domingo, 24 de agosto de 2008

Olavo Bilac (Poesias Avulsas)

(id: MCCXXXVIII)

A velhice

Olha estas velhas árvores, mais belas
Do que as árvores moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas...

O homem, a fera e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres da fome e de fadigas:
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.

Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo. Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,

Na glória de alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!
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Ao coração que sofre

Ao coração que sofre, separado
Do teu, no exílio em que a chorar me vejo,
Não basta o afeto simples e sagrado
Com que das desventuras me protejo.

Não me basta saber que sou amado,
Nem só desejo o teu amor: desejo
Ter nos braços teu corpo delicado,
Ter na boca a doçura de teu beijo.

E as justas ambições que me consomem
Não me envergonham: pois maior baixeza
Não há que a terra pelo céu trocar;

E mais eleva o coração de um homem
Ser de homem sempre e, na maior pureza,
Ficar na terra e humanamente amar.
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"Benedicite"

Bendito o que na terra o fogo fez, e o teto
E o que uniu à charrua o boi paciente e amigo;
E o que encontrou a enxada; e o que do chão abjeto,
Fez aos beijos do sol, o oiro brotar, do trigo;

E o que o ferro forjou; e o piedoso arquiteto
Que ideou, depois do berço e do lar, o jazigo;
E o que os fios urdiu e o que achou o alfabeto;
E o que deu uma esmola ao primeiro mendigo;

E o que soltou ao mar a quilha, e ao vento o pano,
E o que inventou o canto e o que criou a lira,
E o que domou o raio e o que alçou o aeroplano...

Mas bendito entre os mais o que no dó profundo,
Descobriu a Esperança, a divina mentira,
Dando ao homem o dom de suportar o mundo!
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Ciclo

Manhã. Sangue em delírio, verde gomo,
Promessa ardente, berço e liminar:
A árvore pulsa, no primeiro assomo
Da vida, inchando a seiva ao sol... Sonhar!
Dia. A flor - o noivado e o beijo, como
Em perfumes um tálamo e um altar:
A árvore abre-se em riso, espera o pomo,
E canta à voz dos pássaros... Amar!

Tarde. Messe e esplendor, glória e tributo;
A árvore maternal levanta o fruto,
A hóstia da idéia em perfeição... Pensar!

Noite. Oh! Saudade!... A dolorosa rama
Da árvore aflita pelo chão derrama
As folhas, como lágrimas... Lembrar!
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Deixa o olhar do mundo

X

Deixa que o olhar do mundo enfim devasse
Teu grande amor que é teu maior segredo!
Que terias perdido, se, mais cedo,
Todo o afeto que sentes se mostrasse?

Basta de enganos! Mostra-me sem medo
Aos homens, afrontando-os face a face:
Quero que os homens todos, quando eu passe,
Invejosos, apontem-me com o dedo.

Olha: não posso mais! Ando tão cheio
Deste amor, que minh'alma se consome
De te exaltar aos olhos do universo...

Ouço em tudo teu nome, em tudo o leio:
E, fatigado de calar teu nome,
Quase o revelo no final de um verso.
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Fogo-fátuo

Cabelos brancos! dai-me, enfim, a calma
A esta tortura de homem e de artista:
Desdém pelo que encerra a minha palma,
E ambição pelo mais que não exista;
Esta febre, que o espírito me encalma
E logo me enregela; esta conquista
De idéias, ao nascer, morrendo na alma,
De mundos, ao raiar, murchando à vista:

Esta melancolia sem remédio,
Saudade sem razão, louca esperança
Ardendo em choros e findando em tédio;

Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que não há na vida!
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Inania verba

Ah! quem há de exprimir, alma impotente e escrava,
O que a boca não diz, o que a mão não escreve?
— Ardes, sangras, pregada à tua cruz, e, em breve,
Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava...
O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava;
A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve...
E a Palavra pesada abafa a Idéia leve,
Que, perfume e clarão, refulgia e voava.

Quem o molde achará para a expressão de tudo?
Ai! quem há de dizer as ânsias infinitas
Do sonho? e o céu que foge à mão que se levanta?

E a ira muda? e o asco mudo? e o desespero mudo?
E as palavras de fé que nunca foram ditas?
E as confissões de amor que morrem na garganta?
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Maldição

Se por vinte anos, nesta furna escura,
Deixei dormir a minha maldição,
_ Hoje, velha e cansada da amargura,
Minha alma se abrirá como um vulcão.
E, em torrentes de cólera e loucura,
Sobre a tua cabeça ferverão
Vinte anos de silêncio e de tortura,
Vinte anos de agonia e solidão...

Maldita sejas pelo ideal perdido!
Pelo mal que fizeste sem querer!
Pelo amor que morreu sem ter nascido!

Pelas horas vividas sem prazer!
Pela tristeza do que eu tenho sido!
Pelo esplendor do que eu deixei de ser!...
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O cometa

Um cometa passava... Em luz, na penedia,
Na erva, no inseto, em tudo uma alma rebrilhava;
Entregava-se ao sol a terra, como escrava;
Ferviam sangue e seiva. E o cometa fugia...

Assolavam a terra o terremoto, a lava,
A água, o ciclone, a guerra, a fome, a epidemia;
Mas renascia o amor, o orgulho revivia,
Passavam religiões... E o cometa passava.

E fugia, riçando a ígnea cauda flava...
Fenecia uma raça; a solidão bravia
Povoava-se outra vez. E o cometa voltava...

Escoava-se o tropel das eras, dia a dia:
E tudo, desde a pedra ao homem, proclamava
A sua eternidade ! E o cometa sorria...
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O pássaro cativo

Armas, num galho de árvore, o alçapão
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.
Dás-lhe então, por esplêndida morada,
Gaiola dourada;

Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos e tudo.
Por que é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste sem cantar?
É que, criança, os pássaros não falam.

Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:

"Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro

Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores
Sem precisar de ti!

Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola,
De haver perdido aquilo que perdi...
Prefiro o ninho humilde construído

De folhas secas, plácido, escondido.
Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pombas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes? Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade!
Não me roubes a minha liberdade...
Quero voar! Voar!

Estas cousas o pássaro diria,
Se pudesse falar,
E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição,
E a tua mão tremendo lhe abriria
A porta da prisão...
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Ora (direis) ouvir estrelas!

XIII

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-Ias, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto ...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."
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Palavras

As palavras do amor expiram como os versos,
Com que adoço a amargura e embalo o pensamento:
Vagos clarões, vapor de perfumes dispersos,
Vidas que não têm vida, existências que invento;

Esplendor cedo morto, ânsia breve, universos
De pó, que o sopro espalha ao torvelim do vento,
Raios de sol, no oceano entre as águas imersos
-As palavras da fé vivem num só momento...

Mas as palavras más, as do ódio e do despeito,
O "não!" que desengana, o "nunca!" que alucina,
E as do aleive, em baldões, e as da mofa, em risadas,

Abrasam-nos o ouvido e entram-nos pelo peito:
Ficam no coração, numa inércia assassina,
Imóveis e imortais, como pedras geladas.
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Um Beijo

Foste o beijo melhor da minha vida,
Ou talvez o pior ... Glória e tormento,
Contigo à luz subi do firmamento,
Contigo fui pela infernal descida!


Morreste, e o meu desejo não te olvida:
Queimas-me o sangue, enches-me o pensamento,
E do teu gosto amargo me alimento,
E rolo-te na boca malferida.

Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo,
Batismo e extrema-unção, naquele instante
Por que, feliz, eu não morri contigo?

Sinto-te o ardor, e o crepitar te escuto,
Beijo divino! e anseio, delirante,
Na perpétua saudade de um minuto ...
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Pátria

Pátria, latejo em ti, no teu lenho, por onde
circulo! E sou perfume, e sombra, e sol e orvalho!
E, em seiva, ao teu clamor a minha voz responde,
e subo do teu cerne ao céu de galho em galho!

Dos teus liquens, dos teus cipós, da tua fronde,
do ninho que gorjeia em teu doce agasalho,
do fruto a amadurar que em teu seio se esconde,
de ti, - rebento em luz e em cânticos me espalho!

Vivo, choro em teu pranto; e, em teus dias felizes,
no alto, como uma flor, em ti, pompeio e exulto!
E eu, morto, - sendo tu cheia de cicatrizes,

tu golpeada e insultada, ­ eu tremerei sepulto:
e os meus ossos no chão, como as tuas raízes,
se estorcerão de dor, sofrendo o golpe e o insulto!
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Língua Portuguesa

Última flor do Lácio, inculta e bela,
és, a um tempo, esplendor e sepultura:
ouro nativo, que na ganga impura
a bruta mina entre os cascalhos vela...

amo-te assim, desconhecida e obscura,
tuba de alto clangor, lira singela
que tens o trom e o silvo da procela,
e o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

em que da voz materna ouvi: “meu filho”,
E em que Camões chorou no exílio amargo,
­o gênio sem ventura e o amor sem brilho!
--
Fontes:
Jornal de Poesia.
http://www.secrel.com.br/jpoesia/
http://www.antoniomiranda.com.br
Capa do livro: Editora Martin Claret

Olavo Bilac (1865 - 1918)

(id:MCCXXXVII)

Um dos mais notáveis poetas brasileiros, prosador exímio e orador primoroso, nasceu e morreu no Rio de Janeiro, respectivamente, em 1865 e 1918. Aluno da Faculdade de Medicina até o quinto ano, depois de brilhante concurso que ali fez para interno, e apesar do auspicioso futuro que todos lhe auguravam, desistiu do curso médico para tentar o de direito em São Paulo. Atraído, porém, pela vida fluminense, voltou ao Rio estreando, com grande êxito, na imprensa literária.

A irradiação do seu nome foi rápida, e fulgurou com a publicação de Poesias (incluindo Panóplias, Via Láctea e Sarças de Fogo - 1888). Foi um dos mais ardorosos propagandistas da abolição, ligando-se estreitamente a José do Patrocínio. Em 1900 partiu para a Europa como correspondente da publicação Cidade do Rio. Daí em diante, raro era o ano em que não visitava Paris.

Exerceu vários cargos públicos no estado do Rio de Janeiro e na antiga Guanabara, tendo sido inspetor escolar, secretário do Congresso Panamericano e fundador da Agência Americana. Foi um dos fundadores da Liga da Defesa Nacional (da qual foi secretário geral), tendo lutado pelo serviço militar obrigatório, que considerava uma forma de combate ao analfabetismo. Conferencista de platéias elegantes, sua obra tornou-se leitura obrigatória, sendo declamado nos círculos literários.

Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, na cadeira 15, cujo patrono é Gonçalves Dias.

Considerado o maior nome parnasiano brasileiro, foi bastante influenciado pelos poetas franceses. Suas poesias revelam uma grande emoção, nada típica dos parnasianos, um certo erotismo e influência marcante da poesia portuguesa dos séculos XVI e XVII. A correção da linguagem, o rigor da forma e a espontaneidade são as principais características de seus versos.

Além de Poesias também publicou Crônicas e Novelas, Conferências Literárias, Ironia e Piedade, Bocage, Crítica e Fantasia, e, em colaboração, Contos Pátrios (infantil), Livro de Leitura, Livro de Composição, Através do Brasil (os últimos três, pedagógicos), Teatro Infantil, Terra Fluminense, Pátria Brasileira, Tratado de Versificação, A Defesa Nacional (coleção de discursos), Últimas Conferências e Discursos, Dicionário Analógico (inédito) e Tarde (póstuma, coleção de 99 sonetos).

Seu volume de Poesias Infantis, encomendado pela Livraria Francisco Alves, é uma coleção de 58 poemas metrificados falando sobre a natureza e a virtude. Segundo suas próprias palavras, "era preciso achar assuntos simples, humanos, naturais, que, fugindo da banalidade, não fossem também fatigar o cérebro do pequenino leitor, exigindo dele uma reflexão demorada e profunda".

É autor do Hino à Bandeira Nacional.

Fonte:
Jornal de Poesia. http://www.secrel.com.br/jpoesia/

Léo Schlafman (Bilac)

(id:MCCXXXVI)

Quase um século após sua morte, a publicação das obras reunidas serve de estímulo para reavaliar o poeta que, objeto de entusiasmo popular na sua época, tornou-se o alvo preferido dos modernistas

Oitenta anos separam a morte de Olavo Bilac da publicação ônibus de seus livros. É quase um século - mas século de grandes transformações estéticas e políticas. O poeta, que nasceu durante a Guerra do Paraguai e morreu, com a belle époque, no fim da Grande Guerra, reapresenta-se ao público em plena guerra da Chechênia, depois do desmoronamento do império soviético. Mas nunca deixou de ser publicado avulsamente, e lido, analisado nas escolas, e de tal forma que muitos de seus versos hoje fazem parte da memória popular, como "Ora (direis) ouvir estrelas!" ou "Última flor do Lácio, inculta e bela, / És a um tempo, esplendor e sepultura".

Sempre foi transcrito com fartura nas antologias, entronizado na liderança do movimento parnasiano, criticado e defendido, depois da morte como em vida. Mas, como disse T. S. Eliot, de tempos em tempos, em cada 100 anos mais ou menos, é desejável que algum crítico apareça para rever o passado e dispor os poetas e os poemas em nova ordem.

Segundo Eliot, nenhum poeta nem qualquer outro tipo de artista tem seu significado completo sozinho. Sua apreciação é a apreciação da relação com os poetas e artistas mortos. Não se pode avaliá-lo isoladamente. Quando nova obra de arte é criada, algo novo ocorre com todas as obras que a precederam.

O ciclo a que Bilac pertenceu chocou-se de frente com o fogo de barragem da Semana de Arte Moderna. De fato, quatro anos depois da morte dele, em 1918, os modernistas, em 1922, que, na fórmula de Ivan Junqueira, não sabiam bem o que queriam, embora soubessem perfeitamente o que não queriam, escolheram-no como alvo de predileção, abalaram-lhe o prestígio, e tudo "porque sua poesia não interessava em absoluto ao projeto modernista, e não porque o julgassem mau poeta".

O verso livre já destronara soneto, alexandrino e rimas em outras plagas, mas hoje se sabe, com o distanciamento crítico que só o tempo proporciona, que nenhum verso é livre para o homem que deseja fazer bom trabalho. Grande quantidade de prosa de má qualidade tem sido escrita, desde então, com o nome de verso. E vice-versa. Apenas um mau poeta poderia considerar o verso livre libertação da forma.

No entanto, a clivagem entre parnasianismo e modernismo enraizou-se para sempre. Basta comparar a exaltação militar de Bilac, na campanha pelo alistamento obrigatório, com o pacifismo de Clã do jabuti, de Mário de Andrade, dez anos depois, para constatar o abismo que a revolução modernista cavou entre as duas gerações. O abismo teve várias conseqüências. Gonçalves Dias, Castro Alves e Olavo Bilac foram os últimos na literatura brasileira a despertar ao mesmo tempo entusiasmo culto e popular. Implantou-se entre o grande público e as artes, incluindo a poesia, um mal-entendido, uma dissociação, até hoje não suficientemente esclarecida.

Num banquete monstro de que foi alvo, em 1907, Bilac lembrou que quarenta anos antes não havia propriamente homens de letras no Brasil. "Havia estadistas, parlamentares, professores, diplomatas, homens da sociedade ou homens ricos, que, de quando em quando, invadiam por momentos o bairro literário..." Na fase seguinte, poetas e escritores que desejavam ser apenas poetas e escritores cometeram o erro de mostrar desdém pela consideração que a sociedade lhes recusava. A geração de Bilac, e ele principalmente, transformaram o que era então passatempo em profissão, culto, sacerdócio. "Viemos trabalhar cá em baixo, no seio do formigueiro humano."

Hoje em dia não há banquetes monstros para poetas. O formigueiro humano sequer gosta da poesia que lê, alegando que não a entende. Já Bilac, da estréia ao crepúsculo, revelou-se antes simples do que complicado, e isto talvez seja uma das causas da extrema receptividade que tiveram e ainda têm seus versos. José Veríssimo criticava em Bilac a falta de extensão e profundeza, mas reconhecia feição descritiva, pompa, o brilho novo de sua forma, feitos para agradar, dando sempre "impressão de acabado, de perfeito". Machado de Assis, em A nova geração, definiu a poesia parnasiana como uma inclinação nova nos espíritos, sem se utilizar ainda da expressão parnasiana. O parnasianismo renegou o romantismo, e exaltou uma arte fria ("Serás para mim uma deusa, / (...) inviolável e fria", escreveu Bilac), impassível, intelectualizada, contra o transe, a participação e a emotividade - em suma, a hipertrofia do eu. Em Profissão de fé Bilac pregou o trabalho formal, o culto ao estilo: "Torce, aprimora, alteia, lima / A frase; e enfim, / No verso de ouro engasta a rima, / Como um rubim." Queria que a estrofe, cristalina, "Dobrada ao jeito / Do ourives, saia da oficina / Sem um defeito".

No correr da história literária, os parnasianos da primeira hora, como Alberto Oliveira, Raimundo Correia e Bilac (a "trindade parnasiana") têm sido identificados como românticos retardatários. Filiavam-se ao parnasse francês (Gautier, Bainville, Lisle, Baudelaire e Hérédia). Bocage superou Camões na veneração parnasiana brasileira. As obras bem escritas são eternas. Aboliu-se o mistério na poesia. Evitavam-se recursos musicais, como aliterações, homofonias, ecos, expressões de poder encantatório. Repudiava-se o contexto medieval e se proclamava a superioridade da vida, da saúde, da sensualidade, da objetividade, do conhecimento do mal e do homem, sobre a morte, a doença, a melancolia, o sentimentalismo, a objetividade, a inocência e Deus (João Pacheco, em O realismo).

Mas a impassibilidade parnasiana não se manifestou totalmente nos poetas brasileiros, sempre atormentados pela incontinência da sensibilidade nacional, o brilho da paisagem, a exigência do sensualismo. O próprio Bilac, citado por Pacheco, mais de uma vez reclamou, em versos, da asfixia imposta pela escola, demasiadamente atada à prisão da lógica: "O pensamento ferve, e é um turbilhão de lava: / A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve..." Manuel Bandeira, em Poemeto erótico, mostrou que isto não acontecia sempre: "Teu corpo claro e perfeito, / Teu corpo de maravilha, / Quero possuí-lo no leito / Estreito da redondilha." Pode-se, portanto, como fez Bandeira, e Bilac tantas vezes, tirar proveito das limitações da forma, quando se quer. Mário de Andrade, em O empalhador de passarinho, disse, a propósito de Bilac: "A escultura das palavras também tem suas belezas. A solaridade, a luz crua, a nitidez das sombras curtas de certos verbalismos enfunados, pelo próprio afastamento em que estão da verdadeira poesia, têm seu sabor especial, pecaminoso."

Ao estrear, aos 23 anos, com Poesias, Bilac já estava perfeitamente enquadrado no rigor da forma, e com a sensualidade à flor da pele. Na adolescência, encharcou-se dos ecos da Guerra do Paraguai ("Todo esse espetáculo de heroísmo dominando a vida nacional, e por muitos anos alimentando a altivez do povo"). O Rio de sua maturidade era estranho burgo colonial, com quase três quartos de negros. A casa onde nasceu, na Rua da Vala, atual Uruguaiana, pertencia à área que melhor exprimia a fealdade e sujeira da capital. Perto estava a Rua do Ouvidor, com seu singular comércio francês. Conforme descreveu Ledo Ivo, o que dominava o centro urbano era o comércio atacadista de aspecto sinistro. Quando um tílburi corria pelos calçamentos irregulares, os pedestres se colavam às paredes. Passava-se manteiga da Dinamarca no pão de trigo inglês, bebia-se cerveja alemã, comiam-se queijos flamengos na Confeitaria Pascoal, usavam-se os esgotos da City e andava-se em bonde da Botanical Garden. Os cidadãos inconformados reclamavam das loucuras do prefeito Pereira Passos.

Um ano antes da publicação de Poesias (1888) Bilac noivou com Amélia de Oliveira, irmã de seu amigo parnasiano Alberto de Oliveira. O noivado durou pouco. E ela se tornou, para o solteirão empedernido, a inspiradora, a Beatriz - um dos pólos de seu lirismo amoroso. Advogado da vacina obrigatória e do alistamento também obrigatório, republicano de primeira hora, destacou-se contudo por suas inclinações reacionárias. Esteve preso ("Quatro prisões, quatro interrogatórios... / Há três anos que as solas dos sapatos / Gasto, a correr de Herodes a Pilatos" - Em custódia, sob o pseudônimo Fantasio, soneto não incluído na Obra reunida) e exilado em Minas, onde conheceu Afonso Arinos, que marcou a segunda etapa de sua poesia ("meu nacionalismo é filho de meu tradicionalismo". Bebia muito, mas também trabalhava muito. Desde a fundação da Academia Brasileira de Letras deixou de ser boêmio para ser o poeta acadêmico.

Bilac, que nunca escondeu a influência do seiscentista Vieira (em quem se inspirou para escrever o famoso Ouvir estrelas, cuja primeira publicação tinha uma epígrafe extraída do Sermão da Sexagésima) deixou uma semente que frutificou depois da Semana de Arte Moderna. Manuel Bandeira, em Balada das três mulheres de Araxá, cita dois versos de Bilac ("Que outros, não eu, a pedra cortem / Para brutais vos adorardes). Mário Quintana faz ligeira alusão a Bilac no sexto quarteto de Do cuidado da forma: "Teu verso, barro vil, / No teu casto retiro, amolga, enrija, pule.../ Vê depois como brilha, entre os mais, o imbecil, / Arredondado e liso como um bule!"

Para Bilac, como para O caçador de esmeraldas, o crepúsculo caiu "como uma extrema-unção". Voltando a Eliot: o dever do poeta é só indiretamente voltado para o povo. Seu dever direto é para a língua. Ele morreu com o parnasianismo e a belle époque. Ou foram o parnasianismo e a belle époque que morreram com ele, no Brasil?

Fonte:
(in Caderno Idéias, Jornal do Brasil).
Jornal de Poesia.
http://www.secrel.com.br/jpoesia/

José de Alencar (O Guarani)

(id:MCCXXXV)

Na primeira metade do século XVII, Portugal ainda dependia politicamente da Espanha, fato que, se por um lado exasperava os sentimentos patrióticos de um frei Antão, como mostrou Gonçalves Dias, por outro lado a ele se acomodavam os conservadoristas e os portugueses de pouco brio.

D. Antônio de Mariz, fidalgo dos mais insignes da nobreza de Portugal, leva adiante no Brasil uma colonização dentro mais rigoroso espírito de obediência à sua pátria. Representa, com sua casa-forte, elevada na Serra dos Órgãos, um baluarte na Colônia, a desafiar o poderio espanhol.

Sua casa-forte, às margens do Pequequer, afluente do Paraíba, é abrigo de ilustres portugueses, afinados no mesmo espírito patriótico e colonizador, mas acolhe inicialmente, com ingênua cordialidade, bandos de mercenários, homens sedentos de ouro e prata, como o aventureiro Loredano, ex-padre que assassinara um homem desarmado, a troco do mapa das famosas minas de prata.

Dentro da respeitável casa de D. Antônio de Mariz, Loredano vai pacientemente urdindo seu plano de destruição de toda a família e dos agregados. Em seus planos, contudo, está o rapto da bela Cecília, filha de D. Antônio, mas que é constantemente vigiada por um índio forte e corajoso, Peri, que em recompensa por tê-la salvo certa vez de uma avalancha de pedras, recebeu a mais alta gratidão de D. Antônio e mesmo o afeto espontâneo da moça, que o trata como a um irmão.

A narrativa inicia seus momentos épicos logo após o incidente em que Diogo, filho de D. Antônio, inadvertidamente, mata uma indiazinha aimoré, durante uma caçada. Indignados, os aimorés procuram vingança: surpreendidos por Peri, enquanto espreitavam o banho de Ceci, para logo após assassiná-la, dois aimorés caem transpassados por certeiras flechas; o fato é relatado à tribo aimoré por uma índia que conseguira ver o ocorrido.

A luta que se irá travar não diminui a ambição de Loredano, que continua a tramar a destruição de todos os que não o acompanhem. Pela bravura demonstrada do homem português, têm importância ainda dois personagens: Álvaro, jovem enamorado de Ceci e não retribuído nesse amor, senão numa fraterna simpatia; Aires Gomes, espécie de comandante de armas, leal defensor da casa de D. Antônio.

Durante todos os momentos da luta, Peri, vigilante, não descura dos passos de Loredano, frustrando todas suas tentativas de traição ou de rapto de Ceci. Muito mais numerosos, os aimorés vão ganhando a luta passo a passo.

Num momento, dos mais heróicos por sinal, Peri, conhecendo que estavam quase perdidos, tenta uma solução tipicamente indígena: tomando veneno, pois sabe que os aimorés são antropófagos, desce a montanha e vai lutar "in loco" contra os aimorés: sabe que, morrendo, seria sua carne devorada pelos antropófagos e aí estaria a salvação da casa de D. Antônio: eles morreriam, pois seu organismo já estaria de todo envenenado.

Depois de encarniçada luta, onde morreram muitos inimigos, Peri é subjugado e, já sem forças, espera, armado, o sacrifício que lhe irão impingir. Álvaro (a esta altura enamorado de Isabel, irmã adotiva de Cecília) consegue heroicamente salvar Peri. Peri volta e diz a Ceci que havia tomado veneno. Ante o desespero da moça com essa revelação, Peri volta à floresta em busca de um antídoto, espécie de erva que neutraliza o poder letal do veneno.

De volta, traz o cadáver de Álvaro morto em combate com os aimorés. Dá-se então o momento trágico da narrativa: Isabel, inconformada com a desgraça ocorrida ao amado, suicida-se sobre seu corpo. Loredano continua agindo. Crendo-se completamente seguro, trama agora a morte de D. Antônio e parte para a ação. Quando menos supõe, é preso e condenado a morrer na fogueira, como traidor.

O cerco dos selvagens é cada vez maior. Peri, a pedido do pai de Cecília, se faz cristão, única maneira possível para que D. Antônio concordasse, na fuga dos dois, os únicos que se poderiam salvar. Descendo por uma corda através do abismo, carregando Cecília entorpecida pelo vinho que o pai lhe dera para que dormisse, Peri, consegue afinal chegar ao rio Paquequer. Numa frágil canoa, vai descendo rio abaixo, até que ouve o grande estampido provocado por D. Antônio, que, vendo entrarem os aimorés em sua fortaleza, ateia fogo aos barris de pólvora, destruindo índios e portugueses.

Testemunhas únicas do ocorrido, Peri e Ceci caminham agora por uma natureza revolta em águas, enfrentando a fúria dos elementos da tempestade. Cecília acorda e Peri lhe relata o sucedido. Transtornada, a moça se vê sozinha no mundo. Prefere não mais voltar ao Rio de Janeiro, para onde iria. Prefere ficar com Peri, morando nas selvas. A tempestade faz as águas subirem ainda mais. Por segurança, Peri sobe ao alto de uma palmeira, protegendo fielmente a moça.

Como as águas fossem subindo perigosamente, Peri, com força descomunal, arranca a palmeira do solo, improvisando uma canoa. O romance termina com a palmeira perdendo-se no horizonte, não sem antes Alencar ter sugerido, nas últimas linhas do romance, uma bela união amorosa, semente de onde brotaria mais tarde a raça brasileira...
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O livro inteiro pode ser obtido no site http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/guarani.html
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Fonte:
http://www.netsaber.com.br/
Capa do Livro: Editora Martin Claret

Jorge Amado (A Morte e a Morte de Quincas Berro D'Água)

(id:MCCXXXIV)
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Autor dos mais respeitados na literatura brasileira, desde os anos trinta, Jorge Amado tem pontificado e feito sucesso de crítica e de público. Sua obra explora os mais diferentes aspectos da vida baiana: a posse violenta da terra, com as conseqüências sociais terríveis, como ocorreu na colonização da zona cacaueira do Sul da Bahia, está magistralmente imortalizada em Cacau, São Jorge de Ilhéus, Gabriela, Cravo e Canela e Terras do Sem Fim. Os tipos folclóricos das ladeiras de Salvador estão presentes em Tenda dos Milagres, Capitães da Areia, Mar Morto. A literatura engajada, comprometida com a ideologia política do Autor faz-se presente em Os Subterrâneos da Liberdade, O Cavaleiro da Esperança. Os perfis de mulheres extraordinárias que comovem e seduzem estão em Tieta do Agreste, Dona Flor e seus Dois Maridos, Gabriela e muitos outros...

Primeiro é preciso que se tenha em mente o "descompromisso" do Autor com o registro formal culto, para se entender melhor o comentário que se faz constantemente sobre seu "estilo". Jorge Amado já se autoproclamou "um baiano romântico e sensual". É o que a crítica costuma rotular de contador de estórias. Não segue, intencionalmente, o rigor da técnica de construção literária e nem dá a mínima para as normas gramaticais e ortográficas. Incorpora, com a maior naturalidade, à língua escrita, termos e expressões típicas da língua oral e de sua Bahia idolatrada. Não espere o leitor, portanto, defrontar-se com um texto primoroso, regular, pausterizado. Entretanto, quem se aventurar nos meandros de suas páginas, esteja preparado para o deguste de um texto saboroso e suculento que transpira a trópico, a calor, a vida. Suas histórias são tramadas sobre o povo simples e rude, numa língua que esse povo fala e entende.

O texto que serve de suporte a este estudo centra-se na fixação dos tipos marginalizados para, por intermédio deles, analisar e criticar toda a sociedade. A ação dá-se, basicamente, em Salvador e gira em torno da boêmia desqualificada das cercanias do cais do porto.

A Morte e a Morte de Quincas Berro d'Água é uma das melhores narrativas publicadas por Jorge Amado. Veio a lume em 1958 e conquistou desde logo a admiração de quantos dela se aproximaram. Nitidamente imbricada no Realismo Mágico, mistura sonho e realidade; loucura e racionalidade; amor e desamor; ternura e rancor, de forma envolvente e instigante:

Joaquim Soares da Cunha foi funcionário público, pai e marido exemplar até o dia em que se aposentou do serviço público. A partir daí, jogou tudo para o alto: família, respeitabilidade, conhecidos, amigos, tradição. Caiu na malandragem, no alcoolismo, na jogatina. Trocou a vida familiar pela convivência com as prostitutas, os bêbados, os marinheiros, os jogadores e pequenos meliantes e contraventores da ralé de Salvador. Sua sede era saciada com cachaça e seu descanso era no ombro acolhedor da prostituta. Fez-se respeitado e admirado entre seus novos companheiros de infortúnio: era o paizinho, sábio e conselheiro, sempre disposto a mais uma farra ou bebedeira.

Sua opção pela bandalha representa o grito terrível do homem dominado e cerceado por preconceitos de toda sorte e que um dia rompe as amarras e grita por liberdade.

Morreu solitariamente sobre uma enxerga imunda e sua morte detonou todo o processo de reconhecimento/desconhecimento por parte da família real e da família adotada. Os amigos durante o velório se embriagam e resolvem, bêbados, levar o defunto para um último "giro" pelo baixo-mundo que habitavam. O passeio passa pelos bordéis e botecos, terminando em um saveiro, onde há comida e mulheres. Vem uma tempestade e o corpo de Quincas cai ao mar.

Ao renunciar à família, mudar de ambiente e de costumes, Quincas morreu pela primeira vez; na solidão de seu quartinho imundo, envolvido por farrapos e curtindo a última bebedeira, morreu pela segunda vez; ao cair ao mar, não deixando qualquer testemunho físico de sua passagem pela vida, morreu pela terceira vez. A narrativa poderia chamar-se A morte e a morte e a morte de Quincas Berro D'Água, acrescentando-se uma morte ao protagonista, que ficaria bem de acordo com a progressão da trama.

Fonte:
http://www.vestibular1.com.br

José Levy de Oliveira (Exercícios de Trovas)

(id:MCCXXXII)
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UBT – Membro no. 088 - Seção de Juiz de Fora, MG

I. TROVAS BEM-COMPORTADAS

O temas são vários: um cartaz de alguém muito preocupado com meu bem-estar e o da coletividade;a indefinição das vestes e cabelos modernos; algumas fraquezas humanas; um noivo impaciente:

1.
Não que me faltasse aviso
Ou falte espírito crítico;
A mim? De mim! o sorriso
Do sorrateiro político!

2.
Dúvida atroz nos domina
Ante a mocidade nova:
Será menino ou menina
Ou os dois, até contra-prova?

3.
Já está na boca do povo
Que a mulher do Belisário
Vai ser um defunto novo:
Nunca faz aniversário...

4.
A fim de não levar “pito”
O cara, dissimulado,
Pra não revelar o pito
Pitava o pito apagado.

5.
Posso desejar a ti”
É ver-te bem desmaiado,
Pois, antes fora de si
Do que mal acompanhado.

6.
Se detestavas a morta
Por cruel e aborrecida,
Nada disso mais importa,
Pois a encontras ... falecida.

7.
Fui um dos heróis da luta
Nessa batalhe triunfal;
Ninguém me viu na disputa
Mas dei um apoio moral....!

8.
Detida por impudência,
A moça assim se define:
-É clara minha inocência.
Só me esqueci do biquíni...

9.
Doidivanas e ao léu,
Ela trocou o biquíni:
De óculos, chinelo e chapéu
Foi banhar-se ... de triquini.

10.
Para o Carnaval, de fato,
Não é difícil arranjar-se
E fica até bem barato:
Desnudar-se, desnudar-se ...

11.
“- Se te atrasas para o altar,
Eu me agasto, minha nega!
- Não adianta se agastar ...
O problema é que ela chega!

12.
Eu não sei o que seria
Se a Pati nada quisesse,
Mas, supondo que eu fizesse,
Será que a Pati faria?...

13.
- Oh! meu amor! Onde a lua,
As estrelas? Que se passa?
- Mas o que fazes na rua,
Que é só ruído e fumaça?
14.
Aquele beijo roubado
Devolver-te? Só de um jeito!
Que o tires com um beijo dado
Agarradinha ao meu peito.

15.
Troveirei a noite inteira
Na janela do meu bem,
Mas, oh!, sorte traiçoeira!,
Troveirou o céu, também.

16.
Duvidas que o homem troveja
E queres prova, doutor?
O que faz quando verseja
E faz trova o trovador?

II. TROVAS METATROVÍSTICAS
A eficácia terapêutica de poetar; as intertextualidades inerentes a esses pequenos poemas; a grandeza do Santo que é o patrono dos trovadores:

1.
Depois das mais duras provas
E dos percalços da vida,
O trovador pensa em trovas
E leva a dor de vencida...

2.
Se, no caminho, uma pedra
Foi, um dia, inspiração,
Tão forte é a trova, que medra
Nas trilhas do coração.

3.
Não sobra melancolia,
Isso o dia-a-dia prova
Que não sare à melodia
Que há na alma da trova.

4.
No pobrezinho de Assis
Nossa força se renova
E nossa trova lhe diz:
“- Santo Patrono da trova!”

5.
O trovador, eu sustento,
O seu talento comprova
Talando o seu pensamento
No estreito leito da trova.

6.
Tão grande é o poder da trova
Que até a amplidão do universo
- e esta mesma o comprova –
Cabe em qualquer de seus versos.

7.
Porque se trova, na vida,
Com tanta ânsia fremente?
Para, à beleza, guarida
Dar no coração da gente.

8.
Na floresta de concreto
Do urbano trovador,
Dá-se o milagre completo
Quanto ele trova ... essa flor!

9.
Pela vida, de mãos dadas
Com a mais sublime estesia,
Me ponho pelas estradas
Com as trovas de cada dia.

10.
Não trovo por ser perfeito
Trovador, mas por saber:
Dever de casa, a ser feito,
Seja feito com prazer.

III. TROVAS DE CONTEMPLAÇÃO

1.
- Essência? – me perguntaste.
É a porçãozinha mais ínfima
Que sobra após o desbaste
Do que excede à parte íntima...

2.
Por mais que longa a distância
Entre corações leais,
Nada macula a constância
Com que eles se querem mais...

3.
Esta verdade não falha,
Certeza mais que palpite:
Para quem ama e trabalha
O Infinito é o limite.

4.
As perfeições do teu mundo
Amo e admiro, meu Deus,
Mas, poeta, me aprofundo
Em somar esforços meus...

5.
Em noites de céu escuro,
Quando não se pode vê-las,
É nosso anseio mais puro
Que acende a luz das estrelas.

6.
Não tenhas temor de nada,
Se vives honesto e bom.
Não se resume a trovoada
A um pouco de luz e som?

7.
Se a vida é duro embate
Que aos fracos sói abater,
“Combater o bom combate”
É “ajudar a viver”.

8.
Para que o esforço não falhe,
Pondo a perder a intenção,
Atente a cada detalhe,
Busque sempre a perfeição.

9.
O homem procura Deus
Com forte sede e incerteza
E, bem em frente aos olhos seus,
Está Deus na Natureza.

10.
Homem, meu filho, merece,
Esse nome, o que porfia
Em trabalho, amor e prece,
Nas lides de cada dia.

11.
Filho não é prevenção,
Cofre, poupança ou seguro;
Filho é carta de intenção
Que se consigna ao futuro.

12.
Temor é morte, variante
Escrita em modo invertido.
Temer é morrer bem antes
De enfrentar o que é temido.

13.
Temor a Deus? Não concordo
Nem penso viver ao léu.
Com Deus me deito e me acordo
E a Terra com ele é Céu.

14.
Consciente, sereno, altivo,
Em todo e qualquer momento
Deve ser o objetivo
Do cultor do pensamento.

15.
A força que reverdece
O coração sofredor
Provem do alívio da prece
Que vence tristeza e dor.
16.
A vida é para brilhar,
Deve o homem ser feliz;
Em vez de o vício adotar,
Corte o mal pela raiz.

17.
Na vida terás franquia,
Ao nascer, com esta certeza:
A cada meia alegria
Haverá uma tristeza.

18.
A mente lúcida, aberta
À incerta natureza,
Só de uma coisa está certa:
É impossível ter certeza.

19.
Assim vai a Humanidade,
Metade em alegre boemia,
Enquanto a outra metade
Restam suor e porfia.

20.
Temor eu tenho de, um dia,
Descobrir que não vivi
Aventuras, fantasias,
Somente porque as temi.

21.
É hora, de vez por todas,
De deixar da vida a esmo;
Pretendo contrair bodas
E viver comigo ... mesmo.
22.
Se o progresso é despedida
De tudo bom que conheço,
A ir pra frente na vida
Prefiro ir ... de regresso.

23.
“- Ajuda!” – diz meu netinho,
Sempre que quer um socorro.
E corro, vou ligeirinho,
Que ao meu futuro que corro.

24.
Tem sido uma dura andança
Toda minha vida a buscar
Sossego, paz e bonança
... se a tempestade passar.

25.
A natureza, com sono,
Chega a mudar de estação,
Pra descansar, no outono,
Dos excessos do verão.

26.
Querer nem sempre é poder,
Mas, se pudesse eu queria
Deixar de inútil querer:
Seu eu quisesse, poderia?

27.
Nos burburinhos urbanos,
Em que a vida perde a graça,
Uns toques restam, humanos,
No bucolismo da praça..

28.
Caminhava eu num sentido,
Em outro ela, com graça,
Nosso mundo resumido
Em nosso encontro na praça.

29
Causa a distância, querida,
Imenso dó que assim meço:
Maior a dor da partida,
Mais o prazer do regresso.

30.
Se, no Juízo Final
For dar meu depoimento
Contra ti e por teu mal,
Serei réu de esquecimento.

31.
Meu amor é assim, total,
Por isso posso afirmar
Que se ele te fizer mal
Renuncio a te amar.

TROVAS DE LOUVAÇÃO

A uma cidade, cujo nome já é um verso perfeito;
a personalidades dignas de encômios:

1.
Redondilha que seduz,
Cantá-la bem nos compete;
Reluz a antiga Queluz,
Conselheiro Lafaiete!

2.
Luiz Otávio, é a prova
De que é capaz a poesia
De resistir pela trova:
LuizOtáviomania... (1)

3.
Do país que atravessaste
Em aturados estudos,
Euclydes, tu nos deixaste
A epopéia de Canudos.

4.
Luiz da Câmara Cascudo,
Para que o Brasil melhore,
Fixou-lhe, em amplo estudo,
Como é rico o seu folclore...

5.
Em quatro versos, concisa,
Clara, completa, notável,
A trova sempre realiza
O ideal de Luiz Otávio.

6.
Caxias, tu és legenda
De civismo, força e glória,
Sereno em qualquer contenda,
Bondoso, em qualquer vitória...

7.
Ao coibir-lhe agravos,
As tuas ordens, Caxias,
Dão lições aos nossos bravos
De humanismo e fidalguias.

Fonte:
Academia de Letras de Viçosa
http://www.alv.org.br/

Rio Grande do Sul em Trovas

(id: MCCXXX)

Era uma cena tão linda,
cheia de plantas e flores,
e nessa beleza infinda
brilhava com muitas cores!
Alexandre Amaral Trindade (12 anos)

Saudade, grande saudade
daquele alguém especial,
da nossa felicidade
que teve um doce final!
Alexandre Amaral Trindade (12 anos)

O mar... A praia... Saudade!
Lindas ondas relembrando,
me trazem felicidade
e eu continuo sonhando!
Alexandre Amaral Trindade (12 anos)

Mamãe é uma linda flor,
toda cheia de ternura,
ela me enche de amor,
com sua alma linda e pura!
Alessandro Deickel Trindade (9 anos)

Quando a vida tiver fim
hei de sempre ser lembrado
pois deixo um pouco de mim
em cada órgão doado.
Alice Cristina Velho Brandão

Cada gotinha de orvalho,
sorvida por uma flor,
revela, de galho em galho,
uma "promessa" de amor...
Amália Marie Gerda Bornheim

Se a velhice, queres, calma,
e prazer em tua lida,
a primavera põe n’alma
junto ao inverno da vida!
Anita Gonzáles

Meu amor vive distante,
lá do outro lado do mar.
A saudade,a todo instante,
é que vem me visitar!
Antônia Nery

Voa, sim, gaivota, voa,
vai contar ao meu amor
que vivo chorando à toa
tão grande é a minha dor!
Antônia Nery

Perdida no teu abraço
esqueço o mundo lá fora,
flutuo em tempo e espaço,
para mim só existe o agora!
Antônia Nery

Saudade tem um jeitinho
que comove e faz sofrer.
Chega sempre de mansinho,
não depende do querer.
Antonia Viana Machado

Precisamos entender
a vontade do senhor.
Quão importante é crescer,
em nosso mundo interior!
Antonio Nely Fardo

Quanta família sofrida!...
Quanto jovem se destrói!
- as drogas, ceifando a vida,
é uma verdade que dói!
Antonio Vogel Spanemberg

A dor que mais dói na gente
é ver um sonho desfeito,
o coração de repente
parece estourar o peito.
Arlete Sacramento

Chamam-me velho, nem ligo.
Vejam só minha atitude:
olhando meus filhos, digo:
-alí vou com juventude.
Arlete Sacramento

Os ventos de meus caminhos
são tristes recordações,
levaram tantos carinhos,
deixaram mil ilusões...
Arlete Sacramento

A minha alma renasceu
num renascer de emoção!
A alegria não morreu,
vive no meu coração!
Átila Amaral Trindade

Apesar dos meus pesares,
ainda tenho confiança,
de cantar, nos meus cantares,
as notas de uma esperança!
Beatriz Castro

Ternura bateu-me à porta,
com simplicidade entrou
e aquela ilusão já morta,
aos poucos , ressucitou!
Beatriz Castro

Eu queria ser feliz,
Deus me deu sabedoria.
Era um simples aprendiz,
virei mestre da alegria.
Carmen Pio

Esta tão bela amizade,
cheia de recordações,
nos envolve de saudade,
sempre em nossos corações.
Carmen Pio

No caminho desta vida,
amparado nas lembranças,
é você filha querida,
que me faz ter esperanças.
Carmen Pio

A sabedoria alenta,
é o pilar do renascer,
é coluna que sustenta,
nos ensinando a viver.
Carmen Pio

O caminho me fascina,
as lembranças me sustentam,
a saudade me ilumina,
e as emoções só aumentam.
Carmen Pio

Teu caminho foi tão belo,
de virtudes tua vida,
teu gesto sempre singelo,
enobrece tua partida.
Carmen Pio

Sabedoria é serena,
engrandece nossa alma,
deixa a vida mais amena,
tranqüila, dócil e calma.
Carmen Pio

Buscar a sabedoria,
é um ato virtuoso,
é o caminho e é o guia,
para um mundo harmonioso.
Carmen Pio

Sabedoria é a fonte,
de toda a felicidade,
faça dela sua ponte,
de encontro com a humanidade.
Carmen Pio

No silêncio da saudade,
todo envolto de magia,
clamo por felicidade,
chega triste nostalgia.
Carmen Pio

Ó bairro que me inspirou
com sua paz e harmonia.
E a Deus Pai me elevou
com sua oculta magia.
Carmen Pio

Encantada com a beleza
deste rio, belo espelho,
eu me integro à natureza,
coberta de sol vermelho.
Carmen Pio

Uma doce intuição,
explode dentro do peito.
E uma mais linda emoção,
acontece no meu leito.
Carmen Pio

A rima é como balanço,
das águas verdes do mar,
é harmonia que alcanço,
na beleza do trovar.
Carmen Pio

Sonhei em ser bela trova.
Acordei ao lado teu.
Nosso doce amor comprova,
a vida é você e eu.
Carmen Pio

Tive a honra de ingressar,
Na confraria do amor,
Com meus irmãos exaltar,
A trova com muito ardor.
Carmen Pio


Tudo aquilo que foi dito
poderá ser reparado,
mas o que ficou escrito
não pode mais ser mudado.
Cássia Luísa Bolson

Sopra, ó vento, as nuvens rasas,
pelo verde pampa em flor,
transportando em tuas asas,
meu sonho de trovador!
Cláudio Derli

Mãos que ajudam... Mãos seguras,
contra a fome e contra a dor,
formam elos de ternuras
numa corrente de amor!
Cláudio Derli

Comparo o viver sozinho
e, que muita gente tem,
à tristeza de um caminho
onde não passa ninguém.
Conrado da Rosa

Quando acode aos meus apelos,
faz o tempo rodopiar.
Traz a noite nos cabelos,
a madrugada no olhar.
Conrado da Rosa

Eu sempre te quis pra mim
mas nunca soube dizer,
que te amava tanto assim,
por isso vivo a sofrer!
Dalvina Fagundes Ebling

Olho o céu, olho o infinito,
e relembro minha andança,
lembro o momento bonito
do meu tempo de criança!
Dalvina Fagundes Ebling

Beber sorrisos de aurora,
sentir tristezas de ocaso,
é transformar nosso agora
na beleza de um parnaso!
Delcy Canalles

Eu vejo deus na magia
dos versos simples que teço
deus é rima, amor, poesia,
é fim, é meio, é começo!
Delcy Canalles

A manhã sorri contente,
ante a beleza da aurora
e tem pena do poente
que, à tardinha, triste, chora!
Delcy Canalles

Cavalgando o "minuano"
eu sigo, em frente, risonho,
sou tropeirista aragano,
que monta o vento do sonho!
Delcy Canalles

Sem amor, envelheci,
hoje é que vejo, sentida,
que em verdade eu não vivi,
pois sem amor, não há vida!
Delcy Canalles

Cavalgando a fantasia
eu sigo, em frente, risonho.
Ponho no céu da poesia
todo o luar do meu sonho!
Delcy Canalles

A frágil rosa em seu galho
depois que o vento passou,
desfolhou-se sobre o orvalho
que a madrugada deixou!
Doralice Gomes da Rosa

À tardinha, o sol já posto,
com arabescos tristonhos,
vai desenhando teu rosto
na vidraça dos meus sonhos!
Doralice Gomes da Rosa

Sinto em cada trova escrita
que a saudade amarelou,
a lembrança mais bonita,
que tua ausência deixou!
Doralice Gomes da Rosa

Teus olhos trazem mensagem
de luz, de amor e carinho...
São dois fachos de coragem
brilhando no meu caminho.
Doralice Gomes da Rosa

Sonhei, em loucos desejos,
ser um beija-flor colosso,
fechando um colar de beijos
na curva do teu pescoço.
Doralice Gomes da Rosa

O sol e a lua se amaram
às escondidas, ao léu.
Tempos depois despontaram
milhões de estrelas no céu.
Doralice Gomes da Rosa

Este amor que nós vivemos
se eterniza a cada hora,
tanto que nos esquecemos
que existe um mundo lá fora...
Doralice Gomes da Rosa

Se o ódio promove a guerra,
se a esperança se desfaz,
que do amor que ainda há na terra,
brotem cascatas de paz!
Éderson Juliano Savi Pauletti

Se o infinito profundo
cabe inteiro no meu "eu",
bem menor é o vasto mundo
que o desejo de ser teu!
Eldo Ivo Klain

Amizade é como a rosa,
cultivada com ardor.
Continuará mais formosa,
se regada com amor.
Elisabete Beatriz de Lima Scholz

Um beijo roubado às pressas
e de forma singular
pode aguçar as promessas
e dar foto ao pé do altar...
Eloy de Oliveira Fardo

Em ternura plena e extrema,
nossos sonhos se cruzaram!
E a noite se fez poema...
E os versos também se amaram!...
Flávio Roberto Stefani

De manhã, sugando amores,
nesses teus lábios de paz,
provo todos os sabores,
nos sabores que me dás.
Flávio Roberto Stefani

Pela magia do vento,
que leva a semente ao léu,
elevo meu pensamento,
para as lavouras do céu!
Flávio Roberto Stefani

Meu senhor, quero sentir,
de uma forma singular,
a coragem de sorrir,
quando o dia é de chorar.
Flávio Roberto Stefani

Quando a tristeza me alcança,
vencido pelos cansaços,
iço a vela da esperança,
rumo ao porto dos teus braços.
Flávio Roberto Stefani

Mágoas são queixas que a gente,
sem querer, pelas jornadas,
deixa escorrer lentamente
no rosto das madrugadas.
Flávio Roberto Stefani

Meia luz... Noite... A vidraça...
A cama... Beijo... E depois...
Um brinde... O champanhe... A taça...
O amor... O sonho... Nós dois...
Flávio Roberto Stefani

Sou feliz por um segundo
quando o amor encurta espaços
e a fronteira do meu mundo
toma a forma dos teus braços!
Gerson César Souza

Por ter deus que me socorre,
ante a dor, não perco a calma:
a fé é o sangue que corre
pelas veias de minha alma!
Gerson César Souza

Um exemplo que dá gosto
e vontade de viver
é o sol que depois de posto
sempre volta a renascer.
Gerson César Souza

Deus fez todo o universo
criou os mares e as flores,
e para compor seu verso
deu a rima aos trovadores!
Gisele Bueno Pinto

Se nada existir na vida,
se até o sonho fugir,
hei de encontrar-te, querida,
na hora de ressurgir!
Gisele Bueno Pinto

Só quero ter nesta vida
ombro amigo e peito irmão,
anatomia querida
em forma de coração!
Gisele Bueno Pinto

Quero cantar pelo espaço
e, nas estrelas, rever
todas as trovas que eu faço.
Trova é prece em meu viver!
Gislaine Canales

Vivemos juntos, mas sós,
nossa solidão somada,
fez de ti, de mim, de nós,
a soma triste do nada!
Gislaine Canales

Sozinhas nas madrugadas,
donas do mundo e da lua,
nossas mãos entrelaçadas
seguem juntas pela rua!
Gislaine Canales

A mistura de mil cores
e toda a luz do universo,
mais o perfume das flores,
desejo pôr no meu verso!
Gislaine Canales

O sol dourado se espraia
tão lindo com seu calor,
por toda a areia da praia
em doces beijos de amor!
Gislaine Canales

A minha vida é uma trova,
trova de ilusão perdida,
pois a vida é grande prova,
que prova a trova da vida!
Gislaine Canales

Eu quero poder cantar
meus versos aos quatro cantos,
talvez possa transformar
em risos, todos os prantos
Gislaine Canales

Da vida o mais doce encanto
é recordar na velhice,
o maternal acalanto
dos dias da meninice.
Hugo Ramirez

Bebendo o mel dos afagos
das prendas de que sou rei,
sou monarca destes pagos,
onde livre me criei...
Hugo Ramirez

Ai ! Que seria da gente,
neste mundo de amargura,
sem o bálsamo clemente
que nos oferta a ternura!
Hugo Ramirez

Ah, se eu pudesse voltar,
aos tempos de antigamente!
Não teria em meu olhar
esta angústia tão presente!
Irene Canalles

Eu amava tanto...tanto...
Que meu coração cansou.
Hoje vivo do acalanto
que aquele amor me deixou.
Irene Canalles

Meu passado foi um sonho,
e tudo que já passou,
reflete em meu ser tristonho
a saudade que ficou!
Irene Canalles

Fiz um castelo de areia
naquela duna branquinha,
veio o vento e a maré cheia,
levaram tudo que eu tinha!
Irene Canalles

Teus olhos, linda gaúcha,
são flechas de poesia,
paixão real que me puxa
num breve toque-magia.
Israel Lopes

Na rocha em contínuas rondas,
a noite, o farol reluz,
ao refletir sobre as ondas
grandes pingentes de luz!
Ivan Soares Schettert

Mãe é a grande fortaleza,
plena de amor e emoção!
a mais bela realeza
que te ampara na aflição!
Ivani de Souza

Amigo é preciosidade
fazê-lo é grande ciência,
a beleza da amizade
é o novo sol da existência!
João de Souza Machado

Ao sentir a alma perdida
na procura da esperança,
há momentos nessa vida
em que sonho ser criança!
José Westphalen Correa

A visão que me produz
um vaga -lume na altura,
me lembra um pingo de luz
brilhando na noite escura...
Lacy José Raymundi

Minha memória procura,
nos armazéns da lembrança,
os fardos de travessura,
dos bons tempos de criança!...
Lacy José Raymundi

A seca se foi embora,
a chuva do céu derrama
e eu juro que ouvi, lá fora,
as gargalhadas da grama!
Lacy José Raymundi

Foi na ânsia de alcançar
um porvir doce e risonho,
que olvidei de alicerçar
as escadas do meu sonho!
Lisete Johnson Oliveira

Perdão...as ondas pediam
para as areias do mar,
que em volúpia se despiam
com o incessante beijar!
Lisete Johnson Oliveira

Enquanto houver um luar
e um sol, cheio de esplendor,
há de se ouvir o cantar
da lira de um trovador.
Lisete Johnson Oliveira

Pulsa tanto neste peito,
um coração tão febril,
quando mira o vago leito
com sombras do teu perfil!
Lisete Johnson Oliveira

Nosso amor inconfessado,
tão silencioso e prudente,
foi desejo refreado,
foi luz de estrela cadente.
Lisete Johnson Oliveira

Inconstância é estar contigo,
tudo tem duplo valor;
busco o amor, encontro o amigo,
busco o amigo, encontro o amor...
Lisete Johnson Oliveira

Às vezes, doces sonatas,
noutras, preces de louvor;
sempre belas serenatas
tuas confissões de amor!
Lisete Johnson Oliveira

Nas lembranças do passado
tantos sonhos eu gravei,
hoje, releio apressado
as mensagens que arquivei.
Luiz Damo

Estes brinquedos guardados
reduzem qualquer distância,
pois são eles, empoeirados,
que eternizam minha infância.
Luiz Machado Stabile

Quando não puder bater,
em teu peito o coração,
salva a vida de outro ser
na sublime doação.
Lydia Lauer

Na trajetória da vida
às vezes, fico tristonho,
depois encontro guarida,
porque sou filho de um sonho!
Manoela Ajalla Paz

Pela fé, seguir o rumo
da paz que nos fortalece,
é simplesmente em resumo,
amor em forma de prece...
Maria Cardoso Zurlo

Neste mundo de violência,
tem a criança um porvir,
porque deus, pai da existência,
faz sempre a rosa se abrir!
Maria Dorneles

Silêncio, a alma liberta
voando na imensidão,
encontra uma porta aberta
à sublime inspiração!
Maria Dorneles

Este amor adormecido
foi, de repente, acordar,
descompassado e perdido,
na dança do teu olhar.
Maria Dorneles

Vôo nas asas do vento
por rumos desconhecidos
e, nesse voar, eu tento,
achar mil sonhos perdidos.
Maria Helena Binelli Catan

Chegou num jeito sem jeito
de bombacha, bota e espora,
fez morada no meu peito
e nunca mais foi embora.
Maria Pampin

São teus beijos, a magia,
que me acalma e alimenta,
trazem luz, muita alegria
se uma nuvem atormenta.
Marilene Bueno da Silveira

Numa vida com agruras,
se a magia fortalece,
nossos filhos são canduras
– e os netos? – são nossa prece!
Marilene Bueno da Silveira

Renovemos nossos dias
com muita dedicação,
transformando em alegrias
as dores do coração!
Marilene Bueno da Silveira

Quando o "minuano" assobia,
rasgando o espaço, imponente,
é um vendaval de poesia,
soprando na alma da gente!
Marisa Vieira Olivaes

Não há vazio mais triste,
nada mais à alma fala
do que o silêncio que existe,
quando a voz do amor se cala!...
Marisa Vieira Olivaes

A lua, cantada em verso,
o sol, ardente e fecundo,
são luzeiros do universo,
clareando os pagos do mundo!
Marisa Vieira Olivaes

Quando as luzes se apagarem
e a terra, em fendas, se abrir,
se dois corações restarem,
a vida há de ressurgir!
Marisa Vieira Olivaes

De lembranças vou vivendo
abraçada à solidão...
- e a saudade... Vou moendo
na usina do coração!...
Marisa Vieira Olivaes

Um cenário de magia
surge aos versos que componho:
- um reator de poesia
na imensa usina do sonho!
Marisa Vieira Olivaes

Na altivez com que te portas
desdenhando o meu carinho,
transformas em linhas tortas
as retas do meu caminho...!
Marisa Vieira Olivaes

As poças d’água da rua
brincam de espelho quebrado,
há, em cada poça, uma lua,
e um belo céu estrelado!
Marlê Beatriz Araújo

Peço ao vento cirandeiro
das madrugadas de outono,
que seja o meu seresteiro,
mas que não me roube o sono!
Marlê Beatriz Araújo

É na ciranda das horas
que passam todas as juras
passam também as demoras
e até mesmo as amarguras!
Marlê Beatriz Araújo

Do sonho surgiu a trova
que, perspicaz, nos conduz,
a vida que se renova
em rimas, plenas de luz!
Marlê Beatriz Araújo

Há, na beleza selvagem
que a cascata canta, em festa,
emocionante mensagem
de quem criou a floresta!
Marlê Beatriz Araújo

Bendigo essa luz que um dia
em minha estrada brilhou,
e resgatou a alegria
que o tempo quase apagou.
Marlê Beatriz Araújo

Tem sabor de eternidade
esta saudade atrevida,
quando se instala, à vontade,
na história da minha vida.
Marlê Beatriz Araújo

Contigo sempre reparto
este amor que não termina:
é na penumbra do quarto
que o nosso amor se ilumina.
Milton Sebastião Souza

Quando qualquer luz se acende
faz a vida ressurgir.
A própria sombra depende
de uma luz para existir.
Milton Sebastião Souza

Mesmo estando atarefado,
de dois vícios eu não largo:
do teu beijo adocicado
e o chimarrão sempre amargo.
Milton Sebastião Souza

Esta minha alma indecisa
não consegue se aquietar:
mal um sonho realiza,
outro sonho quer buscar...
Milton Sebastião Souza

A luz da estrela, em fulgores,
vence o universo profundo
eenchendo o espaço de cores
enfeita as noites do mundo...
Milton Sebastião Souza

Mal termina a serenata
um silêncio sorrateiro
derrama gotas de prata
no rosto do seresteiro...
Milton Sebastião Souza

O pai, virando um brinquedo
nas mãos do filho petiz
vai lapidando, em segredo,
o adolescente feliz!
Milton Sebastião Souza

Felicidade, na vida,
quem sabe, mal comparando,
é como a chuva caída
que vai e acaba voltando.
Nelson Fachinelli

Eu que vivi de poesia
quando eu morrer, por favor:
-quero festa de alegria,
sem uma lágrima ou dor.
Nelson Fachinelli

Conhecendo bem o mundo,
aconselho a mocidade:
fazer, de cada segundo,
momento de eternidade!
Nelson Fachinelli

Se a vida me põe à prova,
não há nada que me oprima,
meu psicólogo é a trova
e o meu analista, a rima!
Neoly de Oliveira Vargas

Tanto ódio!...tanta guerra!...
Mandai "bons ventos", senhor,
aos quatro cantos da terra,
somente espalhando amor!
Neoly de Oliveira Vargas

Natal! No pobre ranchinho,
a mãe ao bom deus bendiz,
acalentando o filhinho
a cantar..."noite feliz..."
Neoly de Oliveira Vargas

Que lindo é um céu estrelado
numa noite azul-turquesa
parece um manto bordado
nos ombros da natureza!
Nilza Castro

Meu chimarrão é um charrua
na verde seiva pisada...
É um beijo de prata e lua,
no apojo da madrugada!
Nilza Castro

Eu gosto muito de flores,
rosa, branca, qualquer cor,
mas o tom dos meus amores
é rubro, que é cor do amor!
Renata Canales

Eu fiz da saudade a marca
de minha ilusão perdida,
e de meu verso uma tarca
para marcar minha vida.
Rui Cardoso Nunes

Quando me paro cismando,
eu sinto, meio bisonho,
o vento do amor soprando
nas cordilheiras do sonho!
Severino Silveira de Sousa

Meus versos, por excelência,
augurando amor e calma,
são "radiações da consciência"
enluarando minha alma!
Severino Silveira de Sousa

Pensa em tudo que fizeres,
ampara, serve e perdoa.
Socorre o quanto puderes,
consola, passa e perdoa.
Severino Silveira de Sousa

Quem nunca teve um amor
vive uma vida sem vida,
sem carícia, sem ardor,
como uma sombra perdida!
Sidarta da Rosa Soares

Busquei a felicidade
por todo lugar que andei,
para dizer a verdade
só procurei, não achei!
Sílvia Benedetti

Um sorriso de criança
mostra um momento profundo
onde vigora a esperança
de ressurgir novo mundo!
Taciana Canales da Trindade

Cometo qualquer loucura,
das convenções rompo os laços,
só para ter a ventura
de amanhecer nos teus braços!
Wilma Mello Cavalheiro

Meu instante é mais bonito,
e o desejo amplia os laços
quando chego ao infinito,
e volto à terra em teus braços.
Wilma Mello Cavalheiro

Minuano teus intentos,
comprovam, em forte estampa,
que és o corsário dos ventos
na imensidão do meu pampa!
Wilma Mello Cavalheiro

Consola a dor na esperança
que à vida sempre conduz.
Quem não teme, tudo alcança,
transformando a dor em luz.
Zélia Maria de Nardi

Tens nos olhos a poesia
das noites enluaradas,
tens no sorriso a magia
e o frescor das madrugadas.
Zeno Cardoso Nunes

Os netos são a esperança,
são momentos de alegria,
lembrando sempre a criança
que já fomos algum dia!
Zuleika Ribeiro Edler

Fonte:
http://ubtportoalegre.portalcen.org/html/gauchos.html

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Caldeirão Literário do Estado do Acre

(id: MCCXXIX)

Jorge Tufic (A origem da Noite)

A Noite era um fantasma que se repartia
entre a luz e a escuridão.

Um lado desse fantasma era escuro e feio.
O outro lado era claro e bonito.

Nãmi, era como se chamava o dono da Noite.

Os grilos teciam as folhagens do sono
enquanto o pássaro japu tratava de afastar,
com seu bico,
as cortinas da madrugada.

Antes de dar a Noite a seus netos,
Nãmi comeu ipadu e fumou olé-o (cigarro).

O resto dessa estória ninguém sabe,
porque uma parte dela ficou com a Gente da Noite
e a outra parte ficou com a Gente do Dia.

Jorge Tufic (Makunaíma Recria o Mundo)

Depois das águas grandes,
o mundo ficou seco e oco.
Pedaços de carvão ficaram rolando no solo,
como ecos de pedras,
vozes de rio, gemidos de fogo.
Então, Makunaíma acordou.
E do barro de sua vigília
retirou aquele homem, sua forma de barco,
seu peito cavado.

No outro lado de Roraima
seus feitos continuaram.
Homens e mulheres foram sendo mudados
em rochas, antas e javalis.
Perto de Koimelemong, um cervo
mergulha na terra a cabeça-de-pedra.
Sobre uma grande onda na Serra de Aruaiang,
pousa uma cesta de luar.
A Serra do Mel parece conduzir
um silêncio de aragem
e vai sem ter vindo.

Muitas dessas pedras se elevam
No país dos ingleses, assim como peixes
E uma cesta que imita, por baixo,
Um perfil de mulher.

A savana da Serra de Mairani
são braços, pernas e cabeça
de um ladrão de urucu.
Aí também se entreabrem umas nádegas de pedra.
Cachoeiras acima,
o movimento dos peixes adentra na rocha.

Uma pedra chamada Mutum
canta como este
quando alguém vai morrer.
vespas gigantes construíram suas casas
e zumbem na base mais profunda da serra.

Aqui fora, Makunaíma dá os últimos retoques
Nos bichos domésticos.
Depois disso ele deita na terra molhada
e se deixa esvair em milhares de seres
que nadam para o rio.

Jorge Tufic (Cartago Fui Eu)

Canta um pássaro morto sobre o dia
que a muitos outros já se misturou
algo abaixo dos ramos silencia,
treme a terra na pedra que restou.

Vem de que mares essa nostalgia
que meus ossos fenícios engessou?
De Cartago, talvez, da noite fria
transformada no pássaro que sou.

Esse canto noturno me extenua.
Vem de Cartago, sim; da negra lua
por dono o sol que abrasa, mas festeja.

Esplende a noite em látegos de urtiga.
Brinda-se à morte ao cálice da intriga.
Meu corpo, feito escombros, relampeja.

Jorge Tufic (O Desencontro)

Uma folha tremula
sobre o branco aflitivo dos garfos.

Passado & futuro
são fronteiras de aragem.

Formigas saem das tocas
ganham asas de louça.

Cristais se fundem
no brinde sem eco.

Jorge Tufic (Fragmento)

À tarde e à noite
o poeta está ausente.
Relógio e calendário
ficaram do avesso.
Ele usa a freqüência dos búzios
e capta as notícias que envelhecem
antes da letra e do chumbo.

Percebe, então, que falta um elo
para cada coisa.

Possivelmente indecifrável.

Jorge Tufic (Prospecção)

Ninguém te vê.
Só os ventos te penetram.

Ninguém que esteja saciado
ou faminto
necessita de ti.

Neste exato sem nome
reintegra-te à nuvem que passa
e ao canto das aves.

o poeta, já o disse,
é um ser transparente.

Invicto. Desnecessário
entre porcos, hienas
e outros viventes

solidariamente incompletos.

Jorge Tufic (As Três Porcas)

Uma coisa me olha desde que nasci.
Outra coisa me suga.
E ainda sobra uma terceira
que, lenta e pacientemente,
vai desfolhando os meus dias
como quem toca um realejo.

Jorge Tufic (De Ônibus, pelo Sertão)

Lá fora, o diameno.
Bloqueio de trevas,
cysne,
cântico de agulhas.

Em busca desse dia
eu parto: noutras paragens,
decerto,
há homens e bichos
que disputam vitórias,
se matam.

Mas aqui, só nuvens
rascunham fugacidades.
Paisagens, velozes,
não passam por mim.

Atravessamo-nos, apenas.
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JORGE TUFIC (1930- )
Nasceu em Sena Madureira, no Acre e reside em Fortaleza, Ceará, Brasil.
“Aí começou aos sete anos de idade, a ouvir o ponteio das violas sertanejas, acompanhando as trovas, os repentes e as saudades dos soldados da borracha, filhos do nordeste brasileiro.”
Mais de quarenta títulos publicados, entre prosa e poesia,. Os versos a seguir espelham melhor a sua biografia e a sua geografia humana.
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Valquíria Raizer (Dos ipês)

De um amarelo
Impositivo
Flutuante


(cambio, desligo)


As garrafas de fanta
Parecem tão laranja
(ali)


A escada
Tem muitos
(degraus)


Prego
Cada uma
(a seu tempo)

Valquíria Raizer (Laranjas e fantas)

Eu te avisei!
...disse Mário com cara de Maria...
(como se houvesse menos multa
quando se buzina antes de passar o sinal)

Avisou sim é verdade,
mas queria não ser entendido.
Avisou só por desencargo.
E isso não conta.

Disse que o ipê floria,
que era amarelo e só.
Disse que era desse jeito todos os anos,
e que não pensava em mudar.

Mas o ipê muda Mário,
e sou eu
é que estou te avisando.

Há de nascer laranjas nele...

Se não nascer eu mesma subo
e prego umas garrafas de fanta.

Valquíria Raizer (Reticências)

vou escrever qualquer coisa
que não pareça
nada
( ! )

esse tudo
é mesmo
o que
(devasta)

Valquíria Raizer (Coração estranho)

Um coração estranho
E uma alma
Torta

Um coração
Estranho
E uma alma
Torta

Olha pra mim
Vê o que vês
Olha (!)
É só uma
Alma torta

Do que tens medo
Medo de quê
Sou só mais uma alma
Torta

Valquíria Raizer (Aceleração)

...é como se tudo tivesse
girando
Um giro calmo
(e calculado)

Um giro bom
(pro mundo)

Mas o mundo
(é grande)
E não precisa de mim
( e de ti)

Mas eu, querida
Eu preciso do mundo
E ele está aí
(flertando)

Valquíria Raizer (Katauê)

O miolo dentro da casca
(pão)

O miolo dentro
( da casca)

A casca virando


O miolo
O miolo
Miolo

Poderia
Correr
Sem
Léguas
(cem)

Um colar de castanha elétrica
Uma flor amarela
Muru

(estou tão acremente despida hoje que o açai perdeu a cor)
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WALQUÍRIA RAIZER

graduou-se em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Acre e especializou-se em Jornalismo Político pelo Centro Educacional Uninorte. Devido ao engajamento pessoal com as manifestações culturais, tem o histórico profissional voltado para a política cultural. Amazônida, escritora e poetisa, publica seus textos em diversos sites amazônicos. Defende a poesia como matéria prima de todas as artes. "A poesia antecede a escrita: é sentimento." Escreve no desterro21 (http://desterro21.blogspot.com/) e no Um caso Poético (http://umcasopoetico.blogspot.com/).
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Fonte:
http://www.antoniomiranda.com.br
/

Caldeirão Literário do Estado do Maranhão

(id: MCCXXVIII)

Adailton Medeiros (Auto-Retrato)

Diante do espelho grande do tempo
sinto asco
tenho ódio
descubro que não sou mais menino
Aos 50 anos (hoje — 16 / 7 / 88 (câncer) sábado — e sempre
com medo olhando para trás e para os lados)
questiono-me (lagarto sem rabo):
— como deve ser bom
nascer crescer envelhecer e morrer

Diante do espelho grande na porta
(o nascido no jirau: meu nobre catre) choro-me:
feto asno velhote pétreo ser incomunicável
sem qualquer detalhe que eu goste
(Um espermatozóide feio e raquítico)

Como nas cartas do tarô onde me leio
— eis-me aqui espelho grande quebrado ao meio
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ADAILTON MEDEIROS
Nasceu em Caxias, Maranhão, em 1930 e estudou jornalismo em Niterói, Rio de Janeiro., e depois mestrado na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Livros de poesia: O Sol Fala aos Sete Reis das Leis das Aves e Bandeira Vermelha.
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Lago Burnett (O Copo D´Água)

O copo d´água. Insípido
entre o pássaro e a lâmpada.
Lúcido e líquido.

Listras de sol passeiam-lhe a superfície
sem excessos matinais de azul-desperto.
Luz flutuante, o mundo transparente,
o copo dágua resiste.

Sólida contextura, as
firmes paredes de vidro unânimes, eternas,
equilibram o milagre.

O copo dágua. insípido
na antenoite sonora. Simples,
lúcido e líquido.
(Os Elementos do Mito / l953)

Lago Burnett (A Última Canção da Ilha)

Trarei sempre verde
gaivotas e sal:
a lembrança não perde
a ilha inicial

Nem descuido as brisas
o mar de imundícies
(minhas pesquisas
bóiam às superfícies)

A obsessão do cerco
por ínvias águas
é o em que me perco
entre — agora — mágoas

Autêntico Atlântico
aleou-me todo
quanto de romântico
mergulhou-me em lodo

Oh! velas belas
ao ritmo transeunte
vosso, belas velas
que eu me unte

Trago-me à retina
de mastros e quilhas
cheia a sina
de todas as ilhas

Código pressago
de pássaro marítimo
na alma trago
canto e ritmo

Que é quanto me sobre
por ter-me feliz
ao sol que encobre
minha São Luís

Onde era só
com hábil engenho
quanto virou pó
tudo que não tenho

Idéias descalças
desfiando saias
longas como valsas
pelas praias

A primeira estância
ao céu abstrato
coisas como infância
ritmando com mato

Outros poucos casos
como águas insípidas
Nos olhos rasos
saudades liquidas

(Os Elementos do Mito / l953)
===================


LAGO BURNETT
(1929-1995)
José Carlos Lago Burnett é natural da cidade de São Luis do Maranhão, onde atuou intensamente na imprensa e em veículos de cultura com Bandeira Tribuzi e Ferreira Gullar. Considerado um dos expoentes da Geração de 45, passou a exercer atividade jornalística no Rio de Janeiro, principalmente no Jornal do Brasil.
Obra poética: Estrela do céu perdido (1949), 50 poemas (1959).
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Dunshee de Abranches (A Selva)

De pé, no tombadilho, olhos fitos no espaço,
Colombo, palpitante, estende o forte braço,
aos capitães mostrando, ao longe, sobre a esteira
dos negros vagalhões a luz de uma fogueira...
Há três noites velava, há três noites sentia
a esperança deixar-lhe o peito, e a fàntasia
fugir-lhe já também. Rugiam os porões
de fome e de cansaço... e ocas conspirações
iam lentas mudando a bruta marinhagem
o amor do comandante em amor à carnagem.
Há três luas partira a frota de Castela;
e em cada uma lufada a enfunar a vela
em toda a aurora nova, em todo o novo ocaso,
mais a pátria fugia, e mais e mais o acaso,
impávido matava as velhas tradições,
mostrando a cada instante aos crentes corações
que o Caos inda era a luz, que o Abismo inda era o mar!
Jamais se vira um monstro, um só, se levantar
por sobre os vagalhões, grandíloquo, medonho,
como a Grécia sentiu nesse homérico sonho
que os templos levantou e fez as Odisséias.

Dunshee de Abranches (O Violino do Artista)

Só lhe restava o mágico violino
nessa vida de eterno sofrimento;
único amigo, um outro peregrino
na rota desgraçada do talento.

Como sentia o mísero instrumento,
nessa alma rude, um lenho pequenino,
que tinha em mãos do dono um sentimento
que era "mais do que humano, era divino!"

E juntos iam no fulgor das cenas
confundir num adágio as suas penas,
irmãos na glória, gêmeos no tormento!...

Mas morto um dia o artista, gente absurda
quis tocá-lo... mas ah! tinha a alma surda...
já não sentia o mísero instrumento!...
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DUNSHEE DE ABRANCHES
(1867 - 1941)
Dunshee de Abranches (pseudônimo: Rabagas), romancista, poeta, jornalista, orador
nasceu em 1867 em São Luís do Maranhão e faleceu em Petrópolis, em 1941.
Romancista, poeta, jornalista, orador
Obra poética: Cartas de Um Sebastianista (1895), Minha Santa Teresinha (1932),
Pela Itália (1906), Pela Paz (1895), Selva (1923), Versos de Ontem e de Hoje (1916).
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Luís Augusto Cassas (Crônica de Nomeação da Defensoria Lírica da Cidade)

por graça e gosto de el-rei
e espada de bom capitão
por instrução do prior-frei
segredos do coração
e por tudo que oro e sei
moinhos de ventos e brasão
consagro em pública praça
do herói a rebelião
e nomeio fiel protetor
das pedras do nosso chão
a luís Augusto cassas
defensor perpétuo e lírico
de São luís do Maranhão
em nome do sol e mar
dou a ele força e poder
de lapidar e guardar
a vida que há de florescer
expeça-se alvará
salvas de mudo canhão
província de muito amar
firmo: “cais da sagração”
Extraído de Em Nome do Filho (Advento de Aquário). Rio de Janeiro: Imago, 2003.

Luís Augusto Cassas (Mar Deprimido)

mar de São Luis, constrangido,
que banhas as costas do Atlântico
e as costas e seios das pacíficas,
quem te roubou o azul do paraíso:
os vendedores de cloro das piscinas
ou o céu desbotado do olhar das meninas?

mar de São Luis, humilhado,
saqueado por metralhas e conquistadores
em navios que vazam óleo desde o início,
quem roubou o azul do teu sorriso:
os poetas que te deixaram abandonado
ou os petroleiros que te sujaram o vestido?

mar de São Luís, sucateado,
sobra de outros mares, poluído.
o cinzento de tuas águas
é tua bandeira de mágoas?
é o teu vestido e anágua?

choras por Antonio: o de Cleópatra?
choras por outro: o de Ana Amélia.
mar de São Luís, enrubescido,
derramas lágrimas de crocodilo,
deságuas sujas águas em praias e portos.

enches os tonéis, os lenços, os esgotos.
mar de São Luis, emaranhado
em maranhas de mar amargurados,
quem seqüestrou o teu azul-coral
deixou-te em troca o excesso de sal.

entanto, o verde que antevejo nessa manhã,
só o vislumbro detrás de óculos rayban.
a não ser que eu ponha cloro,
nas lágrimas que, em ti, choro.

Luís Augusto Cassas (Os Arautos do Dia)
edital de tombamento
(escrito em papel embrulho)

Ficam declarados tombados
pra todos os efeitos e dados
os herói anônimos e martirizados:

os paralelepípedos sob o asfalto
& a cobertura de cobalto

o sorvete de ameixa do hotel central
& as sessões coloridas no cine-rival

as sabiás de cócoras
& os bem-te-vis de galochas

a coroa de rei dos homens
& a galinhagem de ana jansen

a caldeirada do germano
& os endereços dos pés-de-pano

os vendedores de pirulito
& os jogadores de palito

os anjinhos despirocados
& os poetas emprenhados pelos ouvidos

os quebra-queixos à mingua
& o teu beijo de língua

o doce de bacuri com cravinho
& o pôr-do-sol do portinho

as meninas da rua 28
& as virgens mortas sem coito

(a esses 20 tiros de canhão
e 30 missas em intenção)

e mais ainda: a saudade etérea
do amor de g. dias & ana amélia

O pintor de cartazes do cine-éden
faça repintar e imprimir e correr
a nova aurora que vai nascer

Luís Augusto Cassas (Feira do João Paulo)

Grécia jamaicana:
tua bandeira republicana
é um cacho de banana

Extraídos da obra Ópera barroca (guia erótico-poético & serpentário-lírico da cidade de São Luís do Maranhão). Rio de Janeiro: Imago, 1998.
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LUÍS AUGUSTO CASSAS
Nasceu e mora em São Luis do Maranhão desde 2 de março de 1953. Publicou muitos livros de poesia, sempre bem recebidos pela crítica.
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Félix Aires (Imprevisto)

O viajante, ao passar., joga e esquece, na mata,
a ponta do cigarro, inconsciente do mal;
e nas folhas do chão a fagulha desata
o fogo que não veio ali proposital.

Irrompe a labareda, alarmante arrebata
ramos, troncos, rechãs a investida infernal!
Rubra serpente enorme em fúria desbarata
a fragrância, o viçor do reino vegetal!

Queima-se o campo, a roda, a um sopro, de improviso!
E longe, o causador de todo o prejuízo
vai muito alheio ao dano, olhos não volve atrás.

- Também há quem nos jogue o olhar flamante e quente
que o coração nos leva a uma paixão ardente
e a dona desse olhar nem sabe o mal que faz!

Félix Aires (Soneto Artificial)

Do alto do meu sonho inadiável, do cimo da
impressãp que conduz em prol de novo estilo,
às vezes vejo a Musa - uma Vênus de Milo,
outras vezes, porém, uma pobre quasímoda!

A lira - o coração - a jóia que esmerilo,
tímida, pronuncio aqui no verso - tímida;
metaplasmo ajuda a isto, alcança o arrimo da
antítese que vem para servir de asilo.

Hei de também vencer! O caminho mais reto dos
trabalhos vou a seguir, vendo que se desaba do
esforço que porfio, a rigidez dos métodos.

E fico, noite e dia, alerta, neste afã:
- segunda, terça, quarta, e quinta, e sexta, e sábado,
domingo... E vencerei? - Vencerás, amanhã!

Félix Aires (Porto de São Luis)

De momento a momento, amuado, o mar esmurra,
bruto, esbaqueia, esbate, esbraveja, esbarronda!
Os mais fortes murais o seu chicote surra
e atrevido intromete, estruge, atroa, estronda!

Enche, transborda e vaza, encharca, estoira, esturra,
inquieto, a retesar seus pulsos de onda em onda!
Hércules que protesta e incrivelmente empurra
enormes vagalhões, sem ter quem lhe responda!

Gigante intempestivo, intrépido, arruaceiro,
que de rosto fechado ameaça o mundo inteiro,
espragueja a cuspir os portos das cidades!

- Mar que amedronta a terra em doudos temporais
o ódio, pior que tu, de arremessos fatais,
incha, resmunga e explode em negras tempestades!

(In Vagalume, jan./fev., 1994)

TROVAS
Longe, a gaivota voando,
é um til perdido nos ares...
E eu viajo, me recordando
da bênção dos teus olhares!

Por tua beleza tanta
se enflora meu pensamento,
e a boca da noite canta
as melodias do vento.

Da mais pura filigrana,
com esse encanto de lenda,
tu és uma trova humana
vestida de seda e renda.

Quando ela chega, seu riso
é um lírio abrindo a corola
e então nascem de improviso
flores ao pé da viola.

Que lindo o mar! Nestas rotas
vejo as velas nos folguedo!
Alva toalha de gaivotas
sobre a mesa dos rochedos!

Da caboclinha bonita
armam-se os seios seguros,
que são dois frutos maduros
dentro de um ramo de chita!

In Clóvis Ramos/Minha Terra Tem Palmeiras (Trovadores Maranhenses) Janeiro, 1970)
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FÉLIX AIRES
(1904-1979)
Felício Alves nasceu em Buriti Bravo, M aranhão, Brasil. Poeta, prosador, médico veterinário, membro da Academia Maranhense de Letras.
Obra: Antologia de Sonetos Piauienses (1972), Apanágio (Poesia,1936), Buriti Bravo (Poesia, 1931), Cromos (1953), O mais Lindos Sonetos Piauienses (crítica, teoria e história literárias, 1940), O Maranhão na Poesia Popular (1977 ), O Natal na Poesia Brasileira (1957), O Piauí na Poesia Popular (1975), Os Menores Versos da Língua (crítica, teoria e história literárias, 1962), Ouro Bravo (Poesia, 1960), Pequenas Palestras (1936), Poemas aos Imortais (1937 ), Relâmpagos (Poesia, 1960).
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Assis Garrido (Vênus)

Deusa, a teus pés a flor das minhas crenças, ponho!
Mulher, eu te procuro, eu te amo, eu te desejo!
Para a tua nudez, - a gaze do meu Sonho,
Para a tua volúpia, o fogo do meu beijo.

Divina e humana, impura e casta, o olhar tristonho,
Cabelos soltos, corpo nu, como eu te vejo,
Dás-me todo o calor dos versos que componho
E enches-me de alegria a vida que pelejo.

Glória a ti, que, do Amor, cantaste, aos evos, o hino,
Que surgiste do mar, branca, leve, radiante,
Para a herança pagã do meu sangue latino!

Glória a ti, que ficaste, à alma dos homens, presa,
Para a celebração rubra da carne estuante
E a régia orquestração da Forma e da Beleza!

(In Antologia da Academia Maranhense de Letras,1958)

Assis Garrido (A Frase que Matou o Operário)

"Não precisamos mais do seu serviço",
Disseram-lhe os patrões, há dois meses e pouco.
E ele se foi, sob o calor abafadiço
Daquela tarde, murmurando como um louco:
" Não precisamos mais do seu serviço" .

,. Não precisamos mais do seu serviço..."
De tantos anos de trabalho era esse o troco
Que recebia. Em vez de lucro, apenas isso...
E ele consigo murmurava como um louco:
" Não precisamos mais do seu serviço..,"

"Não precisamos mais do seu serviço..."
Torou-se bruto e respondia, a praga e a soco,
Aos filhos e à mulher, famintos no cortiço,
E após, chorava murmurando como um louco:
"Não precisamos mais do seu serviço..."

"Não precisamos mais do seu serviço..."
E ele saía a ver emprego, triste e mouco,
Nada! Nenhum!... E cabisbaixo, o olhar mortiço,
Ele voltava murmurando como um louco:
"Não precisamos mais do seu serviço..."

"Não precisamos mais do seu serviço..."
E cada vez sentia mais o cérebro oco.
Enforcou-se.Morreu. "Foi o diabo ou feitiço..."
Ele murmurando, como um louco:
"Não precisamos mais do seu serviço..."

(O Livro da Minha Loucura,1926)

TROVAS

Tic-tac... E a mocidade
vais-se e aparece a velhice...
Tic-tac... Ai, que saudade
Dos tempos da meninice!...

O amor, que em sonhos espreito,
em teu coração não medra:
Será por acaso feito
o teu coração de pedra?

Eu era um só. Tu surgiste -
e assim ficamos os dois:
Depois, eu vi que mentiste,
e um só me tornei, depois!

Foge-me a tua conquista,
vou-me embora, - por que não? -
Quanto mais longe da vista,
mais longe do coração...

Minha filha, pobre rosa,
vê quanto sofro, querida,
ao pressentir ver trevosa
a estrada de tua vida!

(In Minha Terra Tem Palmeiras/Clóvis Ramos/1970)
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ASSIS GARRIDO
(1899 - 1969)
Poeta, teatrólogo, jornalista, funcionário público nascido em São Luis do Maranhão, membro da Academia Maranhense de Letras, Instituto Cultural Americano-Argentina.
Obra: A Divina mentira( Poesia, 1944), A Vergonha da família (Teatro),
Dom João (1922), O Livro da minha loucura, e O Meu livro de mágoa e de ternura (Poesia, 1923), Oração materna (Poesia, 1920), Regina (Teatro, 1920) e Sol glorioso (Poesia, 1922).

Fonte:
http://www.antoniomiranda.com.br/