quinta-feira, 29 de maio de 2008

Aventuras de Tintim (Tintim na África - Tintim no Tibete)

Tintin au Congo

Tintin au Congo (Tintim no Congo ou Tintim na África, como editado em português) é um álbum da série de banda desenhada As Aventuras de Tintim, produzida pelo belga Hergé, e lançado em 1931.

Sinopse

Tintim é enviado ao Congo, a grande colônia belga da época. Uma série de peripécias o levam ao reino de Babaoro'm, onde ele torna-se o feiticeiro nomeado. Por um jogo de cincunstâncias, ele se encontra confrontado com um bando de gângsters afiliados a Al Capone, que quer controlar a produção de diamantes. Naturalmente, ele consegue os deter e deixa o país pouco depois.

Análise

Em 1930, o Congo representava um Eldorado para a Bélgica. O Congo, oitenta vezes maior que o país que o colonizava, tinha um subsolo extremamente rico. Nessa época, faltava mão-de-obra. Por conseguinte, Hergé devia fazer uma propaganda deste país.

A história foi publicada de 5 de junho de 1930 a 11 de junho de 1931, no Le Petit Vingtième, suplemento infantil do jornal Le Vingtième Siècle. Foi publicada como álbum em preto-e-branco em 1931, primeiramente pelas Editions du Petit Vingtième, depois republicado pelas Editions Casterman, que tomaram a publicação das Aventuras de Tintim com exclusividade.

Na modificação do álbum em julho de 1946, Hergé redesenha quase toda a aventura. Ele a colore, reduz de 110 páginas à 62 (padrão dos álbuns de Tintim) e altera a ideologia colonialista do álbum. Assim, a lição geográfica e histórica que dava Tintim num determinado trecho do livro, sobre "Vossa pátria, a Bélgica" encontrou-se substituída por uma lição de matemática. Hergé melhora as decorações, corta algumas partes e altera os diálogos para torná-los mais vivos. Os charutos do faraó e Tintim na América também foram redesenhados antes de serem coloridos.

Hergé afirmou mais tarde que para a criação de Tintim no Congo, da mesma maneira que para Tintim no país dos sovietes, ele vivia num meio cheio de preconceitos. De outro modo, a particularidade de Tintin no Congo é que o álbum é cheio de estereótipos da visão do Congo pelos europeus daquela época. Ele afirmou:

"Da mesma maneira quando desenhei Tintim no país dos sovietes, ao desenhar Tintim no Congo estava alimentado de preconceitos do meio burguês no qual vivia... Era 1930. Conhecia deste país apenas o que as pessoas contavam na época: 'os negros são grandes crianças, felizmente estamos lá!', etc. E desenhei os africanos de acordo com estes critérios, de puro espírito paternalista, que era o da época na Bélgica".

Curiosidades
Na versão colorida, Tintim é interrompido por um leopardo enquanto dá uma aula de aritmética. Na versão em preto-e-branco, o quadro-negro é um mapa de geografia, e Tintim diz: "Hoje vamos falar de vossa pátria: a Bélgica".

Neste álbum, os congoleses têm uma pronúncia errada, enquanto os elefantes conversam entre si corretamente.

Na versão atual colorida do álbum, os Dupondt fazem uma breve aparição no primeiro quadro enquanto estão ausentes da versão em preto-e-branco.

Nesta aventura, Tintim faz um buraco nas costas de um rinoceronte, preenchendo-o com dinamite e explodindo-o. A associação dinamarquesa de defesa dos animais não gostou deste detalhe, e esta passagem foi suprimida da versão dinamarquesa, e o rinoceronte foge depois que Tintim atira acidentalmente uma bala.

No primeiro quadro da página 1, aparecem Hergé, Quim e Felipe (personagens de Hergé), Edgar P. Jacobs e Jacques van Melkebeke (colaboradores de Hergé).

Personagens
• Tintim
• Milu
• Tom
Aparece na página 5. Ele é enviado por Gibbons para suprimir Tintim. Ele é "o vilão" do álbum, mas não consiguirá efetuar sua missão. Ele é devorado por crocodilos na página 48.
• Coco
Aparece na página 11. Ele guia Tintim durante sua aventura e lhe salva a vida.
• O Rei dos Babaoro'm
Aparece na página 21.Pede à Tintin que vá à caça ao leão.
• Muganga
Aparece na página 24. É o feiticeiro de Babaoro'm. Fica com inveja de Tintim. Com Tom, ele tentara se livrar do repórter.
• O Missionário
Aparece na página 34. Ele salva Tintim dos crocodilos.
• Jimmy Mac Duff
Aparece na página 38. É fornecedor de animais para os jardins zoológicos europeus.
• Gibbons
Aparece na página 51. É o patrão de Tom. Recebeu de Al Capone a ordem de matar Tintim.

Tintin au Tibet

Tintim no Tibete (Tintin au Tibet, no original em francês) é um álbum de história em quadrinhos da série As aventuras de Tintim, produzida pelo belga Hergé e lançado em 1960.

Tintim no Tibete é um livro à parte na obra de Hergé: sem dúvida o quadrinho mais pessoal de Hergé e também onde Tintim se mostra mais humano

Em férias numa estação alpina, Tintim lê num jornal que um avião caiu no Nepal. Tintim sonha com Tchang, um grande amigo, pedindo socorro. Logo depois, descobre que naquele avião que se dirigia à Europa se encontrava o jovem chinês Tchang.

Tintim, convencido por seu sonho, parte à procura de Tchang, acompanhado por Haddock.

Na época em que escrevia, Hergé tinha acabado de se divorciar e atravessava um profundo conflito interior. Os sonhos que Hergé tinha na época eram brancos, com imagens angustiantes e recorrentes. Hergé procurou auxílio psicanalítico.

Com muita dificuldade, Hergé terminou a história, aliviado e resolvido em relação aos seus problemas pessoais. O livro foi uma espécie de resposta, uma purificação, uma trajetória direta, linear e sóbria.

A história é a mais simples possível. Os personagens e os cenários são menos numerosos. O branco da neve onipresente domina.

É colocada em evidência a coragem de Tintim na sua obstinação em salvar o amigo Tchang, quando todos acreditavam que ele estava morto. Hergé demonstra sua fascinação pelo oriente e por fenômenos como sonhos premonitórios e levitação.

De qualquer maneira, Hergé manteve o mesmo rigor na pesquisa de elementos da região onde acontece a aventura de Tintim: consultou inúmeras fontes sobre a existência do yéti, o abominável homem das neves.

Ao ser reeditada, a história passou por algumas modificações. Uma cena muito explosiva foi suprimida. Hergé havia recebido uma reclamação da companhia aérea Indian Airways, companhia do acidente aéreo. O nome foi trocado por Sari-Airways.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org/

Programação do III Jogos Florais de Balneário Camboriú- SC-2008

(Sujeita a modificações)

Dia 7 de Novembro 2008- BRUSQUE

Encontro dos Trovadores no Hotel, às12, 00 horas.
Hospedagem para todos os Trovadores classificados e convidados.

TARDE DA TROVA EM BRUSQUE

Saída de Balneário Camboriú: 12,00 horas.

Chegada em Brusque: 13,00 horas

Encontro na FIP (centro comercial), às 13,30 com almoço e um refrigerante para cada um dos trovadores, patrocinado pelo FIP.

Compras até as 17,00 horas, em seguida visita ao VIII Simpósio Internacional de Esculturas (onde os artistas de vários países estarão fazendo as estatuas em mármore), visita ao Santuário de Azambuja e a gruta, uma parada na Praça das Bandeiras, onde fica a Prefeitura. Fórum e Câmara de Vereadores para tirar fotos, e depois seguimos para a ABB (local do café colonial) chegada prevista para este local 19,30 horas, onde o Café Colonial já estará pronto para ser servido, juntamente com o chope. Apresentação do coral do círculo trentino e o canto alemão, e muita música para dançar. (mini fenarreco). Rodada de Trovas.

(Almoço, Café Colonial e Chope, patrocinados por Brusque)

Retorno para Balneário Camboriú, às 23 horas.

Dia 8 de Novembro 2008 –

10 horas- Varal de Trovas no Calçadão.

11 horas-Passeio turístico pela cidade de Balneário Camboriú, no Bomdindinho, a partir do Calçadão com a Av. Atlântida.

12 horas- Almoço –(Por conta de cada um)

14 horas- Unipraias -Teleférico- Praia de Laranjeiras- 50% de desconto na passagem.

20 horas – Solenidade na Faculdade de Balneário Camboriú.

Distribuição dos Livretos.

22 horas-Coquetel

Dia 9 de Novembro 2008 –

11 horas – Missa em trovas.

12 horas – Almoço de despedida no Cristo Luz-

Concurso Relâmpago-Tema: Amizade.

O almoço de Despedida é Patrocínio de Miguel Russowsky

Fonte:
TROVAMAR - União Brasileira de Trovadores – Balneário Camboriú-SC
Ano 4– N. 42 – junho / 2008

Rápidas

Novo espaço cultural em São Paulo
A All Print Editora, em parceria com a empresa MiLê Eventos Culturais e Assessoria de Divulgação, informa que no final deste mês de maio estará inaugurando um Espaço Cultural localizado na sede da editora, Rua Ibituruna, 550, Metrô Saúde, São Paulo. Um sonho de muitos anos que vem se concretizando: ter um espaço acolhedor e aconchegante, onde os autores poderão apresentar suas obras, fruto de muito trabalho e dedicação, aos seus amigos, familiares, mídia e ao publico amante da leitura.

Feira promove a troca de livros e gibis em parques de São Paulo
[Folha Online] A Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo continua promovendo a Feira de Troca de Livros e Gibis 2008 em parques da capital paulista. As feiras ocorrem sempre aos domingos, das 10h às 16h. Os próximos parque que sediam a feira são o Anhangüera (11) e o Cidade de Toronto (18)
A cada domingo, o evento é realizado em um local diferente. Mais
http://guia.folha.com.br/passeios/ult10050u399175.shtml

Jornalista lança seu primeiro romance
A jornalista Vera Lúcia da Costa Sampaio lança "Enterrando Nossos Mortos", sua estréia no mercado editorial, publicado pela All Print Editora. Trata-se de um romance baseado em fatos reais, onde o personagem principal é um advogado criminalista oriundo de uma família que, por décadas, trazia sua religiosidade latente. Seus tataravós, bisavós, avós e pais foram evangélicos fervorosos, porém, sua mãe abandonou e se afastou do seio de seus irmãos evangélicos e o personagem seguiu por outros caminhos. Tirou uma assaltante de banco da prisão, apaixonou-se por ela e acabou viciado em drogas aos 40 anos de idade. Já a outra personagem da história não conseguia entender as coincidências que a envolveram com o rapaz e sua família e o motivo da volta dele e de sua família em sua vida depois de quase dois anos de rompimento em seu relacionamento afetivo. A noite de autógrafos ocorre no dia 29/2, sexta-feira, às 19h, na Livraria da Vila, Rua Fradique Coutinho, 915, Vila Madalena, São Paulo, SP.

São Paulo recebe a 20ª Bienal do Livro em agosto
[Globo Online] De 14 a 24 de agosto ocorrerá, no Pavilhão de Exposições do Parque Anhembi, a 20ª edição da Bienal do Livro. Uma das novidades deste ano - quando se celebram 200 anos da indústria gráfica no Brasil e da fundação da Biblioteca Nacional - é a Bienal Criança, para a qual foi reservada uma área de 11 mil metros quadrados dos 80 mil metros que terá a feira. Participarão cerca de 900 selos editoriais do mundo nesta Bienal do Livro, a segunda no gênero no mercado livreiro internacional e que teve 80% de seus estandes vendidos com um ano de antecedência. A previsão é de que 800 mil pessoas visitem o espaço.

Fonte:
http://www.allprinteditora.com.br/

Apresentação Teatral (Auto da Barca do Inferno - de Gil Vicente)


Auto da Barca do Inferno (Gil Vicente)

Direção: Eloísa Vitz
Assist. Direção: Daniela Rocha

Temporada de 26 de abril a 29 de junho de 2008

Sabados as 21hs e Domingos as 20hs

Teatro Gil Vicente - Av. Rudge, 315 - Campos Elíseos - São Paulo
(paralela ao Viaduto Rio Branco)

Informações pelo Telefone: 3618 - 9014

Ingressos:
Inteira: R$ 30,00 Meia: R$ 15,00

INGRESSOS GRÁTIS PARA ALUNOS E FUNCIONÁRIOS UNIBAN - SALETE

PROMOÇÃO PARA 31/05 e 01/06
50% de Desconto para um Acompanhante


Fonte:
E-mail enviado pela UNIBAN

Gil Vicente (1465 - 1536)

Gil Vicente é geralmente considerado o primeiro grande dramaturgo português, além de poeta de renome. Há quem o identifique com o ourives, autor da Custódia de Belém, mestre da balança, e com o mestre de Retórica do rei Dom Manuel. Enquanto homem de teatro, parece ter também desempenhado as tarefas de músico, actor e encenador. É frequentemente considerado, de uma forma geral, o pai do teatro português, ou mesmo do teatro ibérico já que também escreveu em castelhano - partilhando a paternidade da dramaturgia espanhola com Juan del Encina.

A obra vicentina é tida como reflexo da mudança dos tempos e da passagem da Idade Média para o Renascimento, fazendo-se o balanço de uma época onde as hierarquias e a ordem social eram regidas por regras inflexíveis, para uma nova sociedade onde se começa a subverter a ordem instituída, ao questioná-la. Foi, o principal representante da literatura renascentista portuguesa, anterior a Camões, incorporando elementos populares na sua escrita que influenciou, por sua vez, a cultura popular portuguesa.

Apesar de se considerar que a data mais provável para o seu nascimento tenha sido em 1466 — hipótese defendida, entre outros, por Queirós Veloso — há ainda quem proponha as datas de 1460 (Braamcamp Freire) ou entre 1470 e 1475 (Brito Rebelo). Se nos basearmos nas informações veiculadas na própria obra do autor, encontraremos contradições. O Velho da Horta, a Floresta de Enganos ou o Auto da Festa, indicam 1452, 1470 e antes de 1467, respectivamente. Desde 1965, quando decorreram festividades oficiais comemorativas do quincentenário do nascimento do dramaturgo, que se aceita 1465 de forma quase unânime.

Frei Pedro de Poiares localizava o seu nascimento em Barcelos, mas as hipóteses de assim ter sido são poucas. Pires de Lima propôs Guimarães para sua terra natal - hipótese essa que estaria de acordo com a identificação do dramaturgo com o ourives, já que a cidade de Guimarães foi durante muito tempo berço privilegiado de joalheiros. O povo de Guimarães orgulha-se desta hipótese, como se pode verificar, por exemplo, na designação dada a uma das escolas do Concelho (em Urgeses), que homenageia o autor.

Lisboa é também muitas vezes defendida como o local certo. Outros, porém, indicam as Beiras para local de nascimento - de facto, verificam-se várias referências a esta área geográfica de Portugal, seja na toponímia como pela forma de falar das personagens. José Alberto Lopes da Silva assinala que não há na obra vicentina referências a Barcelos nem a Guimarães, mas sim dezenas de elementos relacionados com as Beiras. Há obras inteiras, personagens, caracteres, linguagem. O conhecimento que o autor mostra desta região do país não era fácil de obter se tivesse nascido no norte e vivido a maior parte da sua vida em Évora e Lisboa.

Cada livro publicado sobre Gil Vicente é, quase sempre defensor de uma qualquer tese que identifique ou não o autor ao ourives. A favor desta hipótese existe o facto de o dramaturgo usar com propriedade termos técnicos de ourivesaria na sua obra.

Alguns intelectuais portugueses polemizaram sobre o assunto. Camilo Castelo Branco escreveu, em 1881, o documento "Gil Vicente, Embargos à fantasia do Sr. Teófilo Braga" - este último defendia uma só pessoa para o ourives e para o poeta, enquanto que Camilo defendia duas pessoas distintas. Teófilo Braga mudaria de opinião depois de um estudo de Sanches de Baena que mostrava a genealogia distinta de dois indivíduos de nome Gil Vicente, apesar de Brito Rebelo ter conseguido comprovar a inconsistência histórica destas duas genealogias, utilizando documentos da Torre do Tombo. Lopes da Silva, na obra citada[1], avança uma dezena de argumentos para provar que Gil Vicente era ourives quando escreveu a sua primeira obra, uma imitação do Auto del Repelón, de Juan del Encina a quem pede emprestada não só a história, mas também as personagens com o seu respectivo idioma, o saiaguês.

Dados biográficos

Apesar de se considerar que a data mais provável para o seu nascimento tenha sido em 1466, Sabe-se que casou com Branca Bezerra, de quem nasceram Gaspar Vicente(que morreu em 1519) e Belchior Vicente(nascido em 1505). Depois de enviuvar, casou com Melícia Rodrigues de quem teve Paula Vicente (1519-1576), Luís Vicente (que organizou a compilação das suas obras) e Valéria Borges. Presume-se que tenha estudado em Salamanca.

O seu primeiro trabalho conhecido, a peça em sayaguês Auto da Visitação, também conhecido como Monólogo do Vaqueiro, foi representada nos aposentos da rainha D. Maria, consorte de Dom Manuel, para celebrar o nascimento do príncipe (o futuro D. João III) - sendo esta representação considerada como o marco de partida da história do teatro português. Ocorreu isto na noite de 8 de Junho de 1502, com a presença, além do rei e da rainha, de Dona Leonor, viúva de D. João II e D. Beatriz, mãe do rei.

Tornou-se, então, responsável pela organização dos eventos palacianos. Dona Leonor pediu ao dramaturgo a repetição da peça pelas matinas de Natal, mas o autor, considerando que a ocasião pedia outro tratamento, escreveu o Auto Pastoril Castelhano. De facto, o Auto da Visitação tem elementos claramente inspirados na "adoração dos pastores", de acordo com os relatos do nascimento de Cristo. A encenação incluía um ofertório de prendas simples e rústicas, como queijos, ao futuro rei, ao qual se pressagiavam grandes feitos. Gil Vicente que, além de ter escrito a peça, também a encenou e representou, usou, contudo, o quadro religioso natalício numa perspectiva profana. Perante o interesse de Dona Leonor, que se tornou a sua grande protectora nos anos seguintes, Gil Vicente teve a noção de que o seu talento permitir-lhe-ia mais do que adaptar simplesmente a peça para ocasiões diversas, ainda que semelhantes.

Se foi realmente ourives, terminou a sua obra-prima nesta arte - a Custódia de Belém - feita para o Mosteiro dos Jerónimos, em 1506, produzida com o primeiro ouro vindo de Moçambique. Três anos depois, este mesmo ourives tornou-se vedor do património de ourivesaria no Convento de Cristo, em Tomar, Nossa Senhora de Belém e no Hospital de Todos-os-Santos, em Lisboa.

Consegue-se ainda apurar algumas datas em relação a esta personagem que tanto pode ser una como múltipla: em 1511 é nomeado vassalo de el-Rei e, um ano depois, sabe-se que era representante da bandeira dos ourives na "Casa dos Vinte e Quatro". Em 1513, o mestre da balança da Casa da Moeda, também de nome de Gil Vicente (se é o mesmo ou não, como já se disse, não se sabe), foi eleito pelos outros mestres para os representar junto à vereação de Lisboa.

Será ele que dirigirá os festejos em honra de Dona Leonor, a terceira mulher de Dom Manuel, no ano de 1520, um ano antes de passar a servir Dom João III, conseguindo o prestígio do qual se valeria para se permitir a satirizar o clero e a nobreza nas suas obras ou mesmo para se dirigir ao monarca criticando as suas opções. Foi o que fez em 1531, através de uma carta ao rei onde defende os cristãos-novos.

Morreu em lugar desconhecido, talvez em 1536 porque é a partir desta data que se deixa de encontrar qualquer referência ao seu nome nos documentos da época, além de ter deixado de escrever a partir desta data.

Contexto histórico

O Teatro português antes de Gil Vicente

O teatro português não nasceu com Gil Vicente. Esse mito, criado por vários autores de renome, como Garcia de Resende, na sua Miscelânia, ou o seu próprio filho, Luís Vicente, por ocasião da primeira edição da "Compilação" do obra completa do pai, poderá justificar-se pela importância inegável do autor no contexto literário pensinsular, mas não é de todo verdadeiro já que existiam manifestações teatrais antes da noite de 7 para 8 de Junho de 1502, data da primeira representação do "Auto do vaqueiro" ou "Auto da visitação", nos aposentos da rainha.

Já no reinado de Sancho I, os dois actores mais antigos portugueses, Bonamis e Acompaniado, realizaram um espectáculo de "arremedilho", tendo sido pagos pelo rei com uma doação de terras. O arcebispo de Braga, Dom Frei Telo, refere-se, num documento de 1281, a representações litúrgicas por ocasião das principais festividades católicas. Em 1451, o casamento da infanta Dona Leonor com o imperador Frederico III da Alemanha foi acompanhado também de representações teatrais.

Segundo as crónicas portuguesas de Fernão Lopes, Zurara, Rui de Pina ou Garcia de Resende, também nas cortes de D. João I, D. Afonso V e D.João II, se faziam encenações espectaculares. Rui de Pina refere-se, por exemplo, a um "momo", em que Dom João II participou pessoalmente, fazendo o papel de "Cavaleiro do Cisne", num cenário de ondas agitadas (formadas com panos), numa frota de naus que causou espanto entrando sala adentro acompanhado do som de trombetas, atabales, artilharia e música executada por menestréis, além de uma tripulação atarefada de actores vestidos de forma espectacular.

Contudo, pouco resta dos textos dramáticos pré-vicentinos. Além das éclogas dialogadas de Bernardim Ribeiro, Cristóvão Falcão e Sá de Miranda, André Dias publicou em 1435 um "Pranto de Santa Maria" considerado um esboço razoável de um drama litúrgico.

No Cancioneiro Geral de Garcia de Resende existem alguns textos também significativos, como o Entremez do Anjo (assim designado por Teófilo Braga), de D. Francisco de Portugal, Conde de Vimioso, ou as trovas de Anrique da Mota (ou Farsa do alfaiate, segundo Leite de Vasconcelos) dedicados a temas e peronagens chocarreiros como "um clérigo sobre uma pipa de vinho que se lhe foi pelo chão", entre outros episódios divertidos.

É provável que Gil Vicente tenha assistido algumas destas representações. Viria, contudo, sem qualquer dúvida, a superá-las em mestria e em profundidade, tal como diria Marcelino Menéndez Pelayo ao considerá-lo a "figura mais importante dos primitivos dramaturgos peninsulares", chegando mesmo a dizer que não havia "quem o excedesse na europa do seu tempo".

Obra

Características principais

A sua obra vem no seguimento do teatro ibérico popular e religioso que já se fazia, ainda que de forma menos profunda. Os temas pastoris, presentes na escrita de Juan del Encina vão influenciar fortemente a sua primeira fase de produção teatral e permanecerão esporadicamente na sua obra posterior, de maior diversidade temática e sofistificação de meios. De facto, a sua obra tem uma vasta diversidade de formas: o auto pastoril, a alegoria religiosa, narrativas bíblicas, farsas episódicas e autos narrativos.

O seu filho, Luís Vicente, na primeira compilação de todas as suas obras, classificou-as em autos e mistérios (de carácter sagrado e devocional) e em farsas, comédias e tragicomédias (de carácter profano). Contudo, qualquer classificação é redutora - de facto, basta pensar na Trilogia das Barcas para se verificar como elementos da farsa (as personagens que vão aparecendo, há pouco saídas deste mundo) se misturam com elementos alegóricos religiosos e místicos (o Bem e o Mal).

Gil Vicente retratou, com refinada comicidade, a sociedade portuguesa do século XVI, demonstrando uma capacidade acutilante de observação ao traçar o perfil psicológico das personagens. Crítico severo dos costumes, de acordo com a máxima que seria ditada por Molière ("Ridendo castigat mores" - rindo se castigam os costumes), Gil Vicente é também um dos mais importantes autores satíricos da língua portuguesa. Em 44 peças, usa grande quantidade de personagens extraídos do espectro social português da altura. É comum a presença de marinheiros, ciganos, camponeses, fadas e demônios e de referências – sempre com um lirismo nato – a dialetos e linguagens populares.

Entre suas obras estão Auto Pastoril Castelhano (1502) e Auto dos Reis Magos (1503), escritas para celebração natalina, e Auto da Sibila Cassandra (1503), anunciando os ideais renascentistas em Portugal. Sua obra-prima é a trilogia de sátiras Auto da Barca do Inferno (1516), Auto da Barca do Purgatório (1518) e Auto da Barca da Glória (1519). Em 1523 escreve a Farsa de Inês Pereira.

São geralmente apontados, como aspectos positivos das suas peças, a imaginação e originalidade evidenciadas; o sentido dramático e o conhecimento dos aspectos relacionados com a problemática do teatro.

Alguns autores consideram que a sua espontaneidade, ainda que reflectindo de forma eficaz os sentimentos colectivos e exprimindo a realidade criticável da sociedade a que pertencia, perde em reflexão e em requinte. De facto, a sua forma de exprimir é simples, chã e directa, sem grandes floreados poéticos.

Acima de tudo, o autor exprime-se de forma inspirada, dionisíaca, nem sempre obedecendo a princípios estéticos e artísticos de equilíbrio. É também versátil nas suas manifestações: se, por um lado, parece ser uma alma rebelde, temerária, impiedosa no que toca em demonstrar os vícios dos outros, quase da mesma forma que se esperaria de um inconsciente e tolo bobo da corte, por outro lado, mostra-se dócil, humano e ternurento na sua poesia de cariz religioso e quando se trata de defender aqueles a quem a sociedade maltrata.

O seu lirismo religioso, de raiz medieval e que demonstra influências das Cantigas de Santa Maria está bem presente, por exemplo, no Auto de Mofina Mendes, na cena da Anunciação, ou numa oração dita por Santo Agostinho no Auto da Alma. Por essa razão é, por vezes, designado por "poeta da Virgem".

O seu lirismo patriótico presente em "Exortação da Guerra", Auto da fama ou Cortes de Júpiter, não se limita a glorificar, em estilo épico e orgulhoso, a nacionalidade: de facto, é crítico e eticamente preocupado, principalmente no que diz respeito aos vícios nascidos da nova realidade económica, decorrente do comércio com o Oriente (Auto da Índia). O lirismo amoroso, por outro lado, consegue aliar algum erotismo e alguma brejeirice com influências mais eruditas (Petrarca, por exemplo).

Elementos filosóficos na obra vicentina

Os temas natalícios, muito presentes na obra de Gil Vicente desde a primeira encomenda de Dona Leonor, têm também um significado fortemente simbólico e sugestivo. Aqui, uma pintura do contemporâneo Vicente Gil (não confundir com o Dramaturgo!)

A obra de Gil Vicente transmite uma visão do mundo que se assemelha e se posiciona como uma perspectiva pessoal do Platonismo: existem dois mundos - o Mundo Primeiro, da serenidade e do amor divino, que leva à paz interior, ao sossego e a uma "resplandecente glória", como dá conta sua carta a D. João III; e o Mundo Segundo, aquele que retrata nas suas farsas: um mundo "todo ele falso", cheio de "canseiras", de desordem sem remédio, "sem firmeza certa". Estes dois mundos reflectem-se em temas diversos da sua obra: por um lado, o mundo dos defeitos humanos e das caricaturas, servidos sem grande preocupação de verosimilhança ou de rigor histórico.

Muitos autores criticam em Gil Vicente os anacronismos e as falhas na narrativa (aquilo a que chamaríamos hoje de "gaffes"), mas, para alguém que considerava o mundo retratado como pleno de falsidades, essas seriam apenas mais algumas, sem importância e sem dano para a mensagem que se pretendia transmitir. Por outro lado, o autor valoriza os elementos míticos e simbólicos religiosos do Natal: a figura da Virgem Mãe, do Deus Menino, da noite natalícia, demonstrando aí um zelo lírico e uma vontade de harmonia e de pureza artística que não existe nas suas mais conhecidas obras de crítica social.

Sem as características do maniqueísmo que tantas vezes se constatam nas peças teatrais de quem defende uma tal visão do Mundo, há, realmente, a presença de um forte contraste nos elementos cénicos usados por Gil Vicente: a luz contra a sombra, não numa luta feroz, mas em convivência quase amigável. A noite de natal torna-se também aqui a imagem perfeita que resume a concepção cósmica de Gil Vicente: as grandes trevas emolduram a glória divina da maternidade, do nascimento, do perdão, da serenidade e da boa vontade - mas sem a escuridão, que seria da claridade?

Legado

Note-se que a obra de Gil Vicente não se resume ao teatro, estendendo-se também à poesia. Podemos citar vários vilancetes e cantigas, ainda influenciadas pelo estilo palaciano e temas dos trovadores.

Vários compositores trabalharam poemas de Gil Vicente na forma de lied (principalmente algumas traduções para o alemão, feitas por Emanuel von Geibel), como Max Bruch ou Robert Schumann, o que demonstra o carácter universal da sua obra.

Os seus filhos, Paula e Luís Vicente, foram os responsáveis pela primeira edição das suas obras completas. Em 1586, sai à estampa uma segunda edição, com muitas passagens censuradas pela Inquisição. Só no século XIX se faria a redescoberta do autor, com a terceira edição de 1834, em Hamburgo, levada a cabo por Barreto Feio.

Obras
Monólogo do Vaqueiro ou Auto da Visitação (1502)
Auto Pastoril Castelhano (1502)
Auto dos Reis Magos (1503)
Auto de São Martinho (1504)
Quem Tem Farelos? (1505)
Auto da Alma (1508)
Auto da Índia (1509)
Auto da Fé (1510)
O Velho da Horta (1512)
Exortação da Guerra (1513)
Comédia do Viúvo (1514)
Auto da Fama (1516)
Auto da Barca do Inferno (1517)
Auto da Barca do Purgatório(1518)
Auto da Barca da Glória (1519)
Cortes de Júpiter (1521)
Comédia de Rubena (1521)
Farsa de Inês Pereira (1523)
Auto Pastoril Português (1523)
Frágua de Amor (1524)
Farsa do Juiz da Beira (1525)
Farsa do Templo de Apolo (1526)
Auto da Nau de Amores (1527)
Auto da História de Deus (1527)
Tragicomédia Pastoril da Serra da Estrela (1527)
Farsa dos Almocreves (1527)
Auto da Feira (1528)
Farsa do Clérigo da Beira (1529)
Auto do Triunfo do Inverno (1529)
Auto da Lusitânia, intercalado com o entremez Todo-o-Mundo e Ninguém (1532)
Auto de Amadis de Gaula (1533)
Romagem dos Agravados (1533)
Auto da Cananea (1534)
Auto de Mofina Mendes (1534)
Floresta de Enganos (1536)

Fonte:
http://pt.wikipedia.org

Gil Vicente (Auto da Barca do Inferno)

Definição de auto: designação genérica para peças cuja finalidade é tanto divertir quanto instruir; seus temas, podendo ser religiosos ou profanos, ‘sérios ou cômicos, devem, no entanto, guardar um profundo sentido moralizador.

O teatro vicentino não foi escrito em prosa, mas em versos. Por isso é poético. Adotava, predominantemente, o verso redondilho (maior ou menor), de origem popular e medieval. Possui muitas ressonâncias no Brasil, dentre os quais se destacam as peças didáticas de José de Anchieta (segunda metade do século XVI), Morte e Vida Severina (1956), de João Cabral de Melo Neto, e o Auto da Compadecida (1959), de Ariano Suassuna.

Pequeno resumo

Auto da Barca do Inferno é um auto onde o barqueiro do inferno e o do céu esperam à margem os condenados e os agraciados. Os que morrem chegam e são acusados pelo Diabo e pelo Anjo, ma apenas o Anjo absolve.

O primeiro a chegar é um Fidalgo, a seguida um agiota, um Parvo (bobo), um sapateiro, um frade, uma cafetina, um judeu, um juiz, um promotor, um enforcado e quatro cavaleiros. Um a um eles aproximam-se do Diabo, carregando o que na vida lhes pesou. Perguntam para onde vai a barca; ao saber que vai para o inferno ficam horrorizados e se dizem merecedores do Céu. Aproximam-se então do Anjo que os condena ao inferno por seus pecados.

O Fidalgo, o Onzeneiro (agiota), o Sapateiro, o Frade (e sua amante), a Alcoviteira Brísida Vaz (cafetina e bruxa), o judeu, o Corregedor (juiz), o Procurador (promotor) e o enforcado são todos condenados ao inferno por seus pecados, que achavam pouco ou compensados por visitas a Igreja e esmolas. Apenas o Parvo é absolvido pelo Anjo. Os cavaleiros sequer são acusados, pois deram a vida pela Igreja.

O texto do Auto é escrito em versos rimados, fundindo poesia e teatro, fazendo com que o texto, cheio de ironia, trocadilhos, metáforas e ritmo, flua naturalmente. Faz parte da trilogia dos Autos da Barca (do Inferno, do Purgatório, do Céu).

Movimento literário: Humanismo (Portugal)

Características:

Estilo: obra escrita em versos heptassílabos, em tom coloquial e com intenção marcadamente doutrinária, fundindo em algumas passagens o português, o latim e o espanhol. Cada personagem apresenta, através da fala, traços que denunciam sua condição social.

Estrutura: peça teatral em um único ato, subdividido em cenas marcadas pelos diálogos que o Anjo ou o Diabo travam com os personagens.

Cenário: um ancoradouro, no qual estão atracadas duas vbarcas. Todos os mortos, necessariamente, têm de passar por esta paragem, sendo julgados e condenados ou à barca da Glória ou à barca do Inferno.

Analisando personagens

Fidalgo: representa a nobreza, que chega com um pajem, uma roupagem exagerada e uma cadeira de espaldar, elementos característicos de seu status social. O diabo alega que o Fidalgo o acompanhará por ter tido uma vida de luxúria e de pecados. Ao Fidalgo, nada lhe valem as “compras” de indulgências, ou orações encomendadas. A crítica à nobreza é centrada nos dois principais defeitos humanos: o orgulho e a prática da tirania.

Onzeneiro: o segundo personagem a ser inquirido é o Onzeneiro, usuário que ao chegar à barca do Diabo descobre que seu rico dinheiro ficara em terra. Utilizando o pretexto de ir buscar o dinheiro, tenta convencer o Diabo a deixá-lo retornar, mas acaba cedendo às exigências do julgamento.

Parvo: um dos poucos a não ser condenado ao Inferno. O Parvo chega desprovido de tudo, é simples, sem malícia e consegue driblar o Diabo, e até injuriá-lo. Ao passar pela barca do Anjo, diz ser ninguém. Por sua humildade e por seus verdadeiros valores, é conduzido ao Paraíso.

Sapateiro: representante dos mestres de ofício, que chega à embarcação do Diabo carregando seu instrumento de trabalho, o aventar e as formas. Engana na vida e procura enganar o Diabo, que espertamente não se deixa levar por seus artifícios.

Frade: como todos os representantes do clero, focalizados por Gil Vicente, o Frade é alegre, cantante, bom dançarino e mau-caráter. Acompanhado de sua amante, o Frade acredita que por ter rezado e estar a serviço da fé, deveria ser perdoado de seus pecados mundanos, mas contra suas expectativas, é condenado ao fogo do inferno. Deve-se desar que Gil Vicente desfecha ardorosa crítica ao clero, acreditando-o incapaz de pregar as três coisas mais simples: a paz, a verdade e a fé.

Brísida Vaz: misto de alcoviteira e feiticeira. Por sua devassidão e falta de escrúpulos, é condenada. Personagem interessante que faz o público leitor conhecer a qualidade moral de outros personagens que com ela se relacionaram.

Judeu: entra acompanhado de seu bode. Deplorado por todos, até mesmo pelo Diabo que quase se recusa a levá-lo, é igualmente condenado, inclusive por não seguir os preceitos religiosos da fé cristã. Bom lembrar que, durante o reinado de D. Manuel, houve uma perseguição aos judeus visando à sua expulsão do território português; alguns se foram, carregando grandes fortunas; outros, converteram-se ao cristianismo, sendo tachados cristãos novos.

Corregedor e o Procurador: ambos representantes do judiciário. Juiz e advogado deviam ser exemplos de bom comportamento e acabam sendo condenados justamente por serem tão imorais quanto os mais imorais dos mortais, manipulando a justiça de acordo com as propinas recebidas.

Enforcado: chega ao batel, acredita ter o perdão garantido: seu julgamento terreno e posterior condenação à morte o teriam redimido de seus pecados, mas é condenado também a ir para o Inferno.

Cavaleiros: finalmente chegam à barca quatro cavaleiros cruzados, que lutam pelo triunfo da fé cristã e morrem em poder dos mouros. Obviamente, com uma ficha impecável, serão todos julgados e perdoados.

Cada um dos personagens focalizados adentram a morte com seus instrumentos terrenos, são venais, inconscientes e por causa de seus pecados não atingem a Glória, a salvação eterna.

Destaque deve ser feito à figura do Diabo, personagem vigorosa que conhece a arte de persuadir, é ágil no ataque, zomba, retruca, argumenta e penetra nas consciências humanas. Ao Diabo cabe denunciar os vícios e as fraquezas, sendo o personagem mais importante na crítica que Gil Vicente tece de sua época.

As personagens desta obra são divididas em dois grupos: as personagens alegóricas e as personagens – tipo. No primeiro grupo inserem-se o Anjo e o Diabo, representando respectivamente o Bem e o Mal, o Céu e o Inferno. Ao longo de toda a obra estas personagens são como que os «juízes» do julgamento das almas, tendo em conta os seus pecados e vida terrena. No segundo grupo inserem-se todas as restantes personagens do Auto, nomeadamente o Fidalgo, o Onzeneiro, o Sapateiro, o Parvo (Joane), o Frade, a Alcoviteira, o Judeu, o Corregedor e o Procurador, o Enforcado e os Quatro Cavaleiros. Todos mantêm as suas características terrestres, o que as individualiza visual e linguisticamente, sendo quase sempre estas características sinal de corrupção.

Fazendo uma análise das personagens, cada uma representa uma classe social, ou uma determinada profissão ou mesmo um credo. À medida que estas personagens vão surgindo vemos que todas trazem elementos simbólicos, que representam a sua vida terrena e demonstram que não têm qualquer arrependimento dos seus pecados. Os elementos cénicos de cada personagem são:

Fidalgo: manto e pajem que transporta uma cadeira. Estes elementos simbolizam a opressão dos mais fracos, a tirania e a presunção.
Onzeneiro: bolsão. Este elemento simboliza o apego ao dinheiro, a ambição e a ganância.
Sapateiro: avental e moldes. Estes elementos simbolizam a exploração interesseira, da classe burguesa comercial.
Parvo: representa simbolicamente, os menos afortunados de inteligencia.
Clero, e a dissolução dos seus costumes.
Alcoviteira: moças e os cofres. Estes elementos representam a exploração interesseira dos outros, para seu próprio lucro.
Judeu: bode. Este elemento simboliza a rejeição a fé cristã.
Corregedor e Procurador: processos, vara da Justiça e livros. Estes elementos simbolizam a magistratura.
Enforcado: Acredita ter o perdão garantido. Seu julgamento terreno e posterior condenação à morte o teriam redimido de seus pecados, mas é condenado igual aos outros. Ele carrega a mesma corda com que fora enforcado.
Quatro Cavaleiros: cruz de Cristo simboliza a fé dos cavaleiros pela religião católica.
(todos os elementos cénicos representam os pecados das personagens)

Humor

Surgem ao longo do auto três tipos de cómico: o de carácter, o de situação e o de linguagem. O cômico de carácter é aquele que é demonstrado pela personalidade da personagem, de que é exemplo o Parvo, que devido à sua pobreza de espírito não mede as suas palavras, não podendo ser responsabilizado pelos seus erros. O cómico de situação é o criado à volta de certa situação, de que é bom exemplo a cena do Fidalgo, em que este é gozado pelo Diabo, e o seu orgulho é pisado. Por fim, o cómico de linguagem é aquele que é proferido por certa personagem, de que são bons exemplos as falas do Diabo.

O Auto da Barca do Inferno e o Inferno anónimo (c. 1515) do Museu Nacional de Arte Antiga

Existe no Museu Nacional de Arte Antiga uma pintura anónima do Inferno que é quase contemporânea do Auto da Barca do Inferno. Poderá precedê-lo em dois anos. É uma pintura de qualidade e contém, como a obra de Gil Vicente, intenção de crítica social. Mas enquanto na Barca assistimos ao julgamento, donde se pode sair condenado ou salvo, a pintura mostra um recanto infernal com danados distribuídos por grupos, recordando talvez o que se passa na Divina Comédia; no auto, as personagens são individuais.

Esta pintura, que Gil Vicente pode bem ter conhecido, remete para o mesmo momento cultural e religioso, até para um semelhante empenho pré-reformista de intervir na sociedade.

O Auto da Barca do Inferno e os Diálogo dos Mortos, de Luciano

Como Miguel Ângelo há de fazer cerca de 20 anos mais tarde no Juízo Final da Capela Sistina (ver ao fundo do fresco a barca de Caronte), também Gil Vicente construiu a sua alegoria com vários elementos vindos da mitologia, mais em concreto, dos Diálogos dos Mortos, de Luciano de Samósata.

A intertextualidade entre esta obra e a moralidade de Gil Vicente é clara, de modo particular se considerarmos o Diálogo X. Veja-se como Hermes, sempre satírico como o Diabo vicentino, se dirige ao Filósofo:
Põe de parte a postura, em primeiro lugar, e depois tudo o mais! (…)
Deita fora também a mentira, a presunção e o acreditar que és melhor que os outros, porque se embarcares com tudo isso, qual o navio de cinquenta remadores, capaz de te receber?

A recusa de tudo o que podia significar distinção social na vida terrena aparece também no auto, quando lá se fala das «cárregas» inúteis para garantir êxito no julgamento.

A afastar as duas obras, está tudo o que depende da teologia cristã, a começar pela presença do Anjo, com a possibilidade de dois destinos, o da condenação e o da glória, o final esperançoso (claramente visível quando se tem em conta o modo como o autor aproveita a maré ao longo da obra - que está vasa no final, impedindo a ida para o Inferno), e ainda o novo contexto histórico.

Fontes:
http://www.portrasdasletras.com.br/
http://amadeo.blog.com/ (imagem)
http://pt.wikipedia.org/

Sergio Antonio Meneghetti

Químico, Poeta e Escritor. Natural de Pindorama – SP. Residente em Pindamonhangaba – SP. Casado com 3 filhos.

Autor do livro “Intuição, Ferramenta de Trabalho”

Consagrações em concursos poéticos:
- Antologia de Poetas Brasileiros volume 5.
- II Olimpíada Cultural – “500 Anos da Língua Portuguesa” 2005
- III Olimpíada Cultural – “500 Anos da Língua Portuguesa” 2006
- Livro de Ouro da Poesia Brasileira
- “IV Seletiva de Poesia, Contos e Crônicas de Barra Bonita”.
- “Panorama Literário 2005/2006” (6500 inscritos)
- “Novos Poetas Novos Talentos”
- “Poetas do Brasil”
- “Concurso Internacional do site Voz Di Studanti” (Cabo Verde).
- “4º Concurso Literário de Contos e Poesias”
- Poetas Del Mundo em Poesias – volume I (lançamento no Congresso Poetas Del Mundo em 08/2008)

Participações:
- Revista do Sindicato dos Químicos do ABC
- Rádio Mundial – poemas declamados.
- STOP a Destruição do Mundo (ONG Internacional fundada em Paris - França) www.stop.org.br
- SITA – Sociedade Internacional de Trilogia Analítica
- Café Cultural – SESI – Santo André
- Site www.pidavale.com.br/literatura Pindamonhangaba - SP
- Jornal da Cidade - Pindamonhangaba
- Jornal eletrônico “Estadão”
- Folder Basell Polyolefins – Evitando Desperdício.
- Jornal do Brasil – Rio de Janeiro.
- JB Online – Rio de Janeiro.
- Raza Consulting (Consultoria Empresarial e Gestão de Negócios) - São Paulo.
- Editora Gente – São Paulo.

Fonte:
E-mail enviado pelo autor

Sérgio Meneghetti (Lançamento do Livro Intuição)

A utilização da intuição em nossas vidas também é uma meta, pois ela está à frente da nossa psicologia mediana, somente uma minoria a utiliza em um maior potencial, pois ainda é uma ferramenta inexplorada. Partindo desta idéia, Sérgio Meneghetti desenvolveu este livro, que explica a utilização da intuição como ferramenta de trabalho

Adquira o livro em:
sergio.livro@hotmail.com
Livraria Papiro em Pindamonhangaba
Banca Quadros (Praça São Benedito) e
Super Banca em Santo André
http://www.livrariacultura.com.br/ , http://www.saraiva.com.br/ e http://www.allprinteditora.com.br/

Fonte:
E-mail enviado pelo autor.

Sergio Antonio Meneghetti (Poesias Avulsas)

Ressurreição

Ressurgir da escuridão
Abrir a grande luz
Que invade o coração.

Ter o amor como passos
E abrir os braços
Em perfeita comunhão.

Somos mensageiros da paz
Mesmo aonde exista a dor,
A verdade também se faz.

Somos herdeiros do sofrimento
Mesmo nos gritos e lamentos
Jesus nos cura os ferimentos.

Neste dia da alforria
Quando a dois mil anos
O mestre morria.

O mundo mal sabia
Que naquela cruz
Criava-se nova aurora de luz.

Quem sabe num domingo matinal
O mundo acorde novo
Numa alegria jovial.

Crianças entendendo a verdade
Que acima das mazelas e orgulho
Se pratique a caridade.

Somos a obra mais perfeita da criação
Sua imagem e semelhança
Porque todos somos irmãos.

(escrito na sexta-feira santa)

Gota Azul do Universo

Você que vem de todos os cantos
Com humildade beija meus pés
Você não escolhe o anônimo ou o santo
Quando admiramos sua imensidão, sabemos quem és.

Tuas águas percorrem toda a terra
Banha areias, matas, pedras e montes
É o caminho para as naus na paz e na guerra
Mas ao entardecer, mostra os mais belos horizontes.

A vasta vida que dentro de ti contem
Está muito além do que os olhos vêem
Vos que separa os continentes
Mas pela vida, uni a todos como uma corrente.

Chega manso no meu ser agitado
As vezes vem com terror para meu coração assustado
Mas é sempre belo, quente ou gelado.
É um tapete vivo, debaixo deste céu azulado.

Somos irmãos pela água que nos faz parte
Somos caminho e arte
Por este motivo gravo neste verso
Mar; gota azul deste universo.
18/01/2004


O Amigo

O amigo não cobra
Antes se desdobra
Não cria ilusão
Antes a verdade pura de coração.
Está sempre pronto
Não se afasta nem na tristeza
Ele promove o reencontro
Ele é a pura certeza.
Nunca deixa de amparar
Mesmo que não esteja
Nele podemos confiar
Ele acima de tudo é puro amar.
Que possamos merecer
Ou até surpreender
O amigo leal
Pois é a nossa meta e ideal.
O verdadeiro amigo nos conduz
Na alegria ou na tristeza
Na doçura ou na aspereza
Pois pela amizade, Ele foi à cruz.
Fontes:
E-mail enviado pelo autor.
http://www.pindavale.com.br

Dino Buzzati (1906 - 1972)

Dino Buzzati-Traverso (San Pellegrino, 16 de Outubro, 1906 - Milão, 28 de Janeiro, 1972) foi um escritor italiano, bem como jornalista do Corriere della Sera. Sua fama mundial é principalmente devido ao seu romance Il deserto dei Tartari, traduzido para português como O Deserto dos Tártaros.

Dino Buzzati nasceu no dia 16 de outubro de 1906 em San Pellegrino, Itália, próximo a Belluno, na secular vila de propriedade da família, em uma chácara de sua família. Sua mãe, veterinária, era Veneza e seu pai, professor universitário, era de uma arntiga família de Belluno. Buzzati foi o segundo dos quatros filhos do casal. Desde a mocidade os temas e as paixões do futuro escritor se manifestaram e a elas ele permaneceu fiel por toda a vida: a poesia, a música (estuda violino e piano), o desenho e a montanha, verdadeira companheira da infância. "Eu penso", diz Buzzati numa entrevista concedida em 1959, "que em todo escritor as primeiras memórias da infância são uma base fundamental. As impressões mais fortes que eu tive de criança pertencem à terra onde eu nasci, o vale do Belluno, às montanhas selvagens que o cercam e à vizinha Dolomit. Um mundo completamente nórdico, ao qual se juntou o patrimônio das recordações juvenis e a cidade de Milão, onde minha família sempre viveu no inverno." Sua temática: a fantasia, a solidão, a magia, a montanha, a música, a poesia, a espera, a morte e a eternidade.

Buzzati estudou Direito, mas começou desde cedo a trabalhar em jornal, onde fez de tudo: ilustração, reportagens, crônicas, edição. Além disso, foi correspondente do Corriere della Sera na Segunda Guerra Mundial, aos 22 anos onde permaneceria até sua morte. Entre narrativas em prosa (contos, romances, crônicas, cartas, comentários) e poesia, escreveu cerca de 40 livros. Também escreveu 16 peças de teatro e 5 libretos de ópera.

Viveu em Milão grande parte de sua vida, mas sempre que podia ia com amigos caminhar nas montanhas e todo ano voltava a Belluno e aos vales silenciosos do Monte Schiara. É esse clima de montanhas misteriosas, precipícios inacreditáveis, abismos e solidão que transparece em seus textos desde seu romance de estréia O Barnabé das montanhas de 1933. As montanhas não são só uma insistente recordação, mas também o fundo de suas histórias. Em seu livro mais famoso O deserto dos tártaros, as rochas grandiosas, os silêncios profundos e a solidão constroem a narrativa do Soldado Giovanni Drogo.

Publicado em 1940, O deserto dos tártaros (243 páginas) foi reeditado esse ano pela editora Nova Fronteira, juntamente com o romance Um amor (de 1963) e os volumes de contos Naquele Exato momento (1963) e Noites difíceis. Este último foi publicado em 1971 e traz um tom mais sarcástico, que de certa forma antecipava o seu fim, pois Buzzati já sabia do seu câncer de pâncreas (doença que o matou em 28 de janeiro de 1972).

Durante a Segunda Guerra Mundial, Buzzati serviu na África, como jornalista da Marinha italiana. Buzzati saiu como Sargento. Essa experiência serviu para que escrevesse O deserto dos tártaros antes da Segunda Guerra. Segundo o autor, o romance veio num jorro numa madrugada quando voltava do jornal.
...Caracterizado por um clima de profunda indagação filosófica, comparado desde o seu aparecimento a Kafka, trata-se de uma aguda reflexão sobre a inutilidade do poder. Mas enquanto o mundo do genial tcheco é fechado e maldito, a atmosfera idealizada por Buzzati não abstrai a possilibilidade da esperança - ainda que inútil. Ele sabe, como ninguém, fazer de sua alegoria uma verdade poética desconcertante.

O livro conta a desventura do oficial Giovanni Drogo, o qual, aos vinte anos, é nomeado, em seu primeiro posto, para o forte Bastiani, que se ergue imponente e solitário às margens abandonadas do 'deserto tártaro'. Drogo, que espera ficar ali poucos meses, aguardando uma transferência, vê a vida transcorrer sem que sua razão de ser se realize: transformar-se num soldado verdadeiro, conhecer a glória de participar de uma guerra que, tudo indica, não vai acontecer....

Mas não é só sobre o poder que Buzzati indaga. Seria simplificar muito sua obra. Há uma reflexão sobre o tempo (o que fazemos da nossa vida? Assistimos apenas o passar dos anos como se fôssemos imortais?), sobre a atitude do ser humano frente à vida, sua relação com a natureza e a sociedade. Pode-se perceber também a complexa relação homem x cidade: Drogo acaba se isolando do mundo social/urbano na rotina do forte Bastiani. Interagir e viver o ritmo da cidade torna-se impossível para quem se afasta por um tempo e vive a solidão das montanhas.
"Numa belíssima manhã de setembro Drogo, o capitão Giovanni Drogo, mais uma vez sobe a cavalo a íngreme estrada que conduz ao forte Bastiani. Teve um mês de licença, mas após vinte dias já está de volta; a cidade agora se lhe tornou completamente estranha, os velhos amigos tomaram seu caminho, ocupam posições importantes e o cumprimentam apressadamente como a um oficial qualquer" (pág. 207).

O final do livro emociona os que acompanham toda a vida de Drogo dedicada ao forte. De uma certa forma nos remete aos dias atuais em que muitos se dedicam obstinadamente a objetivos ilusórios, passam sua juventude lutando por um sonho e deixam de viver a vida verdadeiramente. Depois da leitura podemos nos questionar: o que ando fazendo da minha? Pelo quê ando lutando? Em pleno século XXI, se ainda não temos respostas, pelo menos conseguir formular mais claramente nossas perguntas...

Em 1964, casou-se com Almeria Antoniazzi, o que também marcou a realização de seu último romance, Un Amore, traduzido para o português como Um Amor, em 1963. Em 1972 morre em decorrência do câncer, após uma prolongada luta contra a doença.

Obra

Buzzati começou a escrever ficções em 1933. Em sua obra há romances, peças de teatro, peças para rádio, libretos, poesia e contos.

Escreve um livro infantil intitulado La famosa invasione degli orsi in Sicilia. Escreve um livro de comédia baseado no mito de Orfeu, Poema a fumetti.

Sua obra ocasionalmente é classificada como Realismo Mágico e alienação social. Também escreveu diversos contos com animais fantásticos tais como o bogeyman e, de sua própria criação, il colombre.

O Deserto dos Tártaros

Il deserto dei Tartari, obra máxima de Dino Buzzati, foi publicada em 1940. A experiência de quando servira no exército, antes da Segunda Guerra Mundial, serviu como base para o romance. Segundo o próprio o autor, a história veio numa madrugada quando voltava ao jornal onde trabalhava, o Corriere della Sera, de uma só vez:

"Caracterizado por um clima de profunda indagação filosófica, comparado desde o seu aparecimento a Kafka, trata-se de uma aguda reflexão sobre a inutilidade do poder. Mas enquanto o mundo do genial tcheco é fechado e maldito, a atmosfera idealizada por Buzzati não abstrai a possilibilidade da esperança - ainda que inútil. Ele sabe, como ninguém, fazer de sua alegoria uma verdade poética desconcertante. O livro conta a desventura do oficial Giovanni Drogo, o qual, aos vinte anos, é nomeado, em seu primeiro posto, para o forte Bastiani, que se ergue imponente e solitário às margens abandonadas do 'deserto tártaro'. Drogo, que espera ficar ali poucos meses, aguardando uma transferência, vê a vida transcorrer sem que sua razão de ser se realize: transformar-se num soldado verdadeiro, conhecer a glória de participar de uma guerra que, tudo indica, não vai acontecer...."

O romance se passa em torno da figura do recém oficial Giovanni Drogo que passa quase toda sua vida no Forte Bastini à espera do exército de tártaros que podem chegar a qualquer momento. O Deserto dos Tártaros, talvez um dos maiores romances italianos do século passado, constitui assim, uma meditação sobre a solidão e sobre a inexorável passagem do tempo.

Comentário de Ugo Giorgetti acerca do livro: Um homem encerrado numa fortaleza espera por uma batalha decisiva, quando os tártaros chegarem. Em meio à monotonia da vida de quartel, a pequenos incidentes inócuos, a um lento escorrer do tempo, a vida vai passando. E os tártaros nunca chegam. Os olhos agora velhos ainda espreitam através do binóculo o lugar ao longe onde um dia os tártaros deveriam surgir. A vida finalmente passa e o homem morre. Esse romance que é, na síntese de um ensaísta italiano, “o tema da vida como espera, renúncia e derrota” é uma das obras mais inquietantes do século XX.

Influências

Pode-se observar na obra de Dino Buzzati uma forte influência de toda a literatura fantástica do Século XIX. Já no século XX, a influência de Jean-Paul Sartre, Albert Camus e, princiapalmente, Franz Kafka.

Bibliografia

Prosa e Poesia
Bàrnabo delle montagne, 1933
Il segreto del bosco vecchio (O Segredo do Bosque Velho), 1935;
Il deserto dei Tartari (O Deserto dos Tártaros), 1940.
I sette messaggeri (Os Sete Mensageiros), 1942.
La famosa invasione degli orsi in Sicilia (A Famosa Invasão dos Ursos Na Sicília), 1945.
Il libro delle pipe, 1945.
Paura alla Scala, 1949.
In quel preciso momento (Naquele Exato Momento), 1950.
Il crollo della Baliverna (A Queda da Baliverna), 1957.
Sessanta racconti, 1958.
Le storie dipinte, 1958.
Esperimento di magia, 1958.
Il grande ritratto, 1960.
Egregio signore, siamo spiacenti di..., 1975.
Un amore (Um Amor), 1963.
Il capitano Pic e altre poesie, 1965.
Scusi da che parte per Piazza Duomo?, 1965.
Tre colpi alla porta, 1965.
Il colombre, 1966.
Presentazione a L'opera di Bosch, 1966.
Due poemetti, 1967.
Prefazione a R.James, 1967.
Prefazione a W:Disney, Vita e dollari di Paperon de' Paperoni, 1968.
La boutique del mistero, 1968.
Poema a fumetti, 1969.
Le notti difficili (As Noites Difíceis), 1971.
I miracoli di Val Morel, 1971.
Prefazione a Tarzan delle scimmie, 1971.
Cronache terrestri, servizi giornalistici, a cura di Domenico Porzio, 1972.
Congedo a ciglio asciutto di Buzzati, 1974.
Romanzi e racconti, 1975.
I misteri d'Italia, 1978.
Teatro, 1980.
Dino Buzzati al Giro d'Italia, 1981.
Le poesie, 1982.
180 racconti, 1984.
Il reggimento parte all'alba, 1985.
Lettere a Brambilla, 1985.
Il meglio dei racconti, 1990.
Le montagne di vetro, 1990.
Lo strano Natale di Mr. Scrooge e altre storie, 1990.
Bestiario, 1991.
Il buttafuoco, 1992.
La mia Belluno, 1992
Il borghese stregato ed altri racconti, 1994.

Teatro
Piccola passeggiata, 1942.
La rivolta contro i poveri, 1946.
Un caso clinico, 1953.
Drammatica fine di un musicista, 1955.
Sola in casa, 1958.
Una ragazza arrivò, 1958.
Le finestre, 1959.
L'orologio, 1959.
Un verme al ministero, 1960
I suggeritori, 1960.
Il mantello, 1960.
L'uomo che andrà in America, 1962
L'aumento (O aumento), 1962
La colonna infame, 1962.
Spogliarello, 1962.
La telefonista, 1964
La famosa invasione degli orsi in Sicilia (representado em Milão em 1965).
La fine del borghese, 1968.

Libreto para Música
Procedura penale, Ricordi, 1959.
Ferrovia sopraelevata, 1960.
Il mantello, Ricordi, 1960.
Battono alla porta, 1963.
Era proibito, 1963.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/
ALVES, Valéria de Oliveira. Dino Buzzati e o Deserto dos Tártaros. In http://www.sitedeliteratura.cjb.net/
http://www.releituras.com/
http://www.girovagandointrentino.it/ (foto)

Dino Buzzati (A barata)

Tendo voltado tarde para casa, esmaguei uma barata que, no corredor, me escapava entre os pés (ficou lá, preta, no ladrilho) depois entrei no quarto. Ela dormia. Deitei-me ao seu lado, apaguei a luz, da janela aberta via um pedaço de parede e o céu. Fazia calor, não conseguia dormir, velhas histórias renasciam dentro de mim, dúvidas também, uma genérica desconfiança no amanhã. Ela soltou um pequeno lamento. "Que houve?", perguntei. Ela abriu um olho, grande, sem me ver e murmurou: "Tenho medo." "Medo de quê?", perguntei. "Tenho medo de morrer." "Medo de morrer? Por quê?" Respondeu: "Tive um sonho..." Aproximou-se um pouco. "Mas que é que você sonhou?" "Sonhei que estava no campo, estava sentada na margem de um rio e ouvi gritos ao longe... E eu devia morrer." "Na beira de um rio?" "Sim.", respondeu "Ouvia as rãs... faziam crá, crá." "E que horas eram?" "Era noite e ouvi gritar." "Bem, durma, agora são quase duas horas." "Duas horas?", mas não conseguia compreender, já tornara a pegar no sono.

Apaguei a luz e ouvi alguém remexendo no pátio. Depois, subiu a voz de um cão, aguda e longa; parecia lamentar-se. Subiu, passando diante da janela, perdeu-se na noite quente. Depois abriu-se uma persiana (ou se fechou?). Longe, muito longe, mas talvez eu me enganasse, uma criança se pôs a chorar. Depois, novamente o ulular do cão, longo como antes. Eu não conseguia dormir.

Vozes de homens vieram de alguma outra janela. Eram baixas, como murmuradas entre o sono. De uma sacada abaixo, ouvi um cip, cip, zitevitt, e algumas batidas de asas. "Flório!", ouviu-se chamar de repente, devia ser duas ou três casas mais adiante. "Flório!", parecia uma mulher, mulher angustiada, que tivesse perdido o filho.

Mas por que o canarinho do andar de baixo acordara? Que havia? Com um rangido lamentoso, como se fosse empurrada devagarinho por alguém que não queria fazer-se ouvir, uma porta se abriu em algum lugar da casa. Quanta gente acordada a essa hora, pensei. Estranho, a essa hora.

"Tenho medo, tenho medo", queixou-se ela procurando-me com o braço. "Oh, Maria", perguntei, "Que tem você?" Respondeu com voz tênue: "Tenho medo de morrer." "Você sonhou de novo?" Fez que sim, devagarinho, com a cabeça. "De novo aqueles gritos?" Fez sinal que sim. "E você ia morrer?" Sim, sim, indicava, procurando olhar-me, com as pálpebras grudadas pelo sono.

Há alguma coisa, pensei: ela sonha, o cão uiva, o canarinho acordou, as pessoas se levantam e falam, ela sonha com a morte, como se todos tivessem sentido uma coisa, uma presença. Oh, o sono não vinha e as estrelas passavam. Ouvi distintamente no pátio o ruído de um fósforo aceso. Por que alguém se punha a fumar às três horas da manhã? Então senti sede, levantei-me e saí do quarto para beber água. A triste lâmpada do corredor estava acesa, percebi vagamente a mancha preta no ladrilho e parei, assustado. Olhei: a mancha preta se movia.Ou melhor, movia-se um pedacinho (ela sonha que vai morrer, o cão uiva, o canarinho acorda, pessoas se levantaram, uma mãe chama o filho, as portas rangem, alguém fuma, e há talvez um choro de criança).

Vi, no chão, o bichinho preto que movia uma patinha. Era a do meio, à direita. O resto estava imóvel, uma mancha de tinta que caíra da morte. Mas a perninha remava fracamente como se quisesse subir de novo alguma coisa, o rio das trevas, talvez. Teria ainda esperança?

Durante duas horas e meia, dentro da noite — senti um calafrio —, o imundo inseto grudado no ladrilho pelas suas próprias mucilagens viscerais, durante duas horas e meia continuara a morrer e ainda não acabara. Maravilhosamente continuava a morrer, transmitindo, com a última patinha, a sua mensagem. Mas quem a podia colher às três da manhã, na escuridão do corredor de uma pensão desconhecida? Duas horas e meia, pensei, continuamente para cima e para baixo, a última porção de vida na perninha sobrevivente, para invocar justiça. O pranto de uma criança — lera um dia — basta para envenenar o mundo. Em seu coração, Deus onipotente quisera que certas coisas não acontecessem, mas não pôde impedi-lo porque por ele mesmo foi decidido. Mas uma sombra jaz ainda sobre nós. Esmaguei o inseto com o chinelo e, esfregando no chão, esmigalhei-o num longo rasto cinza.

Então, finalmente, o cão calou-se, ela, no sono, se acalmou e parecia quase sorrir, as vozes se apagaram, calou a mãe, não se percebeu mais nenhum sintoma de inquietude do canarinho, a noite recomeçava a passar sobre a casa cansada, a morte fora inchar sua inquietude em outras partes do mundo.

Fonte:
BUZZATTI, Dino. Naquele Exato Momento. RJ: Editora Nova Fronteira, 1986. In
http://www.releituras.com

Dino Buzzati (O aumento)

Quando ficou sabendo que seu jovem colega Bossi, a mais recente admissão da firma, ganhava mais de vinte mil liras por mês do que ele, Giovanni Battistela viu-se tomado de uma raiva espantosa. E teve uma coragem do que em condições normais lhe pareceria uma loucura: de fazer-se receber pelo diretor e dizer-lhe poucas e boas. E ei-lo que se apresenta no solene escritório em cujo fundo estava sentado o chefe.

— Por favor, por favor. Pode se aproximar...

— Queria me desculpar, senhor comendador, mas...

— Desculpar por quê? Não me fale em se desculpar. Não faltava mais nada, meu caro Battistela. Eu é que devo lhe agradecer por ter vindo.

— O senhor!?

— Eu, sim. E estou contente, contentíssimo em revê-lo. Mas por favor, sente-se, sim, porque as pessoas que nos são caras, em quem temos mais confiança, são precisamente aquelas que mais negligenciamos. Esta é a cruel lei da vida, não é mesmo? Diga, diga, meu caro Battistela, há quanto tempo não trocamos duas palavras em santa paz? Semanas, não é mesmo? Semanas o quê! Meses, talvez. Muitos meses. Eu mesmo não me surpreenderia se, em vez de meses, fossem anos...

— Faz exatamente dois anos e meio...

— Dois anos e meio! Mas acredite, meu caro Battistela, que durante esses dois anos e meio, todas as noites — sabe disso? —, na hora em que fazemos nosso exame de consciência eu pensava sempre no senhor. Todas as noites antes de dormir, comigo mesmo: "E Battistela? E o excelente Battistela? Não estás te esquecendo dele?” Era o que eu mesmo me dizia: “Quando irás te decidir a lhe dar o cargo que ele merece? Um trabalhador como ele, uma coluna mestra da administração, um homem hoje cada vez mais raros..." Assim falava eu, e todas as noites sentia remorso, pode acreditar.

— Pois então, senhor comendador...

— Estou disposto a ajudá-lo, não era isso que ia me perguntar? Ah, n não me diga nada. Acha que eu não o compreendo? Que eu não tenho o condão de captar o seu pensamento? Palavra por palavra, poderei lhe repetir tudo quanto intenção de me dizer... Que existe quem, com muito menos títulos, está ganhando mais do que o senhor, que isso é uma injustiça, que o senhor perdeu a paciência e Não é isso mesmo?

— É, realmente...

— E o senhor, meu caro Battistela, teve um ímpeto de exasperação, não é de? Quem não teria tido, não é mesmo? A injustiça consegue transformar cri mansas e humildes em verdadeiros tigres, não é mesmo?

— Bem, em suma...

— Está vendo? E o senhor pensava que eu não compreenderia, que sabia, que eu não me interessava. Homem de pouquíssima fé!... Bem, este deve belo dia para nós. Esta noite ambos estaremos satisfeitos um com o outro. Que de 150?

— Como?

— Creio que agora o senhor ganha entre 95 e 98, se não me engano, não

— 97.

— Bem. Podemos dar um passo adiante. Um pequeno passo. Cento e cinqüenta. Não chega?

— Bem, confesso que não esperava...

— Está vendo? Não sou mais aquele dragão, aquele carniceiro, aquele devorador de cristãos, aquele lobo esfomeado — não é isso que dizem de mim?

— Eu... eu lhe agradeço.

— Não tem nada que me agradecer. Eu é que lhe agradeço pelo seu trabalho... Um cigarro?

— Obrigado, não fumo...

— Bravo, é mais uma virtude... Quanto a mim, fumo como um desesperado... Bem, bem, quer me parecer que ficou tudo resolvido...

— Bem, quer dizer, não quero mais tirar o seu tempo...

— Não sou eu que vou retê-lo, meu caro Battistela. E faço os melhores votos para que... — suspirou. — É pena!

— "É pena", por quê?

— Nada, nada... Eu... para você... eu tinha outros projetos. Mas agora é inútil. O que está feito, está feito.

— Outros projetos?

— Sim, projetos, que eu fazia... Mas, agora...

— Comendador, não quer fazer a gentileza de me dizer...?

— Não, eu te conheço. Aquilo que se faz para o seu bem, o senhor leva a mal...

— Isso não é verdade...

— Seria como lhe dar uma prova de confiança, uma demonstração de amizade. Seria. Mas compreendo que poderia lhe dar uma impressão esquisita...

— Esquisita como?

— Além do mais é um assunto... é um assunto extremamente reservado...

— Não confia em mim?

O diretor levantou-se devagar, atravessou o escritório com ar circunspecto, fechou a porta com a chave, parou como se escutasse a passagem de alguém lá fora, avizinhou o indicador dos lábios num gesto de silêncio, voltou à escrivaninha e começou a falar em voz baixa:

— Battistela... me escuta... Eu estou ficando velho...

— Não é verdade.

— Velho, sim. 0 coração às vezes anda falhando. De um dia para o outro...

— Não diga isso nem brincando...

— E onde? Aqui mesmo, nesta escrivaninha? No meu posto, quem sabe? Mas escuta, Battistela...

— Estou ouvindo.

— Recomendo que guarde isso só para você. Porque em você eu confio... De algum tempo para cá fala-se em grandes mudanças...

— Mudanças?

— Com certeza já deve ter ouvido falar, pelo menos por alto: mudança de proprietários, segundo se diz, passando a firma para as mãos de outro grupo financeiro. E sabe o que isso significa?

— Que os chefes atuais vão-se embora e outros virão.

— E isso não lhe diz mais nada? Não compreende o que pode acontecer em tais circunstâncias?

— Não faço a menor idéia...

— Podem vir medidas de contenção de despesas. Porque se esta mudança ocorrer, o motivo é um só: é que as coisas não vão bem, que a crise está sendo sentida também por nós. Razão, portanto, para que a preocupação dos novos donos seja, sem dúvida, a de poupar ao máximo. E de que maneira? É simplicíssimo. Sabe o que se faz, nestes casos?

— Não. O quê?

— Redimensionamento. Bela palavra, não é? Redimensionamento. Sabe o que ela significa? Significa desembaraçar-se do peso excessivo, eis a solução genial. Elimina-se a escória. Aperta-se o cinto. Passa-se uma vista d'olhos na folha de pagamento. E quem tem alta remuneração, zapt! Estes são os primeiros a se fritarem. Como em todos os casos, são só os peixes miúdos que se salvam.

— E então, quer que eu fique contente com a idéia de ver liquidado um como o senhor? 0 meu dever, neste caso, uma vez que tenho um peso na consciência é o de alertá-lo, meu caro Battistela. Não só o de alertá-lo, como o de ajudá-lo essa possível ameaça.

— Evitar?

— Claro. Quero subtraí-lo à dizimação, mimetizá-lo, colocá-lo num posição segura. Mas é inútil. Os senhores, os jovens, não se dão conta de que...

— Ao contrário. Pode dizer, comendador, pode dizer...

— Quer que eu lhe fale com o coração nas mãos? Como se o senhor fosse o meu próprio filho? Bem... se eu fosse o senhor, frente a uma conjectura desta, sabe que coisa...

— Que coisa o senhor faria?

— É fácil compreender. A moral da história é a seguinte: melhorando a sua situação financeira, no fundo eu lhe prestei um péssimo serviço. Foi a mesma coisa que se eu o atirasse na rua, para falar tipo pão-pão, queijo-queijo...

— De maneira que eu...

— Caro Battistela, não quero que amanhã venha a ter motivos para me recriminar. Se amanhã o senhor vier a me perguntar: mas, comendador, por que não me avisou antes? Por que não me abriu os olhos? Meu querido, as coisas estão a um ponto tal que, mude-se ou não de patrões, um dia eu me verei constrangido a adotar medidas severas. E por que haverá de ser com o seu sacrifício?

— Mas, eu... Bem, não estou compreendendo... Está me falando de aumento? Acha que é melhor eu esperar?

— Não, nada de esperar! Se prevenir, sim. 0 que fazem os soldados, quando os inimigos abrem fogo? Abaixam a cabeça, agacham-se no chão para não serem feridos. Agache-se também, Battistela.

— Agachar-me?

— Em sentido figurado, bem entendido. No momento, convém uma manobra, uma dissimulação, um subterfúgio estratégico. No momento, convém exagerar no seu zelo. Compreendeu, Battistela?

— Realmente...

— E depois, que importância teria para o senhor, que é solteiro, uma redução no salário? Se em vez de 97 fossem apenas 80, isso não causaria a morte de ninguém. Digo-lhe isso porque agora até os ordenados de 90 estão dando na vista. Mas em compensação... considere a segurança, a tranqüilidade, a certeza de não ir de encontro com nenhum desprazer.

— Redução de salário?

— Está vendo como eu não estava enganado? Como era melhor me calado? 0 senhor já está dando às minhas palavras uma interpretação negativa.

— 0 senhor disse oitenta mil?

— Setenta talvez fosse melhor, mas creio que oitenta será o suficiente...

— Mas comendador...

— Eu sabia. 0 senhor é um rapaz inteligente, pega as coisas no ar, toma decisões com rapidez... Pense agora se eu, em vez de lhe falar sobre isso, me calasse... O senhor teria lá o seu aumento. De cinqüenta mil por mês. Mas, e depois? Ia se meter em poucas e boas! Seria carregado pela primeira onda. Menos mal, menos mal que existe alguém que lhe quer bem...

— Quer dizer que acha mesmo que o aumento...?

— Não resta a menor dúvida, meu filho: seria o mesmo que estar com uma corda no pescoço.

— Bem, comendador, eu lhe agradeço. O senhor me poupou de um grande aborrecimento.

— Não precisa agradecer... Vá, volte contente, volte tranqüilo para o seu trabalho. E, meu caro Battistela, saiba que o meu desgosto é apenas um: o de não poder fazer pelo senhor — eu lhe juro — um pouco mais do que fiz.

Fonte:
COSTA, Flávio Moreira (org.). Os cem melhores contos de humor da literatura universal. RJ: Ediouro, 2001. In: http://www.releituras.com

terça-feira, 27 de maio de 2008

Lima Barreto (1881 - 1922)

Afonso Henriques de Lima Barreto (Rio de Janeiro, 13 de Maio de 1881 - Rio de Janeiro, 1º de Novembro de 1922) foi um jornalista e um dos mais importantes escritores brasileiros.

Era filho de João Henrique de Lima Barreto (mulato nascido escravo) e de Amália Augusta (filha de escrava agregada da família Pereira Carvalho). Seu pai foi tipógrafo. Aprendeu a profissão no Imperial Instituto Artístico, que imprimia o famoso periódico A Semana Ilustrada. Sua mãe foi educada com esmero, sendo professora da 1º á 4º séries. Ela morreu cedo e Manoel Joaquim trabalhou muito para sustentar os quatro filhos do casal, como tipógrafo. Manoel Joaquim era monarquista, ligado ao Visconde de Ouro Preto, padrinho do futuro escritor. Talvez as lembranças saudosistas do fim do período imperial no Brasil, bem como suas remotas lembranças da Abolição da Escravatura na infância viriam a exercer influência sobre a visão crítica de Lima Barreto sobre o regime republicano.

Lima Barreto, mulato e portanto vítima do racismo num Brasil que mal acabara de abolir oficialmente a escravatura, teve oportunidade de boa instrução escolar. Com sua mãe Amália aprendera o á-bê-cê. Após a sua morte, passou a frequentar a escola pública de D. Teresa Pimentel do Amaral. Em seguida, passou a cursar o Liceu Popular Niteroiense, após o seu padrinho, o Viscode do Ouro Preto, concordar em custear sua eduação. Lá ficará até 1894, completando o curso secundário e parte do suplento. Em 1895, transferiu-se para a única instituição pública de ensino secundário da época, o conceituado Colégio Pedro II, cujos estudantes eram oriundos basicamente da elite econômica. No ano de 1895 foi admitido no curso da Escola Politécnica, no Rio de Janeiro porém foi obrigado a abandoná-lo em 1904 para assumir o sustento dos irmãos, porquanto seu pai enlouquecera. Tendo sido repetidamente reprovado por não se interessar muito pelas matérias - passava as tardes na Biblioteca Nacional -, deixou de graduar-se em Mecânica. Data dessa época sua entrada no Ministério da Guerra como amanuense, por concurso. O cargo, somado às muitas colaborações em diversos órgãos da imprensa escrita, garantia-lhe algum sustento financeiro. Não obstante, o escritor, que só veio a ser reconhecido fundamental para a Literatura Brasileira após seu precoce falecimento, cada vez mais deixava-se consumir pelo alcoolismo e por estados emocionais caracterizados por crises de profunda depressão e morbidez.

Lima Barreto começou a sua colaboração na imprensa desde estudante, em 1902, colaborando no A Quinzena Alegre, depois no Tagarela, O Diabo, e na Revista da Época. Em jornais de maior circulação, começou em 1905, escrevendo no Correio da Manhã uma série de reportagens sobre a demolição do Morro do Castelo. Daí em diante, colabora em vários jornais e revistas, Fon-Fon, Floreal, Gazeta da Tarde, Jornal do Comercio, Correio da Noite, A Noite, (onde publica em folhetins, Numa e a Ninfa), Careta, A.B.C., um novo A Lanterna (vespertino), Brás Cubas (semanário), Hoje, Revista Souza Cruz e O Mundo Literário.

Em 1911 editou com amigos a revista Floreal, que conseguiu sobreviver apenas até a segunda edição, mas despertou a atenção de alguns poucos críticos. 1909 foi o ano de sua estréia como escritor de ficção, publicando, em Portugal, o romance Recordações do Escrivão Isaías Caminha. A narrativa de Lima Barrreto nesse primeiro livro, pincelada com indisfarçáveis traços autobiográficos, mostra uma contundente crítica à sociedade brasileira, por ele considerada preconceituosa e profundamente hipócrita, até mesmo os bastidores da imprensa opinativa são alvo de sua narrativa mordaz, inspirados na redação do Cartas da Tarde. Em 1914 começou a publicação, em formato de folhetins no Jornal do Dia, de sua mais importante obra, Triste Fim de Policarpo Quaresma, que um ano mais tarde foi editado em brochura e considerado pela crítica especializada como basilar no períodoPré-Modernista.

Entre os leitores, as duas obras anteriormente citadas alcançaram algum êxito, o que não impediu que o autor sofresse severas críticas de outros escritores da época. Baseavam-se elas no fato de Lima fugir, conscientemente, do padrão empolado de escrever que à época vigorava. Chamavam-no "relaxado" por não usar o português castiço e utilizar uma linguagem mais coloquial, muito própria de quem militava na imprensa. Incomodava também o fato de seus personagens não seguirem o "molde" vigente, que impunha limites à criação e exaltava determinadas características psicológicas. Não à toa viu frustradas suas tentativas de ingressar na Academia Brasileira de Letras. A respeito de seus impiedosos e inimigos críticos, Lima acusava-os de fazerem da literatura não uma arte e sim algo mecânico, uma espécie de "continuação do exame de português jurídico".

Simpático ao Anarquismo, passou a militar na imprensa socialista.

Sua vida foi atribulada pelo alcoolismo e por internações psiquiátricas, ocorridas durante suas crises severas de depressão - à época era um dos sintomas pertencentes ao diagnóstico de "neurastenia", constante de sua ficha médica - vindo a falecer aos 41 anos de idade.

As obras

Lima Barreto foi o crítico mais agudo da época da República Velha no Brasil, rompendo com o nacionalismo ufanista e pondo a nu a roupagem da República, que manteve os privilégios de famílias aristocráticas e dos militares.

Em sua obra, de temática social, privilegiou os pobres, os boêmios e os arruinados.

Foi severamente criticado pelos seus contemporâneos parnasianos por seu estilo despojado, fluente e coloquial, que acabou influenciando os escritores modernistas.

Lima Barreto queria que a sua literatura fosse militante. Escrever tinha finalidade de criticar o mundo circundante para despertar alternativas renovadoras dos costumes e de práticas que, na sociedade, privilegiavam pessoas e grupos. Para ele, o escritor tinha uma função social.

Obras
- O Subterrâneo do Morro do Castelo
- Recordações do Escrivão Isaías Caminha
- Triste Fim de Policarpo Quaresma
- Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá
- Cemitério dos Vivos
- Histórias e Sonhos
- Os Bruzundangas
- Clara dos Anjos (póstumo)
- Outras Histórias e Contos Argelinos
- Coisas do Reino de Jambom
- O Homem que Sabia Javanês e outros contos
- A Cartomante

Curiosidade
Foi homenageado, no Carnaval carioca de 1982, pela Escola de Samba GRES Unidos da Tijuca, com o samba-enredo "Lima Barreto, mulato pobre mas livre".

Fonte:
http://pt.wikipedia.org

Lima Barreto (Triste Fim de Policarpo Quaresma)

Triste Fim de Policarpo Quaresma é um romance do pré-modernismo brasileiro e considerado por alguns o principal representante desse movimento.

Escrito por Afonso Henriques de Lima Barreto, foi levado a público pela primeira vez em folhetins, publicados, entre Agosto e Outubro de 1911, na edição da tarde do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro. Em 1915, também no Rio de Janeiro, a obra foi pela primeira vez impressa em livro, em edição do autor.

O romance discute principalmente a questão do nacionalismo, mas também fala do abismo existente entre as pessoas idealistas e aquelas que se preocupam apenas com seus interesses e com sua vida comum. Com uma narrativa leve que em alguns pontos chega a ser cômica, mas sempre salpicada de pequenas críticas a vários aspectos da sociedade, a história se torna mais tensa apenas quando o autor analisa a loucura e no seu final, quando são feitas duras críticas ao positivismo e ao presidente Floriano Peixoto (1891-1894).

O autor optou por escrever a narrativa numa linguagem próxima à informal falada entre os cariocas. Ela se desenvolve em torno de Policarpo Quaresma, brasileiro extremamente nacionalista, e é dividida em três partes, cada uma contendo cinco capítulos.

A Epígrafe
"Le grand inconvénient de la vie réelle et qui la rend insupportable à l'homme supérieur, c'est que, si l'on y transporte les principes de l'idéal, les qualités deviennent des défauts, si bien que fort souvent l'homme accompli y réussit moins bien que celui qui a pour mobiles l'égoïsme ou la routine vulgaire."
(O grande inconveniente da vida real e que a torna insuportável para o homem superior é que, se para ela são transportados os princípios do ideal, as qualidades se tornam defeitos, tanto que muito freqüentemente aquele homem superior realiza e consegue bem menos do que aqueles movidos pelo egoísmo e pela rotina vulgar.)

A epígrafe do romance é retirada do vigésimo sexto capítulo de "Marco Aurélio ou o fim do mundo antigo" ("Marc-Aurèle ou la fin du monde antique"), último volume da obra As origens do cristianismo ("Les origines du christianisme") do escritor e pensador francês Ernest Renan. Renan parece argumentar que os altos ideais, muito nobres, de pouco valem no mundo real, governado por interesses e proveitos pessoais, o que nos prepara para o fracasso final de Policarpo Quaresma.

Enredo

Primeira parte

A primeira parte da obra se desenrola na cidade do Rio de Janeiro, logo após a proclamação da República no Brasil, e introduz as principais personagens.

O major Policarpo Quaresma é um reservado funcionário do Arsenal de Guerra que vive com a irmã, Adelaide, e é marcado por um forte sentimento nacionalista.

Buscando saídas políticas, econômicas e culturais para o Brasil, Policarpo passa grande parte de seu tempo enfiado nos livros, pelo que é criticado por parte da vizinhança - que o critica ainda mais quando ele decide aprender a tocar um instrumento mal visto pela burguesa sociedade carioca da época, o violão, por considerá-lo um representante do espírito popular do país.

E é no aprendizado do instrumento que conhece aquele que será seu grande amigo no correr do romance, o seresteiro Ricardo Coração dos Outros, contratado para lhe ensinar. Porém, cedo Policarpo se desencanta pelo violão - e pelo folclore - e parte em busca das tradições genuinamente nacionais, i.e. indígenas.

Tal aprendizado leva a alguns momentos cômicos - como quando Policarpo recebe a afilhada e o compadre aos prantos - e à tragédia da loucura: após ter sugerido à Assembléia Legislativa republicana a adoção do Tupi como língua oficial - e ser motivo de chacota de toda a imprensa e dos colegas de repartição -, Policarpo redige, distraído, um documento oficial naquela língua e termina, após uma elipse temporal, internado num manicômio.

Lima Barreto aproveita também para ridicularizar a pequena burguesia suburbana em vários momentos, como na festa de noivado de Ismênia, filha do inútil general Albernaz, freqüentada por pedantes funcionários públicos e militares preocupados unicamente com a aposentadoria.

Segunda parte

Na segunda parte, são analisados os problemas enfrentados pela porção rural do país.

São e aposentado, Policarpo vende sua casa e compra, por sugestão da afilhada Olga, um sítio na fictícia cidade de Curuzu, ao qual ele chama de Sossego e onde ele passa a tentar provar a decantada fertilidade do solo brasileiro.

Com a ajuda do empregado Anastácio, Policarpo luta contra saúvas, ervas daninhas e outras pragas na tentativa de incentivar a iniciativa agrícola em outras pessoas e ajudar no crescimento econômico do Brasil.

A fertilidade do solo, no entanto, não se comprova na prática, e sua plantação gerou pouquíssimos lucros. Para piorar, Policarpo viu-se envolvido, involuntariamente, na luta política da cidade, sendo atacado com multas e difamações por gregos e troianos, tudo por causa de sua suspeita (para os locais) neutralidade.

Ao saber sobre a Revolta da Armada, nosso protagonista "pede energia" em telegrama ao Presidente Floriano Peixoto e segue para o Rio de Janeiro para dar apoio ao regime e sugerir reformas que mudassem a situação agrária.

Terceira parte

Última e mais tensa parte do livro, narra as andanças de Policarpo pela Capital Federal durante a Revolta da Armada e mostra sua desilusão final. Há aqui uma crítica feroz aos positivistas que apoiavam a Primeira República.

Chegado ao Rio, Policarpo é bem recebido por Floriano Peixoto, que, no entanto, dá pouca atenção às suas propostas de reforma.

Decidido a lutar pela República, Policarpo é então incorporado a um batalhão, o "Cruzeiro do Sul", com o posto de major, o que, apesar do apelido, ele nunca fôra.

Encarregado de um pelotão de artilharia improvisado com voluntariados à força - como seu amigo Ricardo Coração dos Outros -, Policarpo deveria rechaçar investidas dos marinheiros às praias cariocas.

A revolta criava ao mesmo tempo tensão - devido a prisões e violências arbitrárias - e oportunidades de ascensão social e empregatícia a cupinchas e puxa-sacos. Policarpo, enquanto isto, percebe que suas propostas não eram levadas a sério - é chamado, de forma um tanto irônica, de visionário pelo indolente Marechal de Ferro Floriano Peixoto - e desilude ainda mais quando, tendo entrado em combate, acaba por matar um dos revoltosos.

Finda a Revolta e encarregado de cuidar de um grupo de prisioneiros, Policarpo chega à conclusão de que a pátria, à qual ele sacrificara sua vida de estudos, era uma ilusão.

Seu destino é selado quando, após presenciar a escolha arbitrária de prisioneiros a serem executados, ele escreve uma carta a Floriano Peixoto denunciando a situação: o maior patriota de todo o livro é injustamente preso, acusado de traição.

Ricardo Coração dos Outros, inteirado da situação, procura todos os antigos amigos e conhecidos de Policarpo para ajudá-lo, mas todos se recusam por medo ou ganância, com exceção da afilhada, Olga, que, no entanto, parece incapaz de fazer qualquer coisa pelo padrinho a quem admira tanto.

O romance, no entanto, acaba em aberto, e ficamos sem saber se Policarpo será ou não, de fato, fuzilado.

Filme

Intitulado Policarpo Quaresma, Herói do Brasil, o filme de 1998 tem roteiro de Alcione Araújo e foi dirigido por Paulo Thiago. Embora respeitando em linhas gerais o enredo de Lima Barreto, esta adaptação toma algumas liberdades (como criar uma relação amorosa entre Policarpo e Ismênia e mostrar o fuzilamento final do protagonista, que não é descrito no livro) e satiriza aspectos da política brasileira atual, como quando um grupo de sem-terras invade o sítio do Major Quaresma, "Sossego".

Fontes:
http://pt.wikipedia.org
http://www.adorocinemabrasileiro.com.br (imagem)