sábado, 29 de março de 2008

1º Concurso Trova Une Versos (Resultado Nacional e Estadual)


Resultado Nacional

Tema Sonho

Trovas: 135
Estados / Paises Participantes:
(SP - 20) (SC - 02) (RJ - 09)

(PR - 09) (RS - 06) (PE - 04)

(PA - 01) (CE - 03) (MG - 03)
(Portugal - 09) (Argentina – 01) (USA – 01)

(França – 02)

Trova Ouro - 1º Lugar
( Miguel Russowsky - SC)
A primavera, suponho,
que tendo sonhos de amor,
faz, sim,com que cada sonho
nasça em forma de uma flor.

Trova Prata - 2º Lugar
(Regina Célia de Andrade - RJ)
Aquele que firme avança,
sem receio de fracassos,
mantém consigo a esperança
levando o sonho nos braços.

Trova Bronze - 3º Lugar
(Renata Paccola - SP)
Não há nada que retalhe
os poemas que componho,
pois cada verso é um detalhe
do tamanho do meu sonho!
---
Menção Honrosa

1ª menção honrosa
(João Paulo Ouverney - SP)
Poeta, és velho coreto
onde, na noite estrelada,
teus sonhos fazem dueto
com a voz da madrugada...

2ª menção honrosa
(Alba Christina Campos Netto - SP)
Morre o sonho, e as nossas vidas,
antes, caminhos iguais,
são duas trilhas perdidas
que não se cruzam jamais.

3ª menção honrosa
( Marina Gomes de Souza Valente - SP)
Pelas ruas, no passado,
nos realejos risonhos,
o periquito amestrado
passava vendendo sonhos.
-------------------------------
Menção Especial

1ª menção especial
(Marisa Vieira Olivaes - RS)
Se o mar da vida, tristonho,
faz meu sonho naufragar,
iço as velas de outro sonho
e outra vez volto p'ro mar!

2ª menção especial
(Renato Alves - RJ)
O sonho mais belo e ardente
da minha infância querida
virou cinzas, de repente,
nas fogueiras desta vida!

3ª menção especial
(Milton Sebastião Souza - RS)
Sonhar é o jeito mais certo
de dar um passo gigante:
o sonho traz para perto
o que parece distante.

4ª menção especial
(Domingos Freire Cardoso - PORTUGAL)
Trago um sonho pequenino
Guardado dentro do peito
Que é morar sempre um menino
Neste corpo de homem feito...


Resultado Estadual (RN)

Tema Lenda

38 Trovas Participantes

Trova Ouro - 1º Lugar:
(Ieda Lima - Caicó/RN)
O bilro, velho instrumento,
que entrelaçou tantas rendas,
tece, agora, num momento,
as rimas de minhas lendas.

Trova Prata - 2º Lugar:
(José Lucas de Barros - Caicó/RN)
Mais do que fadas e mitos,
num cernário encantador,
tenho sonhos tão bonitos,
que viram lendas de amor!

Trova Bronze - 3º Lugar
(José Lucas de Barros - Caicó/RN)
Juntei os sonhos dispersos
no chão da realidade
e pus na lenda dos versos
um poema de verdade.
________________
Menções Honrosas

1ª Menção Honrosa:
(Ademar Macedo - Natal/RN)
Arquivei na minha mente
lendas que trazem saudades,
e eu as vivo, simplesmente,
como se fossem verdades.

2ª Menção Honrosa:
(Mara Melinni de Araújo Garcia - Caicó/RN)
Tempo que reparte a vida,
faz o meu destino assim:
Vida é lenda dividida...
Parte é começo, outra é fim!

3ª Menção Honrosa
(Fabiano de Cristo Magalhães Wanderley - Natal/RN)
Confirmando as suas lendas,
por capricho, o velho mar,
cobre as areias de rendas,
quando a praia, vem beijar...
______________________
Menções Especiais

1º Menção Especial:
(Francisco Neves Macedo - Natal/RN)
Eu vou trilhando esta senda
tão difícil da poesia,
e nela quero ser lenda,
eis meu "sonho fantasia"!

2ª Menção Especial:
(Joamir Medeiros - Natal/RN)
Mesmo vencendo a contenda,
e os medos da tenra idade,
o lobisomem é a lenda
que vive em minha saudade!

3ªMenção Especial
(Paulo Roberto da Silva - Caicó/RN)
Há na mente da criança
um ideal tão fecundo,
que toda desesperança
torna-se lenda no mundo.

4ªmenção Especial
(João Medeiros - Caicó/RN)
De formas tão diferentes,
entre ritos e oferendas...
do imaginário das gentes
surgiram mitos e lendas!

Fonte:
Colaboração por e-mail de
Helio Alexandre (Natal/RN)

Izo Goldman (Trovas de quem Ama a Trova)

Izo Goldman, um dos maiores talentos trovadorescos da atualidade, no Brasil, e a maior “enciclopédia ambulante” sobre o assunto, lançou, com grande repercussão, em São Paulo, no ano passado, o seu livro “TROVAS DE QUEM AMA A TROVA”.

São 311 trovas, incluindo prólogo, etc., de um verdadeiro gênio da arte de fazer poesia em quatro versos de sete sílabas.

Eis algumas delas:
Se a gente fosse dar crédito
ao que diz a maioria,
só de "autor de livro inédito"
tinha uns mil na Academia!...

No seu biquini apertado,
Maria me deixa mudo,
pois nunca vi "tanto nada"
cobrindo, tão pouco ..."tudo"...

Marcando suas fronteiras
as bandeiras eram trapos,
e, os trapos eram bandeiras,
na Querência dos Farrapos!

Quem morreu naquela Cruz,
foi o Corpo e nada mais:
ninguém apaga uma Luz
crucificando ideais!

Quando pergunta o burrinho,
diz a mula envergonhada:
- "Tu nasceste, meu filhinho,
por causa de uma...burrada!..."

Eu sou príncipe tristonho
porque, na história real,
não há, na escada do sonho,
sapatinhos de cristal!...

Na briga que o meu cabelo,
e a careca estão travando
lamento ter que dizê-lo,
a careca está ganhando...

Com seu valor aumentado,
saudade é a restituição
do que já nos foi cobrado
pelos sonhos e a ilusão...

- " O trabalho é que enobrece!"
Dizem todos ao Raul.
E ele responde: - "Acontece,
que eu detesto sangue azul!"

A saudade não me poupa,
desenhando, fio a fio,
o perfil da tua roupa
no guarda-roupa vazio...

O teu gesto de ternura,
na minha vida sofrida,
foi um copo de água pura
matando a sede da vida! ...

Uma devota a rezar
é o que a rendeira parece,
faz da almofada um altar,
de cada renda, uma prece!

Cara cheia...Perna bamba,
ele mesmo se conforta,
olha a rua e diz: - "Caramba!"
Nunca vi rua mais torta!...

Ficou rico o Zé Maria
na seca do Juazeiro,
vendendo "fotografia
de chuva"...por "dois cruzeiro"...

Vendo alguém varrer o chão,
ele deita de comprido,
e, dá logo a explicação:
- "Quero ser...doido varrido..."

"Casamento... - alguém já disse -
é chegar à encruzilhada
onde acaba a criancice
e começa...a criançada..."

Todo "barbeiro" sustenta
que a "batida" foi assim:
-"Veio um poste a mais de oitenta,
na contra-mão, contra mim!..."

Sai do museu, braço dado
com sua sogra, o Sinfrônio:
e o guarda grita, alarmado:
- "Tão roubando o patrimônio!"

O pai da moça, que é mau,
Chega em casa e acaba o "baile"...
É que o Zé, "cara de pau",
tava namorando em..."braile"!!!

-"Vem aí um furacão!!!",
avisa a rádio, - "Cuidado!!!"
e o genro por ...precaução...
põe a sogra...no telhado!!!

Tomou Viagra...Fracasso...
Foi cobrar de quem vendeu:
- "E agora, como é que eu faço???"
- "Enterra! Que já morreu!!!"
.
Fontes:
GOLDMAN, Izo. Trovas de quem ama a trova. São Paulo: BMG, 2007.
http://www.tribunadonorte.net/edicoesanteriores/030807/cultura.htm
http://trovasecia.blogspot.com/ (capa do livro)

Trilussa (Coisas da Alta Sociedade)

Uma das fábulas mais traduzidas, de Trilussa, é a que se refere ao porco desejoso de abandonar a vida do chiqueiro e que tentou adaptar-se ao luxo nos salões da alta sociedade. A melhor dessas traduções é a da lavra de Paulo Duarte:

O PORCO

Um velho porco disse, um dia, à vaca:
– À minha vida suja vou dar fim.
Para isso, é só meter-me na casaca,
E a cartola, a luneta e o borzeguim

farão o resto. Vou para a cidade,
onde me insinuarei no alto escol,
em meio à nata e a flor da sociedade,
que isto aqui não vale um caracol.

Com tal coisa metida na cabeça,
se bem disse, melhor o porco fez.
Ao chá dançante foi, de uma condessa,
onde bebeu, dançou, falou francês.

Metendo-se no meio da alta roda,
e com ela gozando o vinho e o amor,
vários dias o porco andou na moda,
parecendo um autêntico senhor.

Mas…não se sabe que reviravolta
Houve, que regressou dias depois.
– Como? – pergunta a vaca – já de volta?
Outra vez entre porcos e entre bois?

Não se deu bem com a aristocracia?
O que vi, ninguém pode calcular,
respondeu, – pois vi tanta porcaria
que não pude por lá me acostumar.

====================================================
Trilussa (pseudônimo do fabulista romano Carlos Alberto Salustri) (Roma, 26 de outubro de 1871 — 21 de dezembro de 1950) foi muito conhecido e aplaudido em todo o mundo, principalmente no Brasil, na década de 30 do século passado. Sua ironia mordaz não poupava as vaidades e as pretensões humanas do seu tempo, evidentes e reconhecíveis sob a máscara de bichos humanos e selváticos. Advogados, magistrados, diplomatas, religiosos, políticos, governantes e governados – eram o alvo certeiro de suas sátiras bem imaginosas, escritas em dialeto romanesco, uma espécie de gíria da capital italiana.
=====================================================
Fonte:
SOUSA, Sávio Soares de. Novas fábulas de Trilussa. Seção Nozes & Vozes. in Revista Bali – ano XIX – nr 201 – novembro de 2007 – Itaocara, RJ – p.3 e 5

sexta-feira, 28 de março de 2008

Paraná em Luto

Morre presidente da Academia Paranaense
de Letras, Odilon Túlio Vargas.

O ex-deputado federal, ex-secretário de Justiça do Paraná, procurador aposentado do Estado e presidente da Academia Paranaense de Letras, Túlio Vargas, de 78 anos, morreu nesta madrugada vítima de fibrose pulmonar, no Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba, onde estava internado desde sábado.

Lauro Grein Filho, presidente em exercício da Academia Paranaense de Letras, e amigo pessoal de Túlio Vargas disse que só tem elogios à fazer. "Ele era uma pessoa muito autêntica, muito correta, muito fiel. Como político teve um comportamento educado, além de ser um amigo dileto por muitos anos", salientou Grein.

Luto oficial

O governador Roberto Requião decretou luto oficial de três dias pela morte do presidente da Academia Paranaense de Letras, Túlio Vargas. “Perco um bom amigo e o Paraná perde um paranaense ilustre, um intelectual competente, um homem sério e correto que deu grande contribuição ao Paraná contemporâneo”, disse Requião, pela assessoria de imprensa.

Vargas deixa a mulher Lílian e dois filhos. O corpo será sepultado hoje no Cemitério Parque Iguaçu.

Fontes:
http://www.atarde.com.br/
Gazeta do Povo - 27 de março de 2008.

Túlio Vargas (1929 - 2008)

Odilon Túlio Vargas nasceu em Pirai do Sul, Paraná, no dia 28 de junho de 1929. Túlio Vargas era filho do deputado Rivadavia Vargas e de Dalila Rolim Vargas, é bisneto do célebre sertanista, revolucionário e político Telêmaco Borba. Frequentou escolas do ensino fundamental em cidades do interior de São Paulo e graduou-se pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) em 1954. Depois de formado mudou-se para Maringá, Noroeste do Paraná, onde se elegeu presidente da Associação dos Advogados e fundou o partido Democrata Cristão. Foi o partido pelo qual se elegeu deputado estadual, em 1961, e se reelegeu na legislatura seguinte.

Advogado e escritor, Túlio Vargas foi deputado estadual, federal e secretário de estado. Em 1970 elegeu-se para Câmara dos Deputados, em Brasília (DF). Em 1974 foi nomeado secretário de estado de Justiça, no governo Canet Júnior, e posteriormente nos governos de Ney Braga e Hosken de Novais. Ainda na década de 70, em 1978, foi o candidato mais votado na eleição para o Senado Federal.

Ainda como político, Túlio Vargas também exerceu a presidência do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul e foi nomeado procurador-geral do estado junto ao Tribunal de Contas do Paraná, cargo em que se aposentou.

Locutor Esportivo
Tulio começou a gostar de rádio aos quinze anos de idade, quando se instalou uma emissora em Itararé, São Paulo, onde ele morava com a sua família. Aquela novidade deixou o jovem empolgado e ele começou a sonhar em ser um locutor de rádio.

Foi, no entanto, em Itapeva, uma cidade próxima onde passou a estudar, que Túlio Vargas teve suas primeiras experiências como profissional do microfone, trabalhando como locutor num serviço de alto-falante. Os serviços de alto-falantes eram muito comuns nos anos 40 e neles começaram suas carreiras outros radialistas de sucesso, entre eles Haroldo de Andrade, Vicente Mickosz, Nicolau Nader e Herrera Filho.

Vindo para Curitiba, Túlio assumiu a chefia de esportes da Rádio Clube Paranaense em abril de 1947, quando Epaminondas Santos era o proprietário da emissora e Jacinto Cunha era o Gerente. Foram seus colegas de atividade nos programas esportivos Castro Pereira, Machado Neto, Arthur de Souza, Eolo César de Oliveira, entre outros. Naquela época a Rádio Clube Paranaense apresentava seus programas de esporte apenas nos estúdios. Túlio Vargas criou uma série de inovações, lançou as transmissões externas e entrevistas nos mais variados locais, inaugurando uma nova fase na radiofonia do Paraná. Valério Hoerner Júnior, em seu livro "RÁDIO CLUBE PARANAENSE - A PIONEIRA DO PARANÁ", referindo-se a Túlio Vargas escreve:
"O primeiro jogo por ele narrado foi Coritiba X Botafogo,no Estádio Belfort Duarte, hoje Couto Pereira. Nessa época começou a ser conhecido como "o mais novo locutor esportivo".

Ainda no livro de Valério encontramos:
Como já foi dito, seu programa principal foi "Bola na Trave", em que promovia entrevistas ao vivo, especialmente geradas do Bar Stuart, ainda na esquina da rua Voluntários da Pátria com a avenida Luiz Xavier, na Praça Osório.

Túlio criou, também, um programa sindical e político, o que demonstrava, já naquela época, a sua tendência para a carreira como homem público, na qual foi brilhante.

Em 1947, recebendo tentadora proposta da recém-fundada Rádio Guairacá (hoje Iguaçu), que andava explodindo no Ibope da época, Túlio deixou a Bedois e passou a atuar na nova emissora. Na Guairacá, participou das transmissões esportivas, trabalhando com Rocha Braga, João Féder, e outros, numa fase áurea da "voz nativa da terra dos pinheirais".

Túlio Vargas, um dos pioneiros das transmissões esportivas do Rádio paranaense, foi um grande inovador. No final dos anos 40, ele introduziu na Bedois as transmissões externas de eventos esportivos em caráter contínuo. Antes dele, essas transmissões eram feitas eventualmente.

Certa vez, no começo da sua carreira, num daqueles improvisos dos quais é farta a atuação dos locutores esportivos, ele foi dar uma notícia sobre os jogadores campeões do Rio de Janeiro. Então, por distração, quando ele foi dizer CAMPEÕES CARIOCAS, o que saiu foi CAMPEÕES CARECAS. Causou surpresa, pois naquele tempo os jogadores de futebol eram cabeludos, ainda não surgira a moda de rapar a cabeça.

Durante muito tempo o Túlio Vargas teve que ouvir a gozação de seus familiares e amigos.

Vida cultural

Tulio Vargas começou a interessar-se pela pesquisa histórica há 10 anos, ao escrever uma biografia de seu bisavô materno, Telêmaco (Augusto Enéas Morocine) Borba (1840-1918), que mereceria o livro "O Indomável Republicano", transformado em calamitosa opereta e cujos prejuízos ainda se fazem sentir. Depois, Tulio pesquisou a vida do Barão do Serro Azul, Ildefonso Pereira Correia (1848-1894), cujo livro biográfico lançou antes de trocar a confortável cadeira de deputado federal pela incômoda Secretaria da Justiça.

Na área de história publicou 26 livros ao longo de sua vida, além de “A última viagem do Barão do Cerro Azul” (transformado no filme "O Preço do Paz"), “O Conselheiro Zacarias”, e “História Biográfica da República no Paraná”, entre outros.

Para escrever seus livros Tulio fez demoradas pesquisas em jornais e documentos da época, procurando levantar registros que permanecem inéditos.

Teve vários artigos publicados no jornal Gazeta do Povo e desde 1994, era presidente da Academia Paranaense de Letras, mas estava afastado, devido à fibrose pulmonar, doença com a qual conviveu por cerca de dois anos.

Em 1974 foi eleito para a cadeira No. 23 da Academia Paranaense de Letras da qual foi eleito presidente em 1994.

Fontes:
http://www.millarch.org/
http://www.ulustosa.com/

Túlio Vargas (alguns livros)

O Conselheiro Zacarias: (1815 - 1877

Jamais deixou o nobre Conselheiro
de utilizar seu mágico talento,
ao defender com garra e prazenteiro
tudo que fosse justo cem por cento.

Se alguém quisesse ser seu companheiro,
indispensável ter discernimento
a distinguir do falso o verdadeiro,
fosse qual fosse a causa, ou o evento.

O timoneiro e magistral Visconde
de São Lourenço enalteceu-lhe a fama
e frente a Cotegipe brada e exclama:

As águias que criei voam por onde
o turvo sol dos néscios mal se esconde
e a luz de Zacarias se derrama.

A Ùltima Viagem do Barão do Serro Azul

Última Viagem do Barão do Serro Azul, A Inspirado neste livro, o produtor Maurício Appel levou para as telas dos cinemas, sob o título de “O Preço da Paz”, a tragédia do Barão do Serro Azul. Libelo contra a violência, a intolerância e a perfídia, o longa-metragem recompõe a imagem fascinante do Barão em meio ao tumulto das paixões que sacudiram aqueles tempos revolucionários. Premiado no Festival de Cinema de Gramado(RS) nas categorias Júri Popular, Produção de Arte e Montagem Técnica, o filme revelou para o Brasil os grandes avanços do Paraná nesse campo, tanto na qualidade técnica ou no primoroso roteiro, quanto na temática instigante e atraente. Serro Azul foi sempre uma figura singular. A desventura aumentou-lhe aquela auréola de encantamento e brilho, que tem causado impacto em sucessivas gerações. Mártir ou herói, tanto o livro, quanto o filme, permitem uma reflexão ou uma revisão sobre o papel que ele desempenhou nessa quase lendária história de pica-paus e maragatos. Então será possível entender as causas determinantes desse drama épico que lhe arrebatou a vida.


Laertes Munhoz: o Mestre Sublime
"Ninguém melhor que o autor, advogado, homem público e historiador de escol, poderia escrever com naturalidade, precisão, beleza e sentimento sobre o grande tribuno, jurista de imensa erudição, que foi Laertes Munhoz. O retrato, que saiu da sua pena, é de assinalada profundidade psicológica. Das páginas do livro, escritas com muita afeição, surgem bem nítidos os traços inconfundíveis de quem foi orador exemplar, conferencista e advogado militante. Ouso apontar entre as circunstâncias a influir na sua decisão de escrever essa biografia, o fato de ter ouvido de primeira mão o testemunho de seu pai, deputado Rivadávia Vargas, também outro homem público de exemplar conduta parlamentar, correligionário e contemporâneo do biografado."
.
Fonte:

quarta-feira, 26 de março de 2008

Vânia Moreira Diniz

Vânia Moreira Diniz é natural do Rio de Janeiro (RJ) - 21/10.
Residente e domiciliada na cidade de Brasília-DF Escritora, Humanista e Pesquisadora, Fundou o Centro de Treinamento de Línguas em Brasília e dirigiu-o durante 10 anos. Formada em Letras com pós graduação em Educação. Palestrante nas áreas de educação, humanas e literária Colaboradora da Revista "Mirante" em Santos e "Estalo" em Belo-Horizonte

Orientadora de teses e monografias. Autora de diversas obras,

Co-autora do livro Manual da Saúde Física e Mental do Servidor Público com o tema DROGAS: Pesquisa e Contextualização.
Autora dos e-books pela e-B Maytê.
Participante de 9 antologias.
Participante da Equipe Fixa de Blocos online e colaboradora em mais de 10 sites.
Co editora da Revista virtual Poética Social.
Promotora de sites de literatura.
Co-fundadora e Co-editora do jornal/ecos- http://www.jornalecos.net.
Co-fundadora e Co-editora da Revista Honoris Causa.

Fonte:
http://sorocult.com/el/colunas.htm

Vânia Moreira Diniz (O Sonho Inesperado)

Ele estava ali a dois passos.Não poderia mais fazer mal. Eu estava gloriosamente vigorosa, em meus conceitos, corajosamente defendendo tudo que um dia pequenina, não pudera fazer. Ele estava alquebrado pela idade, pela consciência a atormentá-lo, pela solidão em que o deixara seus amigos e parentes. Seus olhos lacrimejavam cinzentos, os mesmos olhos que me apavoraram um dia, as mãos que me machucaram, o rosto que me fizera dar gritos de horror.

"Tudo era denso naquele lugar, não existiam outras pessoas, mesmo assim eu não sentia medo. Não sentia...O que conseguia divisar era uma luz e uma faixa colorida que me separava de qualquer violência. O céu estava fantasticamente azul, um lago manso e calmo, a superfície macia, sem atritos, meus pés pela primeira vez descalços caminhavam por um chão aveludado e perfeito.

"Meus olhos avistavam beleza em todas as suas formas e um pequeno palco centralizava o ambiente infinito. Com suavidade eu dançava em movimentos cadenciados e ligeiros, sentindo um aroma embriagadoramente delicioso.

"As paredes de cor suave me convidavam a uma paz harmoniosa, as flores vermelhas e amarelas, viçosas e frescas. Os frutos com o sabor delicioso jamais experimentado.

"Circunvagueei o olhar por tudo que se me apresentava , não acreditando no que via, sensibilizada de uma forma desconhecida.

"E quando olhei novamente o vi, alquebrado, abatido , debilitado tanto exterior como interiormente. E retrocedi, há muitos anos passados, eu tão pequenina, ele tão forte e cruel em seus instintos os mais descontrolados possíveis. O horror que transbordava em meu coração, a sensação de repulsa a me dominar e os gritos que ele abafava.

"Vendo-o um trapo humano senti uma pena desmedida do meu algoz , achando que nenhum ser humano merecia ficar no estado que ele se encontrava. Como se a dignidade humana, a coisa mais substancial da vida tivesse fugido completamente dele e marcado profundamente sua alma , transparecendo no físico devastado.

"Sempre que pensava nele uma náusea me dilacerava mas jamais desejei presenciar cena tão macabra e destruidora.

"Senti o contraste da minha vida, das alegrias que se apresentavam, da ternura que contornava o dia-a-dia alvissareiro que se impunha todas as manhãs, das tristezas passageiras mas que faziam parte do contexto do viver.

"E compreendi porque tinha sobrevivido daquele dia remoto da minha infância.Entendi que acima de tudo havia o sentimento verdadeiro que se impõe acima de qualquer momento de desgraça ou dor.

"E quando chegava a essa conclusão penalizada pela miséria moral, maldade, fria indiferença, vulgaridade ou violência, abri os olhos e entorpecida verifiquei que acordava de um sonho que me mostrara o subconsciente a concordar com o que eu sempre pensara: que o perdão é a mais bela forma de uma consciência tranqüilizadora.

"Senti-me intacta a submergir em minha própria alma agradecendo a força que tirei dela....

Fonte:
http://sorocult.com/el/colunas.htm

Vânia Moreira Diniz (Dia da Poesia)

Dia 14 de março, aniversário de nascimento do nosso grande poeta baiano Castro Alves e em homenagem a ele é comemorado o “Dia Nacional da poesia" e dia 21 festejamos o “Dia Mundial da Poesia”.

Nestas datas comemoramos a poesia em todos os níveis. Aquela que sai da pena dos grandes ou desconhecidos, reflete a beleza do mar, o canto dos pássaros, os espaços luminosos ou a escuridão lírica, onde os namorados fazem suas juras de amor, nas noites enluaradas em que se canta a paixão e até nos momentos lúgubres em que a alma se obscurece e subjetivamente pede socorro e anseia por ternura.

O dia da Poesia retrata a criatura, com sensações, sorrisos, meiguice, o olhar em contemplação ou o sentimento abstratamente real de quem ama. Por isso é uma data especial, em que não há exclusividade nem influência do sucesso ou fama, mas que penetra na alma universal do mais desconhecido ser humano.

Nele a natureza transcende qualquer idéia descritiva para se alojar na beleza, encantamento, fascínio que domina o universo, em suas potencialidades intrínsecas, no infinito de suas revelações e não se refere à criatura somente, mas ao planeta no sentido mais abrangente.

O dia da poesia se manifesta na criança que nasce sofrendo o oxigênio que o inunda, na simplicidade de alguém emanando eflúvios de bondade espontânea, nas crianças à procura do alimento, nos pais chorando a tristeza de não poderem resguardá-lo, na simplicidade dos gestos, ternura dos olhares, reflexos do sol aquecendo o dia ainda frio, na solicitude dos que estendem a mão universalmente e no beijo, máxima expressão de afeto e de carinho.

Nele a bondade é seu maior atributo, generosidade que chega de mansinho sem que faça ruído, solidariedade que se manifesta no aconchego amigo, vaidade que é capaz de apartar seus próprios interesses e olvidar a presença do ego exigente para se doar em transe na presença do ser humano mais próximo.

A esperança se faz realidade, o dia explode em claridade ofuscante, o horizonte chamuscado de cores e projetados pela sombra amarelada espera passos cada vez mais céleres na busca do sonhos ali abrigados e a estrada amacia os pés que a percorrem, saltitantes e ansiosos.

O dia da Poesia é único e encontra os liames da razão que ordena o minuto de paz, contorna a realidade e absorve o lirismo para que seja divulgado em letras de harmonia a todos que desejam dele se aproximar.

Nele a terra gira impondo química e sentimento enquanto o poeta compõe o que a inspiração sugere radiante em cada momento de suspense ou nos instantes que não se repetirão com a mesma força e realidade. Nele a poesia lidera onipotente e somos instrumentos, expectadores apreciando a força do mundo que naquele momento só poesia infunde.

O dia da Poesia é a conscientização da formosura, vida e alegria, das flores multicores e dos movimentos inconscientes da natureza, dos embalos inesperados, do amor surgindo, da amizade reiterando e das sensações que transmitem a sua origem.

Mas verdadeiramente não há dia específico para a poesia, porque ela existe independente de tempo e hora ou data, constantemente em todas as situações. Dias de poesia são consecutivos, plenos, absorventes e inspiram ao poeta a hora certa de transmiti-los.

Na verdade todos os dias nos levam à poesia de uma maneira ou de outra, por intermédio da natureza, do amor, da generosidade ou do carinho, do olhar de uma criança, do perdão, da compreensão, da saudade e da união de todos os seres humanos.

E nessa edição deixamos de fazer reflexões sobre o mundo e seus conturbados problemas para dirigir nosso pensamento e coração à poesia que amamos tanto porque ela é universal e a fonte de inspiração da literatura.

Fonte:
http://sorocult.com/el/colunas.htm

Yoko Oshima Franco

Yoko tem 48 anos
Possui graduação em Farmácia pela Universidade de São Paulo (1982), mestrado e doutorado em Farmacologia pela Universidade Estadual de Campinas (1997 e 2001, respectivamente). Atualmente é professor horista da Universidade Metodista de Piracicaba e professor titular da Universidade de Sorocaba (40 horas semanais). Faz parte do corpo docente permanente do Mestrado Stricto sensu em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba. Tem experiência na área de Farmacologia, linha de pesquisa em neurofarmacologia, com ênfase em Toxinologia (venenos ofídicos) e plantas medicinais.
Colunista do site Sorocult.com, de Sorocaba e Região.
É casada também com um farmacêutico e docente. É mãe de três filhos.

Fontes:
http://sorocult.com/el/colunas.htm
Currículo Lattes.

Yoko Oshima Franco (Crônica da vida)

A vida me é tão óbvia. Cenas de emoções vividas. Dócil, seguia os passos de minha mãe, desviando dos capins mais altos que denunciavam a despedida de uma noite chuvosa, à medida que me esbarrava nas folhas e observava as gotinhas de chuva caírem. O frescor da manhã com sua leve brisa, o sol calmo anunciando um lindo dia e eu ali, simplesmente seguindo minha mãe. Não me importava para onde íamos, o que faríamos, nem por que. Girinos agitados nas poças de água causavam-me maravilha e minha imaginação voava, pois na minha sabedoria já sabia que se tornariam sapos. E da feiúra do sapo também já era conhecedora. Sentia-me completa ali, nada a desejar, simplesmente encantada com a natureza, com tudo o que ela continha, com tudo ao meu redor.

E este mundo foi crescendo, que festa jubilosa quando aprendi a ler e escrever. Como me sentia grandiosa podendo ler o nome das lojas da pequena cidade, quando descobri a aventura que os livros traziam e me permitiam as mais distantes viagens, por mundos e mundos povoados pelos meus sonhos. Sonhos perturbados por uma fase de angústia, de vazio, de perguntas... sem respostas! Ah, aquela amiga que todos têm, que nos ajuda nessa travessia, como se estivéssemos em um barco sem remo, perdidos num mar turbulento. Que presente a vida nos oferece para nos mostrar que não estamos sós.

E que desalento foi descobrir que era preciso algo mais para dar completude à existência. Hoje, sei que tudo o que precisamos está dentro de nós. E rio internamente, pois esta parte é a mais engraçada e, ao mesmo tempo, a mais comovente. Ela move o mundo. Ela inspira os poetas, os dramaturgos, os cineastas, os musicistas... a arte enfim! E quanta arte existe em nossa vida. Outro dia, vendo minha filha caçula sofrer de amor, disse: “veja, agora eu não lhe basto como antigamente”. Ela sorriu com tais palavras. E silêncio se fez e ambas percebemos que o tempo havia passado rápido.

Completude é um sentimento que só a paz oferece. E paz só se alcança se permitirmos a criança renascer em nós. Se isto não fizer sentido, seremos adultos (muitas vezes infelizes) buscando no outro (alguém, emprego, objeto...) a felicidade, talvez pais sofredores quando os filhos se tornarem adolescentes e a troca pelos amigos (ou namorados/esposos e esposas) se tornar insuportável. Podaremos os seus sonhos (em nome de sabermos o que é melhor para eles. Será?) e desejaremos que realizem os nossos (aqueles que não conseguimos realizar). Como se fosse possível delegar a nossa vida a alguém.

Mas a vida é eterna fonte de aprendizagem. E oferece oportunidade para ampla revisão, para quem ainda não tem olhos de ver. O corpo envia mensagens sábias e necessárias. Um exemplo. Foi incrível ouvir o desabafo de um professor: “Já tinham me avisado que ‘chegar aos quarenta’ era difícil, mas nunca me avisaram dos ‘quarenta e cinco!”. Digo incrível, pois a manutenção da aparência tem sido uma milenar preocupação feminina (por inúmeros fatores, a que não cabe aprofundamento no momento). Contrariando a natureza, o envelhecimento é algo inaceitável para a grande maioria (arrisco dizer, sem paz). Renegam sua expressão facial (é preciso extinguir urgente este vinco entre as sobrancelhas, ah e essas bolsas debaixo de meus olhos, o que é isso?), suas manchas nos braços, a perda da elasticidade da pele. Renegam a vida vivida. Pior, esquecem de viver o presente e a beleza de cada fase da existência.

Observando a bisavó, o bisnetinho exclamou, “isto pendurado no seu braço é gordura?” Risada gostosa se seguiu entre os presentes e veio a resposta da bisa “é pelanca mesmo!”. O biso completou “Idade não se esconde mesmo!”. Refleti sobre a questão. Quanta verdade havia na frase. E escondê-la para quê? Esta pergunta não deveria ser calada.

Muito tempo atrás, conversando com meu então vizinho, ele confessou, aos seus 86 anos: “sabe, chega uma hora em que viver torna-se enfastiante”. Não conseguia entender aquela frase. O tempo se passou e pude ver quantos cuidados necessitava a vózinha, ‘bisa’. O que vem depois de bisa? (Sim, pois era o caso) Entendi o seu João (meu vizinho). Aos 105 anos, a vózinha não mais andava, depois de sua última queda que lhe rendeu cirurgia no fêmur; suas mãos ágeis que foram – habilidosas no crochê, não mais se abriam; não havia mais lente de óculos possível para trazer-lhe novamente a visão, cujas cirurgias de cataratas tinham sido realizadas no passado; era preciso gritar para que ela ouvisse alguma coisa; o lado esquerdo era mais sensível, era preciso tocá-la com cuidado, pois qualquer pressão na sua pele provocava hematomas (parecia papel que se rasgava); necessitava de todos os cuidados imagináveis que iam da higiene à alimentação. A vózinha não tinha doença, seus exames de sangue sempre normais, sua mente saudável, lembrava-se mais de coisas do passado que recentes. A vózinha tinha apenas velhice. E um sorriso sempre estampado no rosto. A vózinha voltou a ser criança, conduzida apenas. Saberia para onde iria, o que faria, por quê? Tornou-se apenas uma espectadora da vida.

E, num determinado dia, partiu. Integrou-se à natureza. As lágrimas de despedida foram de paz. Viveu (o suficiente?) para dissipar rancores e angariar perdões. Hoje a palavra paz é uma das que me trazem maior significado. Tão curta e tão intensa. O amor? Por que não digo que é o amor? Ah, ainda não temos maturidade espiritual para entendermos o amor (em nome do amor se mata e muitas vezes ele é carregado de sofrimento). O amor é sentimento de liberdade e não de posse (para exemplificar, as pessoas diriam “eu amo você, mas respeito o fato de não ser correspondida, logo, como meu amor por você não tem limites e quero unicamente a sua felicidade, você é livre para seguir o seu caminho”!). Quanto à paz... ah este sentimento sublime! A paz é aceitação da vida (com todas as surpresas que ela encerra, boas e más). É integração com a natureza. É bem-estar. É tranqüilidade nas decisões. É desapego (amar as coisas sem possuí-las).

Quantas vezes olhamos as crianças e perguntamos “o que será que elas estão pensando, o que desejam, o que esperam da vida etc?”. Desafio alguém que ainda não tenha pensado nisso. Só se nunca observou uma criança. Elas têm paz. Por isso vejo a vida tão óbvia. Buscar a paz é sabedoria, não importa em qual fase de vida estamos. Bem, mas se ainda assim nada do dito aqui fizer sentido, vamos apenas viver. Um dia de cada vez, saboreando cada momento. O tempo revela o necessário, aos poucos e generosamente...

Fonte:
http://sorocult.com/el/colunas.htm

Artur da Tavola (Conversando com Deus)

Nestes tempos de loucura guerreira, a gente deve buscar refúgio também nas crianças. Elas são sempre a conseqüência trágica das guerras. Mesmo quando não estão no campo das mesmas. Fui criança em 1940 e hoje, sessenta anos depois ainda me recordo do rádio de meu pai, com notícias da Segunda Guerra Mundial e do meu susto pois não sabia o que queria dizer "lá longe". Acreditava que “longe” era o que ficava além do Túnel Novo.

Mas recebi de um mensageiro da Internet chamado Müller (não deu outras informações acerca de si mesmo) esta deliciosa tradução de algumas frases de crianças. Nada tem a ver com a guerra. É só para vermos como são criativas as crianças e pensarmos nas que morrem por causa dos delírios humanos, o maior dos quais é a guerra e seu estúpido cortejo de destruição.

CARTINHAS PARA DEUS: cartas reais para Deus escritas por crianças
(traduzidas de original em inglês):

1. Querido Deus, Eu não pensava que laranja combinava com roxo até que eu vi o pôr-do-sol que Você fez terça- feira. Foi demais! (Eugene)

2. Querido Deus, Você queria mesmo que a girafa se parecesse assim ou foi um acidente? (Norma)

3. Querido Deus, Em vez de deixar as pessoas morrerem e ter que fazer outras novas, porquê você não mantêm aquelas que você tem agora? (Jane)

4. Querido Deus, Eu fui a um casamento e eles beijaram dentro da igreja. Tem algum problema com isso? (Neil)

5. Querido Deus, Obrigado pelo meu irmãozinho, mas eu orei por um cachorrinho. (Joyce)

6. Querido Deus, Choveu o tempo todo durante as nossas férias e como meu pai ficou zangado! Ele disse algumas coisas sobre você que as pessoas não deveriam dizer, mas eu espero que você não vá machucá-lo. Seu amigo (mas eu não vou dizer quem eu sou)

7. Querido Deus, Por favor, me mande um poney. Eu nunca te pedi nada antes, Você pode checar. (Bruce)

8. Querido Deus, Eu quero ser igualzinho ao meu pai quando eu crescer, mas não com tanto cabelo no corpo. ( Sam)

9. Querido Deus, Eu penso em Você de vez em quando, mesmo quando não estou orando. (Elliott)

10. Querido Deus, Eu aposto que é muito difícil para você amar a todas as pessoas no mundo. Na nossa família tem só quatro pessoas e eu nunca consigo... (Nan)

11. Querido Deus, Meus irmãos me falaram sobre nascer de novo, mas soa muito estranho. Eles estão só brincando, não é? (Marsha)

12. Querido Deus, Se Você olhar para mim na igreja domingo, eu vou te mostrar meus sapatos novos. (Mickey)

13. Querido Deus, Nós lemos que Thomas Edison fez a luz. Mas na escola dominical nós aprendemos que foi Você. Eu acho mesmo que ele roubou sua idéia. Sinceramente, (Donna)

14. Querido Deus, Eu não acho que alguém poderia ser um Deus melhor que você. Bem, eu só quero que saiba que não estou dizendo isso porque você já é Deus. (Charles)
15. Querido Deus, Talvez Caim e Abel não matassem tanto um ao outro se eles tivessem seu próprio quarto. Isso funciona com meu irmão. (Eddie)

Fonte:
http://intervox.nce.ufrj.br/~jobis/a-conv.html

Fernando Sabino (Ela Lava e Ele Enxuga)

Como já tive ocasião de contar (Aventura do Cotidiano - 4, em "A Falta que Ela me Faz"), eram três solteirões que viviam com o pai viúvo naquela casa do interior de Minas. Um dia o mais novo, e já não tão novo, conheceu uma moça, gostou da moça, acabou se casando com a moça.

Casou e mudou.

Tempos depois, indo visitar o pai e os irmãos, não escondeu seu entusiasmo:

— Gente, vocês não sabem como mulher é bom! Serve para tanta coisa...

Não deixa de ser uma definição do casamento, como era concebido antigamente. Hoje em dia, prevalece mais a que decorre do comentário feito por aquele outro, depois que se casou:

— Então quer dizer que casamento é isso? Ela lava e eu enxugo?

— Pois comigo agora vai ser diferente — pensava ela, ao deixar o trabalho. Em vez de ir direto para casa fazer o jantar do marido, foi ao cabeleireiro mudar o penteado.

Depois de vários meses sem cozinheira, chegara enfim o dia de não encostar a barriguinha no fogão, como ele costumava gracejar, aliás sem graça nenhuma

Em vão ela havia tentado avisar, telefonando-lhe para o escritório, que queria jantar fora naquela noite: não está na sala, está em reunião, ainda não chegou, já saiu. Onde diabo estaria? Nenhuma ponta de ciúme chegou a se manifestar na sua irritação por não encontrá-lo: parece até que está fugindo de mim, pensou apenas, indo finalmente para casa.

— Eu hoje quero jantar fora — foi declarando, categórica, quando ele lhe abriu a porta.

— Onde você andou? — perguntou ele, dando-lhe passagem.

— Fui ao cabeleireiro. E você? Tentei te avisar o dia todo.

— Me avisar o quê?

— Que eu queria jantar fora.

— Vim mais cedo para casa. Como não te encontrei...

— Nem podia encontrar, pois eu estava no cabeleireiro.

— Eu sei, você já falou. Não te encontrei, e estava com fome...

Que é que ele queria dizer? Que já havia jantado?

— Jantado, propriamente, não. Como estava com fome, fritei um ovo, e tinha um resto de arroz na geladeira... Não achei mais nada.

— Não achou nada porque eu não vim fazer o jantar.

— Estou sabendo. Foi ao cabeleireiro.

— Isso mesmo. Fui e hoje eu quero jantar fora — insistiu ela: — Não venha me dizer que você não vai me levar só porque comeu um ovo.

— Calma, minha filha — fez ele, evasivo: — Jantar onde? Você nem acabou de chegar da rua e já quer sair de novo. Que diabo de penteado é esse?

O comentário final foi a gota d'água — ela, que esperava dele um elogio pelo penteado.

— Não pensa que você me leva na conversa — protestou, indignada: — Eu quero saber se vai me levar para jantar. Se não vai, diga logo, que eu vou sozinha.

Um tanto temerária, aquela afirmativa, admitiu ela para si mesma: jantar sozinha como? onde? com quem? e pagar com quê?

— Estou com fome... — choramingou, para ganhar tempo.

Ele fora sentar-se diante da televisão, indiferente, enquanto ela ficava por ali, lamuriando a sua fome.

— Vê se encontra aí qualquer coisa para comer, como eu fiz — ele se limitou a dizer.

Ela botou as mãos na cintura e sacudiu com raiva a cabeça, ao risco de desmanchar o penteado:

— Olha bem para mim e vê se me acha com cara de arroz com ovo.

— Ovo, só tinha um — ele ria, o cínico! — E o arroz já era.

Num impulso de revolta, ela se voltou para a porta:

— Não preciso de você. Na casa da mamãe deve ter sobrado alguma coisa do jantar.

— Ridículo — ele se limitou a suspirar, e voltou a se distrair com a televisão.

Em vez de sair, ela partiu batendo os saltos em direção à cozinha. Pôs-se a remexer ruidosamente em tudo, devassando a geladeira, abrindo latas e destampando panelas. Acabou encontrando duas bolachas e, no armário sobre a pia, uma simples, única e solitária cebola. Começou a descascá-la, já em lágrimas, soluçando alto para que ele ouvisse lá da sala. Em pouco ele vinha bisbilhotar:

— Que é que você está fazendo? Está chorando por quê? Por causa dessa cebola?

— Não seja estúpido — reagiu ela, enxugando as lágrimas com as costas da mão: — Estou chorando porque estou sem comer! Quando me casei com você jamais pensei que ainda ia acabar passando fome.

— Amanhã te levo para jantar fora — concedeu ele.

— Não preciso de você. Se eu quiser, eu sei como encontrar alguém que me leve ainda hoje.

O sorriso irônico dele não animava a prosseguir nesse caminho: não encontraria ninguém, ainda mais assim de repente — nem ao menos uma amiga tão infeliz quanto ela. Descobrindo no armário um tablete de caldo de carne, animou-se e com deliberação pôs-se a preparar uma sopa de cebola, enquanto ele voltava para a televisão.

Levou a bandeja com a sopa para tomar na sala, com as duas bolachas, como se fosse o melhor dos jantares, esperando que o cheiro que dela emanava, realmente apetitoso, provocasse nele alguma fome. Se tal aconteceu, ele não deu mostras: em pouco desligava a televisão e, espreguiçando, ia para o quarto dormir.

Como era de esperar, passaram a noite de costas um para o outro. Pela manhã nenhum dos dois tomou a iniciativa de romper o silêncio. E em silêncio partiu cada um para o seu trabalho. O que mais doía nela era o detalhe do penteado-que fez questão de desfazer durante o banho.

Ao longo do dia não se telefonaram, como costumavam fazer.

À tarde, quando ela regressou, teve a surpresa de sua vida: encontrou a mesa posta, com o que havia de melhor a esperá-la para o jantar dos dois. Até mesmo, como sobremesa, aquela tortinha de mil-folhas de que gostava tanto.

Ao lado do prato, um bilhete: "Para que você hoje não passe fome."

— Como é que você fez tudo isso? — exclamou, ao vê-lo surgir do quarto.

— Encostando a barriguinha no fogão.

— Encomendou no restaurante — ela concluiu, encantada.

Ele a abraçou, afagou-lhe os cabelos:

— Ficam tão mais bonitos assim, ao natural.

Findo o jantar, ele quis levá-la em seguida para o quarto, mas ela pediu que esperasse: ia primeiro tirar a mesa e lavar os pratos.

— Eu lavo e você enxuga — disse, com doçura. Mais tarde, já na cama, ao tê-la nos braços, ele admitiria para si mesmo:

— Como mulher é bom! Serve para tanta coisa...

Fonte:
SABINO, Fernando. No Fim Dá Certo. Rio de Janeiro: Record, 1998, Disponível em http://www.releituras.com/fsabino_elalava.asp

Plínio Marcos (O pranto e o canto pelo anjos caídos)

O seco olhar do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, correu pelo chão seco da triste aldeia e parou na gente seca de sua outrora tão gloriosa tribo. Gente seca que, com as mão secas de almas sem esperança, teciam, a duras penas, vergados sob o peso da indolência, seus ofícios aviltantes, nesses secos tempos, tempos dos tempos da raça. E o ofício ali exercido por gente seca, de mãos secas de almas sem esperança, lhes foi generosamente legado por seus bravos antepassados, por seus venerados antepassados, que foram bravos e foram venerados justamente porque exerceram esses ofícios orgulhosamente em seus tempos, em foram muitos tempos, tempos bastantes para os fundamentos da tribo serem plantados, tempos bastantes pra vida da tribo ser honrada por várias gerações.

E o seco olhar do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, já turvo por tantos tempos de sua existência seca, começava a bem ver, ver de ver, ver de perceber, ver de penetrar nas entranhas das coisas, ver de enxergar o essencial. E o seco olhar do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via pela primeira vez que o arco, a flecha, o tacape e os cocares de penas multicoloridas, que as mãos secas de almas sem esperança dos lamentáveis indios sem cor, sem brilho, sem cantos arrematavam, vergados ao peso da indolência, jamais seriam as armas de valor provado em tantas batalhas, como aquelas que, em outros tempos, empunhadas por bravos guerreiros, foram guardiãs da honra da tribo, da liberdade da tribo, do respeito da tribo por si mesma. E o seco olhar do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via pela primeira vez que o barro, amassado sem nenhum encantamento pelas secas índias, de mamas secas, de ventre apodrecido, parideiras de uma prole sem cor, sem brilho, sem cantos, prole que não encarnava o bravo espírito dos bravos guerreiros de outrora, jamais seria a cuia das doces bebidas que os deuses ensinaram os bravos índios a beber pra terem sempre seus ânimos renovados para os duros combates da preservação. E o olhar seco do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via, via, pela primeira vez, que a mandioca batida pelas secas mãos de almas sem esperança jamais seria a farinha da nutrição da gente seca de sua outrora tribo. O seco olhar do velho indio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via, via que jamais, jamais, jamais o trabalho feito pelas mãos secas de almas sem esperança seria o nobre trabalho que dignifica o homem. Que o arco, a fecha, o tacape, o cocar de penas multicoloridas, o barro, a farinha jamais seriam distendidos, moldados, consumidos pela liberdade, pela honra, pelo auto-respeito da tribo, gente seca, de mão secas de almas sem esperança.

O arco, a flecha, o tacape, o cocar de penas multicoloridas, o barro, a farinha, feitos pela geração enferma da outrora gloriosa tribo seriam levados pelos tristes índios sem cor, sem brilho, sem canto, com passos trôpegos, ao posto comercial dos brancos cidadãos contribuintes e seriam trocados pela branca aguardente dos brancos cidadãos contribuintes. E a branca aguardente dos brancos cidadãos contribuintes envenenaria o sangue, a energia, o trabalho, a fé, a esperança do índio. Envenenaria o índio, e o arco do índio, e a flecha do índio, e o cocar de penas multicoloridas, e o barro do índio, e a farinha do índio, e a cor, e o brilho, e o canto do índio, e a honra, e a liberdade, e o respeito do índio por si mesmo, e todos os fundamentos da tribo do índio, e o ventre apodrecido das mulheres da tribo, que geraria cada vez mais a mais miserável das descendências do índio.

E o arco, a flecha, o tacape, e o cocar de penas multicoloridas, e a cuia iriam enfeitar as brancas paredes das brancas moradas dos brancos cidadãos contribuintes. E o olhar seco do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via, via, pela primeira vez, que esse comércio já há tanto tempo praticado por sua gente, por ele mesmo e por seus antepassados, com os brancos cidadãos contribuintes, lhes envenenava o sangue, os fundamentos recebidos por herança, os gritos de guerra de toda uma raça, o sonho, a energia, o trabalho, a ânsia de liberdade, sobretudo a ânsia de liberdade. E o seco olhar do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, via, via, via que era o tempo dos tempos de sua raça. Via, via, via, o olhar seco do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, que era a grande hora de dor da sua tribo. E sentia que era chegado o seu momento-limite de cacique, o momento de tomar a decisão mais corajosa de todos os tempos da tribo. Era o momento doloroso da escolha.

Era a hora do crepúsculo. Era a hora do crepúsculo da tribo e também era crepúsculo de mais um dia de triste trabalho da outrora gloriosa tribo. O Sol se punha por trás das montanhas e a primeira estrela brilhava no infinito. E o seco olhar do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, se fixou nessa estrela. E seu pensamento se elevou até os grandes espíritos e se fez a magia. E o velho índio, com a visão imemorial, viu com coragem todos os tempos da sua tribo. Correu pelas matas com a alma virgem dos bravos índios que plantaram os fundamentos da tribo, quando as matas eram virgens das patas dos brancos cidadãos contribuintes. E depois viu chegarem as brancas caravelas, de brancas velas, com a tripulação branca de cidadãos contribuintes, que tinham brancas armas que matavam à distância. E o velho índio viu e reviu que seus antepassados se deslumbravam diante da branca feitiçaria dos brancos cidadãos contribuintes, mas não se deixavam subjugar. E os brancos cidadãos contribuintes em vão tentaram subjugar os bravos índios, com suas brancas armas. Não se subjuga um bravo.

Nem o ferro, nem o fogo, nem a chibata subjuga um bravo que sonha o sonho mais lúcido do espírito, que é a liberdade. Liberdade pra ser caminheiro em busca de luz, da síntese do amor e do tempo. E, esgotados os recursos das armas, os brancos cidadãos contribuintes vieram com os brancos truques da branca tecnocracia. E o velho índio, com sua visão imemorial, viu chegarem no meio de sua gente os falsos filhos dos deuses, os falsos homens do fogo, os falsos filhos do trovão, reles lacaios brancos dos brancos cidadãos contribuintes que assombraram os índios com seus brancos truques tecnocratas. Assombravam os índios os brancos truques da branca tecnocracia dos brancos cidadãos contribuintes, mas não os subjugavam. Os bravos índios, assim como todos os bravos, com todo o vigor das almas puras, ingênuos no fervor de suas crenças, podem ser acabados pelo furor das armas, podem ser enganados, mas não se subjugam suas almas livres, nem com o ferro, nem com o fogo, nem com a chibata. Não se prende o espírito, nem o espírito se apaga, quando ele retém, mesmo que inconsciente, a chama geradora da virilidade. E os ingênuos, no fervor de suas crenças, sempre retêm a sagrada chama. E o índio não podia ser escravo pelo peso das armas, ele que já era escravo dos fundamentos da sua tribo, por querência, por respeito a si mesmo, por honra, pelo desejo lúcido do espírito de ser livre. Não se escraviza quem se escravizou espontaneamente no fervor de uma fé. E o índio de alma pura não se submeteu nem ao ferro, nem ao fogo, nem à chibata, nem aos assombrosos truques tecnocratas dos brancos cidadãos contribuintes escravocratas, mesquinhos escravos da própria ganância. E a visão imemorial do velho viu, viu, viu bem o peito de seus bravos antepassados serem rasgados pelo fogo e pelo trovão dos brancos cidadãos contribuinte. Viu, viu, viu, com a visão imemorial, o sangue generoso dos seus bravos antepassados regar o solo de terra firme, consagrada por toda uma raça que se nutria de honra e se multiplicava em bravos. E o velho índio viu, viu, viu, com a visão imemorial, que não se ganha nas armas a alma de um bravo, ingênuo no fervor de sua crença. Mas, o velho índio, pálido de espanto, viu, viu, viu que um bravo, mesmo ingênuo no fervor de sua crença, mesmo forte no fervor de sua crença, pode ser seduzido com a hipócrita palavra, com o hipócrita paternalismo, com hipócritas presentes. Com a lábia.

O velho índio, com sua visão imemorial, viu, viu, viu pálido de espanto, descerem das brancas caravelas dos brancos cidadãos contribuintes brancos sacerdotes que, viajando sem bandeira, em nome do grande Deus branco dos brancos cidadãos contribuintes, foram pacientemente, com agrados, ensinado a língua estrangeira, os costumes estrangeiros, a religião estrangeira, a cultura estrangeira ao índio. E foram desarmando o índio dos seus fundamentos, dos fundamentos da sua tribo, foram descaracterizando o índio e entregando o índio, desarmado dos seus fundamentos e de suas crenças, aos brancos cidadãos contribuintes. O homem sem os seus fundamentos de origem se corrompe, se vicia. E os brancos sacerdotes dos brancos cidadãos contribuintes, com a pose de pais magnânimos, corromperam o espírito do índio nos seus fundamentos. E os brancos cidadãos contribuintes viciaram a carne do índio, geração após geração. E foi fácil para os brancos cidadãos contribuintes, com suas brancas armas tecnocratas, matarem os poucos índios que não se degeneraram, que não se desvincularam dos fundamentos da tribo, que não se descaracterizaram. E aí chamaram os índios desarmados dos seus fundamentos, adoecidos de corpo e alma, para o comércio. Comércio feito sempre na língua branca dos brancos cidadãos contribuintes, com pesos e medidas dos brancos cidadãos contribuintes, peritos em trocar suas quinquilharias supérfluas pelos gêneros vitais dos índios. E os brancos cidadãos contribuintes chamaram o índio, desarmado dos seus fundamentos, desarmado do fervor de sua crença, doente de corpo e alma, empobrecido por um comércio sórdido, para fazer acordos territoriais. E os acordos foram feitos na branca língua dos brancos cidadãos contribuintes, com os pesos e as medidas dos brancos cidadãos contribuintes. E foram limitados os espaço do índio, e foram limitados os sonhos do índio, e foram apagados os fundamentos da tribo do índio. E o índio, ao ser desligado dos seus fundamentos, como qualquer povo que se desliga do seus fundamentos, perdeu o fervor ingênuo em sua crença, se tornou enfermo de corpo e alma, adquiriu os brancos vícios dos brancos cidadãos contribuintes, ficou desfibrado, indolente, sem coragem pra se rebelar. E o velho índio viu, com a visão imemorial anos e anos a fio, sua tribo, sua raça inteira se degenerar no contato social, religioso, cultural, comercial com os brancos cidadãos contribuintes. E viu o velho índio, viu, viu, viu quantas vezes quis ou teve coragem. Viu tudo com visão imemorial. E entendeu o velho índio que a sua outrora gloriosa tribo começou a morrer quando aprendeu a fala branca dos brancos cidadãos contribuintes. Que começou a morrer quando aceitou o grande Deus branco do branco cidadão contribuinte. Que os brancos cidadãos contribuintes, em nome da religião, da filosofia, da cultura, da tecnocracia, mataram a religião, a filosofia, a cultura e todos os fundamentos da tribo e da raça.

E o velho índio voltou para si mesmo. Era a hora grande, hora de todos os espíritos, de uma noite de Lua cheia. A aldeia estava em silêncio, os índios dormiam o sono sem repouso das almas secas de sonho. Era a hora grande, hora de todos os espíritos, de uma noite de Lua cheia, mas era também a grande hora de uma tribo inteira. E o seco olhar do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, correu pelo seco chão da triste aldeia dos lamentáveis índios sem cor, sem brilho, sem canto e encontrou o sagrado tambor de guerra, há muito tempo mudo por não poder ser tocado por mãos secas de alma sem esperança. E o velho índio de seco olhar, como é seco o olhar de um corpo sem alma, tocou o tambor, tocou o tambor, tocou o tambor. Tocou o toque guerreiro de toda a sua tribo, tocou o toque dos fundamentos de toda sua raça, tocou o toque de honra, o toque do auto-respeito, o toque sublime dos sublimes anseios de liberdade de um povo. Dentro da noite soou forte o toque de guerra da tribo do velho índio, o toque dos fundamentos da tribo do velho índio, o toque dos anseios de liberdade de toda a raça do velho índio. Mas, os lamentáveis índios, sem cor, sem brilho, sem canto, estavam arreados pela indolência num sono sem repouso das almas secas de sonho. Nenhum respondeu aos apelos do toque do tambor guerreiro batido pelo velho índio. Nenhum escutou o toque dos fundamentos da tribo e da raça, batidos no tambor guerreiro pelo velho índio.

E o seco olhar do velho índio, seco como o olhar de um corpo sem alma, se encheu de lágrimas. Ele via, via, via tudo com clareza. Mas era tarde. Ele não tinha mais a cor, o brilho, o canto para convocar pra labuta da vida uma gente que se amesquinhou no aviltante trabalho de mãos secas de almas sem esperança. Já não tinha, o velho índio, a cor, o brilho, o canto. A sua pele encardida, o seu sangue apodrecido, seu espírito vacilante já não tinham a cor, o brilho, o canto para convocar sua gente de pele encardida, de sangue apodrecido, de espírito vacilante, para a labuta da vida que dignifica a existência. E já não tinha a cor, o brilho, o canto para convocar sua gente sem cor, sem brilho, sem canto para a morte honrosa que dignifica a existência. E o velho índio compreendeu que toda a sua raça estava surda aos próprios fundamentos da raça. E compreendeu que, quando um povo já não pode ser convocado para a labuta da vida, que é o que dignifica a existência, quando um povo já não pode ser convocado para a morte honrosa, que é o que dignifica a existência, é o tempo final desse povo, é o tempo dos tempos desse povo. E, compreendendo tudo isso, o velho índio chamou a sua tribo para o centro da triste aldeia. E vieram todos, sonados, arrastando seus corpos cansados de almas sem esperança, e pararam diante do velho índio.

O velho índio de olhar seco, como seco é o olhar de um corpo sem alma, olhou os lamentáveis índios sem cor, sem brilho, sem canto, de uma tribo em degeneração total e, com a voz firme, ordenou serenamente que se matassem todas as mulheres da tribo nascidas daquela lua em diante. Ordenou serenamente, com a voz firme de um grande cacique, ordenou com ternura, ordenou certo de ser obedecido, e se afastou. Foi sentar-se num tronco seco de uma outrora frondosa árvore e, com os olhos secos, como são secos os olhos de um corpo sem alma, ficou espiando o nada, o vazio, esperando o fim de toda sua raça.

Fonte:
Publicado na Folha de S.Paulo, domingo, 3 de abril de 1977. Neste texto foi mantida a grafia original
http://almanaque.folha.uol.com.br/plinio_marcos_o_pranto.htm

terça-feira, 25 de março de 2008

III Feira Nacional do Livro e 2o. Festival Literário de Poços de Caldas

Após percorrer pouco mais de 240 mil quilômetros de estradas por este Brasil afora, e doar em torno de 145 toneladas de mais de 80.000 livros de histórias infantis, o Projeto Idéia Fixa por um Sertão 100 Fome, volta a ser destaque. E desta vez durante um dos eventos de sucesso realizado pela GSC Eventos Especiais, a 3ª Feira Nacional do Livro que acontecerá na cidade de Poços de Caldas (MG), entre os dias 02 e 06 de abril.

A III Feira Nacional do Livro de Poços de Caldas, acontecerá de 02 a 06 de abril de 2008.Mais informações acesse: http://www.feiradolivropocosdecaldas.com.br/"> ou pelo fone: 35 3713 9901

Grandes nomes da Literatura Brasileira já confirmaram a participação na Feira do Livro e no Festival Literário. A patronesse, uma das maiores especialistas em lingüística textual do Brasil, Ingedore Villaça Koch, será homenageada e, oficialmente, abrirá o 2º Festival Literário Nacional da cidade a palestra “O Texto e seus Segredos”.

Entre os dias 02 e 06 de abril, nas dependências do Palace, os visitantes poderão contar com a presença de outros escritores renomados, como Telma Guimarães (02/04, manhã/tarde); MV Bill, autor do livro Falcão – Meninos do Tráfico (02/04, às 19h50); Jonas Ribeiro (02 e 03/04, manhã/tarde); Elias José (03/04, manhã/tarde); André Ribeiro com a oficina: Reportagem Biográfica (03/04 – às 14h); Julio Emilio (04/04, manhã e tarde); Gabriel O Pensador (03/04, às 19h50); Márcia Nehemy Bittar e Beth Nanni – autoras do livro “Os Deuses e o Amor” (04/04, às 17h); o antropólogo Roberto DaMatta (04/04, às 19h50); Lino de Albergaria (05/04, manhã e tarde); Walter Alvarenga, escritor do livro “Cinco Crianças” (05/04, às 16h); e o poeta Fabrício Carpinejar (05/04, às 19h50). Todos já têm a presença confirmada.

Peças teatrais escolares e profissionais, murais de poesias, concursos de redação, contadores de histórias, exposições de escritores mirins, tardes de autógrafos, e recreação com os monitores do SESC/MG e o Cinearte Sarau Petrobras Brasil Adentro são outras atividades que enriquecerão a programação desse grande evento literário.

As escolas já podem agendar a visita entrando em contato pelo telefone (35) 3713-9901. Esse evento é uma realização da GSC Eventos com a parceria da Prefeitura Municipal de Poços de Caldas, Secretaria de Educação e Cultura, Secretaria de Turismo, com o patrocínio oficial da Petrobras, patrocinadores Alcoa GBS e CBA, e apoio da Cia. Bella de Artes, Renovias, Câmara Brasileira do Livro, Hotel Minas Garden, Unimed, SESC e SENAC.

Fontes:
Colaboração de Douglas Lara, em Acontece em Sorocaba - Últimas Notícias
http://www.sorocaba.com.br/acontece
http://www.feiradolivropocosdecaldas.com.br/

Gabriel, o Pensador na 2o. Festival Literário Nacional

Está confirmada a presença do cantor de rap e escritor, Gabriel – O Pensador para o dia 03 de abril, às 19h50, no 2º Festival Literário Nacional de Poços de Caldas, que acontecerá no Palace Casino.

Gabriel O Pensador, é autor dos livros “Diário Noturno” e do livro que lhe concedeu o prêmio Jabuti de melhor livro infantil, "Um Garoto Chamado Rorbeto".

Além de escritor, é um dos maiores nomes do rap brasileiro, diferenciou-se de boa parte de seus pares (e chegou a ser por eles criticado) por ser garoto branco de classe média alta. Mas desde o começo fez das letras de crítica social o seu “cavalo de batalha”, como convém ao melhor rap.

Filho da jornalista Belisa Ribeiro, ele apareceu no fim de 1992, quando ainda era estudante de comunicação na PUC do Rio, com a música "Tô Feliz, Matei o Presidente". O personagem da letra era Fernando Collor de Mello, que tinha acabado de renunciar ao cargo frente a um processo de impeachment (e de quem Belisa tinha sido assessora).

Contratado pela Sony Music por causa do sucesso da música, Gabriel lançou em 1993 seu primeiro e homônimo disco, que ganhou as rádios com as ácidas, mas bem-humoradas "Lôraburra" e "Retrato de um Playboy".

Em 1995, ele saiu com o feroz "Ainda É Só o Começo", que provocou polêmica com as músicas "Estudo Errado" e "FDP ao Cubo", mas não repetiu o sucesso do primeiro álbum. Dois anos depois, Gabriel voltou à carga com a irreverente e pop "2345meia78", que seria a primeira faixa de trabalho do disco "Quebra-Cabeça". "Cachimbo da Paz" e "Festa da Música" estouraram depois, levando o CD a ultrapassar a marca do um milhão de cópias vendidas.

Sucesso em Portugal, atração escolhida pela banda irlandesa U2 para fazer a abertura de seus shows brasileiros em 1998, Gabriel deu prosseguimento aos seus trabalhos com o disco "Nádegas a Declarar", lançado no fim de 1999.

Em 2003, Gabriel lança seu registro acústico "MTV ao Vivo" com os seus maiores sucessos, como "Lôraburra", "Festa da Música" e "Cachimbo da Paz", e destaca as participações especiais de Lulu Santos (Astronauta), Aninha Lima (FDP³) e Titãs (na faixa inédita, "Cara Feia").

Cavaleiro Andante é o sétimo disco de Gabriel O Pensador, lançado em 2005. No novo trabalho, o rapper recria "Pais e Filhos", sucesso da Legião Urbana, em "Palavras Repetidas", apresentando ainda mais dez composições marcadas por suas letras fortes e elaboradas. "Tudo na Mente", "Sem Neurose" e "Tempestade" são outros destaques do CD.

Para participar do bate-papo literário com Gabriel O Pensador . Será necessário trocar um livro, em bom estado, por um ingresso. As trocas serão realizadas na GSC Eventos Especiais (Rua Prefeito Chagas, 305 – Sala 308 – 3º andar – informação: (035) 3713-9901) e na Livraria Libertas (informação: (035) 3721-0908) e/ou na Secretaria do Evento, durante o período da Feira. A quantidade de ingresso é limitada.
.
Fonte:

segunda-feira, 24 de março de 2008

Patativa do Assaré (1909 - 2002)

As penas plúmbeas, as asas e cauda pretas da patativa, pássaro de canto enternecedor que habita as caatingas e matas do Nordeste brasileiro, batizaram poeta Antônio Gonçalves da Silva, conhecido em todo o Brasil como Patativa do Assaré, referência ao município que nasceu. Analfabeto "sem saber as letra onde mora ", como diz num de seus poemas, sua projeção em todo o Brasil se iniciou na década de 50, a partir da regravação de "Triste Partida", toada de retirante gravada por Luiz Gonzaga.

Filho do agricultor Pedro Gonçalves da Silva e de Maria Pereira da Silva, Patativa do Assaré veio ao mundo no dia 9 de março de 1909. Criado num ambiente de roça, pequena propriedade rural de seus pais em Serra de Santana, município de Assaré, no sul do Ceará, seu pai morrera quando tinha apenas oito anos legando aos seus filhos Antônio, José, Pedro, Joaquim, e Maria o ofício da enxada, "arrastar cobra pros pés" , como se diz no sertão. Filho mais velho entre os cinco irmãos, começou a vida trabalhando na enxada.
Casou-se com D. Belinha, e foi pai de nove filhos.
A sua vocação de poeta, cantador da existência e cronista das mazelas do mundo despertou cedo, aos cinco anos já exercitava seu versejar. A mesma infância que lhe testemunhou os primeiros versos presenciaria a perda da visão direita, em decorrência de uma doença, segundo ele, chamada "mal d'olhos".

Sua verve poética serviu vassala a denunciar injustiças sociais, propagando sempre a consciência e a perseverança do povo nordestino que sobrevive e dá sinais de bravura ao resistir ao condições climáticas e políticas desfavoráveis. A esse fato se refere a estrofe da música Cabra da Peste:

"Eu sou de uma terra que o povo padece
Mas não esmorece e procura vencer.
Da terra querida, que a linda cabocla
De riso na boca zomba no sofrê
Não nego meu sangue, não nego meu nome.
Olho para a fome , pergunto: que há ?
Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,
Sou cabra da Peste, sou do Ceará."

Embora tivesse facilidade para fazer versos desde menino, a Patativa do município de Assaré, no Vale do Cariri, nunca quis ganhar a vida em cima do seu dom de poeta. Mesmo tendo feito shows pelo Sul do país, quando foi mostrado ao grande público por Fagner em finais da década de 70, até hoje se considera o mesmo camponês humilde e mora no mesmo torrão natal onde nasceu, no seu pedaço de terra na Serra de Santana.

Do Vale do Cariri, que compreende o Sul do Ceará e parte Oeste da Paraíba, muitas famílias migraram para outras regiões do Brasil. A própria família Gonçalves , da qual faz parte o poeta, se largou do Crato , de Assaré e circunvizinhanças para o Sul da Bahia, em busca do dinheiro fácil do cacau, nas décadas de 20 e 30.

Seus livros foram publicados ocasionalmente por pesquisadores e músicos amigos e, parceria com pequenos selos tipográficos e hoje são relíquias para os colecionadores da literatura nordestina.

Publicou Inspiração Nordestina, em 1956. Cantos de Patativa, em 1966. Em 1970, Figueiredo Filho publicou seus poemas comentados

A estréia do vate cearense em vinil se deu no ano de 1979, quando gravou o LP "Poemas e Canções", lançado pela CBS . As gravações foram realizadas em recital no Teatro José de Alencar, em Fortaleza. Cantando para seu povo brincou poeticamente com o fato de estar sendo gravado em disco na abertura A dor Gravada:

"Gravador que está gravando
Aqui no nosso ambiente
Tu gravas a minha voz,
O meu verso e o meu repente
Mas gravador tu não gravas
A dor que meu peito sente".

O recital fez parte de uma revisão cultural que a nova classe intelectual ligada á musica e ao cinema faz sobre o obra dos grandes poetas populares cearenses como Cego Oliveira, Ascenso Ferreira e o próprio Patativa. Artistas como Fagner , o cineasta Rosemberg Cariri e outros, se encarregaram de produzir em vídeo e película documentários com finalidade de registrar ar um pouco da cultura em seu molde mais genuíno.

Do mesmo disco é a destemida Senhor Doutor, que em pleno governo do general Ernesto Geisel falava em baixos salários numa posição de afronta em relação à situação da elite, representada pela figura do doutor. Assim vocifera o bardo do Assaré, com seu ressonante gogó:

"Sinhô Dotô não se enfade
Vá guardando essa verdade
E pode crê, sou aquele operário
Que ganha um pobre salário
Que não dá para comer."


Após a gravação do primeiro LP o recitador , fez uma série de shows com seu discípulo Fagner . Em 81 a apresentação da dupla no Festival de Verão do Guarujá ganha ampla repercussão na imprensa. Nesta mesma ocasião gravou seu segundo LP "A Terra é Naturá", também pela CBS. Patativa sempre cantou as saudades da sua terra, embora não tenha deixado o seu Cariri no último pau-de-arara, como diz a letra. Seu lamento arrastado e monocórdico acalanta os que se retiraram e serve de ombro aos que ficam.
.
A toada-aboio "Vaca Estrela e Boi Fubá" que narra a saudade da terra natal e do gado foi o sucesso do disco em versão gravada por Fagner no LP "Raimundo Fagner", de 1980.

"Eu sou filho do Nordeste, não nego o meu naturá
Mas uma seca medonha me tangeu de lá pra cá
Lá eu tinha o meu gadinnho, num é bom nem imaginar
Minha linda Vaca Estrela e o meu belo Boi Fubá.
Quando era de tardezinha eu começava a aboiar
".

Outro ponto alto do disco "A Terra é Naturá" que foi lançado em CD pela 97 é a poesia Antônio Conselheiro que narra a saga do messiânico desde os dias iniciais em Quixeramobim, no Ceará até o combate final no Arraial de Belo Monte, na Fazenda Canudos, em 1897. Patativa, como muitos dos cantadores, registram na memória as histórias que boiam no leito da tradição oral, contadas aqui e ali, reproduzidas pelos violeiros e pelos cordéis.

"A Terra é Naturá" foi produzido por Fagner , tendo o cineasta Rosemberg Cariri entrado como assistente de produção artística. O acompanhamento é feito por Manassés, músico especialista em violas que se revelou juntamente com o Pessoal do Ceará, e pelo violonista Nonato Luiz, violonista de mão cheia. A presença do rabequeiro Cego Oliveira, fazendo o introdutório das músicas ajuda a consolidar a reputação de indispensável ao LP.

O lirismo dos versos de Mãe Preta, poema dedicado à sua mãe de criação cuja morte é narrada em versos contundentes e simplórios ao mesmo tempo, apresenta uma densidade poética que só os que cantam com pureza d'alma atingem.

" Mamãe, com muito carinho, chorando um beijo me deu
E me disse : meu filhinho, sua Mãe Preta morreu.
E outras coisa me dizendo, senti meu corpo tremendo,
Me considerei um réu. Perdi da vida o prazer,
Com vontade de morrer pra ver Mãe Preta no céu"


Depois deste disco Patativa voltou para o seu roçado na Serra de Santana, em Assaré.

De lá saia esporadicamente para alguns recitais mas é no seu pé-de-serra, que recebe a inspiração poética.

Em 9 de março de 1994 o poeta completou 85 verões e foi homenageado com o LP "Patativa do Assaré - 85 Anos de Poesia", sendo este seu mais recente lançamento, com participação das duplas de repentistas Ivanildo Vila Nova e Geraldo Amâncio e Otacílio Batista e Oliveira de Panelas. Como narrador do progresso nos meios de comunicação expôs em Presente Disagradável suas convicções autênticas, sobre o aparelho de televisão:

"Toda vez que eu ligo ele
No chafurdo das novela
Vejo logo os papo é feio
Vejo o maior tumaré
Com a briga das mulhé
Querendo os marido alheio
Do que adianta ter fama?
Ter curso de Faculdade?
Mode apresentar programa
Com tanta imoralidade !"

Em reconhecimento a seu trabalho, que é admirado internacionalmente, foi agraciado, no Brasil, com o título de doutor "honoris causa" por universidades locais. Tem inúmeros folhetos de cordel e poemas publicados em revistas e jornais. Sua memória está preservada no centro da cidade de Assaré, num sobradão do século XIX que abriga o Memorial Patativa do Assaré. Em seu livro Cante lá que eu canto cá, Patativa afirma que o sertão enfrenta a fome, a dor e a miséria, e que "para ser poeta de vera é preciso ter sofrimento".

O poeta faleceu no dia 08/07/2002, aos 93 anos.

Discografia
Patativa do Assaré - (CBS - 79)
A Terra é naturá - (CBS - 81)
85 Anos de Poesia
(Som Zoom - 95)


Fontes:
Cláudio Carvalho Moreira e Zezão Castro. Patativa do Assaré e seus 90 verões de gorjeio poético. Disponível em http://www.facom.ufba.br/pexsites/musicanordestina/patati.htm

http://www.releituras.com/patativa_poetclassicos.asp

Patativa do Assaré (Aos poetas clássicos)

Poetas niversitário,
Poetas de Cademia,
De rico vocabularo
Cheio de mitologia;
Se a gente canta o que pensa,
Eu quero pedir licença,
Pois mesmo sem português
Neste livrinho apresento
O prazê e o sofrimento
De um poeta camponês.

Eu nasci aqui no mato,
Vivi sempre a trabaiá,
Neste meu pobre recato,
Eu não pude estudá
No verdô de minha idade,
Só tive a felicidad
De dá um pequeno insaio
In dois livro do iscritô,
O famoso professô
Filisberto de Carvaio.

No premêro livro havia
Belas figuras na capa,
E no começo se lia:
A pá — O dedo do Papa,
Papa, pia, dedo, dado,
Pua, o pote de melado,
Dá-me o dado, a fera é má
E tantas coisa bonita,
Qui o meu coração parpita
Quando eu pego a rescordá.

Foi os livro de valô
Mais maió que vi no mundo,
Apenas daquele autô
Li o premêro e o segundo;
Mas, porém, esta leitura,
Me tirô da treva escura,
Mostrando o caminho certo,
Bastante me protegeu;
Eu juro que Jesus deu
Sarvação a Filisberto.

Depois que os dois livro eu li,
Fiquei me sintindo bem,
E ôtras coisinha aprendi
Sem tê lição de ninguém.
Na minha pobre linguage,
A minha lira servage
Canto o que minha arma sente
E o meu coração incerra,
As coisa de minha terra
E a vida de minha gente.

Poeta niversitaro,
Poeta de cademia,
De rico vocabularo
Cheio de mitologia,
Tarvez este meu livrinho
Não vá recebê carinho,
Nem lugio e nem istima,
Mas garanto sê fié
E não istruí papé
Com poesia sem rima.

Cheio de rima e sintindo
Quero iscrevê meu volume,
Pra não ficá parecido
Com a fulô sem perfume;
A poesia sem rima,
Bastante me disanima
E alegria não me dá;
Não tem sabô a leitura,
Parece uma noite iscura
Sem istrela e sem luá.

Se um dotô me perguntá
Se o verso sem rima presta,
Calado eu não vou ficá,
A minha resposta é esta:
— Sem a rima, a poesia
Perde arguma simpatia
E uma parte do primô;
Não merece munta parma,
É como o corpo sem arma
E o coração sem amô.

Meu caro amigo poeta,
Qui faz poesia branca,
Não me chame de pateta
Por esta opinião franca.
Nasci entre a natureza,
Sempre adorando as beleza
Das obra do Criadô,
Uvindo o vento na serva
E vendo no campo a reva
Pintadinha de fulô.

Sou um caboco rocêro,
Sem letra e sem istrução;
O meu verso tem o chêro
Da poêra do sertão;
Vivo nesta solidade
Bem destante da cidade
Onde a ciença guverna.
Tudo meu é naturá,
Não sou capaz de gostá
Da poesia moderna.

Deste jeito Deus me quis
E assim eu me sinto bem;
Me considero feliz
Sem nunca invejá quem tem
Profundo conhecimento.
Ou ligêro como o vento
Ou divagá como a lesma,
Tudo sofre a mesma prova,
Vai batê na fria cova;
Esta vida é sempre a mesma.
Fonte:
O texto acima foi extraído de livreto de cordel de mesmo título, sem dados para identificação.
http://www.releituras.com/patativa_poetclassicos.asp

Osman Lins (1924 - 1978)

  • - Osman Lins nasceu a 5 de julho de 1924, em Vitória de Santo Antão (PE).
  • - Publicou seu primeiro romance, O visitante, em 1955 e, em 1957, Os gestos.
    - Em 1960, concluiu o curso de dramaturgia na Escola de Belas Artes, da Universidade do Recife.
    - Estreou peça de sua autoria, Lisbela e o prisioneiro, no Rio de Janeiro, em 1961. No mesmo ano, editou o romance O Fiel e a Pedra. Em seguida viajou para a Europa como bolsista da Alliance Française.
    - Em 1962, transferiu-se para São Paulo.
    - Publicou, em 1966, Nove, novena, narrativas e Um mundo estagnado, ensaios sobre livros didáticos de português e a peça Guerra do "Cansa-Cavalo" .
    - Em 1970, ingressou no ensino superior como professor de Literatura Brasileira.
    - Em 1973, publica Avalovara, romance, traduzido posteriormente para o espanhol, francês e alemão.
    - Obtém o grau de Doutor em Letras pela Faculdade de Filosofia e Letras de Marília (1973), com a tese "Lima Barreto e o espaço romanesco", publicada em 1975.
    - Foi professor titular de Literatura Brasileira na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Marília (SP) até 1976, quando deixa o ensino universitário dedicando-se exclusivamente à atividade de escritor.

    Obras do autor:
    O visitante (1955) romance,
    Os gestos (1957) contos,
    O fiel e a pedra (1961) romance,
    Marinheiro de primeira viagem (1963) notas de viagem,
    Lisbela e o prisioneiro (1964) teatro,
    Nove, Novena (1966) narrativas,
    Um mundo estagnado (1966) ensaio,
    "Capa Verde" e o Natal (1967) teatro infantil,
    Guerra do "Cansa Cavalo" (1967) teatro,
    Guerra sem testemunhas: o escritor, sua condição e a realidade social (1969) ensaio,
    Avalovara (1973) romance,
    Santa, automóvel e soldado (1975) teatro,
    Lima Barreto e o espaço romanesco (1976) ensaio
    A Rainha dos Cárceres da Grécia (1976), romance.

    Seu conto "A ilha no espaço" foi adaptado e apresentada no programa Caso Especial da TV Globo.

    A partir de 1976, começa a colaborar ativamente na imprensa e a escrever para televisão, além de redigir ensaios em colaboração com Julieta de Godoy Ladeira: Do Ideal e da Glória e Problemas Inculturais Brasileiros.
    Prêmios literários:
    "Fábio Prado" (SP),1955,
    "Monteiro Lobato" (SP),
    "Coelho Neto", da Academia Brasileira de Letras (1955),
    "Vânia Souto Carvalho" (Recife), 1957,
    "Nacional de Comédia",
    "Mário Sette" (Recife), 1962
    "José de Anchieta" (SP), 1965.
  • Faleceu em São Paulo a 8 de julho de 1978.

    Fonte:
    http://www.releituras.com/osmanlins_menu.asp

Osman Lins (A Partida)

Hoje, revendo minhas atitudes quando vim embora, reconheço que mudei bastante. Verifico também que estava aflito e que havia um fundo de mágoa ou desespero em minha impaciência. Eu queria deixar minha casa, minha avó e seus cuidados. Estava farto de chegar a horas certas, de ouvir reclamações; de ser vigiado, contemplado, querido. Sim, também a afeição de minha avó incomodava-me. Era quase palpável, quase como um objeto, uma túnica, um paletó justo que eu não pudesse despir.

Ela vivia a comprar-me remédios, a censurar minha falta de modos, a olhar-me, a repetir conselhos que eu já sabia de cor. Era boa demais, intoleravelmente boa e amorosa e justa.
Na véspera da viagem, enquanto eu a ajudava a arrumar as coisas na maleta, pensava que no dia seguinte estaria livre e imaginava o amplo mundo no qual iria desafogar-me: passeios, domingos sem missa, trabalho em vez de livros, mulheres nas praias, caras novas. Como tudo era fascinante! Que viesse logo. Que as horas corressem e eu me encontrasse imediatamente na posse de todos esses bens que me aguardavam. Que as horas voassem, voassem!

Percebi que minha avó não me olhava. A princípio, achei inexplicável ela fizesse isso, pois costumava fitar-me, longamente, com uma ternura que incomodava. Tive raiva do que me parecia um capricho e, como represália, fui para a cama.

Deixei a luz acesa. Sentia não sei que prazer em contar as vigas do teto, em olhar para a lâmpada. Desejava que nenhuma dessas coisas me afetasse e irritava-me por começar a entender que não conseguiria afastar-me delas sem emoção.

Minha avó fechara a maleta e agora se movia, devagar, calada, fiel ao seu hábito de fazer arrumações tardias. A quietude da casa parecia triste e ficava mais nítida com os poucos ruídos aos quais me fixava: manso arrastar de chinelos, cuidadoso abrir e lento fechar de gavetas, o tique-taque do relógio, tilintar de talheres, de xícaras.

Por fim, ela veio ao meu quarto, curvou-se:

— Acordado?

Apanhou o lençol e ia cobrir-me (gostava disto, ainda hoje o faz quando a visito); mas pretextei calor, beijei sua mão enrugada e, antes que ela saísse, dei-lhe as costas.
Não consegui dormir. Continuava preso a outros rumores. E quando estes se esvaíam, indistintas imagens me acossavam. Edifícios imensos, opressivos, barulho de trens, luzes, tudo a afligir-me, persistente, desagradável — imagens de febre.

Sentei-me na cama, as têmporas batendo, o coração inchado, retendo uma alegria dolorosa, que mais parecia um anúncio de morte. As horas passavam, cantavam grilos, minha avó tossia e voltava-se no leito, as molas duras rangiam ao peso de seu corpo. A tosse passou, emudeceram as molas; ficaram só os grilos e os relógios. Deitei-me.

Passava de meia-noite quando a velha cama gemeu: minha avó levantava-se. Abriu de leve a porta de seu quarto, sempre de leve entrou no meu, veio chegando e ficou de pé junto a mim. Com que finalidade? — perguntava eu. Cobrir-me ainda? Repetir-me conselhos? Ouvi-a então soluçar e quase fui sacudido por um acesso de raiva. Ela estava olhando para mim e chorando como se eu fosse um cadáver — pensei. Mas eu não me parecia em nada com um morto, senão no estar deitado. Estava vivo, bem vivo, não ia morrer. Sentia-me a ponto de gritar. Que me deixasse em paz e fosse chorar longe, na sala, na cozinha, no quintal, mas longe de mim. Eu não estava morto.

Afinal, ela beijou-me a fronte e se afastou, abafando os soluços. Eu crispei as mãos nas grades de ferro da cama, sobre as quais apoiei a testa ardente. E adormeci.

Acordei pela madrugada. A princípio com tranqüilidade, e logo com obstinação, quis novamente dormir. Inútil, o sono esgotara-se. Com precaução, acendi um fósforo: passava das três. Restavam-me, portanto, menos de duas horas, pois o trem chegaria às cinco. Veio-me então o desejo de não passar nem uma hora mais naquela casa. Partir, sem dizer nada, deixar quanto antes minhas cadeias de disciplina e de amor.

Com receio de fazer barulho, dirigi-me à cozinha, lavei o rosto, os dentes, penteei-me e, voltando ao meu quarto, vesti-me. Calcei os sapatos, sentei-me um instante à beira da cama. Minha avó continuava dormindo. Deveria fugir ou falar com ela? Ora, algumas palavras... Que me custava acordá-la, dizer-lhe adeus?

Ela estava encolhida, pequenina, envolta numa coberta escura. Toquei-lhe no ombro, ela se moveu, descobriu-se. Quis levantar-se e eu procurei detê-la. Não era preciso, eu tomaria um café na estação. Esquecera de falar com um colega e, se fosse esperar, talvez não houvesse mais tempo. Ainda assim, levantou-se. Ralhava comigo por não tê-la despertado antes, acusava-se de ter dormido muito. Tentava sorrir.

Não sei por que motivo, retardei ainda a partida. Andei pela casa, cabisbaixo, à procura de objetos imaginários enquanto ela me seguia, abrigada em sua coberta. Eu sabia que desejava beijar-me, prender-se a mim, e à simples idéia desses gestos, estremeci. Como seria se, na hora do adeus, ela chorasse?

Enfim, beijei sua mão, bati-lhe de leve na cabeça. Creio mesmo que lhe surpreendi um gesto de aproximação, decerto na esperança de um abraço final. Esquivei-me, apanhei a maleta e, ao fazê-lo, lancei um rápido olhar para a mesa (cuidadosamente posta para dois, com a humilde louça dos grandes dias e a velha toalha branca, bordada, que só se usava em nossos aniversários.

Fonte:
"Os Gestos", Editora Melhoramentos — São Paulo, 1975 e "Os cem melhores contos brasileiros do século", seleção de Ítalo Moriconi, Editora Objetiva — Rio de Janeiro, 2000, pág. 190. Disponível em
http://www.releituras.com/osmanlins_menu.asp