quinta-feira, 25 de março de 2010

Bueno de Rivera (Antologia Poética)


A CABEÇA

O mágico equilíbrio
da cabeça no espaço!
Meus olhos me fitam,
se espraiam no corpo,
mas roupas, botões,
nos longos sapatos.
Neus olhos na febre
me buscam, não estou.
Mas vejo a cabeça
tão vaga, distante,
tão minha, tão próxima!
O universo em síntese
no pescoço-base.

Ai! como sofrem
os meus pensamentos!
O suor nas pálpebras
ou na testa infinita
de que fonte virá?
Da fonte das lágrimas?
Dança a cabeça,
agita-se em sonhos
mas cai desolada

nas mãos inocentes.
E cabeças há tantas
expostas ao luxo,
brinquedo de fígaro;
o pente nas ondas,
o mar de loções,
tesouras voando
como aves marinhas
nos claros espelhos.

Tão longe vivo,
tão distante vou,
que o resto é apenas
abstração... -
A gravata louca,
as meias de cores,
as solas macias
tão simples enfeites.
Meus olhos aflitos
me buscam, não estou.
Irmãos, eu vos digo,
Meu corpo não há.

Apenas a cabeça
como estranha lâmpada
na imensa torre
vela os tormentos.
Sinto a tragédia
do irmão do mundo.
Triste mensagem
chega, abafada
pelos gemidos
de alguém pedindo
pão e calor.

Cabeça inquieta,
mundo pequeno
em vão pousado
na paina quente.
Insônia amarga
que espera ansiosa
a luz tranqüila
da aurora próxima.

O beijo amoroso
da mãe ou da amiga
pergunta em silêncio.
A cabeça, no entanto,
não pode dizer.
Na sombra do quarto
acende-se em febre
no doce delírio
de um mundo melhor.

NOTURNO MINEIRO

Boa Viagem
dos velhos tempos de Minas.

0 alvo carregador
põe as lembranças no ombro,
recebe o abraço e a gorjeta.
0 chefe apita com força.
Não há lenços, há. camisas
rôtas, meninos e fraldas
acenando nos quintais.

As estrelas da vidraça
e a cara do itinerante
dançam nos óculos
do bacharel disponível.

Na luz morna do carro
a memória acende o olho.
Sinto a primeira viagem,
o trem do oeste, as vacas
descendo a serra, a fazenda
com gente amável no alpendre
e as lavadeiras no vale
como aves mansas pousadas
no córrego claro.

Congonhas do Campo. A cabeça
na janela espia o templo.
Os profetas do Aleijadinho
viajam na segunda classe
mas os museus não percebem.

A madrugada no túnel
acorda os heróis.
A tarde traz a fumaça do
mar. Um homem sozinho.
O mineiro pensa na vida
sentado no cais.

POEMA SIMPLES PARA O ÓRFÃO

Chora. A tua mãe levou nos olhos mortos
a tua madrugada.

Sentirás saudades do carinho perdido
e olharás com tristeza o crepúsculo
sobre o mundo vazio.

Tua mãe é tua infância,
não volta mais.

O MICROSCÓPIO

O olho no microscópio
vê o outro lado, é solene
sondando o indefinível.

Dramática a paciência
do olho através da lente,
buscando o mundo na lâmina.

A tosse espera a sentença,
o Ieito aguarda a resposta.
0 tísico pensa na morte.

O silencio é puro e o frio envolve
o laboratório.
Os frascos tremem de susto.

0 infinito dos germes
reflete no olho imenso
que pousa na objetiva.

0 avental se levanta.
Os dedos inconscientes
escrevem a palavra ríspida.

0 resultado terrível
entra nos óculos do medico
e ele diz: positivo.

0 doente tira o lenço.
Aperta a mulher e o filho,
chora no ombro da esposa.

Imagina a reclusão
no sanatório, a saudade
e o vento no quarto branco.

olha o papel: positivo.
Cresce a palavra com a tosse.
A febre queima a esperança.

0 microscopista, no entanto,
conta anedotas no bar.
Esta alheio e feliz.

Não sabe que o olho esquerdo
ditou a sentença e a morte.
Paga o café e caminha.

MANHÃ

O pão entre as flores de janela,
a vasilha de leite sob o orvalho.
As rosas e as crianças nuas
esperando o sol no alpendre.
Leio no jornal a frase mágica
"Glória aos que amanhecem !"

Galo do vizinho, a lua ainda
perdida no céu claro,
A água fresca no rosto

as idéias como espuma
Amanhece no meu espírito.
sinto as alegrias, os afetos
como corolas acesas.
A gravata como um símbolo.
As roupas leves conduzem
o meu corpo pelas ruas.
Vamos apagar o ódio
da face dos semelhantes.
Vamos rasgar a história.
Façamos de conta, irmãos,
que este dia tão puro
é o primeiro de mundo!

Olho o relógio e a folhinha,
A cabeça cai nas mãos.
Não adianta a alegria
amorosa da manha,
nem os eflúvios, os arroubos.
Amanhece no pássaro, na flor,
no trabalho das abelhas,
na pureza dos meninos,
mas cai a tarde nos ombros,
anoitece nos espíritos.
O homem acorda a nao sabe
que a vida espera na esquina.

O HOMEM DO MUNDO

Quando acordei, nao vi mais os tempos de meu pai
a face de minha mãe não falou de orações.
minha avó rezando na tempestade

e o vulto do Monsenhor entre as rosas da praça.
As perdidas casuarinas no crepúsculo vago,
lembrança de mortos no soluço do vento.

Onde estas, vitrola do bilhar deserto?
Onde arquivaste os discursos de quatorze?
Agora, ouço apenas o clamor dos vivos
unindo os continentes.

Não sou mais o homem do interior, sou o homem do mundo.
Hoje, o meu coração é um alfinete no mapa,
aceso também na hora solidária.

Adeus, alegrias inúteis! A dor bateu às nossas portas.
Temos os olhos enxutos, estamos conscientes.

A DISCOTECA

0 passado surge nos discos,
a voz profunda ressuscita.
Há cavatinas gemendo,
melodias brancas, soluços
do violino em conserva.

A mão nervosa, a batuta
dança no estúdio. Silencio.
A pauta sugere as notas.

Schubert morrendo tísico,
Patápio nas serenatas.
Caruso da um suspiro
no fundo da cera mágica.

A agulha fere o mistério.
Um beijo de lua desce.

Catulo abraça Beethoven
e o luar a doce a limpo
na modinha e na sonata.

Contralto em gestos macios,
sopramos em amplos lamentos.
A tristeza envolve o rosto
do tenor com a flor no peito.

Cansado das vozes mortal
da minha vitrola dócil,
abro a janela, recebo
o forte rumor da noite.
Pregões, gritos na praça,
casal lutando no alpendre
crianças chamando a mãe

O céu grava em cera virgem
o choro vivo do mundo.
________

Fonte:
J.G . de Araujo Jorge. Antologia da Nova Poesia Brasileira. 1. ed. 1948.
- Montagem da imagem = José Feldman

Bueno de Rivera (1911- 1982)


Odorico Bueno de Rivera Filho, mais conhecido por Bueno de Rivera (3 de abril de 1911, Santo Antônio do Monte, Minas Gerais — 25 de junho de 1982, Belo Horizonte) foi um radialista e poeta surrealista brasileiro

Tendo freqüentado apenas o primário, revelou-se um dos melhores de todo o Modernismo brasileiro. Em busca de futuro foi ainda moço para Belo Horizonte, onde aprendeu tipografia e trabalhou no ramo durante vários anos. Mais tarde foi microscopista no serviço de saúde pública e aí se motivou para escrever o marcante poema "O Microscópio".

Bueno de Rivera foi também um dos mais famosos speakers de Minas,tendo atuado longamente na histórica Rádio Mineira. Sabe-se que, ouvindo sua voz no rádio, dona Ângela se enamorara do poeta, antes mesmo de conhecê-lo pessoalmente, e viria a ser depois, para sempre, a sua companheira.

Pela editora José Olympio, publicou Mundo Submerso (1944) e Luz do Pântano (1948); pela Imprensa Oficial de Minas Gerais publicou - mais de 20 anos depois - Pasto de Pedra (1971).

Bueno de Rivera viveu 71 anos. Em 25/06/1982 veio a falecer, deixando viúva dona Ângela, os filhos Isaac e Clara, oito netos e sete irmãos.

Fontes:
- J. G. de Araujo Jorge. Antologia da Nova Poesia Brasileira. 1a ed. 1948.
- Wikipedia

terça-feira, 23 de março de 2010

Trova 131 - Arlene Lima (Maringá/PR)

Rita Elisa Seda (Garimpagem Literária)



Hoje peguei uma linda caixa que normalmente só abro uma vez por mês, ou melhor... algumas vezes por ano (poucas). Ela é toda de madeira texturizada em ocre e na tampa há uma roseta de gesso. Coloquei-a devagar em cima da cama, removi a tampa e vislumbrei os envelopes, de todas as cores, vários tamanhos e selos diversos. Uma alegria. Foi como puxar um fio condutor que nos leva direto ao passado. Tenho uma amiga que diz que sou muito organizada... olhando para aquela montoeira de cartas eliminei essa idéia – não sou assim, tão organizada! Os envelopes deveriam, pelo menos, estarem empilhados cronologicamente. Ainda bem que estavam fora de tempo e num espaço restrito.

Meu Deus! quantas lembranças içadas, várias sensações relembradas, muitas tristezas choradas, inúmeras alegrias conquistadas e o melhor foi reconhecer a evolução das amizades. Li algumas, escondi outras, mas não rasguei alguma. Sei que tudo tem seu momento e que um dia vou querer reler as que deixei de lado.
Foi quando já conseguia ver o fundo da caixa, tirando um enorme envelope pardo, vi a famigerada, a mal-amada, a terrorista das letras, a devoradora de idéias: a senhora dona traça! Lembrei-me do primeiro conselho que recebi quando comecei a escrever – os dois maiores inimigos de uma escritora são: sua morte e a traça. Sendo que a traça leva alguns anos para devorar um livro, mas o viúvo acaba com tudo em 1 minuto. Voltemos à traça! Ela estava gordinha, escura, serelepe se escondeu embaixo da ultima carta. Fui lá, sem dó nem piedade, e zás, esmaguei-a. Adeus corpinho movido por celulose e tinta. Olhei para o lado, encostada na parede, sob a janela, minha mala goiana. E, se nela também estivessem traças? Ainda pior... nos meus baús?! Afinal são vários espalhados em toda casa e dentro deles vários livros, vários é pouco... muitos livros. Verdadeiras preciosidades.

Nessa ciranda onde uma coisa puxa a outra, vieram algumas soluções, coisas simples para serem colocadas nas malas, caixas e baús: laranja sachê espetada de cravos da índia, velas de citronela (apagadas, é claro!), spray mata tudo (apelação) e o golpe final – naftalina. Quem é que agüenta um cheiro desse? Eu, não! mas sei que acaba com a traça, tão sensível, tão culta, com tanta informação em seu corpo, tanta que em sua veia não corre sangue, correm letras. Se duvida, mate uma traça para ver, ou melhor – ler. Decidi apelar, os sprays atuais são ecologicamente corretos; a não ser pelo fato de matar insetos. Chiiiiiiiiiiiiii, por todo canto. E, para que eu não morresse, também, precisei sair de casa.

Aproveitei para ficar no banco Roma, dando nó na ponta dessa ciranda. Como foi que Fernando Pessoa conseguiu eliminar as traças de seu baú? Sim... em Portugal também há traças. A Sônia Gabriel tem uma enorme mala Sheherazade onde podemos ficar mil e uma noites lendo seus contos. Será que por lá apareceu alguma traça? Melhor daqui por diante praticar o que era do feitio de Cora Coralina, a melhor maneira de se guardar livros é... colocando-os na geladeira! Isso mesmo, sempre, a vida toda, a geladeira da poeta era repleta de livros. Uma bela alternativa, economizo luz e tenho uma biblioteca na cozinha. Só sei que a hora que eu puder retornar à minha casa, quando lá o ar estiver respirável novamente, vou fazer algumas mudanças significativas... para as traças!

Fonte:
http://www.entrementes.com.br

Milton T. Mendonça (O Retrato de Ludmila)


Ao entrar no ateliê para mais uma seção de pintura, hoje pela manhã, a placa com os dizeres: livrai-me senhor dos abestados e dos atoleimados, que peguei emprestado de Hilda Hilst (Os dizeres e não a placa, infelizmente não a conheci pessoalmente), que coloco em cima da porta para espantar os espíritos de porco, olhou-me alerta esperando me pegar desprevenido. Meu sorriso foi inevitável. Imaginei-a sentada na sala, encurvada sobre a mesa de tampo redondo e brilhante, escrevendo seus textos, a lucidez estalando, vibrando a sua volta como uma descarga elétrica, fazendo saltar todos aqueles que raso na suas intenções entravam desavisados em seu horizonte. Meu sorriso se estendeu, senti ímpeto de gargalhar. Por algum motivo, quando percebo aquela placa, que há anos está no mesmo lugar, o dia fica diferente, é como se algo bom fosse acontecer. O dia começara bem.

Alegre voltei meus olhos para a tela sobre o cavalete. Fazem mais de duas semanas que o retrato está sendo elaborado, pensei que terminaria em dez dias como os outros, mas não deu, este é diferente. Faz parte da série de convidadas que estou pintando. É o segundo da série. Convidei-as por serem especiais, são algumas das mulheres que se preocupam com a cultura joséense, todas se esforçam para, de uma maneira ou de outra, deixar o povo menos atoleimado e isso para mim é uma causa muito nobre.

Parei em frente ao cavalete e aqueles olhos verdes, enormes, irradiando inteligência me olharam inquiridores. Faltam apenas algumas pinceladas para terminar. Essa é a parte mais difícil. Como já sei o que fazer, termino rapidamente.

A arte consiste em saber finalizar. O propósito caminha até o ponto da concretização, não podemos ultrapassa-lo ou ele se perde caindo no caos. Assino, está pronto. Não posso mais acrescentar nada. Esta é uma regra que para o bem do meu equilíbrio mental não quebro em hipótese alguma. É a minha gravidade.

Coloquei meus óculos para enxergar de longe e analisei o quadro com cuidado. Fiquei feliz por ter assinado assim que me sento, outra alternativa para construir a mão surge espontânea em minha imaginação, mas não sinto vontade de pegar o pincel. A força descomunal que me fez pintar aquele retrato extinguiu-se. Sinto-me tranqüilo e espantado por ter conseguido terminar. É uma sensação extremamente agradável apesar de contraditórias.

A luz da lanterna que o interlocutor joga sobre o rosto da sacerdotisa que me olha da tela, se espalha para todos os lados chocando-se e refletindo, voltando a chocar-se até criar a imagem que estou vendo, ela é única exatamente por só poder ser vista por mim. Sabemos que a luz só é percebida quando incide diretamente sobre a pupila, somente eu posso vê-la, portanto, preciso ser honesto na hora de retrata-la. Calculo os possíveis ângulos da luz rapidamente, poderia ter colocado mais sombra ali, mais luz acolá, percebo incomodado, mas não sinto vontade de me levantar, está terminado. No próximo acrescento, prometo cansado, sei que este é apenas um estudo.

Quando recebi a foto que ela me mandou, fiquei preocupado, era um close. Como colocar aquele rosto em uma tela cinqüenta por setenta? – perguntei-me ansioso. A sacerdotisa pagã, meio Celta, meio cigana veio a minha mente quase imediatamente. A Ludmila é assim: uma sacerdotisa do século XII, obrigada a viver no século XXI por força do tempo que não para.

Não gosto de fazer retrato baseado em fotografia. A fotografia é uma arte por si só, essa tal de releitura é um negócio que ainda não digeri direito. Sempre imagino estar em frente ao modelo – claro que tem exceção – o primeiro retrato desta série, o da Sônia Gabriel, por exemplo, copiei descaradamente da foto. O fotógrafo, apesar de ter recém entrado na adolescência, conseguiu captar a luz ideal, um verdadeiro olhar de gênio.

Pretendo pintar nove telas, ou quase isso, minhas convidadas são arredias e, como demorei em criar coragem para expor minha arte ao público, sou um senhor desconhecido e isto espanta os colaboradores. Infelizmente o ser humano gosta mesmo é de acompanhar a opinião da maioria. Faz parte da genética acho. Lembranças de aventuras imemoriais. Deu certo com um é provável que de certo com muitos – algo assim.

A calma invade meu corpo e saboreio a visão do retrato por um longo tempo. Será que ela vai gostar? – pergunto-me preocupado mas logo afasto a duvida. Ela me deu carta branca, não poderá reclamar. Mas não creio que emitirá sua opinião, se contentará com um franzir de nariz ou um comentário sarcástico sobre a minha idealização, não espero mais que isso. Estou satisfeito.

Levanto-me e vou a procura da máquina fotográfica. Ela será a primeira a receber a imagem. Uma pequena deferência pelo imenso prazer que me proporcionou.

Fonte:
http://www.entrementes.com.br/

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Decisão)



Quero curtir o tempo que me resta,
Deixar de lado a dor que eu senti,
Trazer no peito um coração em festa,
Recuperar momentos que perdi.

Jogar no lixo o resto da saudade,
Que por maldade se apossou de mim,
Fazer as pazes com a liberdade
E não lembrar que tudo tem seu fim.

Quero cantar um canto encantado,
Amar o mundo como nunca amei;
Quero esquecer o tempo já passado
E resgatar a vida que sonhei.

Quero da brisa o toque de frescor,
Sentir no peito toda esperança,
Reconquistar todo aquele amor
Que ainda guardo comigo na lembrança.
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Fonte:
Colaboração do Autor

Branca Tirollo (Não Brinque com o Fogo)


Notei a porta entreaberta. Não era o vento a tocá-la. O ar estava parado, e as folhas do coqueiro, silenciosa. Levantei-me do sofá e caminhei até a varanda. Então, notei uma luz bem pequenina por trás das montanhas. Não havia estrelas no céu, nem a lua estava exposta. Havia algumas nuvens escuras.

A luz me atraia cada vez mais, e lentamente caminhando, cruzei a avenida.

Do outro lado havia uma arvore pequena e enquanto voltei meus olhos para ela, a pequenina luz desapareceu. De repente tudo escureceu e na negridão da noite eu me senti perdida. Pensava estar caminhando de volta, mas sentia que o caminho de volta ficava mais distante.

Caminhei, caminhei, e quando dei por conta, estava à beira de um grande rio. Quase não enxergava, mas ouvia nitidamente o som das águas que bravas desciam para o mar.

Meus pés estavam machucados. Não tinha colocado os sapatos quando fui atraída pela porta se abrindo.

Eu não reconhecia o rio e tinha certeza de que não estava em minha cidade, pois lá não havia nenhum rio grande.

Mas eu lembrei de um fato muito importante: eu tinha deixado alguma coisa no fogão, acho que estava cozinhando algo. Só não me lembrava o que era.

Cada minuto que passava, sentia que a água daquele rio misterioso subia com muita força. Já estavam molhados, os meus pés. Ainda estava escuro e eu não enxergava nada.

De repente ouço um estouro: PUF!

Nossa! Eu tinha adormecido no sofá que fica na copa, observando o gás aceso.

Lá tinha se ido a minha panela de pressão. Hilariante! Precisei gastar muita água para limpar a sujeira, mas foi bem melhor do que estar perdida num lugar qualquer.

Fonte:
Colaboração da autora.

domingo, 21 de março de 2010

21 de Março - Dia Mundial da Poesia


Antonio Manuel Abreu Sardenberg
POESIA – NOSSA MUSA

Seja bem-vinda, poesia!
Desperte como a alvorada
Com seu toque de carinho
No surgir de cada dia
Trazendo a luz que irradia
Nosso mundo, nosso ninho!

Salpique o céu com estrelas,
Cante a imensidão do mar,
Ensine o mundo perdido
Sentir o que é amar...
Mostre o cruzeiro do sul,
Guie o nosso caminhar!

Seja bem-vinda, poesia!
Traga o frescor da aragem,
A brisa leve a soprar...
Seja nossa fantasia,
No bloco do dia-a-dia
Nos ensine a desfilar...

Cante a beleza da rosa,
O perfume do jasmim;
Quero ficar todo prosa
Com você perto de mim.

Seja bem-vinda, poesia!
Traga ao mundo a primavera,
A vida explodindo em cor...
Seja o sonho e a quimera,
Seja, enfim, o que quiser:
A musa, a deusa, a mulher
O nosso caso de amor...
_________

Fontes:
Alma de Poeta.
- Imagem = montagem de José Feldman com pintura do Poeta, de Jonn Herschend

Mario Quintana (Carta a um Poeta)


Meu caro poeta,

Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola trancada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!

Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.

A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.

Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técnica dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.

Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.

Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convém, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.

Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?


Mario Quintana

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Fonte:
Casa do Bruxo

“A Poesia” pelos Poetas


José Feldman
A POESIA

A poesia é a janela da alma.
É a flor que ainda não nasceu
É a vida que nunca se acalma
A aurora no seu apogeu.

É a luz dos amantes,
Os olhos de uma criança
O bálsamo dos agonizantes,
Da tempestade a bonança.

A poesia é a magia que acalma as tormentas,
que transforma armas em flores,
que transforma almas violentas
ao mundo pintando com mais cores!

A poesia é as cachoeiras e o mar,
O sol, as estrelas, a lua
A casa que sempre estamos a sonhar
A fé que move montanhas que nunca extenua.

A poesia é o fio
que comanda os nosso sonhos!
Z Z Z Z Z Z Z Z Z

Andréa Motta
PEQUENO POEMA

Trovejam em coro as idéias
infusão vermelha
que conspira
e cresce

desabrocha ramo
fino e flexível

conciso mimo
a atar as sílabas
Pó & sias
Z Z Z Z Z Z Z Z
A poesia é a pintura dos ouvidos, assim como a pintura é a poesia dos olhos".
(Lope de Vega)
Z Z Z Z Z Z Z Z
Fernando Pessoa
AUTOPSICOGRAFIA

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Claudia Sleman
SER POETA

Ser poeta é ser apenas
Nada mais que o vento leva...
É ser a prece que enleva...
É ser a praga que extrema...

É amar sem nunca ter...
É ser mar e ser areia...
Plantador que ora semeia
Sem o tempo de colher...

Ser poeta é ser homem
E ser deus a um só tempo...
E existir em dualidade

Tendo a poesia por alento,
Para os dias que o consomem
O amor, a dor e a saudade...
Z Z Z Z Z Z Z Z
Susana Mendes
POETA E POESIA

Como nasce a poesia na alma de um poeta?
Ah...Sua alma transcende,transmuta a algo divino!
E ele vôa, brincando em seus versos,
dando asas diáfanas às suas palavras!
Sonhando sempre, olhos e coração abertos,
ele atravessa a imensidade...
Suas linhas cintilam e colorem jogando com as estrelas
e com a noite...Num misto de magias, fantasias,
enquanto uma nuvem suspira à voz do vento,
ele manda uma mensagem de amor, ao destino do universo,
envoltos em raios de plenas esperanças.
Bendita sejas, ó alma que verseja na embriaguez da vida,
deixando-se fluir em aromas penetrantes do seu âmago e
se elevando ao ápice dos céus !
Poetas e Poesias...
Seus versos livres são filtrados
no mais recôndito de suas expressivas emoções!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Abílio Terra Junior
SE ÉS POETA

se és poeta
e amas a poesia
cumpre tua meta
entregue-te a ela
te esmeres em cada verso
esperes pelo despertar
da tua alma
chores no frio da madrugada
caminhes solitário pela calçada
ouça a canção da que se entrega
o murmúrio da criança que se perdeu
sintas o olhar do velho
frágil e sério
o afago da tua amada
perscrutes o brilho que se apaga
da estrela anã
a dança da folha seca
que o vento leva
os contornos da jovem
que desperta para o amor
os galhos que buscam o sol
da centenária árvore
a placidez comovente
da lua que te inspira
Z Z Z Z Z Z Z Z
Vinicius de Moraes
O POETA E A LUA

Em meio a um cristal de ecos
O poeta vai pela rua
Seus olhos verdes de éter
Abrem cavernas na lua.
A lua volta de flanco
Eriçada de luxúria
O poeta, aloucado e branco
Palpa as nádegas da lua.
Entre as esferas nitentes
Tremeluzem pêlos fulvos
O poeta, de olhar dormente
Entreabre o pente da lua.
Em frouxos de luz e água
Palpita a ferida crua
O poeta todo se lava
De palidez e doçura.
Ardente e desesperada
A lua vira em decúbito
A vinda lenta do espasmo
Aguça as pontas da lua.
O poeta afaga-lhe os braços
E o ventre que se menstrua
A lua se curva em arco
Num delírio de volúpia.
O gozo aumenta de súbito
Em frêmitos que perduram
A lua vira o outro quarto
E fica de frente, nua.
O orgasmo desce do espaço
Desfeito em estrelas e nuvens
Nos ventos do mar perspassa
Um salso cheiro de lua
E a lua, no êxtase, cresce
Se dilata e alteia e estua
O poeta se deixa em prece
Ante a beleza da lua.
Depois a lua adormece
E míngua e se apazigua...
O poeta desaparece
Envolto em cantos e plumas
Enquanto a noite enlouquece
No seu claustro de ciúmes.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Elisa de Andrade
O POETA

O poeta é....

Um ser que na verdade
Com tamanha maestria
E através da sua poesia
Foge um pouco da realidade !

O poeta é....

A criatura que ao se expressar
Busca no seu sentimento de amor
Uma forma de contar
O que vai no seu interior !

O poeta é...

Aquele que busca no fundo do pensamento
Um sonho que um dia na sua imaginação
Sonhou e traduz naquele momento
O que vai dentro do coração !

O poeta é....

Por Deus grandemente iluminado
Descreve o que vai na sua alma
E quem lê sente-se privilegiado
Sentindo como tudo aquilo o acalma !

O poeta é....

Aquele que faz da arte de escrever
Uma forma de se refugiar
Seus lindos poemas têm o poder
De tanto .... tanto encantar !

O poeta é....

Uma luz que desponta no firmamento
Vinda em nossa direção
Como se fosse um mágico momento
Que ficará para sempre em nosso coração!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marília Bechara
POETA

A poesia passeava abraçada pelo vento.
Onde passava sem nada tocar perfumava.
Mas sonhador bem acordado a percebeu,
Sentidos em alerta nos braços a prendeu:
Era um poeta!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Lourdinha Biagioni
POETA E POESIA

O poeta faz da poesia
sua terna e fiel companhia.
Junto de alguns a fantasia
acontece de estar sozinha.

A poesia faz do poeta,
vulnerável pedaço de sonho,
enternece, fascina e encanta,
dada palavra pelo caminho.

A poesia e o poeta enaltecem
sentido, métrica e pensamento.
Expressão e forma se enobrecem
de íntimo e latente sentimento.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Nídia Vargas Potsch
O VERSEJAR DO POETA ...

Mansa é a noite
em que as lembranças são doces ...
E o Poeta viaja em sonhos!
Em sua fantasia cria mundos,
inventa situações,
brinca com as palavras,
retrata o novo,
o banal, o inusitado ...
Faz da saudade uma incógnita
remexendo com os sentimentos alheios
e revolvendo suas próprias recordações ...
Desvenda sua alma,
de sensações fragmentadas,
como retalhos de uma colcha
velha e inacabada,
que só se completa,
na imaginação
de quem o lê e o compreende ...
Porque o Poeta se vai, mas
sua Poesia, permanecerá Eterna!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marinez Stringheta
TECENDO POEMAS

Idéias na mente,
Desejos no coração.
Palavras e sentimentos se unem.
Lápis e papel trabalham..
A borracha apaga...
A caneta escreve.
Risca e rabisca.
A poesia é moldada
Como escultura
Na mão de seu criador!!

Muitas vezes, o papel (amassado)
No cesto é jogado.
Nesse vai e vem
Os olhos se embriagam
De visões imaginárias.
Os ouvidos percebem
Melodias inaudíveis.
O poeta observa
O mundo que o cerca.
O mundo... do qual ele é parte.
E... com a sensibilidade
Que o torna diferente dos normais
Recomeça....
Sem medo... de lutar com palavras
Por um mundo mais humano...
Sem medo... de ser questionado!!!

O poeta quer, através de seus poemas
Abrir os olhos do leitor
Ou... pelo menos tentar!!!
Contudo... Entretanto...
A alma do poeta jamais se aquieta.
Ele poeta a dor, o sofrimento
Poeta a paixão, o amor
E também...
Seu próprio tormento!!!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Marisa Cajado
O VÔO DO POETA

O poeta com a pena, traça a letra
E à letra dá vida, com a interior consciência.
E deste instante fugaz, uno à divina essência.
Nasce a poesia, que o amor soletra.

Ai, encontra ele o paraíso.
Longe da Terra, onde é prisioneiro.
E voa por ele, num vôo certeiro
Energizado, retorna ao corpo, é preciso.

Sentiu-se por segundos realizado
Provou o néctar da verdade universal.
Então transfere em versos, para a humanidade.
A porção mágica do éter divinal
Z Z Z Z Z Z Z Z
Liane Niremberg
“O POETA”

Será louco aquele...
Que sonha doces palavras
E ao sussurra-las ao vento
Faz brotar esperança ao relento?

Será mesmo loucura
Em versos dizer sentimentos...
Das alegrias e tristezas
Injustiças
Ou solidão?

Será louco aquele...
Peregrino das estrelas
Que na procura da verdade
Une emoção e razão?

Não creio não
Pois aquele...
É o poeta!
Misto de real e etéreo...

Escreve, faz, acontece...
Eterno se faz presente
Com um único refrão:
A paz é minha canção!
Z Z Z Z Z Z Z Z
Graça Ribeiro
POETEMOS

Poetemos
porque sem a poesia morremos...

Morremos de tédio entre silêncios
morremos na fome de amor do só
morremos na cama de verso triste
morremos na palavra emudecida

Poetemos
porque sem a poesia desistimos...

Desistimos de entender os nãos do tempo
desistimos de olhar a cara no espelho
desistimos de morder a vida sem fome
desistimos de acreditar em outro mundo

Poetemos
porque sem a poesia esquecemos...

Esquecemos de ver com olhos de ouvir
esquecemos de sentir com a língua e voz
esquecemos de gritar o prazer do gozo pleno
esquecemos de SER a vida que vive em nós

Poetemos
porque sem a poesia choramos...

Choramos a morte do amor que não houve
choramos a vida perdida entre os sonhos
choramos a fome de amor que nos mata
choramos o choro dos que amam chorando

Poetemos
porque sem a poesia morremos...

Morremos na palavra que perde os sentidos
morremos no verso que cria asas partidas
morremos na metáfora vermelha do sonho
moremos no inverso de um verso sem rima

Poetemos
porque apenas na poesia renascemos...

Renascemos na ternura de mãos que se entrelaçam
renascemos nos beijos das bocas que beijamos
renascemos no orgasmo das letras que criamos
renascemos no susto e assim... acordamos

Acordamos para entender que a poesia é VIDA
e que a poesia não é o poema que escrevemos
mas a voz que damos às palavras que ouvimos
dentro de um mundo que só nós entendemos.
Z Z Z Z Z Z Z Z
Paulo Monti
POETA

Poeta desencontrado
Palavras soltas ao vento
Recolhidas e soltas em ouvidos surdos!
Poeta esquartejado
Sonhos desfeitos na madrugada
Feitos e refeitos em uma musa!
Poeta suave
Dormido de nuvens, brisas e luares
Amado pela sua própria essência!
Poeta sofrido
Assim como tu, amigo
Abandonado, mal-amado, porém saudado
Numa réstia de sol!
Poeta amigo
De sua poesia, sua loucura
Espalhada nas ruas, nos risos
De mãos estendidas!
Poeta, poeta...
Por que não seres comum?
Por que poeta?
Para poetares simplesmente?!
Poeta...
Z Z Z Z Z Z Z Z
Rosimeire Leal da Motta
A POESIA

Eu sinto a poesia como se fosse um pedaço da alma, um ser vivo que transmite um sentimento. Ler uma poesia é como abrir um frasco de perfume e aspirar seu aroma... A fragrância é totalmente absorvida por nosso íntimo. Penso que a realização do poeta se faz na alma, pois ele já nasce com este dom, ou seja, não há como participar de um curso para se tornar um profissional da poesia... Ele poderá se inscrever num curso para aperfeiçoar a escrita com base na gramática e somente isto. Ser poeta é um dom que a pessoa tem, que a torna capaz de transformar letras em sentimento
Z Z Z Z Z Z Z Z
Florbela Espanca

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.'
Z Z Z Z Z Z Z Z
Rachel de Queiroz
POESIA

Eis que temos aqui a Poesia,
a grande Poesia.
Que não oferece signos
nem linguagem específica, não respeita
sequer os limites do idioma. Ela flui, como um rio.
como o sangue nas artérias,
tão espontânea que nem se sabe como foi escrita.
E ao mesmo tempo tão elaborada -
feito uma flor na sua perfeição minuciosa,
um cristal que se arranca da terra
já dentro da geometria impecável
da sua lapidação.

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Fontes:
Poetas del Mundo
Cavalgada de Sonhos
Wikipedia
Antologia da Poesia Brasileira

sábado, 20 de março de 2010

Trova 130 - Amália Max (Ponta Grossa/PR)

Heitor Saldanha (Poesias Escolhidas)


O ACIDENTE DE ONTEM

O menino levava um buquê de flores
e um cartão com endereço.
O bonde matou o menino.
Um horizontes de olhos
reuniu o sofrido instante.
Dentro da manhã de abril
alada em altas bandeiras,
o sangue escorria puro, simples,
sobre os trilhos de ferro
sobre as pedras da rua.
Ninguém leu o endereço do cartão.

ESTRUTURA DAS ÁGUAS
a Moacyr Félix

O mar é um cenário aberto
que derrapou no espaço,
e ancorou-se
de bruços
à espera de si mesmo.
Quando sonha se rascunha
lenta metamorfose.
Às vezes
vem,
é um galgo
com seu arco de triunfo,
Chega,
flue,
e dissuade
sua breve estrutura.
Outras vezes vem armado
duma carranca bovina,
Chega,
muge
e se estira
desarmado,
lascivo
Mas quando se recompõe
em placitude de espera,
é o campo do boi mugindo.



Hoje enquanto tiver dinheiro
beberei
Depois
entregarei ao garçom
meu relógio de pulso
meus carpins de nylon
meus óculos de tartaruga (que nome bonito)
minha caneta tinteiro
e continuarei bebendo
bebendo
sem literatura
sem poema
sem nada.
Só.
Como se o mundo começasse agora.
Estou nesses conscientes estados de alma
em que não posso me salvar
e nem salvá-la.

ANDAMENTO

De que estarei me despedindo hoje?
Há em mim uma clara ressonância de
despedida.
Mas não devo saber,
nem é preciso saber.
Creio que vim
pra dizer um dia
na cara do mundo:
hoje estou me despedindo.
E as criaturas boas do meu sangue
abririam a boca
que lhes cortasse o ímpeto inexpresso.
Claro que estou me despedindo.
Hoje sou mais criança do que nunca.
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Fontes:
A Hora Evarista, Instituto Estadual do Livro, Editora Movimento, Porto Alegre, 1974.
Antonio Hohlfeldt (seleção). Antologia da Literatura Rio-Grandense Contemporânea. vol. 2. Cronica e poesia. RS: L&PM, 1979.

Heitor Saldanha (1910 – 1986)


Heitor Saldanha (Cruz Alta, 1910 — Porto Alegre, 1986) foi um poeta brasileiro.

É considerado um dos maiores poetas do Rio Grande do Sul. Participou, com vários outros autores, do Grupo Quixote, muito importante na década de 1950 em Porto Alegre.

Seus poemas, que mostram uma preocupação nítida com os problemas das classes oprimidas, estão reunidos no volume A Hora Evarista. Entre eles, se sobressaem aqueles reunidos em As Galerias Escuras, em que poetiza a vida dos carvoeiros de Arroio dos Ratos e Minas do Butiá.

Heitor Saldanha era fascinado pela vida dos homens trabalhadores em minas de carvão. Chegou a trabalhar numa dessas minas em São Jerônimo, na década de 1950, por dois anos e meio, segundo ele "na busca da poesia, embora não seja necessário que para se escrever sobre alguma coisa, se participe diretamente dela..." Quando os mineiros souberam que havia sido lançado um livro (As Galerias Escuras), presentearam Saldanha com uma lanterna de mina, ou "a luz que iluminava seus caminhos".

Casado com a contista gaúcha Laura Ferreira, foi morar no Rio de Janeiro em 1958, permanecendo por doze anos na cidade. Lá tornou-se amigo de Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Ferreira Gullar e Décio Pignatari, entre outros, participando de inúmeros debates, encontros poéticos e muita agitação e boemia.

Participou de várias antologias e teve obras traduzidas para o espanhol.

Fontes:
– wikipedia.
– Desenho do escritor feito pelo artista plástico francês Michel Drouillon. Publicado no fascículo sobre o poeta da série Autores Gaúchos, do Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, 1984.

Luis Fernando Verissimo (O Nariz)


Era um dentista, respeitadíssimo. Com seus quarenta e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um homem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes mas uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um dia, apareceu em casa com um nariz postiço. Passado o susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerância. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de aros pretos, sombrancelhas e bigodes que fazem a pessoa ficar parecida com o Groucho Marx. Mas o nosso dentista não estava imitando o Groucho Marx. Sentou-se à mesa do almoço – sempre almoçava em casa – com a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com um nariz postiço.

- O que é isso? – perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos.
- Isso o quê?
- Esse nariz.
- Ah. Vi numa vitrina, entrei e comprei.
- Logo você, papai...

Depois do almoço, ele foi recostar-se no sofá da sala, como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se.

- Tire esse negócio.
- Por quê?
- Brincadeira tem hora.
- Mas isto não é brincadeira.

Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A mulher o interpelou.

- Aonde é que você vai?
- Como, aonde é que eu vou? Vou voltar para o consultório.
- Mas com esse nariz?
- Eu não compreendo você – disse ele, olhando-a com censura através dos aros sem lentes. – Se fosse uma gravata nova você não diria nada. Só porque é um nariz...
- Pense nos vizinhos. Pense nos cliente.

Os clientes, realmente, não compreenderam o nariz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor, doutor...”) fizeram perguntas, mas terminaram a consulta intrigados e saíram do consultório com dúvidas.

- Ele enlouqueceu?
- Não sei – respondia a recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos. – Nunca vi ele assim.

Naquela noite ele tomou seu chuveiro, como fazia sempre antes de dormir. Depois vestiu o pijama e o nariz postiço e foi se deitar.

- Você vai usar esse nariz na cama? – perguntou a mulher.
- Vou. Aliás, não vou mais tirar esse nariz.
- Mas, por quê?
- Por quê não?

Dormiu logo. A mulher passou metade da noite olhando para o nariz de borracha. De madrugada começou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto. Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma reputação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado por um nariz postiço.

- Papai...
- Sim, minha filha.
- Podemos conversar?
- Claro que podemos.
- É sobre esse nariz...
- O meu nariz outra vez? Mas vocês só pensam nisso?
- Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma hora para outra um homem como você resolve andar de nariz postiço e não quer que ninguém note?
- O nariz é meu e vou continuar a usar.
- Mas, por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no palhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe não tem mais vida social.
- Não tem porque não quer...
- Como é que ela vai sair na rua com um homem de nariz postiço?
- Mas não sou “um homem”. Sou eu. O marido dela. O seu pai. Continuo o mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença.
- Se não faz nenhuma diferença, então por que usar?
- Se não faz diferença, porque não usar?
- Mas, mas...
- Minha filha...
- Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai!

A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu demissão. Não sabia o que esperar de um homem que usava nariz postiço. Evitava aproximar-se dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados, numa última tentativa de salvar sua reputação, o convenceram a consultar um psiquiatra.

- Você vai concordar – disse o psiquiatra, depois de concluir que não havia nada de errado com ele – que seu comportamento é um pouco estranho...
- Estranho é o comportamento dos outros! – disse ele. – Eu continuo o mesmo. Noventa e dois por cento de meu corpo continua o que era antes. Não mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar, Continuo sendo um ótimo dentista, um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Fluminense, tudo como era antes.
- Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa deste nariz. Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu sou o meu nariz?
- É... – disse o psiquiatra. – Talvez você tenha razão...

O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. Continua a usar nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de nariz. Agora é uma questão de princípios
.

Fonte:
Luis Fernando Verissimo. O Nariz e outras cronicas. Ed. Ática, 2003.

Mario Quintana (O Chalé da Praça Quinze)



O chalé fazia parte da gente. Me lembro do Bilo, com o seu perfil perpendicular de cegonho sábio, o longo bico mergulhado – não no gargalo do gomil da fábula, não propriamente no canecão de chop, que era de fato o que estava acontecendo – mas no poço artesiano de si mesmo.

Me lembro do Reynaldo, redondo, pacato, amável, tão amável, pacato e redondo que parecia um desses personagens de romance policial que ninguém desconfia que seja o autor do último crime da mala.

Me lembro do Cavalcanti com a sua cara silenciosa e receptiva de mata-borrão.

Me lembro de mim, silencioso. Sim, a determinada hora éramos todos silenciosos...essa hora em que não é preciso dizer nada, nem mesmo o verso inesquecível de Valery: “Oh mon bom compagnon de silence”.

Este silêncio era apenas quebrado quando chegava o Athos, o Athos centrífugo e pirotécnico. Mas isso não perturbava o nosso silêncio, nem o próprio silêncio do Athos...Pois havia um profundo e misterioso rio de silêncio que corria subterraneamente a todas as nossas palavras.

Era o rio da poesia?

O rio da harmoniosa confusão das almas?

Agora é apenas o rio do tempo que passou.

Fonte:
Antonio Hohlfeldt (seleção). Antologia da Literatura Rio-Grandense Contemporânea. vol. 2. poesia e crônica. RS: L&PM, 1979.

Armindo Trevisan (Poesias Escolhidas)


NÃO ESCOLHI A COR DE MINHA PELE
(tradução da poesia, do espanhol, por José Feldman)

Não escolhi a cor de minha pele
que é igual a pele de qualquer homem
ela que me envolve por todos os lados
mas, dentro desta pele estou eu: um negro!

Tenho a mesma imagem e semelhança
de homens que possuem outra cor de pele
e eu sei que foi o sol que me queimou
para fazer-me mais resistente e mais formoso.

Como negro, eu habitei um continente
amaldiçoado durante séculos,
fui perseguido por outros homens
e, algumas vezes, também perseguido por homens de minha cor.

Que profundas são as feridas que sangram,
dentro e fora de mim! Pode acaso esquecer
o látego, os suplícios e a morte
daquele tempo em que cobiçavam meu ouro e meu marfim?

Eu sei que nada me serve crucificar-me
em minha propria historia! Nem com fúria selvagem
sonhar a destruição de meus perseguidores.
Antes de ser negro, eu sou simplesmente um homem.

Minha gloria é elevar-me à altura
das palmeiras de meus desertos,
e, quando bradem os leões, deixar-me
ao largo dos rios que inundam minhas florestas.

Não escolhi a cor de minha pele!
Vejo que a noite borbulha de estrelas,
e que a lua, mais que o sol, suaviza
os recantos inacessíveis de minha alma.

Sempre foram brancos vossos Deuses e vossos anjos!
Meu coração sabe que o espírito voa
tão veloz que não se consegue ver sua cor .
Sim! A cor de Deus é a cor do vento.

Eu sou negro e eu sou homem! Agora
que a história abriu aos poucos suas portas
eu posso, pela primeira vez, ser um homem negro.
A humanidade se tornou maior comigo.

Me toca a responsabilidade de perdoar
Eu que não posso tirar, para sempre,
de sobre os ombros de homens vivos: eu com eles
carregar meu fardo até a grande Aurora.

Não escolhi a cor de minha pele
Que é igual a pele de qualquer homem!
Voces também compreenderão que o sangue dos homens
está debaixo da pele, e é um rio de fogo.

Posto que sou um homem livre, me amo
como se ama a vida, que também oferece
a brancura dos dentes para sorrir.
A vida – que nos submerge em sua noite luminosa.

A LUZ DE TUA PELE

À luz de tua pele invento a noite.
Nela me embrenho até à morte alheia.
Ninguém é mais sozinho do que o açoite
que apaga tua luz, e me incendeia.

SOBRE AS PLUMAS

Sobre as plumas da noite quando, amada,
a carne lhe varria o pensamento,

olhou à sua volta, e viu na estrada
os ossos de milhões que a lua ungia:

crematórios, bengalas, dentaduras,
retratos esmaecidos, tristes óculos ...

E meditou no sonho e na loucura.
Como podia amar uma outra carne

se a carne, donde lhe nascera o sexo,
era esse fogo que lavrava forte

nos campos e cidades, semeando
vitríolo e estrume com a mão da morte?

QUISERAM HOSPEDAR-SE

Quiseram hospedar-se no silêncio,
que embriaga o amor depois que os corpos lassos
derramam o perfume de seu vinhos.

Mas não puderam. Triste e sozinhos,
falaram de si mesmos como ausentes.

EMBORA TUA CARNE

Embora tua carne seja a mesma:
quem põe no teu braseiro outro carvão,
e irrita a flama que se torna azul
para variar de língua e de bailado?

Quem faz girar o teu robolo, e afia
a lâmina que não te deixa fria?

O TRÂNSITO

Que fica deste trânsito? É a seda
com sua larva dentro do casulo,

cobrindo a solidão. E, no seu músculo,
a forte pontaria de uma flecha

que, no ar gelado e azul, abate e ave,
sem destruir-lhe vôo tão suave.

A QUEM TE ALÇA

A quem te alça às nuvens, desvalida,
doas teu corpo. E apóias tua mão

numa outra mão, ciente de que o coito
é uma aventura de soldado afoito.

Pois essa subita valentia
te reconduz aos pés da noite fria,

onde tua mão é garra de animal:
e vence, de ambos, quem não desconfia.

REFÚGIO

Às praias dão garrafas com mensagens,
ou tábuas em que flutuaram náufragos.

Às praias dão navios com equipagens,
pinguins, baleias que se desnortearam.

Não é diverso o porto de teus lábios:
ali também vão dar tristes suspiros,

Gemidos, alaridos, menoscabos,
e a alegria de giros e regiros

em que te perdes quando amas de fato,
e o teu corpo se rende a um ultimato.

PRIMAVERA

Por que será que penso nos teus lábios
quando avisto, em quintais, limões maduros?

Serão eles, dobrados sobre os muros,
Livreiros que esquadrinham alfarrábios?

Ou hão de perecer polidos cabos
Rumorejando sobre os ares puros?

Eu sempre penso nos limões: dourados,
Guardam-se incorruptíveis, e fechados.

QUEM DIRÁ AOS AMANTES

Quem dirá aos amantes
o caminho
pelo qual os corpos vão
ao termo do que souberam?
E depois foi noção,
espaço, letra,
e não quiseram o retorno?
Quem os aguardará do outro lado
onde o riso,
a aveia, são o preâmbulo
da carícia no seio?

Quem dirá aos
amantes que o amor há de despir
o acontecido
e passará pela mão
como passou o frio
de flor em flor?

POEMA QUE COMEÇA EM SÁBADO

Foi então que as ervas
se dobraram a língua dos cactos enrugou-se
e subiram pelos telhados os pombos

e ambos na medula da noite ao pé do copo
e da lâmpada resolveram amar-se por toda
a eternidade e isto durou até à véspera do sim

e o não reboou
silenciosamente dentro da boca onde um beijo
polia os ossos o homem apalpou-se e por fim
rolaram em cima dessa coisa chamada mundo

e houve um mundo chamado amor.

SALMO NUPCIAL

Sejas visível
Senhor

quando a carne
de outra carne
florescer na minha

e um enxame
de abelhas brancas
beber no umbigo
dela

e nossa escuridão
servir à noite

e erguermos
à altura do mundo

a solidão
dos animais.
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Fontes:
Armindo Trevisan. A Dança do Fogo. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2001.
Armindo Trevisan. Abajur de Píndaro & Fabricação do Real. São Paulo: Edições Quíron; INL, 1975

Armindo Trevisan (1933)



Nasceu em Santa Maria, RS, em 1933.

Doutorou-se em Filosofia pela Universidade de Fribourg, Suíça, com a tese Ensaio sobre o problema da criação em Bergson (1963).

Nesse mesmo ano, fez curso de aperfeiçoamento em Paris.

De 1969 a 1970, e de setembro de 1974 a fevereiro de 1975, foi bolsista da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Atuou como Professor Adjunto de História da Arte e Estética na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, de 1973 a 1986.

Lecionou, também, no curso de pós-graduação em Artes Visuais da UFRGS até 2000.

Entretanto, é a religiosidade que permeia toda a sua obra, mesmo em seus versos mais sexuais. E é esse criticismo social e político entrelaçado com um sensual lirismo religioso que faz sua obra merecedora de vários prêmios.

E é esse criticismo social e político entrelaçado com um sensual lirismo religioso que faz sua obra merecedora de vários prêmios. Entre eles o Prêmio Gonçalves Dias da União Brasileira de Escritores por seu primeiro livro de poesias, “A surpresa do ser”, publicado em 1967 e em cuja comissão julgadora se incluíam Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e Cassiano Ricardo, o prêmio nacional de Brasília pelo livro “O abajur de Píndaro” em 1972 e o prêmio APLUB de Literatura 1996-1997 pelo livro “A dança do fogo”.

Mas além de poesias, também escreve alguns ensaios ao longo de sua trajetória, bem como contribui com alguns jornais, entre 1967 e 1982, em Brasília (DF), Petrópolis (RJ), Porto Alegre (RS), São Paulo, Rio de Janeiro e Portugal, bem como com algumas revistas em ambos os países.

Este poeta e ensaísta tem obras traduzidas em várias línguas, principalmente alemão, italiano, espanhol e inglês, rompendo as fronteiras geográficas da cultura brasileira.

Foi escolhido como patrono da 47" Feira do Livro de Porto Alegre.

Poesias:
A surpresa de ser (1967),
A imploração do nada (1971),
Funilaria no ar (1973),
Corpo a corpo (1973),
O abajur de Píndaro / A fabricação do real (1975),
Em pele e osso (1977),
O ferreiro harmonioso (1978),
O rumor do sangue, 1979,
A mesa do silêncio (1982),
O moinho de Deus (1985),
Antologia poética (1986),
A dança do fogo (1995),
Os olhos da noite (1997),
O canto das criaturas (1998),
Orações para o novo milênio (1999).

ENSAIOS
- Essai sur le problème de la création chez Bérgson – Fribourg, Suíça, 1963
- A escultura dos sete povos – Porto Alegre, 1978
- Os sete povos das Missões – Série: Raízes gaúchas, III volume – Porto Alegre, 1980
- Escultores contemporâneos do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, 1982
- Os sete povos das Missões – Porto Alegre, 1984
- A dança do sozinho – uma análise da arte abstrata – São Paulo, 1988
- Como apreciar a arte – do saber ao sabor: uma síntese possível – Porto Alegre, 1990
- Reflexões sobre a poesia – Porto Alegre, 1993
- A sombra luminosa – ensaios de estética cristã – Petrópolis, 1995
- A poesia: uma iniciação à leitura poética – Porto Alegre, 2000

Fontes:
http://revistaentrelivros.uol.com.br
http://www.ufsm.br/literaturaehistoria/armindotrevisan.html

Caravana da Leitura nas praças públicas de Avaré e Região



O projeto é aberto a estudantes e ao público em geral e consiste na venda de livros por um preço simbólico.

O projeto “Caravana da Leitura” criado pelo escritor Laé de Souza, depois de percorrer mais de 60 cidades brasileiras chega a diversas cidades do interior de São Paulo. Aplicado desde 2004, em parceria com as Secretarias de Educação e de Cultura dos municípios e apoio do Ministério da Cultura, o trabalho acontecerá nos municípios de Itaporanga, Itaí, Piraju, Cerqueira César e Avaré, entre os dias 22 a 27 de março.

Até o final de 2010 o público terá a oportunidade de conferir a passagem da “Caravana” em diferentes praças públicas do país, oferecendo livros para o público infantil, juvenil e adulto, pelo valor simbólico de R$1,99. O projeto reúne uma grande variedade de obras literárias do escritor Laé de Souza, apresentando histórias do cotidiano, em uma linguagem bem-humorada e pontuada por reflexões.

Aos amantes da literatura, a atividade oferece uma ótima oportunidade para rechear a estante e saciar o desejo de boa cultura. De acordo com Laé de Souza, idealizador do projeto, a ação é inédita e tem como objetivo gerar oportunidades de leitura a pessoas de todas as idades e classes sociais. “Buscamos quebrar o estigma que o brasileiro não gosta de ler. O brasileiro gosta de ler sim, o que lhe falta é oportunidade e acessibilidade aos livros que infelizmente custam muito caro no Brasil. O Caravana da Leitura vai na contramão dessa fórmula errada”, esclarece Laé de Souza.

Este ano, o evento deverá passar por mais de 40 cidades dos estados de São Paulo e Bahia com previsão de distribuição de cerca de 120 mil livros. “O objetivo do trabalho é levar cultura e incentivar o hábito da leitura em todo o Brasil. Dessa forma acreditamos que a leitura pode ser democratizada”, destaca Laé de Souza.

Como funciona o projeto?

Para realização das atividades uma tenda é montada em praça pública, com a exposição de muitos livros. Como numa feira livre, além de estudantes convidados para o evento, as pessoas podem circular, pegar e obter orientações de uma equipe multidisplinar que auxilia aos leitores na escolha das obras. A idéia da tenda é aproximar as pessoas de forma livre e sem compromisso, permitindo que elas sintam-se parte integrante desse grande movimento em prol da leitura.

Interessados poderão conhecer outros projetos de incentivo à leitura, de Laé de Souza e o roteiro da Caravana da Leitura, em "Agenda", no site http://www.projetosdeleitura.com.br/

Fonte:
Colaboração de Laé de Souza.

II Conferencia Nacional de Cultura



PROPOSIÇÕES APROVADAS NA II CONFERÊNCIA NACIONAL DE CULTURA

II CONFERÊNCIA NACIONAL DE CULTURA ELEGE 32 PRIORIDADES PARA O SETOR

Após três dias de debates, os participantes da II Conferência Nacional de Cultura (CNC), realizada em Brasília, elegeram as 32 prioridades que nortearão as políticas públicas para o setor. As prioridades setoriais foram aprovadas por unanimidade no plenário pela manhã.

Presente ao Centro de Convenções e Eventos Brasil 21 durante os trabalhos na tarde deste domingo, o ministro da Cultura, Juca Ferreira, reafirmou o grande mérito da Conferência: promover o acesso de todos à discussão e formulação das políticas públicas. “A democracia e a inclusão têm sido uma grande preocupação do governo e do ministério da Cultura”.

As prioridades eleitas serão tratadas uma a uma, de acordo com sua natureza. Algumas poderão servir para incrementar políticas públicas já existentes, outras devem se transformar em projetos de lei para envio ao Congresso Nacional ou, ainda, integrarem ações interministeriais de estímulo a áreas afins, como cultura e educação, por exemplo.

Ao todo, foram analisadas 347 propostas pelos participantes da conferência, dentre os quais artistas, produtores culturais, investidores, gestores e representantes da sociedade de todos os setores da cultura e de todos os estados do País. Dos 883 delegados credenciados, 851 votaram por meio de cédulas nas propostas prioritárias.

A aprovação do marco regulatório da Cultura, que já tramita no Congresso Nacional, foi a proposta mais votada (754 votos). O marco é composto principalmente pelo Sistema Nacional de Cultura (SNC), Plano Nacional de Cultura (PNC) e proposta de emenda constitucional (PEC) 150/2003, que vincula à Cultura 2% da receita federal, 1,5% das estaduais e 1% das municipais. A proposta também explicita o apoio à aprovação do Programa de Fomento e Incentivo à Cultura (Procultura), que atualiza a Lei Rouanet.

A Conferência aponta a urgência de se construir um marco regulatório para a cultura brasileira. É uma demanda legítima da sociedade, que prioriza a agenda cultural em todas as esferas de governo. Demos um grande passo para fortalecer definitivamente a importância dessa políticas para o desenvolvimento sustentável do país”, explica a coordenadora executiva da Conferência, Silvana Meireles.

Os debates da Conferência seguiram cinco eixos temáticos: produção simbólica e diversidade cultural; cultura, cidade e cidadania; cultura e desenvolvimento sustentável; cultura e economia criativa; gestão e institucionalidade da cultura.

Entre os destaques estão a formalização do trabalho na cultura, o incentivo ao ensino de arte nas escolas, o reconhecimento de um “custo amazônico” como fator que onera as iniciativas culturais devido a questões geográficas e logísticas da região – a ser incluído em editais de novos projetos -, a ampliação do acesso à internet e a necessidade de reformulação da Lei de Direitos Autorais. O marco legal para os Pontos de Cultura e a Lei Griô Nacional também estiveram entre as propostas mais votadas.

Esse é um momento de afirmação da cultura. Esse tema não será mais subalterno. Claro que todas as outras pastas são importantes, mas nada se realiza sem cultura”, afirma Juca Ferreira, ressaltando que neste ano o ministério terá orçamento recorde, o equivalente a 1% do total de impostos arrecadados pela União.

Pré-conferências

Todos os estados realizaram suas conferências, elegendo 743 delegados ao todo. Mais de 200 mil pessoas estiveram diretamente envolvidas nas etapas estaduais e municipais. Novidade nesta edição, as conferências setoriais – 143 no total – tiveram 3.193 inscrições de candidatos a delegados. Além de deliberar, esses encontros têm o objetivo de estimular a criação e o fortalecimento de redes de agentes e instituições culturais do País.

I CNC

Em sua primeira edição, em 2005, 1.192 municípios realizaram conferências, o que representou 21,42% do total das cidades brasileiras. Nesta segunda Conferência, nas etapas municipais e estaduais, observou-se um significativo avanço no processo participativo, uma vez que, de agosto a outubro de 2009, aconteceram 3.071 reuniões, ou seja, mais da metade do total dos municípios do País estiveram envolvidos.

PROPOSTAS PRIORITÁRIAS

EIXO1: PRODUÇÃO SIMBÓLICA E DIVERSIDADE CULTURAL
SUB–EIXO: 1.1 - Produção de Arte e Bens Simbólicos
1 - Implementar políticas de intercâmbio em nível regional, nacional e internacional entre os segmentos artísticos e culturais englobando das manifestações populares tradicionais às contemporâneas que contemplem a realização de mostras, feiras, festivais, oficinas, fóruns, intervenções urbanas, dentre outras ações, estabelecendo um calendário anual que interligue todas as regiões brasileiras, com ampla divulgação, priorizando os grupos mais vulneráveis às dinâmicas excludentes da globalização, com o objetivo de valorizar a diversidade cultural.
6 - Registrar, valorizar, preservar, e promover as manifestações de comunidades e povos tradicionais (conforme o decreto federal 6.040 de 7 de fevereiro de 2007), itinerantes, nômades, das culturas populares, comunidades ayahuasqueiras, LGBT, de imigrantes, entre outros com a difusão de seus símbolos, pinturas, instrumentos, danças, músicas, e memórias dos antigos, por meio de apresentações ou produção de CDs, DVDs, livros, fotografias, exposições e audiovisuais, incentivando o mapeamento e inventário das referencias culturais desses grupos e comunidades.

SUB–EIXO: 1.2 - Convenção da Diversidade e Diálogos Interculturais
17 - Garantir políticas públicas de combate à discriminação, ao preconceito e à intolerância religiosa por meio de: a) campanhas educativas na mídia, em horário nobre, mostrando as diversas raças e etnias existentes em nosso país, ressaltando o caráter criminoso da discriminação racial; b) demarcação de terras das populações tradicionais (ribeirinhos, seringueiros, indígenas e quilombolas), estendendo serviços sociais e culturais a essa população, a fim de garantir sua permanência na terra; c) campanhas contra homofobia visando respeito a diversidade sexual e identidades de gênero.
18 - Implementar a Convenção da Diversidade Cultural por meio de ações sócio-educativas nas diversas linguagens culturais (literatura, dança, teatro, memória e outras), e as linguagens especificas próprias dos povos e culturas tradicionais, conforme o decreto federal 6.040 de 7 de fevereiro de 2007 dirigidas a públicos específicos: crianças, jovens, adultos, melhor idade.

SUB – EIXO: 1.3 - Cultura, Educação e Criatividade
22 - Articular a política cultural (MINC e outros) com a política educacional (MEC e outros) nas três esferas governamentais para elaborar e implementar conteúdos programáticos nas disciplinas curriculares e extracurriculares dedicados à cultura, à preservação do patrimônio, memória e à história afro-brasileira, indígena e de imigrantes ao desenvolvimento sustentável e ao ensino das diferentes linguagens artísticas, inclusive arte digital e línguas étnicas do território nacional, de matriz africana e indígena, e ao ensino de línguas, inserindo-os no Plano Nacional de Educação,sob a perspectiva da diversidade e pluralidade cultural, nas escolas, desde o ensino fundamental, universidades públicas e privadas com a devida capacitação dos profissionais da educação, por meio da troca de saberes com os mestres da cultura popular nos sistemas municipais, estaduais e federais, bem como (26) Garantir condições financeiras e pedagógicas para a efetiva aplicação da disciplina "Língua e Cultura Local".
36 - Instituir a lei Griô, que estabelece uma política nacional de transmissão dos saberes e fazeres de tradição oral, em diálogo com a educação formal, para promover o fortalecimento da identidade e ancestralidade do povo brasileiro, por meio do reconhecimento político, econômico e sociocultural dos Grios Mestres e Mestras da tradição oral, acompanhado por uma proposta de um programa nacional, a ser instituído, regulamentado e implantado no âmbito do MINC e do Sistema Nacional de Cultura.

SUB–EIXO: 1.4 - Cultura, Comunicação e Democracia
63 - Garantir que o acesso a internet seja realizado em regime de serviço publico e avançar com a formulação e implantação do plano nacional de banda larga contemplando as instituições culturais e suas demandas por aplicação e serviços específicos.
68. Regulamentar e implementar o capitulo da comunicação social na Constituição Federal, tendo em vista a integração das políticas de comunicação e cultura, em especial o artigo 223, que garante a complementaridade dos sistemas publico, privado e estatal. Fortalecer as emissoras de radio e TV do campo público (comunitárias, educativas, universitárias e legislativas) e incentivar a produção simbólica que promova a diversidade cultural e regional brasileira, produzida de forma independente. Implantar mecanismos que viabilizem o efetivo controle social sobre os veículos do campo público de comunicação e criar um sistema de financiamento que articule a participação da união, estados e municípios.

EIXO 2: CULTURA, CIDADE E CIDADANIA
SUB-EIXO 2.1: Cidade como fenômeno cultural
80 - Estabelecer uma política nacional integrada entre os governos federal, estaduais, municipais e no Distrito Federal, visando a criação de fontes de financiamento, vinculação e repasses de recursos que permitam a instalação, construção, manutenção e requalificação de espaços e complexos culturais com acessibilidade plena: teatros, bibliotecas, museus, memoriais, espaços de espetáculos, de audiovisual, de criação, produção e difusão de tecnologias e artes digitais, priorizando a ocupação dos patrimônios da união, dos estados, municípios e do Distrito Federal em desuso no país.
83 - Criar marco regulatório (Lei Cultura Viva) que garanta que os Pontos de Cultura se tornem política de Estado garantindo a ampliação no número de Pontos contemplando ao menos um em cada município brasileiro e Distrito Federal, priorizando populações em situação de vulnerabilidade social de modo a fortalecer a rede nacional dos Pontos de Cultura.
SUB–EIXO: 2.2 - Memória e Transformação Social
101 - Incluir na agenda política e econômica da União, estados, municípios e no Distrito Federal o fomento à leitura por meio da criação de bibliotecas públicas, urbanas e rurais em todos os Municípios, com fortalecimento e ampliação dos acervos bibliográficos e arquivísticos, infraestrutura, acesso a novas tecnologias de inclusão digital, capacitação de recursos humanos, bem como ações da sociedade civil e da iniciativa privada,com objetivo de democratizar o acesso à cultura oral, letrada e digital.
112 – Propiciar condições plenas de funcionamento ao Ibram de modo a garantir com sua atuação, que os museus brasileiros sejam consolidados como territórios de salvaguarda e difusão de valores democráticos e de cidadania, colocadas a serviço da sociedade com o objetivo de propiciar o fortalecimento e a manifestação das identidades, a percepção crítica e reflexiva da realidade, a produção de conhecimento, a promoção da dignidade humana e oportunidades de lazer.
SUB–EIXO: 2.3 - Acesso, Acessibilidade e Direitos Culturais
124 – Criar dispositivos de atualização da lei de direitos autorais em consonância com os novos modos de fruição e produção cultural que surgiram a partir das novas tecnologias garantindo o livre acesso a bens culturais compartilhados sem fins econômicos desde que não cause prejuízos ao(s) titular(es) da obra, facilitando o uso de licenças livres e a produção colaborativa, considerando a transnacionalidade de produtos e processos de forma que se atinja o equilíbrio entre o direito da sociedade de acesso a informação e a cultura e o direito do criador de ter sua obra protegida, assim como o equilíbrio entre os interesses do autor e do investidor.
131 – Assegurar a destinação dos recursos do Fundo Social do Pré-sal para a cultura, aos programas de sustentabilidade e desenvolvimento do Sistema Nacional de Cultura, ampliando os investimentos nos programas que envolvam conveniamentos entre União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

EIXO 3: CULTURA E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
SUB–EIXO: 3.1 - Centralidade e Transversalidade da Cultura
140 – Implementar e fortalecer as políticas culturais dos estados, a fim de promover o desenvolvimento cultural sustentável, reconhecendo e valorizando as identidades e memórias culturais locais – incluindo regulamentação de profissões de mestres detentores e transmissores dos saberes e fazeres tradicionais, ampliando as ações intersetoriais e transversais por meio das interfaces com a educação, economia, comunicação, turismo, ciência, tecnologia, saúde e meio ambiente, segurança pública e programas de inclusão digital, com estímulo a novas tecnologias sociais de base comunitária.
141 - Incentivar a criação e manutenção de ambientes lúdicos, para o desenvolvimento de atividades artísticas e culturais em escolas públicas e espaços educacionais sem fins lucrativos, museus, hospitais, casas de saúde, instituições de longa permanência, entidades de acolhimento e abrigos, CAPs, CAPs – AD (Centro de Atenção Psicossocial), centros de recuperação de dependentes químicos e de ressocialização de presos (Apacs) e presídios.
SUB–EIXO: 3.2 - Cultura, Território e Desenvolvimento Local
152 – Promover, em articulação com o MEC, organizações governamentais e não governamentais, a criação de cursos técnicos e programas de capacitação na área cultural para o desenvolvimento sustentável.
154 – Fomentar e ampliar observatórios e as políticas culturais participativas com o objetivo de produzir inventários, pesquisas e diagnósticos permanentes, também em parceria com universidades e instituições de pesquisa, subsidiando políticas públicas de cultura, articuladas intersetorialmente e territorialmente, com ações capazes de preservar os patrimônios cultural e natural, inserindo as histórias locais nos conteúdos das instituições educacionais, identificando e valorizando as tradições e diversidade culturais locais, aproximando os movimentos culturais das questões sociais e ambientais, contribuindo assim para o desenvolvimento sustentável local e a redução das desigualdades regionais.
SUB–EIXO: 3.3 - Patrimônio Cultural, Meio Ambiente e Turismo
165 - Promover e garantir o reconhecimento, a defesa, a preservação e a valorização do patrimônio cultural, natural e arquivístico a partir de inventários e estudos participativos, em especial nas comunidades tradicionais, estimulando o turismo comunitário sustentável, por meio da articulação interministerial com participação popular, que crie parâmetros para a atuação nessa vertente da economia da cultura e destine recursos, inclusive por meio de editais, para a implantação e o fortalecimento de roteiros turísticos que articulem patrimônio cultural, memórias, meio ambiente, tecnologias, saberes e fazeres, valorizando a mão-de-obra local/regional, com a realização de ações voltadas para a formação, gestão e processos de comercialização da produção artístico-cultural da região.
175 - Valorizar as tradições culturais dos 5 biomas,o, como forma de proteção e sustentabilidade, bem como garantir a melhoria e conservação das vias de acesso a todos os municípios, revelando e valorizando suas potencialidades turísticas e culturais, com sua difusão em museus, sites específicos e redes sociais, preservando o patrimônio material e imaterial, regulamentando em lei o cerrado e demais biomas como patrimônio cultural.

EIXO 4: CULTURA E ECONOMIA CRIATIVA
SUB–EIXO: 4.1 - Financiamento da Cultura
187 - Com base no art. 3º inciso III da Constituição brasileira que estabelece a redução das desigualdades sociais e regionais, que seja garantido o reconhecimento do “custo amazônico” pelos órgãos gestores da cultura em projetos culturais, editais e leis de incentivo, em especial pelo Fundo Nacional de Cultura, assegurando dotação específica e diferenciada para os estados da Amazônia Legal, considerando as dimensões continentais, as diferenças geográficas e humanas e as dificuldades de comunicação e circulação na região, incluindo o Custo Amazônico na Lei Rouanet no Fundo Amazônia.
192 - Garantir, com a aprovação da PEC 150/2003, ainda neste semestre, as políticas de fomento e financiamento, via editais, dos processos de criação, produção, consumo, formação, difusão e preservação dos bens simbólicos materiais, imateriais e tradicionais (indígenas, ribeirinhas, afrodescendentes, quilombolas e outros) e contemporâneas (de vanguarda e emergentes), facilitando a mostra de suas obras artísticas, garantindo direitos autorais e registrando os artistas e suas obras como patrimônio nacional.
SUB–EIXO: 4.2 - Sustentabilidade das Cadeias produtivas
230 - Ampliar os recursos públicos e privados, para a sustentabilidade das cadeias criativas e produtivas da cultura, valorizando as potencialidades regionais e envolvendo todos os setores da sociedade civil e do poder público no processo de criação, produção e circulação dos bens e produtos culturais, objetivando ampliar a circulação e a exportação dos produtos culturais brasileiros.
236 - Criar um programa nacional (por região) de capacitação de agentes e empreendedores culturais, com foco nas cadeias produtivas, contemplando a elaboração e gestão de projetos, captação de recursos e qualificação técnica e artística, ofertando oficinas, cursos técnicos e de graduação, em parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES).
SUB–EIXO: 4.3 - Geração de Trabalho e Renda
250 - Regulamentar as profissões da área cultural, criando condições para o reconhecimento de direitos trabalhistas, previdenciários no campo da arte, da produção e da gestão cultural, incluindo os profissionais da cultura em atividades sazonais.
252 - Investir na profissionalização dos trabalhadores da cultura, através da ampliação dos cursos de nível superior, técnicos e profissionalizantes, realizar concursos públicos em todas as esferas governamentais para o setor, equiparando nestes concursos o piso salarial de nível superior à carreira especialista em gestão pública ou equivalente e incluindo o reconhecimento de novas áreas de formação relacionadas ao campo.

EIXO 5: GESTÃO E INSTITUCIONALIDADE DA CULTURA
SUB–EIXO: 5.1 - Sistemas Nacional, Estaduais, Distrital e Municipais de Cultura
262 – Consolidar, institucionalizar e implementar o Sistema Nacional de Cultura (SNC), constituído de órgãos específicos de cultura, conselhos de política cultural (consultivos , deliberativos e fiscalizadores), tendo, no mínimo, 50% de representantes da sociedade civil eleitos democraticamente pelos respectivos segmentos, planos e fundos de cultura, comissões intergestores, sistemas setoriais e programas de formação na área da cultura, na União, Estados, Municípios e no Distrito Federal, garantindo ampla participação da sociedade civil e realizando periodicamente as conferências de cultura e, especialmente, a aprovação pelo Congresso Nacional da PEC 416/2005 que institui o Sistema Nacional de Cultura, da PEC 150/2003 que designa recursos financeiros à cultura com vinculação orçamentária e da PEC 049/2007, que insere a cultura no rol dos direitos sociais da Constituição Federal, bem como dos projetos de lei que instituem o Plano Nacional de Cultura e o Programa de Fomento e Incentivo a Cultura-Procultura e do que regulamenta o funcionamento do Sistema Nacional de Cultura.
279 – Criar um sistema nacional de formação na área da cultura, integrado ao SNC, articulando parcerias públicas e privadas, a fim de promover a atualização, capacitação e aprimoramento de agentes e grupos culturais, gestores e servidores públicos, produtores, conselheiros, professores, pesquisadores, técnicos e artistas, para atender todo o processo de criação, fruição, qualificação dos bens, elaboração e acompanhamento de projeto, captação de recursos e prestação de contas, garantindo a formação cultural nos níveis básico, técnico, médio e superior, à distância e presencial, fazendo uso de ferramentas tecnológicas e métodos experimentais e produção cultural.
SUB–EIXO: 5.2 - Planos Nacional, Estaduais, Distrital, Regionais e Setoriais de Cultura
308 – Defender a aprovação do Programa Cultura Viva e o Programa Mais Cultura no âmbito da proposta de consolidação das leis sociais como políticas publicas de Estado, com dotação orçamentária prevista em lei e mecanismo publico de controle e gestão compartilhada com a sociedade civil.
310 - Garantir que as conferências nacional, distrital, estaduais e municipais de Cultura tenham caráter de política pública e que suas diretrizes e decisões sejam incorporadas nos respectivos Planos Plurianuais e nas Leis de Diretrizes Orçamentárias, assegurando sua efetiva execução nas Leis Orçamentárias Anuais.
SUB–EIXO: 5.3 - Sistema de Informações e Indicadores Culturais
324 – Realizar imediatamente mapeamento preliminar das manifestações culturais, dos distintos segmentos (conforme a II CNC), dos povos e comunidades tradicionais (em conformidade com o decreto 6040), das expressões contemporâneas, dos agentes culturais, instituições e organizações, dos grupos e coletivos, disponibilizando o banco de dados resultante em uma plataforma livre de fácil acesso e com descentralização da informação; em paralelo, a criação de um órgão federal de estudos e indicadores culturais integrado ao SNC; mapear as cadeias criativas e produtivas, empreendimentos solidários; investir em capacitação técnica de equipes locais; atualizar continuamente o mapeamento preliminar e gerar produtos tais como: roteiros e eventos de integração e intercambio; catálogos com as varias linguagens e manifestações, publicação de anuários e revistas.
336 - Implantar o Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais e os respectivos sistemas estaduais e municipais, desenvolver mecanismos de articulação entre governo e sociedade civil, para facilitar e ampliar o acesso às informações e capacitar pessoal em todas as esferas, para a geração, tratamento e armazenamento de dados e informações culturais.

LIVRO, LEITURA, LITERATURA: DIREITO DE TODOS

A leitura e a escrita constituem elementos fundamentais para a construção de sociedades democráticas, baseadas na diversidade, na pluralidade e no exercício da cidadania; são direitos de todos, constituindo condição necessária para que possam exercer seus direitos fundamentais, viver uma vida digna e contribuir na construção de uma sociedade mais justa.” (Plano Nacional do Livro e Leitura – PNLL - dezembro de 2006)

A leitura e a escrita são direitos e necessidades relacionados com a prática cidadã, que ajudam as pessoas a construir sua individualidade e seu prazer estético, sendo transversais a todas as artes. O letramento – habilidade de ler criticamente e produzir textos - contribui de forma efetiva para o rompimento da fatalidade social e capacita o cidadão a criar seu espaço no mundo contemporâneo e a estabelecer as relações com os demais. Diretrizes que fundamentam uma Política de Estado, aliadas à gestão eficaz, são fundamentais para a concretização dos objetivos de toda política cultural para um país.

Por essas razões fundamentais ao desenvolvimento integral do ser humano é que se faz necessária a inclusão, no Plano Nacional de Cultura, de propostas que garantam a democratização do acesso à leitura e à escritura para todos os brasileiros.

O PNLL, avaliado e aprovado após três anos de sua implantação pela Pré-Conferência do Livro, Leitura e Literatura, sustenta que o melhor caminho para o acesso à leitura no Brasil é por intermédio da biblioteca de acesso público, seja ela escolar pública ou comunitária, na zona urbana ou rural, porque ela, quando bem estruturada, é:
• Centro de educação permanente, única forma de acesso ao livro e à informação na maioria dos municípios brasileiros;
• Centro de memória das cidades, que preserva e dá acesso à história e à cultura universal e local;
• Centro cultural, que pode agregar às suas atividades e serviços o diálogo com outras linguagens artísticas;
• Promotora do letramento, que é condição importante para o acesso a outras linguagens artísticas e às novas tecnologias.
Assim, pedimos sua atenção e apoio para as seguintes propostas, nos eixos 2 e 5, elaboradas e legitimadas pela Pré-Conferência do Livro, Leitura e Literatura:

Eixo 2 – Cultura, cidade e cidadania:

Garantir para toda a população urbana e rural, em sua diversidade, a criação, a manutenção e a sustentabilidade de bibliotecas públicas, comunitárias, itinerantes e escolares da rede pública e outros espaços de leitura, com quadro de profissionais qualificados que permitam o acesso à leitura literária, científica e informativa, em seus diversos suportes (livros, jornais, revistas, internet, livro acessível, em Braille, áudios-livro, equipamentos visuo-espaciais etc.), informatizadas, em rede, integradas e dinamizadas por mediadores de leitura.

Eixo 5 – Gestão e institucionalidade da cultura:

Consolidar o PNLL (Plano Nacional do Livro e da Leitura), por meio de mecanismos legais e da garantia dos recursos orçamentários; criar o Instituto Nacional do Livro, Leitura e Literatura, e incentivar a implantação de planos e fundos estaduais e municipais, mediados pelos Conselhos Estaduais e Municipais de Política Cultural, assegurando o controle e a participação social e criando um sistema de condicionamentos e contrapartidas previstas nos demais programas sociais do governo federal para as instâncias responsáveis pela institucionalização das políticas públicas; fortalecimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas Municipais.

Em resumo: a aprovação de propostas que garantam e viabilizem o acesso ao livro, à leitura, à literatura, e promovam a conseqüente melhoria do índice de letramento dos brasileiros, aliadas à consolidação institucional do PNLL e à criação de novos órgãos de gestão eficiente nesta área da cultura, vai ao encontro e potencializa toda ação proposta pelos vários segmentos representados nessa Conferência.

Brasília, 13 de março de 2010.

Fonte:
Neida Rocha