADO — Ficar ciente. Também, se usa em sentido pejorativo: Fiquei inteirado com o mal procedimento de F…: fiquei conhecendo-o bem.

FORMIGA CABEÇUDA — Saúva.

IR ATRÁS DE ALGUÉM — Ir à procura.

MAIS LOGO — Depois, mais tarde, logo mais.

MAL SERVIDO: FICAR MAL SERVIDO COM ALGUÉM — Mal impressionado, desgostoso.

MEDIR RUA — Passar o tempo a toa, na cidade.

METIDO A SEBO — Diz-se do indivíduo pedante, pretensioso, petulante.

MUITA DÓ — Muito dó. Usa–se dó no feminino; cal e pá (aliás apá) no masculino: o cal, o apá.

NÃO ATA NEM DESATA — Nada adianta, não dá resultado algum; tanto faz como fez; é o mesmo; uma coisa equivalente à outra.

NO SUFRAGANTE — Em flagrante, (corrupt.).’

ÔVO FRITO — Ôvo estrelado.

PEGAR NO ESTRIBO DE ALGUÉM — Ato de bajulação; rastaquerismo.

PORTA-VIANDAS — Carregador de marmitas.

PRA MODE — Para; a fim de; por causa de…

PUXAR FOGO — Expressão acompanhada de movimento do polegar, na direção da boca, indicando bebida: beber cachaça.

RABO DE FORNALHA — Mesa terminal do fogão, destinada a sustentar as sobras de lenha, a arder.

RABO DE TATU — Chicote. Passar o rabo de tatu em alguém, chicoteá-lo.

RABO DOS OLHOS — Soslaio. "Olhar com o rabo dos olhos.

SEM SECA — Sem cerimônias, acessível: pessoa sem seca.

SENTIR UM RUIM — Um mal estar interno.

"SE QUISER, BEM; SE NÃO QUISER, BERÊM" — Isto é, pouco importa que queira ou não.

TANTA DE FRUTA, TANTA DE COISA — Tanta fruta, tanta coisa… Expressão muito em uso na antiga capital.

TODA A VIDA — Sempre assim.

TREM RUIM — Coisa ruim, pessoa ruim. O trem ruim por antonomásia é o capeta (demônio) .

Fonte:
Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Ed. Literat. 1962

sábado, 5 de outubro de 2013

Paulo Mendes Campos (O Despertar da Montanha)

Assim como há quem sofra de insônia, sofro de despertar. Meu sonho é tão nebuloso, tão viscoso, tão atravessado de assombrações e armadilhas, que me custa o indizível ter de me arrastar desse brejo ancestral para as obrigações do mundo urbano. Existe um poema de Henri Michaux que conta o angustioso renascimento do planeta gasoso em que certas pessoas se transformam depois da viagem noturna; dele e meu.

Enquanto pude, filho ou chefe de família, proíbi que me fosse feito qualquer pergunta durante minha primeira hora de vida cada manha.

Você vai hoje cedo para cidade? Uma questão à toa como essa, em vez de me puxar para frete, me empurra de novo para trás, para o pântano primeiro onde se conhece apenas o desconhecimento.

Quer um ovo quente? E eis-me outra vez cadáver que não morreu de todo, um morto ainda emaranhado no pesadelo de ter vivido.

Quando os pequenos foram crescendo (são dois, como no Plebiscito, um menino e uma menina), minha interdição começou a ser desmoralizada. Abro os olhos omissos e, como um cão que estranha o dono, tenho vontade de latir para o universo.

Venho de charnecas nevoentas, venho de violentos desencontros e nada quero. Sou só um pedaço de homem, sem forças para galgar os degraus do dia que se oferece. Já inclinado a regressar para sempre ao meu povoado de fantasmas, de horrores e êxtases selvagens, ouço uma voz a pronunciar palavras incompreensíveis e, decerto, sinistras. Faço um esforço sem direção. Uma faísca sonora articulou a palavra papai, estilhaçando a treva que vedava a face do abismo. Papai era eu. Abro os olhos idiotas e vejo uma carinha que não me é de todo estranha. Depois de sofrida reflexão, admito que pode ser minha filha. Mais terei uma filha? Desisto de saber. Fujo por um túnel, ando, ando, e reapareço do outro lado, onde a mesma carinha me espera com a sua condenação. Papai!

Papai sou o mesmo, digo para tranquilizar-me. Removo destroços, procuro espantar pelo menos o grosso do nevoeiro, agarro-me ao abajur, ao armário, á persiana, ao homem da caverna consegue afinal emitir uma palavra: Hã!

A menina, esperançada, repete a sentença ininteligível:

- Como é que eu distribuo 2.400 litros d'água por três reservatórios, de modo que o primeiro tenha 54 litros mais que o segundo, e este 63 litros mais que o terceiro?

Diante desse enigma repelente é muito melhor voltar á condição de ameba, mas já é tarde: estou grudado a uma zona intermediária, numa desolada terra de ninguém, entre dois mundos absurdos. Abre-se um pouco mais a réstia do entendimento, mas o impasse continua. Com timidez e ressentido orgulho, confesso: Não sei. A carinha não se afasta e compõe outro enigma, como se fosse possível a gente ignorar uma coisa e saber outra, como se os enigmas todos não constituíssem um único e esmagador enigma:

- Uma livraria manda pagar a uma casa editora de Paris uma fatura de 1.500 francos por intermédio de Banco de Londres...

Gemido e desespero. A esfinge continua implacável:

- Eu quero saber qual a quantia necessária, em moeda brasileira, se 30 fracos valem uma libra, e esta, 2 cruzeiros.

Aquela libra a 2 cruzeiros me funde e difunde outra vez :

- Não sei; pergunte á sua mãe que é inglesa.

Fecho os olhos. (Puxa, papai!) Abro os olhos. Reconheço com uma alegria de bicho inferior que a menina impertinente sumiu. Posso regressar aos meus pampas impalpáveis, ás minhas campinas eternas. Mas uma pata de urso me agarra pelos cabelos. Papai. Abra os olhos com relutância e vejo uma cara redonda e resolvida do menino.

- Pai, os músculos formam o que chamamos de carne?

- É claro - respondo sem convicção, só para ficar livre daquela cara de maçã.

- Quais são os símbolos da pátria?

- Que pátria?

- Da nossa pátria, ora bolas.

- Não me lembro de todos.

- Como eram constituídas as bandeiras?

- Mesma coisa de sempre: um pedaço de pano e um pedaço de pau.

- Deixa de ser burro, pai; essa até eu sei: as bandeiras eram constituídas de homens, mulheres, moços, velhos, índios amassados, padres, animais domésticos e bestas de carga.

- Se você sabe, por que está perguntando?

- Queria ver se você é mesmo ignorante.

- Vê se não chateia, Daniel.

Recebo uma patada no ombro e reconheço que perdi o combate: vou nascer de novo. A luz me machuca. Usando de todos os meus pseudópodos, rastejo até o chuveiro. A água faz bem aos animais.

Do outro lado da porta as perguntas também chovem: - Qual é o antônimo de fervor?

- O barulho do chuveiro não me deixa ouvir.

- Que consequências trágicas sofreu o Brasil na segunda Guerra Mundial por não possuir estradas?

- Hein? Depois eu conto.

- Movimento de translação é assim ou assim?

- Não posso ver pela porta, não é, Gabriela?

- Como Pedro Alves Cabral podia saber que tinha chegado na baía Cabrália?

- Engraçadinho!...

- Como era mesmo o nome direito do Caramuru?

- João Ramalho, menina.

- Que João Ramalho, pai?

- Uai, não é não?

- João Ramalho é aquele que ajudou Martim Afonso de Sousa na capitania de São Vicente.

- Ah, isso mesmo: o bacharel de Cananéia.

- Mas eu quero saber é o Caramuru.

- O de Caramuru eu não sei não.

Fonte:
Paulo Mendes Campos. Balé do Pato e outras cronicas. SP: Editora Ática, 2008.

Ciranda da Primavera (Seleção por Simone Borba Pinheiro) Parte 6

Retrato
MARIA ALICE ESTRELLA

-
Das marcas que trago no rosto,
muitas recordam as dores,
outras revelam os risos
de um tempo que se perdeu,
mas deixou o seu retrato
nos riscos e cicatrizes,
que lapidaram minha face
como jóia de saudade,
pedra preciosa de emoções raras,
profundas e sempre vivas.
Afinal, tenho um tesouro
que insiste em refletir
no espelho fiel,
os olhos da menina
que, ainda, brilham
nas memórias de sentir.
===================

Prima Vera
MARIA APARECIDA FELIZOLA


I
Na casa da prima Vera
Há caramanchões de primaveras
Plantadas em plena primavera
II
Todos os anos a prima Vera
poda as primaveras
que na primavera
encanta a casa dela
III
A casa da prima Vera
Fica na viela da Vila
da Ponte velha
VI
È primavera vermelha
È primavera rosa
É primavera laranja
É primavera branca
VII
Enfim um festival de primaveras
Que encanta não só a
Casa da prima Vera
mas toda a viela
da Ponte Velha.
VII
Venham todos à viela
Da Ponte Velha
Apreciar as primaveras
Da casa da prima Vera
Em plena primavera
========================

Noites Criativas da Primavera
MARIA REGINA MOURA RIBEIRO


No verão, minha alma canta...
na primavera, meu coração versos cria...
no outono, meu corpo dança...,
e no inverno, eu me entrego aos sonhos.
Prefiro as noites criativas da primavera...
======================

Primavera I
MARICI BROSS


Estação das flores
É a Primavera que chega
Cheia de vida e cores
É a estação do amor
A estação das cores
Dos sabores.

Viver, amar, desfrutar
Deste belo amanhecer
Cheio de magia e beleza

Ah! Estação do Amor
Estação da vida
Seja bem-vinda!
Traga amor e vida
A este coração cansado.

Traga a beleza de suas cores
A suavidade de suas flores
Traga o amor
Traga a vida a este coração
De muito amor.
=====================

Há de vingar o amor
MARILENA TRUJILLO


Lágrimas brilham em meu olhar,
Dolorosa saudade me invade...
Onde ficou o nosso amor, repleto
De ternura, desejo e cumplicidade?

A primavera chegou, seu perfume
Está no ar. Flores enfeitam a cidade,
Pássaros entoam hinos à natureza...
Namorados se beijam com suavidade.

Plantas se vestem de esperança, rosas
Desabrocham cor de sangue, cor de vida.
Sons, odores, vaga-lumes em plena festa...
Há de vingar o amor, de cicatrizar a ferida...

As nuvens negras, assustadas se foram...
Volto para seus braços, para os seus beijos,
Enfeitiçada pela estação, como uma borboleta
Colorida, esvoaçando, acariciando os arvoredos!
=======================

O Ipê Roxo
MÁRIO OSNY ROSA


Naquela roxa flor
A beleza que ali impera.
Ela o anunciador
Logo vem a bela primavera.

O belo jardim florido
Com olhinhos de boneca.
Seu perfume sentido
No momento nem se peca.

Azaléias e hibisco
Roseira e seus botões.
Ninguém logo resiste
Nessa sua bela floração.

Seu perfume a exalar
Que delicia essa viver.
Contaminando o ar
Na primavera conviver.
===========================

Primavera Esperada
NADIR A D'ONOFRIO


Hoje acordei feliz,
Olhei para o sol e sorri.
Chegou, a mais bela estação primavera!
Flores enfeitando as janelas...

Fragrâncias suaves,
Borboletas e abelhas,
As flores fecundando.
Colibris, como jóias cintilando!

Os pássaros no ritual do amor,
Andorinhas em revoada.
Minha sabiá...mais uma vez,
Seu ninho, sobre a porta da cozinha fez!

É a vida seu ciclo renovando,
Uns partindo, outros chegando.
Eu...nesse jardim à esperar,
Assim, nosso antigo caso recomeçar...

Eu quero e você quer também,
Ser feliz...outra uma vez.
Ter o céu e o mar para testemunhar
Um grande amor que nunca...vai terminar!

Quero viver nessa estação,
Em total plenitude, como no verão!
Dar asas à imaginação,
Poder te amar...como ordena...meu coração!
================================

Mãe Natureza
NÁDYA HAUA


O dia amanheceu triste e nublado
Há nuvens pesadas no céu
Sinto a mãe natureza grávida...
Atrás dessas nuvens negras
Um ser se esforça para nascer...
O vento age como o soro
As nuvens são as fortes contrações
Movimentando-se rapidamente
outrora lentas...
A mãe natureza vai conseguir
Um brilho quente desponta agora
A vida está surgindo em forma de luz
A mãe natureza vai ser mãe
É primavera!
E o sol acaba de nascer...
===========================

Primavera e Espera
NANY SCHNEIDER


Chegou setembro, mês de esperanças.
Já se renovam velhas lembranças.
Trazendo ares de muitas mudanças.
E a saudade de tantas andanças....

Chegou setembro, estação das flores.
Sentindo ao longe, aromas e odores.
Vindos de sonhos de antigos amores.
Flores nascendo em todas as cores.

Chegou setembro, com ele o calor.
Das noites amenas, cheias de ardor.
Antevendo o gosto, sentindo o sabor.
Da tão esperada volta do amor.

Chegou setembro, de aves cantantes.
De polens trocados por abelhas errantes.
Movimento suave de relvas ondulantes.
Onde se faz cama a muitos amantes.

Eis a Primavera a cantar.
Versos mágicos a encantar.
Mais uma vez sente-se clamar,
A natureza inteira, para se amar...
=============================

Te fuiste en Primavera
NORA LANZIERI


Las mañanas para mi, ya no tienen sentido.
Salir corriendo,
el colectivo, ¿estarás en la parada?
o llegarás tarde ¿cómo tantas veces?.

Y los sueños, ¿recuerdas?
El amor de tu “Nacho”
el amor de mi, “Adrián”…
que lindo haber vivido
esa etapa de felicidad.

Un día… el segundo y el tercero,
ya no esperabas el colectivo
mis ojos solo te buscaban a ti…
a ti ¡Amiga!, que tanto compartíamos.

Te fuiste lentamente, sin decirme nada,
como el mar con sus olas
se aleja de la orilla sin decir adiós.
Así fue tu partida.
Nuestros secretos quedarán sellados
en el vaivén de un viaje en colectivo,
cuando el otoño lánguidamente vuelva a nacer
cada año y la primavera traiga el aroma profundo
de la nueva estación enamorada.

Fonte:
Seleção por Simone Borba Pinheiro. in http://www.familiaborbapinheiro.com

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 5 : Borboletas, moscas e formigas

Emília esqueceu a vaca e saiu correndo atrás da borboleta, a gritar: - "Dessa não tenho ainda!" Mas não conseguiu pegá-la; cansadinha da corrida, explicou:

- Estou fazendo uma bela coleção de borboletas e dessas azuis não consigo. São das mais ariscas. Temos também de reformar as borboletas.

- Impossível, Emília! - gritou a Rã. - Tudo nelas é tão bem feito, tão direitinho e lindo, que qualquer reforma as estraga.

- Minha reforma das borboletas - explicou Emília - não é na beleza delas e sim  no gênio delas. Quero que se tornem "pegáveis", como os besouros. Já reparou que besouro não foge da gente? Mansíssimos. Mas as borboletas, sobretudo destas azuis, são umas pestes de tão ariscas. Quando descubro uma sentada e me aproximo, ela "bota-se"!

E as borboletas azuis foram reformadas, ficando mansinhas como besouros.

- E as moscas? - perguntou a Rã.

- As moscas - respondeu Emília - vão ficar sem asas, porque são uns bichinhos inúteis e incômodos. Sem asas terão de andar pela terra, como as formigas, e num instante as formigas dão cabo de todas. Para que moscas no mundo? Suprimindo as asas, liquidaremos com as moscas.

- E os pernilongos também?

- Está claro. Esses ainda são piores, porque transmitem moléstias e fazem Dona Benta gastar muito dinheiro com Flit. Q Visconde diz que a febre-amarela, a malária e outras doenças são transmitidas pêlos pernilongos. Corto-lhes as asas e adeus pernilongos, adeus febre-amarela, adeus malária...

A Rã alegou que isso vinha diminuir a música que há no mundo, porque os pernilongos cantam a música do Fiun e propôs outra reforma:

- Em vez de suprimir as asinhas deles, podemos fazer que percam o gosto pelo sangue e aprendam outras músicas além do Fiun. Poderão alimentar-se de água açucarada, ou mel das flores. E podemos fazer gaiolinhas minúsculas, de fios de cabelo, do tamanho de caixas de fósforos, para termos em casa pernilongos cantores. Seria uma galanteza. Um freguês chega a uma loja e pede: "Quero um pernilongo na gaiola, dos bons." E o caixeiro traz várias gaiolinhas para ele escolher, todas com um cantor do Fiun dentro. Mas acho os pernilongos pequenos demais. Eu os faria assim do tamanho de camundongos.

- Oh, não! - protestou Emília. - Sou inimiga do tamanho. Acho que as coisas quanto mais se aperfeiçoam, menores ficam.

A conversa caiu sobre o tamanho. Emília contou vários episódios do tempo em que ela destruiu o tamanho das criaturas humanas, como está contado na chave do Tamanho.

- O tamanho. Rã, é a tolice das tolices, coisa inútil, que só serve para atrapalhar. Se dentro duma formiguinha cabem todos os órgãos necessários á vida - coração, cérebro, pulmões e o mais, e se pequeninínhas como são elas se arranjam tão bem no mundo, por que motivo um tamanhão como o do Quindim, por exemplo? Se os homens fossem do tamanho de pulgas seriam mais felizes. A desgraça dos homens está no tamanho. O Coronel Teodorico tem quase dois metros de altura e pesa cem quilos. Mas que adianta? Nescora uma discussão com o Visconde, que pesa menos de meio quilo e só tem dois palmos de altura. Quando uma coisa começa a aperfeiçoar-se, vai perdendo o tamanho. Aqueles animalões de antigamente - os brontossauros, por exemplo. Por que desapareceram? Porque eram grandes demais. Não havia comida que chegasse. Hoje há poucos animais muito grandes, e parece que todos vão diminuindo. Já o número dos pequenos aumenta. Só de micróbios há milhões. Aqui no sítio nós fizemos guerra ao tamanho e empacamos. Ninguém cresce. Pedrinho e Narizinho estão parados há anos - como Peter Pan.

A Rã ficou triste e confessou que estava crescendo. Cada ano sua estatura aumentava e ela também aumentava de peso.

Emília resolveu o caso:

- Pois pare. Faça como eu. Faça como o Visconde. Qs mamíferos estão diminuindo de tamanho. Você é mamífera. Dona Benta contou que no começo eram quase todos enormíssimos e hoje estão bem menores. E os que teimam em ficar grandes levam a breca. Por que os homens andam a matar se de todos os jeitos nas guerras? Por causa do tamanho. Se ficassem pequenininhos como os pulgões, todos viveriam na maior abundância e sem guerras. Dona Benta diz que a causa das guerras é a falta de comida, um homem como o Coronel Teodorico come uns dois ou três quilos de coisas por dia. Se fosse do tamanho duma pulga contentava-se com iscas de coisas. O que ele come num dia dá para alimentar um milhão de formigas por um mês. Se Dona Benta e tia Nastácia não conseguirem harmonizar os homens lá na Europa, eles continuarão a matar-se nas guerras até não ficar nem um só para remédio.

- E se acontecer isso, quem você acha que vai tomar conta do mundo? - perguntou a Rã.

- As formigas, disso não tenho a menor dúvida. São inteligentíssimas. As idéias delas, de fazerem suas cidades no fundo da terra, é a melhor idéia que existe. Só com isso já escapam de mil coisas, de cem mil perigos - até dos bombardeios aéreos. Que é que os homens fazem para se libertar dos bombardeios? Imitam as formigas - afundam pela terra adentro. Nas zonas arrasadas pela guerra não ficou animal nenhum - mas as formigas ficaram. Só elas - imagine que beleza!

- Mas as formigas me parecem atrasadas em muitos pontos - tornou a Rã. Nem asas têm...

- Como não têm? Têm quando querem. No tempo da "ovação" o céu fica cheio de formigas de asas. Depois descem para abrir buraquinhos e pôr os ovos, e a primeira coisa que fazem é sacudir o corpo e derrubar as asas. No mês de outubro vejo muito disso por aqui.

A Rã ficou pensativa.

- Por que será que elas derrubam as asas, uma coisa tão preciosa?

- Porque só precisam de asas numa ocasião, quando sobem, bem, bem alto, em outubro, a fim de captarem as vitaminas do sol para os ovos. Depois que descem e abrem os buraquinhos já não precisam de asas. Iriam atrapalhá-las lá dentro.

- Mas deve ser muito escuro nos formigueiros - observou a Rã. - Eu gosto muito de luz, muita luz, só luz.

- Que engano! - exclamou Emília. - Você passa nove horas por dia de olhos fechados, dormindo, por quê? Para não ver a luz. Luz só, o tempo inteiro, cansa, atordoa a gente. As formigas usam o escuro á vontade. Quando saem dos formigueiros, regalam-se de luz; quando se recolhem, regalam se de escuro. Isso é que é saber viver. Só luz é tão horrível como só escuro. Por isso é que há a Noite e o Dia.

- E que reforma você pretende fazer nas formigas, Emília?

- Ah, nenhuma. Estudei o caso e vi que com elas nada há a reformar. Tudo perfeito. Eu dou um doce para quem descobrir um meio de melhorar a vida das formigas.

A Rã pensou, pensou e afinal concordou que é mesmo difícil melhorar a vidinha das formigas.
–––––––––––––––––––-
continua…

Folclore dos Estados Unidos (A Lenda do Cervo Branco)

Muitas lendas surgiram devido ao desaparecimento da colônia inglesa de Roanoke. Livros, contos, quadros, séries, filmes falam sobre o assunto.

O livro de Sallie Southall Cotten, “O Cervo Branco: O Destino de Virginia Dare” é uma tentativa de explicar o destino da colônia e de Virginia Dare, a primeira criança de descendência inglesa nascida nas Américas.

Quanto à chegada de europeus à província de Terra Nova, no Canadá, há muito já se descobriu que os vikings foram os primeiros a chegar aqui, 500 anos antes de Colombo.  Graças às pesquisas de Helge Ingstad, descobriu-se as ruínas de L’Anse aux Meadows no Canadá, e segunda os contos nórdicos, uma mulher de nome Gudrun deu à luz um filho que seria o primeiro descendente de europeus nessa terra…

Mas voltando ao livro, ele narra como Virginia cresceu na tribo de Manteo,  winona significa “primeira filha” em Sioux e ska, significa branca. Ela cresceu e se tornou uma linda mulher. Okisko um jovem chefe índio queria casar com ela, só que Chico um velho feiticeiro também queria a mesma coisa.

O velho tentou em vão convencê-la a se casar com ele. Rejeitado ele lançou um feitiço sobe ela e a transformou em um cervo branco.

Okisko estava decidido a reverter a maldição e pediu ajuda a um feiticeiro do bem chamado Wenokan. Okisko fez um flecha com uma concha de ostra e Wenokan a banhou em uma fonte mágica, transformando-a em uma pérola. Para quebrar o feitiço Okisko deveria acertar a flecha mágica no cervo branco e ela se tornaria novamente Winona-Ska.

Nesse meio tempo, o jovem Wanchese, filho daquele que foi à Inglaterra com Manteo, resolveu matar o cervo encantando para ter fama. Para matar esse animal especial seria necessário uma flecha de prata. Por coincidência o pai dele tinha ganhado uma da rainha Elizabeth I quando ele visitou a Inglaterra.

Um dia, Okisko viu o cervo branco próxima das ruínas de Fort Raleigh, na ilha de Roanoke. Mais que depressa ele apontou sua flecha de pérola para o animal. Infelizmente, Manteo também disparou sua flecha de prata no cervo.

As duas flechas acertaram o cervo ao mesmo tempo. A flecha de Okisko transformou-o em uma linda mulher novamente, só que a flecha de Manteo também acertou seu coração.  Okisko correu até ela, mas Virginia morreu em seus braços.

Desesperado ele corre até a fonte mágica e banha as duas flechas nas águas, implorando pela vida de Winona. Quando ele voltou para o local, não havia sinal nem de Virginia, nem de cervo. Mais tarde, o cervo branco reaparece olhando para ele com olhos lindos e tristes. Então ela corre para as matas.

Desde esse dia, até hoje muitas pessoas dizem que veem um cervo branco fantasmagórico próximo da área onde a Colônia Perdida fez seu primeiro assentamento.

E essa foi uma das lendas sobre Virginia Doe, talvez o mistério nunca seja explicado, nem mesmo com o projeto de análise do DNA dos índios da área, mas talvez seja mais interessante imaginar o que teria sido feito de todos…

Fonte:
http://www.learnnc.org/lp/pages/1647
Texto em português http://casadecha.wordpress.com

José Roberto Balestra (A Barragem)

Há dias que tanto faz como tanto fez
Que a coisa fique cinza ou amarela
Feito alguma estupidez
Ou qualquer abanadela
De um doce adolescer

Hoje amanheci assim
Não troco uma Zepparella
Por um velho e bom Led Zeppelin
A vida é boa barbaridade

Melhor é ter um dente só
E andar pela cidade
Do que ficar logo banguela
Sem nenhuma bocatividade
Esperando quando a barragem romper...

Concurso Literário Litercultura (Resultado Final)

Os mais de setecentos textos inscritos no concurso promovido pelo Litercultura, com o apoio da Fundação Cultural de Curitiba e da Gráfica e Editora Mona Lisa comprovam o êxito da iniciativa. E revelam parte da produção e das tendências de linguagem dos novos autores que estão escrevendo poemas, contos e crônicas no Paraná. Principalmente em Curitiba, de onde proveio a grande maioria dos trabalhos concorrentes.

Não foi somente na quantidade o sucesso do concurso, mas também na qualidade dos inscritos. Especialmente no gênero conto, foi preciso reler e reexaminar, comparar, refletir para, afinal, selecionar apenas no limite de vinte. Houve aí muito mais trigo do que joio.

Houve casos também de autores que inscreveram livros inteiros – romances, coletâneas inteiras de poesia e de contos. No caso dos dois últimos, entendeu-se que os autores preferiram revelar um conjunto mais amplo de sua produção, para que houvesse pelo menos a escolha de um texto.

Mas, tratando-se de um romance inteiro, infelizmente, não foi possível sequer sua leitura, por extrapolar o propósito do concurso e, claro, os gêneros do concurso. Além do mais, tratando-se uma antologia, com propósitos modestos – o de revelar bons novos autores –, as restrições já estavam definidas na própria medida do livro. Apesar disso, também foram considerados aqueles contos que, sendo extensos, não extrapolavam, entretanto, as características do seu gênero. Porque, embora uma parte das peculiaridades da modernidade e da pós-modernidade tenha sido o turvar um pouco a definição dos gêneros, eles ainda são reconhecíveis e classificáveis, inclusive os narrativos.

Também foram inscritos trabalhos que se inserem claramente em gêneros como o infanto-juvenil e o de novela gráfica ou de história em quadrinhos, e, como no critério usado para os romances, não foram considerados para a antologia.

Algumas surpresas e peculiaridades podem ser apontadas. A primeira foi a predominância da prosa sobre a poesia. E, na prosa, do conto sobre a crônica. Na prosa, a influência de Leminski é bem nítida em vários textos, e Dalton Trevisan segue como uma referência muito viva no conto, quase sempre tendo como ponto de partida e de chegada a realidade urbana. Mas peculiar mesmo é a sobrevivência do Romantismo e até do Ultra-Romantismo em diversos dos textos inscritos, e a irrupção do interesse pela Fantasia em outros, mas em grande parte epígonos do cinema ou da literatura anglo-saxã.

O intimismo convive com flashes da realidade mais bruta. Retrato ampliado do que se vive tocando a imaginação e a memória da literatura na atualidade.

Por fim, chegou-se a um conjunto de textos que refletem bem, e de modo quase homogêneo, algo como um leque das tendências e dos talentos que florescem, já floresceram ou afloram, a partir desta antologia.  Em muitos sentidos, visceral, e à flor da pele.

 RESULTADO DO CONCURSO:

POESIA

1          Tarde de Domingo, de José Tucón

2          Teia, de Matheus Alexandre Moreira Toniolo

3          A cada poema, de Giovanna Lima

4          Perspectiva, de Isabel Furini

5          Biografia de um homem, de Rodrigo Dallapiccolo

6          Caminhos, de Livia Lakomy

7          A vida das coisas, de Carla Anéte Berwig

8          Inspiração, de Fábio de Castro Quintanilha

9          Já não é, de Gilberto Gil Jesse de Oliveira

10        Viaduto, de Miguel Henrique Sandin

11        Exclamação, de Miguel Henrique Sandin

12        Já viu um olho de perto?, de Miguel Henrique Sandin

13        Gritam na casa, de Miguel Henrique Sandin

14        Alcóolatra, de Miguel Henrique Sandin

15        Sublimação, de Fabio Bioca (Fábio André Rolim De Moura)

16        As Mil e Uma Noites em 140 Caracteres Rimando, de Luiz Cezar de Araújo

17        Mobilidade, de Livia Lakomy

18        Quebranto, de Milena Vargas de Oliveira

19        Silêncios, de Giovanna Lima

20       Dois olhares, de Mário Augusto Jaceguay Zamataro

CONTO

1          Surpresa!, de Monica Kukulka

2          Tom, de Marina Yoshimi Rodrigues Mori

3          Tons, de Daniela Piva

4          Dama da noite, de Amanda Tintori

5          Dançando com garrafas vazias na banheira de tijolos, de Victor Hugo Turezo

6          Discórdia, de Luiz Cezar de Araújo

7          Pequenas tempestades, de Carolina Baldissera Damião

8          Polainas, de Laís Valério Gabriel

9          Batom vermelho-sangue, de Amanda Tintori

10        Beco 1, de Victor Hugo Turezo

11        A poça, de Tatiana Angèle de Carvalho

12        Eu, Tom & Jerry, de Rodrigo Gomes de Araujo

13        Grão de milho, de Diego Gianni

14        Sobrevivente, de Thaís Macedo

15        Luar, de Emerson Henrique Gomes Machado

16        O inferno são os outros, de Luiz Cezar De Araújo

17        O pescador de pecados, de Márcia Széliga

18        Dominique, de Paulo Roberto Anastacio Da Silva

19        Entremares, de Eliege Cristina Pepler

20        Eternidade, de Reinaldo Alexander Franco Zaruvni
 CRÔNICA         

1          Demiurgia, de Gustavo Henrique Fontes

2          Machado vs. Nietzche, de Renato Vieira Ostrowski

3          Bons tempos aqueles, de Fabricio Luiz Matoso

4          Coisas da língua, de Pulcina Maria Souza Ribeiro
5          A sétima badalada, de Mark Mielke de Lima

6          Experiências torpes, corpos viciados e mentes mais do que normais, de Evelin Raupp Maia de Almeida
7          Insone, de Nando São Luiz

8          Sorria você esta sendo filmado, de Regina Célia Rodrigues dos Santos

9          Curitiba é uma fresta, de Willy Bortolini Barp

10        Mistério nas noites de um passeio público, de Zélia Maria Bonamigo

11        Paciente CWB, de Livia Lakomy

12        O resto da vida, de Rodrigo Gomes de Araujo

13        O vento, de Surya Amitrano

14        Olha o bucheirooooo, de Alcir Chiari

15        Paciência, de Pedro Meregue Filho

16        Sábado, de Thiago Alberto Kaminski Larsen/Gustavo Moreira

17        Arte sem intelecto, de Thiago Alberto Kaminski Larsen/Gustavo Moreira

18        Visagem, de Gabriela Mendes da Cunha

19        21 de dezembro, de Celio Roberto Pereira de Oliveira
20        A Colifata. O Drama da Vaca, de Sheila Maria José Pita

Lançamento dia 20 de novembro em horário e local a ser divulgado.

Fonte:
http://www.litercultura.com.br/?p=793

Vocabulário de termos e expressões regionais e populares do Centro Oeste (Mato Grosso e Goiás) T, U, V e Z

T

TRIEIRO — Trilheiro: trilho onde se anda a pé, principalmente por onde caminha o gado, para a aguada.

TUCUM — Coqueiro muito abundante em Goiás. Produz um cacho grosso e carregado de frutos redondos e roxos-pretos, parecendo jabuticabas; o fruto faz-se muito apreciado. Das folhas do tucum extrai-se uma fibra muito forte que no norte do Estado é largamente aproveitada para a fabricação de redes. O espinho é muito perigoso.

U

UBÁ — Canoa dos índios; é feita de um pau só, como um cocho.

V

VARANDA — Sala de jantar das casas do interior.

VAREJAR — Usar o varejão, ou vara comprida que vai ao fundo do rio, impulsionando a canoa.

VAU — Lugar do rio que dá passagem.

VEREDA — Várzea servida por um regato margeado de prados virentes.

VIAJADO — Indivíduo que lucrou em viagens grande experiência da vida.

VIANDA — Comida -de pensão, conduzida em marmitas.

Z

ZOEIRA — Barulho; atordoamento da cabeça, dos ouvidos; zumbido.

ZONZO — Tonto. "Levou uma paulada na cabeça e ficou zonzo". Desatinado, "indivíduo zonzo".

Fonte:
Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. Ed. Literat. 1962

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Norália de Mello Castro (Mandacaru)

Sou montanhesa.

Um dia, o mandacaru entrou em minha vida.
Encontrei-o com seu desenho peculiar
a chamar todos os clamores do verde com espinhos.

Forma altiva,
singular,
soberbo
das raízes às suas pontas,
mesmo sem acalentar
qualquer galho, qualquer tronco.

Sangrei as mãos em feridas,
lambi o sangue
dos espinhos a tocar a capa das entranhas.

O mandacaru permaneceu.
Em beleza explodiu.
Joguei brancos e
matizei toda aquela planta.
Pintei.
Sintetizei o passado
no presente.
Deu uma saudade danada!
Joguei tudo ao chão.
Parti o mandacaru.
Não retirei a sua seiva.
Retirei da planta a água onde nasci.

O mandacaru esfacelado
jorra ainda a seiva do viver;
colhi de sua essência - o alimento.
***

A essência:

Mandacaru
verde,
palmilhado de branco,
ligeiros toques marrons.
Cor soberba
permanece na vitrine,
Sem perder seu frescor,
Sem perder sua mensagem,
Sem dizer uma palavra
a formar todo o texto.
***

A viagem:

Do mandacaru
às estradas dos eucaliptos:

lá onde bebem de sua seiva,
cá onde recolhem de sua lágrima,

Lá sem cheiros ou perfumes,
Cá os perfumes a embrenhar.

Lá onde o sol castiga.
Cá onde a sombra se faz.

Lá entre espinhos rasteiros.
Cá entre folhagens luzentes.

Lá onde o dia nasceu.
Cá onde a noite se fez.

Lá onde os passos foram dados.
Cá onde os sons se repetem.

Lá o sol e o fá.
Cá o carrilhão.

Entre lá e cá,
permanece a alma,
estranhamente,
a ditar: vivi,
não sonhei.
Amanheci encharcada.
***

A disciplina:

Disciplina. Disciplina.
Qualidade necessária
para desenvolver o talento.

Disciplina. Disciplina.
Receita dada por pensadores
aos jovens que querem vencer.

Disciplina. Disciplina.
Envolve ordem,
requer constância.

Disciplina. Disciplina.
Determinação.
Até virar obsessão

A obsessão deve ter módulos
até tornar dona de todos,
esgotando-se até chegar
à realização.
***

Tem-se de arrancar
os espinhos do mandacaru
com disciplina mágica,
para não se ferir as mãos,
muito menos o coração.
Sem feridas a sangrar,
descobre-se o ponto final
da disciplina disciplinada.
Cai-se na indisciplina ordenada.

É o jeito
da Dor virar prazer.
***

As travessias:

Passei pelas águas
- o rio caudaloso entornou.

Passei pelas montanhas
- aspirei junção do rio e terras.

Passei por ruas
- sombras encontrei.

Passei aqui e ali
- matutei:
Por onde andarei agora?
- a Mãe Terra me acolheu,
Assim. Aos montões:
terra e águas juntas,
terra e céu juntos.
Juntei tudo:
***
O encontro:

finalmente deixei
o coração mergulhar nas águas,
a transpor por montes.
Abri o coração do mandacaru,
Jorrei sua seiva sobre o papel.

Fonte:
Rede de Escritoras Brasileiras

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Clevane Pessoa (Encantamentos)

Imagem: Bia Tomaz
Tudo em torno parece feérico e extasiante:
a neblina
que desce num momento
de repente, qual um sonho de menina...
o canto da ave
que singra o espaço azul
qual se fosse bela nave
feita de imaginação...
a asa da borboleta
a fremir qual um pincel
cheio de tintas...
o riso do idoso que brincando
quer brincar ainda-e sempre...
a flor que sonolenta acorda
adulta e se abre inteira
ao beijo do sol...
a semente gorda
que sob a Mãe Terra, eclode
e vai romper seu ventre
em sinal verde...
Tudo é magia, encantamento
porque a ânsia criativa das criaturas
põe fiapos de luz
em cada nuance da Vida
e trabalhando o mundo
a cada instante,
o transmuta e recria...

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 4 – Reforma da Mocha

Por muito tempo ficaram as duas conversando sobre reformas e mais reformas e, como estivessem debaixo da jabuticabeira, iam falando e comendo as deliciosas frutas. Em certo momento Emília disse;

- Esta jabuticabeira, por exemplo. Não acha que é uma vergonha uma árvore deste tamanho dar frutinhas tão pequenas? E no entanto temos lá na horta um pé de abóbora que dá abóboras enormes e é um pé que nem é pé de coisa nenhuma - não passa dum talinho mole que se esborracha quando a gente pisa em cima. Vou mudar. Vou botar as jabuticabas no pé de abóbora e as abóboras na jabuticabeira.

- Mas isso foi o que o Américo Pisca-Pisca fez - alegou a Rã - e o sonho lhe abriu os olhos.

- É que o bobo foi dormir debaixo da jabuticabeira - e sabe para quê? Para que a fábula ficasse bem arranjadinha. O fabulista era um grande medroso; queria fazer uma fábula que desse razão ao seu medo de mudar - e inventou essa história do sono do Américo debaixo da jabuticabeira. Já reformei essa fábula.

O chão encheu-se de tantas cascas que Rabicó se aproximou, farejando.

A Rãzinha, que ainda não conhecia o famoso Marquês, regalou-se de olhá-lo.

- Como está gordinho e lustroso, Emília! É ainda marquês?

- Que remédio? - berrou Emília. - Título é como apelido: quando agarra uma criatura não larga mais.

Aqui nas vizinhanças temos um negro de 70 anos que tem o apelido de Tadinho. Sabe por quê? Porque quando nasceu todos começaram a tratá-lo de "Coitadinho" - depois "Tadinho" - e ficou Tadinho toda a vida, um negrão daqueles...

- Mas você, Emília, parece que nem mais se lembra de que é marquesa, não?

- Às vezes me lembro, mas sem prazer nenhum. Que gosto ser marquesa de um marquês assim? Meu sonho você bem sabe qual é...

- Sei - é ser mulher dum grande pirata, para mandar num navio. Por que então não se casa com o Capitão Gancho?

- Que idéia ! - exclamou Emília. - Não há pirata que mais desmoralize a classe do que esse. Primeiro não tinha um braço e agora nem navio tem. A sua "Hiena dos Mares" virou "Beija-Flor das Ondas", como você bem sabe - e hoje é de Pedrinho. Eu queria casar-me com um daqueles grandes piratas dos tempos do ouro do Peru, aqueles que atacavam os galeões espanhóis em pleno mar, com as facas atravessadas nos dentes. Há um, chamado Morgan, que me servia. Também já pensei num pirata submarino mas desisti. Submarino me dá falta de ar.

Rabicó apenas cheirou as cascas das laranjas. Só gostava de casca com gomos dentro.

- E a vaca Mocha? - perguntou a Rã. - Vai reformá-la também?

- Claro que sim - e já. Acompanhe-me. Lá se foram as duas para o pastinho da Mocha, que estava pachorrentamente mascando umas palhas de milho. Ficaram diante dela, de mãos á cintura, discutindo a reforma.

- Eu mudava o depósito de leite - disse a Rãzinha. - Punha torneirinha nas tetas para evitar o que hoje acontece: para tirar o leite os vaqueiros apertam as tetas com as suas mãos sujíssimas - uma porcaria. Com o sistema de torneira essas mãos não tocam nas tetas.

Emília deu uma risada gostosa.

- Que bobagem! Bem se vê que você é menina do Rio de Janeiro. Pois não sabe que a função das tetas é dar leite aos bezerros?

Como pode um bezerrinho mamar em torneiras?

- Ensinávamos os bezerros a abrir as torneiras.

- Não - declarou Emília. - Muito complicado. Na Mocha quero umas reformas úteis para ela mesma e não para as criaturas que a exploram. Vou pôr a cauda da Mocha bem no meio das costas, porque assim como está só alcança metade do corpo. Como pode a coitada espantar as moscas que lhe sentam no pescoço, se o espanador só chega às costelas? Tudo errado ...

E plantou a cauda da Mocha no meio das costas de modo que pudesse espantar as moscas do corpo inteiro: norte, sul, leste, oeste. E passou as tetas para os lados, metade á esquerda, metade á direita.

- Assim podemos tirar leite de um lado enquanto o bezerrinho mama do outro. Reforma não é brincadeira. Precisa ciência.

- ótimo! - concordou a Rã. - E podemos botar torneirinhas nas tetas do lado direito - para serviço dos leiteiros. As do lado esquerdo ficam como são - para uso dos bezerrinhos.

Emília aprovou a idéia . Depois passaram a considerar os chifres.

- Toda vaca de respeito tem chifres - disse Emília - menos esta coitada, que é Moclia. Vou dar-lhe  chifres compridos, mas sem ponta aguda.

A Rã lembrou que os esgrimistas usam floretes com um chumaço na ponta. Podiam dar à Mocha dois chifres pontudos mas com chumaço na ponta. Emília aperfeiçoou imediatamente a idéia .

- Em vez de chumaço. Rã, podemos espetar nas pontas uma bola de borracha maciça - uma bola "tirável", isto é, que possa ser tirada de noite.

- Para quê?

- Para que ela possa defender-se de algum ataque noturno. Os chifres são a única defesa dela, coitada.

- Mas que perigosos noturnos há por aqui?

- O das onças, minha cara. Tio Barnabé diz que uma antepassada desta Mocha foi comida por uma onça.

De dia a Mocha pode usar a bola porque as onças só atacam durante a noite. E a Mocha foi armada de dois esplêndidos chifres elegantemente retorcidos como saca-rôlhas, com duas bolas maciças nas pontas - bolas "tiráveis."

O pêlo da vaca também sofreu reforma. Ficou macio como pelúcia e furta-côr. Estavam ocupadas na reforma da Mocha, quando passou por cima delas uma linda borboleta azul.
----------
continua...

Wanderlino Arruda (Poesias Avulsas)

Libreria Fogola Pisa
Adoro tua beleza

Adoro a tua beleza,
a luz da tua simpatia,
o amor gostoso que há nos teus olhos,
um brilho, uma bênção de felicidade
que tua alma não deixa esconder,
que te faz tão linda!

Como é bom amar a vida
do jeito que te vejo amar.
bom seria que estivéssemos sempre juntos,
bem juntinhos para vermos o sol e a lua,
para sentir as estrelas todas
e contá-las no tempo e no infinito,
com infinita ternura.

Bom seria ter sempre e sempre
a sensação de tua presença,
do teu calor,
da tua pele morena,
da tua alegria,
do teu viver !
–––––––––––-
Amar

Amar,
Amar muito,
Amar todas as horas,
amar sempre, sempre
amar a vida,
te amar, meu amor,
porque amar é viver.
Gostando de ti,
gosto do vida,
vivo de amar.
De tudo que acontece,
no meio dos sofrimentos,
no meio das alegrias,
no meio das esperanças,
adoro o teu amor,
adoro o teu sorriso,
o brilho da tua alegria,
a cor verde dos teus olhos,
te adoro, morena.
Entre a terra e o céu,
gosto das flores,
da brisa, da luz,
das muitas crianças,
gosto do próprio amor.
Mas, acima de tudo,
de mais do que tudo,
é de ti, minha querida,
o meu viver,
O meu amar !
–––––––––––––––-

Bons dias bem vividos

Doce lembrança,
saudades,
adoráveis sentimentos,
claros montes,
luz, muita luz,
intensa luz.

Meio-dia, limite,
alegria muita.
Na distância, um logo além,
no depois, um antes:
auroras, felicidade.

Tardes de intensa alegria,
noites-verão, dias-inverno,
Ingênuas manhãs,
ingênuas,
bem ingênuas,
mais que a madrugada,
de sonhos nos sonhos,
deleite.
Simbiose, crepúsculos,
tons vermelhos,
rosa-amarelo, ouro no azul,
lilases e sombras
douradas maravilhas...
prata. Antes do depois, ainda,
fios de claridade,
fontes, conforto-luz,
pura alegria,
sorrisos,
bons dias bem vividos!
–––––––––––––––––––––––-

Causa de amor
Ao teu lado,
bem pertinho de ti,
sinto feliz alegria,
aura de muito amor
envolvente e carinhoso,
doce como sonho
em meio da madrugada.

És beleza, brilho e luz.
Tez morena,
olhos de esmeralda:
um encanto.Tua presença linda
desperta em mim
gostosa vida,
evidente causa de amor !
––––––––––––––––––

Olhar-magia

A beleza de teus olhos
eu julgo, eu analiso:
são brilhos de um céu em cor
de mil momentos.Teu olhar tem majestade
em claro-verde
de penumbra luz,
carinho e tarde
em viagem mito
de encantamento.

Teus olhos, um esplendor,
cativam minh'alma
e o meu querer.Teus olhos mostram,
teus olhos vibram
sonho e transcendência linda,
em direção Sul,
ou Leste-oeste,
ou ao Infinito.

Nunca vou deixar dizê-los
charme e bem-parecer,
encantamento:
a Natureza os fez,
mas o enlevo-imã,
luzir fascínio, emoção e música
só eu sei sentir.Teus olhos,
Um espelhar divino,
uma luz crescente,
sol marcante para os meus.

Aí teu fôlego e coração:
significado de amor.
Aí, minha querida,
em guerra e viver-estímulo
reconheço te fazer feliz !
–––––––––––––––––––-

A poesia de Dóris
Linda a poesia de Dóris,
Linda!
Muito de poesia:
beleza de juventude,
ritmo de meninice,
colorido de alegria.
Mil cores.

Confidência de Primavera,
Dóris deixa fluir e fluir-se
sem segredo algum.
O verso é cristal:
jorra e seduz, sempre sincero,
limpo e transparente.
Agradável sempre!

Dóris canta o canto,
não importa se o dia é dia
ou se a noite chega,
porque poesia tem cheiro-criança
e brilho de floresta mágica.
Toda criatura é de Deus,
Realidade sempre.
A música é livre
e o verso não é ilusão.

No infinito olhar de Dóris,
o além permite caminho
E o amanhã será sempre lindo.
Preciso é dourar a esperança,
preciso é viver e amar,
dispensando a visão de enfeites.
"Felicidade é pés na enxurrada,
tamancos na mão,
alma ensopada
pingando paixão".Mais do que isso
só banho em águas de fadas.
Ou dança com duendes
de múltiplas madrugadas.
––––––––––––––––––––––––––––

Sonhos de sonhos

Passo a passo,
passam os passos
de sonhos bem sonhados
em múltiplas sinergias.

Alma com sol e lua,
estrelas incontadas,
terra e céu,
saudades.
Aqui encanta o canto
com mil matizes.

A sensibilidade vive e vibra
por luminosas dimensões.
O bem-querer cavalga
em cintilantes brisas
de vento-luz.
Felicidade sim.

É acordado o amanhecer:
agora ilumina a sedução
e poetiza vívidas vidas,
vidas revividas.
Múltiplas vidas.

Fonte:
Casa do Bruxo