quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Eça de Queirós (O Mandarim) Parte 2

Análise da Obra
http://singrandohorizontes.blogspot.com.br/2012/04/eca-de-queiros-o-mandarim.html

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Eu murmurei, com as faces abrasadas:

– Têm.

E a sua voz prosseguiu, paciente e suave:

– Que me diz a cento e cinco, ou cento e seis mil contos? Bem sei, é uma bagatela... Mas enfim, constituem um começo; são uma ligeira habilitação pára conquistar a felicidade. Agora pondere estes factos: o Mandarim, esse Mandarim do fundo da China, está decrépito e está gotoso: como homem, como funcionário do Celeste Império, é mais inútil em Pequim e na humanidade, que um seixo na boca de um cão esfomeado. Mas a transformação da Substância existe: garanto-lha eu, que sei o segredo das coisas... Porque a terra é assim: recolhe aqui um homem apodrecido, e restitui-o além ao conjunto das formas como vegetal viçoso. Bem pode ser que ele, inútil como mandarim no Império do Meio, vá ser útil noutra terra como rosa perfumada ou saboroso repolho. Matar, meu filho, é quase sempre equilibrar as necessidades universais. É eliminar aqui a excrescência para ir além suprir a falta. Penetre-se destas sólidas filosofias. Uma pobre costureira de Londres anseia por ver florir, na sua trapeira, um vaso cheio de terra negra: uma flor consolaria aquela deserdada; mas na disposição dos seres, infelizmente, nesse momento, a Substância que lá devia ser rosa é aqui na Baixa homem de Estado... Vem então o fadista de navalha aberta, e fende o estadista; o enxurro leva lhe os intestinos; enterram-no, com tipóias atrás; a matéria começa a desorganizar-se, mistura-se à vasta evolução dos átomos – e o supérfluo homem de governo vai alegrar, sob a forma de amor-perfeito, a água-furtada da loura costureira. O assassino é um filantropo! Deixe-me resumir, Teodoro: a morte desse velho Mandarim idiota traz-lhe à algibeira alguns milhares de contos. Pode desde esse momento dar pontapés nos poderes públicos: medite na intensidade deste gozo! – É desde logo citado nos jornais: reveja-se nesse máximo da glória humana! E agora note: é só agarrar a campainha, e fazer ti-li-tim. Eu não sou um bárbaro: compreendo a repugnância de um gentleman em assassinar um contemporâneo: o espirrar do sangue suja vergonhosamente os punhos, e é repulsivo o agonizar de um corpo humano. Mas aqui, nenhum desses espectáculos torpes... É como quem chama um criado... E são cento e cinco ou cento e seis mil contos; não me lembro, mas tenho-o nos meus apontamentos... O Teodoro não duvida de mim. Sou um cavalheiro: – provei-o, quando, fazendo a guerra a um tirano na primeira insurreição da justiça, me vi precipitado de alturas que nem Vossa Senhoria concebe... Um trambolhão considerável, meu caro senhor! Grandes desgostos! O que me consola é que o outro está também muito abalado: porque, meu amigo, quando um Jeová tem apenas contra si um Satanás, tira-se bem de dificuldades mandando carregar mais uma legião de arcanjos; mas quando o inimigo é um homem, armado de uma pena de pato e de um caderno de papel branco – está perdido... Enfim são seis mil contos. Vamos, Teodoro, ai tem a campainha, seja um homem.

Eu sei o que deve a si mesmo um cristão. Se este personagem me tivesse levado ao cume de uma montanha na Palestina, por uma noite de lua cheia, e aí, mostrando-me cidades, raças e impérios adormecidos, sombriamente me dissesse: «Mata o mandarim, e tudo o que vês em vale e colina será teu», eu saberia replicar-lhe, seguindo um exemplo ilustre, e erguendo o dedo às profundidades consteladas: «O meu reino não é deste mundo!» Eu conheço os meus autores. Mas eram cento e tantos mil contos, oferecidos à luz de uma vela de estearina, na Travessa da Conceição, por um sujeito de chapéu alto, apoiado a um guarda-chuva...

Então não hesitei. E, de mão firme, repeniquei a campainha. Foi talvez uma ilusão; mas pareceu-me que um sino, de boca tão vasta como o mesmo céu, badalava na escuridão, através do universo, num tom temeroso que decerto foi acordar sóis que faziam nené e planetas pançudos ressonando sobre os seus eixos...

O indivíduo levou um dedo à pálpebra, e limpando a lágrima que enevoara um instante o seu olho rutilante:

– Pobre Ti Chin-Fu!...

– Morreu?

– Estava no seu jardim, sossegado, armando, para o lançar ao ar, um papagaio de papel, no passatempo honesto de um mandarim retirado, – quando o surpreendeu este ti-li-tim da campainha. Agora jaz à beira de um arroio cantante, todo vestido de seda amarela, morto, de pança ao ar, sobre a relva verde: e nos braços frios tem o seu papagaio de papel, que parece tão morto como ele. Amanhã são os funerais. Que a sabedoria de Confúcio, penetrando-o, ajude a bem emigrar a sua alma!

E o sujeito, erguendo-se, tirou respeitosamente o chapéu, saiu, com o seu guarda-chuva debaixo do braço.

Então, ao sentir bater a porta, afigurou-se-me que emergia de um pesadelo. Saltei ao corredor. Uma voz jovial falava com a Madame Marques; e a cancela da escada cerrou-se subtilmente.

– Quem é que saiu agora, ó D. Augusta? – perguntei, num suor.

– Foi o Cabritinha que vai um bocadinho à batota...

Voltei ao quarto: tudo lá repousava tranquilo, idêntico, real. O in-fólio ainda estava aberto na página temerosa. Reli-a: agora parecia-me apenas a prosa antiquada de um moralista caturra; cada palavra se tornara como um carvão apagado...

Deitei-me: – e sonhei que estava longe, para além de Pequim, nas fronteiras da Tartária, no quiosque de um convento de lamas, ouvindo máximas prudentes e suaves que escorriam, com um aroma fino de chá, dos lábios de um Buda vivo.

II

Decorreu um mês.

Eu, no entanto, rotineiro e triste, lá ia pondo o meu cursivo ao serviço dos poderes públicos, e admirando aos domingos a perícia tocante com que a D. Augusta lavava a caspa do Couceiro. Era agora evidente para mim que, nessa noite, eu adormecera sobre o in-fólio e sonhara com uma «Tentação da Montanha» sob formas familiares. Instintivamente, porém, comecei a preocupar-me com a China. Ia ler os telegramas à Havanesa; e o que o meu interesse lá buscava, eram sempre as notícias do Império do Meio; parece porém que, a esse tempo, nada se passava na região das raças amarelas... A Agência Havas só tagarelava sobre a Herzegovina, a Bósnia, a Bulgária e outras curiosidades bárbaras...

Pouco a pouco fui esquecendo o meu episódio fantasmagórico: e ao mesmo tempo, como gradualmente o meu espírito resserenava, voltaram de novo a mover-se as antigas ambições que lá habitavam – um ordenado de director-geral, um seio amoroso de Lola, bifes mais tenros que os da D. Augusta. Mas tais regalos pareciam-me tão inacessíveis, tão nascidos dos sonhos – como os próprios milhões do Mandarim. E pelo monótono deserto da vida, lá foi seguindo, lá foi marchando a lenta caravana das minhas melancolias...

Um domingo de Agosto, de manhã, estirado na cama em mangas de camisa, eu dormitava, com o cigarro apagado no lábio – quando a porta rangeu devagarinho e, entreabrindo a pálpebra dormente, vi curvar-se ao meu lado uma calva respeitosa. E logo uma voz perturbada murmurou:

– O sr. Teodoro?... O sr. Teodoro do Ministério do Reino?

Ergui-me lentamente sobre o cotovelo e respondi num bocejo:

– Sou eu, cavalheiro.

O indivíduo recurvou o espinhaço: assim na presença augusta de el-rei Bobeche se arqueia o cortesão... Era pequenino e obeso: a ponta das suíças brancas roçava-lhe as lapelas do fraque de alpaca: veneráveis óculos de ouro reluziam na sua face bochechuda, que parecia uma próspera personificação da Ordem: e todo ele tremia desde a calva lustrosa até aos botins de bezerro. Pigarreou, cuspilhou, balbuciou:

– São notícias para Vossa Senhoria! Consideráveis notícias! O meu nome é Silvestre... Silvestre, Juliano & Cª... Um serviçal criado de Vossa Excelência... Chegaram justamente pelo paquete de Southampton... Nós somos correspondentes de Brito, Alves & Cª, de Macau... Correspondentes de Craig and Cª, de Hong-Kong... As letras vêm de Hong-Kong...

O sujeito engasgava-se; e a sua mão gordinha agitava em tremuras um envelope repleto, com um selo de lacre negro.

– Vossa Excelência – prosseguiu – estava decerto prevenido... Nós é que o não estávamos... A atrapalhação é natural... O que esperamos é que Vossa Excelência nos conserve a sua benevolência... Nós sempre respeitámos muito o carácter de Vossa Excelência... Vossa Excelência é nesta terra uma flor de virtude, e espelho de bons! Aqui estão os primeiros saques sobre Bhering and Brothers, de Londres... Letras a trinta dias sobre Rothschild...

A este nome, ressoante como o mesmo ouro, saltei vorazmente do leito:

– O que é isso, senhor? – gritei.

E ele, gritando mais, brandindo o envelope, todo alçado no bico dos botins:

– São cento e seis mil contos, senhor! Cento e seis mil contos sobre Londres, Paris, Hamburgo e Amsterdão, sacados a seu favor, excelentíssimo senhor!... A seu favor, excelentíssimo senhor! Pelas casas de Hong-Kong, de Xangai e de Cantão, da herança depositada do mandarim Ti Chin-Fu!

Senti tremer o globo sob os meus pés – e cerrei um momento os olhos.. Mas compreendi, num relance, que eu era, desde essa hora, como uma encarnação do Sobrenatural, recebendo dele a minha força e possuindo os seus atributos. Não podia comportar-me como um homem, nem desconsiderar-me em expansões humanas. Até, para não quebrar a linha hierática – abstive-me de ir soluçar, como mo pedia a alma, sobre o vasto seio da Madame Marques...

De ora em diante cabia-me a impassibilidade de um deus – ou de um demónio: dei, com naturalidade, um puxão às calças, e disse a Silvestre, Juliano & Cª estas palavras:

– Está bem! O Mandarim... esse Mandarim que disse, portou-se com cavalheirismo. Eu sei do que se trata: é uma questão de família. Deixe aí os papéis... Bons dias.

Silvestre, Juliano & Cª retirou-se, às arrecuas, de dorso vergado e fronte voltada ao chão.

Eu então fui abrir, toda larga, a janela: e, dobrando para trás a cabeça, respirei o ar cálido, consoladamente, como uma corça cansada...

Depois olhei para baixo, para a rua, onde toda uma burguesia se escoava, numa pacata saída de missa, entre duas filas de trens. Fixei, aqui e além, inconscientemente, algumas cuias de senhoras, alguns metais brilhantes de arreios. E de repente veio-me esta ideia, esta triunfante certeza – que todas aquelas tipóias as podia eu tomar à hora ou ao ano! Que nenhuma das mulheres que via deixaria de me oferecer o seu seio nu a um aceno do meu desejo! Que todos esses homens, de sobrecasaca de domingo, se prostrariam diante de mim como diante de um Cristo, de um Maomé ou de um Buda, se eu lhes sacudisse junto à face cento e seis mil contos sobre as praças da Europa!...

Apoiei-me à varanda: e ri, com tédio, vendo a agitação efémera daquela humanidade subalterna – que se considerava livre e forte, enquanto por cima, numa sacada de quarto andar, eu tinha na mão, num envelope lacrado de negro, o princípio mesmo da sua fraqueza e da sua escravidão! Então, satisfações do Luxo, regalos do Amor, orgulhos do Poder, tudo gozei, pela imaginação; num instante, e de um só sorvo. Mas logo uma grande saciedade me foi invadindo a alma: e, sentindo o mundo aos meus pés – bocejei como um leão farto.

De que me serviam por fim tantos milhões senão para me trazerem, dia a dia, a afirmação desoladora da vileza humana?... E assim, ao choque de tanto ouro, ia desaparecer a meus olhos, como um fumo, a beleza moral do universo! Tomou-me uma tristeza mística. Abati-me sobre uma cadeira; e, com a face entre as mãos, chorei abundantemente.
Daí a pouco Madame Marques abria a porta, toda vistosa nas suas sedas pretas.

– Está-se à sua espera para jantar, enguiço! Emergi da minha amargura para lhe responder secamente:

– Não janto!

– Mas fica!

Nesse momento estalavam foguetes ao longe. Lembrei-me que era domingo, dia de touros: de repente uma visão rebrilhou, flamejou, atraindo-me deliciosamente: – era a tourada vista de um camarote; depois um jantar com champanhe; à noite a orgia, como uma iniciação! Corri à mesa. Atulhei as algibeiras de letras sobre Londres. Desci à rua com um furor de abutre fendendo o ar contra a presa. Uma caleche passava, vazia. Detive-a, berrei:

– Aos touros!

– São dez tostões, meu amo!

Encarei com repulsão aquele reles pedaço de matéria organizada – que falava em placas de prata a um colosso de ouro! Enterrei a mão na algibeira ajoujada de milhões e tirei o meu metal: tinha setecentos e vinte!

O cocheiro bateu a anca da égua e seguiu, resmungando. Eu balbuciei:

– Mas tenho letras!... Aqui estão! Sobre Londres! Sobre Hamburgo!...

– Não pega.

Setecentos e vinte!... E touros, jantar de lorde, andaluzas nuas, todo esse sonho expirou como uma bola de sabão que bate a ponta de um prego.

Odiei a humanidade, abominei o numerário. Outra tipóia, lançada a trote, apinhada de gente festiva, quase me atropelou naquela abstracção em que eu ficara com os meus setecentos e vinte na palma da mão suada.

Cabisbaixo, enchumaçado de milhões sobre Rothschild, voltei ao meu quarto andar: humilhei-me à Madame Marques, aceitei-lhe o bife córneo; e passei essa primeira noite de riqueza bocejando sobre o leito solitário – enquanto fora o alegre Couceiro, o mesquinho tenente de quinze mil réis de soldo, ria com a D. Augusta, repenicando à viola o «Fado da Cotovia».
–––––––––––
Continua…

Fonte:
http://leituradiaria.com

Clássicos do Cancioneiro Popular (O Rabicho da Geralda)

Sou o boi liso, rabicho,

Boi de fama, conhecido,
Minha senhora Geralda
Já me tinha por perdido.

Era minha fama tanta,
Nestes sertões estendida...
Vaqueiros vinham de longe
Pra me tirarem a vida.

Onze anos morei eu
Lá na serra da Preguiça,
Minha senhora Geralda
De mim não tinha notícia.

Morava em cima da serra,
Naqueles altos penhascos,
Só davam notícias minhas
Quando me viam os rastos.

Ao cabo de onze anos
Saí na Várzea do Cisco,
Por minha infelicidade
Por um caboclo fui visto.

Quando o caboclo me viu
Saiu por ali aos topes,
Logo foi dar novas minhas
Ao vaqueiro José Lopes.

Quando o caboclo chegou
Foi com grande matinada:
— Oh! José Lopes, eu vi
O rabicho da Geralda.

Estava na Várzea do Cisco
C’um magotinho de gado,
Lá na pontinha de cima,
Onde entra pra talhado.

José Lopes chamou logo
Por seu filho Antonio João:
"Vá buscar o barbadinho,
"E o cavalo tropelão.

"Diga ao senhor José Gomes
"Que traga sua guiada
"E venha pronto pra irmos
"Ao rabicho da Geralda".

Chegados eles que foram,
Montaram, fizeram linha,
A quem eles encontravam
Perguntavam novas minhas.

Encontrando Zé Tomás,
Que vinha lá da Queimada...
"Camarada, dá-me novas
"Do rabicho da Geralda?"

— Ainda mesmo que eu visse,
Eu não daria passada,
Pois será muito o trabalho,
E o lucro não será nada.

— Não senhor, meu camarada,
A coisa está conversada:
A dona mesmo me disse
Que desse boi não quer nada.

Uma das bandas e o couro
Fica pra nós de bocório;
A outra vai se vender
Pras almas do purgatório.

Despediram-se uns dos outros,
No carrasco se internaram,
Cacaram-me todo o dia
Porém não me alcançaram.

Deram de marcha pra casa,
Já todos mortos de fome,
Foram comer um bocado
Na casa do José Gomes.

Passados bem cinco dias,
Estando eu na ribanceira,
Quando fui botando os olhos,
Vejo vir Manuel Moreira.

Um dos vaqueiros de fama
Que naquele tempo havia,
Que muita gente supunha
Só ele me pegaria.

Olhei para o outro lado,
Para ver se vinha alguém:
Divisei Manuel Francisco
E seu sobrinho Xerém.

Fui tratando de correr
Pelo lugar mais fechado,
Quando o Moreira gritou-me
Aos pés juntos, enrabado,

Corra, corra, camarada,
Pise seguro no chão,
Que hoje sempre dou fim
Ao famanaz do sertão.

Tiremos uma carreira
Assim por uma beirada;
Eu mesmo desconfiei
Do rabicho da Geralda.

Mais adiante pus-me em pé
Para ver o zuadão:
Enxerguei Manuel Francisco
Caído num barrocão.

Estive ali muito tempo,
Ali posto e demorado;
A resposta que me deram
Foi dizer: vai-te malvado!

Toda vida terei pena
De correr atrás de ti;
Bem me basta minha faca,
E minha esposa que perdi!

Daí seguiu para trás
Ajuntando o que era seu,
E juntamente caçando
O Xerém, que se perdeu.

Nesse tempo tinha ido
A Pajeú ver um vaqueiro;
Dentre muitos que lá tinha,
Viera o mais catingueiro.

Este veio por seu gosto,
Trazendo sua guiada,
E desejava ter encontro
Com o rabicho da Geralda.

Chamava-se Inácio Gomes,
Era cabra curiboca,
O nariz achamurrado
Cara cheia de pipoca.

Na fazenda da Concórdia,
Chegou ele a uma hora;
Muita gente já dizia:
O rabicho morre agora.

Dizia que pra matar-me
Não precisava de mais:
Bastava dar-me no rasto
De oito dias atrás.

Deram-lhe então um guia
Que bem soubesse do pasto,
E que também conhecesse
Dentre todos o meu rasto.

Onze dias me caçaram
Com grande empenho e cuidada:
Não puderam descobrir
Nem novas e nem mandado.

Passados os onze dias
Lá no Riacho do Agudo,
Quando fui botando os olhos,
Vi o cabra topetudo.

Disse o guia me avistando:
— Venha ver, meu camarada,
Eis ali o boi de fama,
O rabicho da Geralda.

Bem cedo, ao sair do sol,
Vimo-nos de cara a cara,
E nos primeiros arrancos
Logo lhe caiu a vara.

Ele disto não fez caso,
Relho ao cavalo chegou
E em poucas palhetadas
Bem pertinho me gritou:

— Corra, corra, camarada,
Puxe bem pela memória
Que não vim da minha terra
Para vir contar estória.

Gritou-me da outra banda
O senhor guia também:
— Tu cuidas que sou Moreira,
Ou seu sobrinho Xerém?

Tinha um pau atravessado
Na passagem dum riacho:
O cabra passou por cima
E o cavalo por baixo.

Segui a meia carreira,
No meu correr costumado,
E antes de meia légua,
Ambos já tinham ficado.

Pôs-se o cabra topetudo
A pensar o que faria,
E quando chegasse em casa
Que estória contaria!...

Na fazenda da Botica
Tinha gente em demasia,
Esperando ter notícia
Do rabicho nesse dia.

Perguntou José de Góis,
Morador no Carrapicho:
— Amigo, seja benvindo!
Dá-me novas do rabicho?

— Eu o vi, mas não fiz nada,
Pois nunca vi correr tanto,
Como esse boi, o rabicho,
É coisa que causa espanto!

— Nesta terra eu não vejo
Quem o pegue pelo pé,
Aquele morre de velho
Ou de cobra cascavel.

Respondeu José de Góis,
Morador no Carrapicho:
— Eu pelos olhos conheço
Quem dá voltas ao rabicho.

— Já anda em dezoito anos
Que Zé Lopes o capou,
Era ele então garrotinho,
Por isso foi que pegou.

Foi-se o cabra topetudo
E não sei se lá chegou,
Só sei é que ele foi
Com os beiços com que mamou.

Chega enfim — noventa e dois —
Aquela seca comprida;
Logo vi que era a causa
De eu perder a minha vida.

Secaram-se os olhos d’água,
Não tive onde beber,
E botei-me aos campos grandes
Já bem disposto a morrer.

Desci por uma vereda
E disse: esta me socorra;
Quando quis cuidar em mim
Estava numa gangorra.

Fui à fonte beber água,
Refresquei o coração!
Quando quis sair não pude,
Tinham fechado o portão.

Corri logo a cerca toda
E sair não pude mais:
Quem me fez prisioneiro
Foi apenas um rapaz.

Este saiu às carreiras,
E, vendo um seu camarada,
Gritou logo: já está preso
O rabicho da Geralda.

Espalhando-se a notícia,
Correram todos a ver,
E vinham todos gritando:
O rabicho vai morrer!

Trouxeram três bacamartes,
Todos três me apontaram,
Quando dispararam as armas,
Todas três me traspassaram!

Ferido caí no chão!
Saltaram a me pegar
Uns nos pés, outros nas mãos,
Outros para me sangrar!

Disse então um dentre eles:
— Só assim, meu camarada,
Nós provaríamos todos
Do rabicho da Geralda

Assim findo-se este drama,
Tudo assim se findará,
Como este boi, nesta terra
Não houve, nem haverá.

Fonte:
Jangada Brasil
Setembro 2010 - Ano XII - nº 140. Edição Especial de Aniversário

Mitos e Lendas (A Cascavel e a Surucucu )

Contam que certa vez houve uma reunião de cobras e serpentes. Num recanto da mata, ao cair da tarde, as comadres rastejantes contavam uma às outras as suas proezas. E eram exclamações, risadas, silvos de assustar qualquer animal que passasse a uma légua de distância.

Perto do olho d´água, afastadas das demais, a cascavel e a sucuri, inegavelmente as rainhas das serpentes conversavam, animadas.

Cheia de fingida modéstia, dizia a cascavel:

— Bem... eu não faço nada demais. Mas o coitado do bicho que sente a picada dos meus dentes, ou morre, ou fica aleijado para o resto da vida. Não escapa mesmo.

A surucucu deu uma risadinha de mofa, como quem diz "grande coisa" e, depois com indiferença falou:

— Comigo é diferente. Quando finco os dentes em qualquer bicho, humano ou não, tenho de correr depressa, para que o cadáver não caia em cima de mim.
Fonte:
Colhido por Jerônimo B. Monteiro e publicado em sua coluna Lendas, mitos e crendices
Jangada Brasil. Setembro 2010 - Ano XII - nº 140. Edição Especial de Aniversário

Machado de Assis (Junqueira Freire: Inspirações do Claustro)

DEVÍAMOS falar hoje do último livro do Sr. Fagundes Varela; o talentoso autor do prefácio que acompanha os Cantos e Fantasias, diz ali que um dos modelos do mavioso poeta foi o autor das Inspirações do Claustro; esta alusão trouxe-nos à memória um dos talentos mais estimados da nossa terra, e lembrou-nos de algum modo o cumprimento de uma promessa feita algures. Além de que, convém examinar se há realmente alguma filiação entre o poeta baiano e o poeta fluminense. Trataremos pois de Junqueira Freire e da sua obra, adiando para a semana próxima o exame do belo livro do Sr. Varela. Nisto executamos o programa desta revista; quando a semana for nula de publicações literárias, — e muitas o são, — recorreremos à estante nacional, onde não faltam livros para folhear, em íntima conversa com os leitores.

Nem todos os poetas podem ter a fortuna de Junqueira Freire, que atravessou a vida cercado de circunstâncias romanescas e legendárias. A sua figura destaca-se no fundo solitário da cela comprimindo ao peito o desespero e o remorso. Como dizem de Mallebranche, poderia dizer-se dele que e uma águia encerrada no templo, batendo com as vastas asas as abóbadas sombrias e imóveis do santuário. Rara fortuna esta, que nos arreda para longe dos tempos atuais, em que o poeta, depois de uma valsa de Strauss, vai chorar uma comprida elegia; este é decerto o mais infeliz: qualquer que seja a sinceridade da sua dor, nunca poderá ser acreditado pelo vulgo, a quem não e dado perscrutar toda a profundidade da alma humana.

Junqueira Freire entrou para o claustro, levado por uma tendência ascética; esta nos parece a explicação mais razoável, e é a que resulta, não só da própria natureza do seu talento, como do texto de alguns dos seus cantos. Três anos ali esteve, e de lá saiu, após esse tempo, trazendo consigo um livro e uma história. Todas as ilusões desesperos, ódios, amores, remorsos, contrastes, vinham contados ali, página por página. Não é palestra de sacristia, nem mexerico de locutório; é um livro profundamente sentido, uma história dolorosamente narrada em versos, muitas vezes duros, mas geralmente saídos do coração. Compreende-se que um livro escrito em condições tais, devia atrair a atenção pública; o poeta vinha falar da vida monástica, não como filósofo, mas como testemunha, como o observador, como vítima. Não discutia a santidade da instituição; reunia em algumas Páginas a história íntima do que vira e sentira. O livro era ao mesmo tempo uma sentença e uma lição; não significava uma aspiração Poética, pretendia ser uma obra de utilidade; a epígrafe de P.-L. Courrier, inscrita no prefácio, parece-nos que não exprime senão isto. De todasestas circunstâncias nasceu, antes de tudo, um grande interesse de curiosidade.

Que viria dizer aquela alma, escapa do mosteiro, heróica para uns, covarde para outros? Essa foi a nossa impressão, antes de lermos pela primeira vez as Inspirações do Claustro. Digamos em poucas palavras o que pensamos do livro e do poeta, a quem parece que os deuses amavam, pois que o levaram cedo.

No prefácio que acompanha as Inspirações do Claustro, Junqueira Freire procura defender-se previamente de uma censura da crítica: a censura de inconseqüência, de contradição, de falta de unidade no livro, censura que, segundo ele, deve recair sobretudo no caráter diferente dos "Claustros", a apologia do convento, e do "Monge" condenação da ordem monástica. Teme, disse ele, que lhe chamem o livro uma coleção de orações e blasfêmias. Caso raro! O poeta via objeto de censura exatamente naquilo que faz a beleza da obra; defendia-se de um contraste, que representa a consciência e a unidade do livro. Sem esse dúplice aspecto, o livro das Inspirações perde o encanto natural, o caráter de uma história real e sincera; deixa de ser um drama vivo. Contrário a si mesmo, cantando por inspirações opostas, aparece-nos o homem através do poeta; vê-se descer o espírito da esfera da ilusão religiosa para o terreno da realidade prática; assiste-se às peripécias daquela transformação; acredita-se na palavra do poeta, pois que ele sai, corno Enéias, dentre as chamas de Tróia. O escrúpulo portanto era demasiado, era descabido; e a explicação que Junqueira Freire procura dar ao dúplice caráter das suas Inspirações, sobre desnecessária e confusa.

A poesia dos "Claustros" é uma apologia da instituição monástica; estava então no pleno verdor das suas ilusões religiosas. O convento para ele é o refúgio único e santo às almas sequiosas de paz, revestidas de virtude. A voz do poeta é grave, a expressão sombria, o espírito ascético. Não hesita em clamar contra o século, a favor do mosteiro contra os homens, a favor do frade. Confundindo na mesma adoração os primeiros solitários com os monges modernos, a instituição primitiva com a instituição atual, o poeta levanta um grito contra a filosofia, e espera morrer abraçado à cruz do claustro.

O que faz interessar esta poesia é que ela representa um estado sincero da alma do poeta. uma aspiração conscienciosa; a designação do século XVIII, feita por ele, para tirar os seus versos do círculo das impressões atuais e constituí-los em simples apreciação histórica, nada significa ali, e se alguma coisa pudesse significar, não seria a favor do prestígio do livro. Os "Claustros", o "Apóstolo Entre as Gentes", e algumas outras páginas, exprimindo o estado contemplativo do poeta, completam essa unidade do livro que ele não viu, por virtude de um escrúpulo exagerado.

Não diz ele próprio algures, saudando a profissão de um religioso:


Eu também ideei a linda imagem
Da placidez da vida;
Eu também desejei o claustro estéril
Como feliz guarida.


Pois bem, as páginas aludidas representam nada menos que a imagem ideada pelo poeta; dar-lhes outra explicação é mutilar a alma do livro.

O poeta canta depois o "Monge". É o anverso da medalha; e a decepção, o arrependimento, o remorso. Aqui já o claustro não é aquele refúgio sonhado nos primeiros tempos; é um cárcere de ferro, o homem se estorce de desespero, e chora suas ilusões perdidas. Quereis ver que profundo abismo separa o "Monge" dos "Claustros", ligando-o todavia, por uma sucessão natural? O próprio monge o diz:


Corpo nem alma os mesmos me ficaram.
Homem que fui não sou. Meu ser, meu todo
Fugiu-me, esvaeceu-se, transformou-se.
Vivo, mas acabei meu ser primeiro.
....................................
Dista, dista de mim minh'alma antiga.


Aquele ser primeiro, aquela alma antiga, é o ser, é a almados "Claustro". A transformação do poeta fica aí perfeitamente definida no livro. E para avaliar a tremenda queda que a alma devia sentir basta comparar essas duas composições, tão diversas entre si, na forma e na inspiração; elas resumem a história dos três anos de vida do convento, aonde o poeta entrou cheio de crença viva, e donde saiu extenuado e descrente, não das coisas divinas, mas das obras humanas. Da comparação entre essas duas poesias, fruto de duas épocas, é que resulta a autoridade de que vem selada aquela sentença contra a instituição monacal. Sem excluir da comparação o "Apóstolo Entre as Gentes", devemos todavia lembrar que há nessa poesia um tom geral, um espírito puramente religioso, que não deriva da inspiração dos "Claustros", nem se prende à existência dos mosteiros. O poeta canta simplesmente a missão do apóstolo; a história e a religião são as suas musas. Falando a um sentimento mais universal, pois que a filosofia não tem negado até hoje a grandeza histórica do apostolado cristão, Junqueira Freire eleva-se mais ainda que em todas as outras poesias, e acha até uma nova harmonia para os seus versos que são os mais perfeitos do livro. Aí é elemais poeta e menos frade: alguns versos mesmo deviam produzir estranha impressão aos solitários do Mosteiro; o poeta não hesita em proclamar a unidade religiosa de todos os homens, a mesma divindade dominando em todas as regiões, sob nomes diversos. Os últimos versos, porém, resumem a superioridade do sacerdote cristão; superioridade que o poeta faz nascer da constância e do infortúnio:

Nos, áditos do místico pagode
O ministro de Brama aspira incensos.
O áugure de Teos assentado
Na trípode tremente auspícios canta.
O piaga de Tupá, severo e casto,
Nas ocas tece os versos dos oráculos.
E o sacerdote do Senhor, — sozinho, —
Coberto de baldões, a par do réprobo,
Ante o mundo ao martírio o colo curva,
E aos céus cantando um hino sacrossanto,
Como as notas finais do órgão do templo,
Confessa a Deus, e — confessando — morre.


A sentença de impiedade que o poeta antevia, se lhe deram, não teve nem efeito nem base. Combatendo o anacronismo e a ociosidade de uma instituição religiosa,
Junqueira Freire não se desquitava da fé cristã. A impiedade não estava nele, estava nos outros Veja-se, por exemplo, os versos a "Frei Bastos", um Bossuet, na frase do poeta, que se afogava, ébrio de vinho:


No imundo pego da lascívia impura
.....................................
Desces do altar à crápula homicida,
Sobes da crápula aos fulmíneos púlpitos.
Ali teu brado lisonjeia os vícios,
Aqui atroa apavorado os crimes.
E os lábios rubros dos femíneos beijos
Disparam raios que as paixões aterram.


Ora, vejamos: este espetáculo era próprio para avigorar o espírito do poeta, na sua dedicação à vida monástica? Imagine-se uma alma jovem, de elevadas aspirações, ascética por índole, buscando na solidão do claustro um refúgio e um descanso, e indo lá encontrar os vícios e as paixões cá de fora; compare-se e veja-se, se a elegia do "Monge" não é o eco sincero e eloqüente de uma dor eloqüente e sincera.

"Meu Filho no Claustro" e a "Freira" exprimem o mesmo sentimento do "Monge"; mas aí o quadro é mais restrito, e a inspiração menos impetuosa. o monólogo da "Freira" é sobretudo lindo pela originalidade da idéia, e por uma expressão franca e ingênua, que contrasta singularmente com a castidade de uma esposa do Senhor.

Fora dessas poesias que compõem a história do monge e do poeta, muitas outras há nas Inspirações do Claustro, filhas de inspiração diversa, e que servem para caracterizar o talento de Junqueira Freire: "Mílton", o "Apóstata", o "Converso", o "Misantropo" , o "Renegado" várias nênias a morte de alguns religiosos. Todas nascem do claustro; pelo assunto e pela forma; vê-se que foram compostas na solidão da cela; esta observação precede mesmo em relação ao “Renegado”, canção do judeu. Uma só poesia faz destaque no meio de todas essas: é a que tem referência a uma mulher e a um amor. Entraria o amor, por alguma coisa, na resolução que levou Junqueira Freire para o fundo do mosteiro? Ou, pelo contrário, precipitou ele o rompimento do monge e do claustro? A este respeito, como de tudo quanto diz respeito ao poeta, apenas podemos conjeturar; nada sabemos de sua vida, senão o que ele próprio refere no prefácio. Qualquer que seja, porém, a explicação dessa página obscura, nem por isso deixa ela de ser uma das mais dolorosas da vida do poeta, uni elemento de apreciação literária e moral do homem.

Tratamos até aqui do frade; vejamos o poeta. Junqueira Freire diz no prefácio que não é poeta, e não o diz para preencher essa regra de modéstia literária, que é comum nos prólogos; sentia em si, diz ele, a reflexão gelada de Montaigne, que apaga os ímpetos. Teria razão o autor das Inspirações? Achamos que não. Não e inspiração que lhe falta, nem fervor poético; colorido, vigor, imagens belas e novas, tudo isso nos parece que sobram em Junqueira Freire. O seu verso, porém, às vezes incorreto, às vezes duro, participa das circunstâncias em que nascia; traz em si o cunho das impressões que rodeavam o poeta; Junqueira Freire pretendia mesmo dar-lhe o caráter de prosa medida, e por honra da musa e dele devemos afirmar que o sistema muitas vezes lhe falhou. Tivesse ele o cuidado de aperfeiçoar os seus versos, e o livro ficaria completo pelo lado da forma. O que lhe dá sobretudo um sabor especial é a sua grande originalidade, que deriva não só das circunstâncias pessoais do autor, mas também da feição própria do seu talento; Junqueira Freire não imita ninguém; rude embora, aquela poesia é propriamente dele; sente-se ali essa preciosa virtude que se chama — individualidade poética. Com uma poesia sua, uma língua própria, exprimindo idéias novas e sentimentos verdadeiros, era um poeta fadado para os grandes arrojos, e para as graves meditações. Quis Deus que ele morresse na flor dos anos, legando à nossa bela pátria a memória de um talento tão robusto quanto infeliz.

Fonte:
Machado de Assis. Crítica Literária. Pará de Minas/ MG: Virtualbooks, 2003.

Soares de Passos (O Canto do Livre)

Ao meu amigo Alexandre Braga.

Gema embora a terra inteira
Acurvada a iníquas leis;
Esta fronte sobranceira
Jamais de rojo a vereis.
Oh! ninguém, ninguém a esmaga,
Que eu sou livre como a vaga,
Que sacode sobre a plaga
O jugo d'altos baixéis.

Liberdade é o mote escrito
No céu, na terra, e no mar!
Di-lo a fera no seu grito,
E as aves cruzando o ar;
Di-lo o vento da procela,
A vaga que se encapela,
E nos espaços a estrela
Em seu contínuo girar.

Di-lo tudo! mas ainda
Mais livre me criou Deus
Que os astros da altura infinda,
Os ventos, e os escarcéus.
Eu tenho mais liberdade
Desta alma na imensidade,
Pois tenho nela a vontade,
Tenho a razão, luz dos céus.

Eu sou livre! erguendo a fronte
Diz-mo uma voz na amplidão,
Quando de pé sobre o monte
Me elevo rei da soidão;
Quando além do firmamento
Alçando meu pensamento,
Solto nas asas do vento
Meu canto d'inspiração.

Eu sou livre! eis minha crença,
Nem força contra ela vale.
Que um tirano enfim me vença –
Triunfarei por seu mal.
Triunfarei, que algemado
E diante dele arrastado,
Sou livre! será meu brado
Té ao momento final.

E que importa que o tirano,
Jurando vingança atroz,
Faça erguer, sorrindo ufano,
Um cutelo à sua voz?
Minha fronte sempre erguida
Há-de encará-lo atrevida,
E só cair abatida
Ao rolar aos pés do algoz.

Mas nunca! pois fora um preito
Dar os pulsos ao grilhão.
Tenho um ferro, e neste peito
Tenho um livre coração!
Não! jamais serei cativo!
Se vencido restar vivo,
Cairei, sorrindo altivo,
Sob o punhal de Catão!

Fonte:

Poesias de Soares de Passos. 1858 (1ª ed. em 1856). http://groups.google.com/group/digitalsource

Ricardo Azevedo (Voltando da Escola pra Casa)

O menino estava voltando a pé da escola. A vida para ele parecia uma coisa sempre igual. Chegar em casa, comer, fazer lição, brincar, tomar banho, jantar, dormir, acordar. No dia seguinte, tudo a mesma coisa outra vez.

Um ruído veio de um terreno baldio. Parecia uma voz. Por entre as folhagens, o menino viu um cachorro cobrindo o focinho com as patas. O bicho, de repente, resmungou:

— Isso não podia ter acontecido!

O cabelo do menino ficou duro feito arame. Saiu correndo, mas parou. Onde já se viu cachorro falar? Deu risada de si mesmo. Já estava quase na 4a série. Sabia escrever, ler e fazer contas. Aquilo só podia ser alguma confusão.

Deu meia volta e passou de novo pelo terreno baldio. O cachorro agora estava andando de uma lado para o outro dizendo:

— Não, não e não!

Quase sem respirar, o menino chegou mais perto.

Foi quando o animal gritou:

— É a pior desgraça que podia ter acontecido em minha vida!

O menino sabia que aquilo era impossível. Mesmo assim, sentiu pena do cachorro, um bicho não muito grande com o focinho sujo de terra.

O animal soltou um uivo tão sem esperança que o menino entrou no mato e perguntou se ele estava precisando de alguma coisa.

Dois olhos surpresos examinaram o menino de alto a baixo. Depois, o bicho encolheu-se, escondendo o rosto com as patas. O menino sentou-se e acariciou aquela cabeça peluda.

— Se eu contar o que acabo de descobrir hoje — disse o animal — você não vai acreditar.

E continuou falando devagarinho:

— Faz tempo, conheci uma cachorra linda. Eu estava fazendo xixi num poste. Ela passou. Abanei o rabo. Ela também. Foi amor à primeira vista.

O menino não conseguia piscar os olhos.

— No fim — continuou ele — a gente acabou se casando. A cachorra era viúva e tinha uma filha já grandinha. Cuidei dela como se fosse minha própria filha. Um dia, meu pai veio me visitar. Ele também era viúvo. Só sei que os dois gostaram um do outro, namoraram e casaram.

O menino queria fugir e ficar.

— Do casamento de meu pai com minha filha — contou o animal — nasceu uma ninhada de três cachorrinhos que, ao mesmo tempo, são meus netos, pois são filhos de minha filha, e meus irmãos pois são filhos do meu pai. Eu também tive três filhotinhos. Eles passaram a ser irmãos da minha madrasta, a filha da minha mulher. Portanto, além de meus filhos, são meus tios.

As lágrimas esguichavam dos olhos do cachorro.

— Meu pai é casado com minha filha, ou seja, minha madastra é também minha filha. Por outro lado, sou pai dos irmãos do meu pai, logo, pai de meu próprio pai. E como o pai do pai de alguém é avô desse alguém … — e aí o cachorro agitou-se — descobri que sou avô de mim mesmo!

O queixo do menino balançava debaixo da boca.

— É duro ser avô da gente mesmo! — exclamou o cachorro em prantos.

Abraçado com o menino, o animal chorou ainda durante um bom tempo. Depois, enxugou as lágrimas, pediu desculpas, despediu-se e, com ar agradecido, sumiu no matagal. Naquele dia, o menino chegou em casa mais tarde, almoçou e foi para o quarto. Deitado na cama, ficou só pensando. Como a vida pode ser uma coisa rica, complicada, meio louca, bonita, espantosa e cheia de surpresas!
Fonte:
Revista Nova Esacola. Extraído do livro Não Tenho Medo de Homem, nem do Ronco, publicado pela Fundação Cargill

Jornais e Revistas do Brasil (Folha do Acre)

Período disponível: 1910 a 1946
Local: Rio Branco, AC

O jornal Folha do Acre começou a circular em 14 de agosto de 1910, quando se declarou “órgão das aspirações e dos ideaes do povo acreano”. Era editado em “Cidade da Empresa”, cidade que daria origem à atual Rio Branco, capital do atual Estado do Acre.

O Acre era então território federal (criado em 1904), dividido em três departamentos: Alto Acre – com sede na cidade da Empreza (hoje Rio Branco), onde o jornal impresso; Alto Purus – sede em Sena Madureira e Alto Juruá – sede em Cruzeiro do Sul. Este último departamento foi desmembrado em 1912 para formar mais um, o Alto Tarauacá.

Esta organização administrativa prevaleceu até 1920, quando os departamentos foram extintos. Até então, cada departamento era administrado por prefeitos, nomeados pelo presidente da República. Com a extinção, o Território Federal do Acre passou a ter um governador, também designado pelo presidente da República.

A falta de autonomia política e econômica (o Acre não tinha controle sobre o recolhimento dos impostos oriundos da sua produção de borracha, importante geradora de riqueza para o país até a década de 20) e o sentimento de abandono por parte do governo federal provocaram crescente insatisfação da população acreana, que tentou, algumas vezes, reivindicar e até mesmo se rebelar contra a situação do território. Essa mobilização da população ficou conhecida como Movimento Autonomista.

O primeiro movimento, chamado de Revolta dos Cem Dias, ocorreu já em 1910, quando o prefeito do departamento do Juruá, o coronel João Cordeiro, foi deposto por comerciantes da cidade de Cruzeiro do Sul, e a região passou ao governo de uma junta autonomista durante cem dias. A revolta foi controlada pelo Exército e, dois anos depois, o departamento perdeu ainda mais autonomia e poder ao ser desmembrado. Na primeira página do número inicial da Folha do Acre podem-se ler notícias sobre a luta pela autonomia do Acre:

"No intuito de prestarmos aos nossos leitores as mais amplas informações sobre o movimento autonomista que nesse departamento se levantou triumphante no dia 1 de junho ultimo, extrahimos os seguintes tópicos da longa e circumstanciada noticia que a respeito estampou o nosso illustre colega Cruzeiro do Sul sentindo não a podermos reproduzir na integra, attendendo á absoluta falta de espaço em nossa folha.

Há muito que os habitantes do Alto Juruá anciavam a sua libertação do regimem prefeitural que não se retribuía de nenhum modo as suas aspirações de liberdade. 

A nomeação do exmo. Sr. Coronel João Cordeiro, para prefeito do Alto Juruá veio implantar no espírito popular a convicção de que o governo não concederia tão cedo a nossa tantas vezes solicitada autonomia.

A população continuava onerada pelo pezado gravame dos impostos; a verba que o governo concedia á Prefeitura era escassa e mal satisfazia as mais urgentes necessidades; a instrução publica estava ameaçada de desapparecer, pelas reduções dos ordenados dos professores; todos finalmente experimentavam a negra sensação de um eclipse que viesse obumbrar todas as nossas aspirações.

Com recurso supremo foi decidida a proclamação da autonomia do Território do Acre. 

O governo seria forçado a nos conceder o que até então nos havia recuzado.

Anuciou-se a vinda á vinda a esta cidade do venerando e prestimoso chefe do Partido Autonomista, exmo. Sr. Coronel Francisco Freire de Carvalho, e, de fato, á 29 do mez passado a população do Cruzeiro do Sul, assistia comovida a mais solene e expotanea consagração feita a um vulto político."

Dois anos depois, no departamento do Alto Purus, o prefeito também foi deposto pela população. No entanto, nos dois departamentos, a prefeitura foi retomada pelo governo federal.

A insatisfação popular não diminuiu com a extinção dos departamentos em 1920 e a questão autonomista continuou em pauta até a criação do Estado do Acre, em 1962.

Foi este o contexto histórico em que circulou a Folha do Acre, um período de tensão (e conflitos) na história do Acre, que se estendeu por mais de cinquenta anos.

Lançado com quatro páginas, o jornal era propriedade de uma “Associação”, de origem não identificada. Seus primeiros diretor e redator foram respectivamente Teophilo Maia e Nelson Noronha. Em 1911 o jornal passou ao controle do Partido Constructor Acreano – “Órgão do Partido Constructor Acreano”, segundo passou a informar a edição número 50, de 14 de agosto de 1911. Nota na mesma edição informava que o jornal continuaria defendendo “os interesses do povo” e apoiando à administração municipal de Deocleciano de Souza.

No número 102, de 20 de dezembro de 1912, a Folha do Acre noticiou a primeira reforma do Território do Acre, ao publicar decreto, datado de 28 de outubro de 1912, criando o novo departamento de Tarauacá. Em 23 de novembro de 1920, no número 339, o jornal publicou decreto de 1 de outubro de 1920, que extinguia os departamentos unificando o território. Dois números depois, já no ano de 1921, o local de publicação informado não é mais o “Departamento do Alto Acre”, mas sim o “Território do Acre – Brasil”, enquanto a primeira página noticiava a chegada do primeiro governador do território unificado, Epaminondas Jacome.

No início as assinaturas anuais custavam 50$000 e semestrais 30$000. Era impresso em máquina “Marinoni” em oficina própria, na rua General Olimpio da Silveira, na Cidade da Empreza.
Fonte
Morais, Maria de Jesus. “Acreanidade”: invenção e reinvenção da identidade acreana. 2008. 301f. Tese (Doutorado em Geografia). Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2008.
Disponível em http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/folha-do-acre

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 771)


Uma Trova de Ademar  

Um desejo que me abrasa,
no Ano Novo é ver os nobres,
levando as sobras de casa
para a casa dos mais pobres!

–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional


A paz que tanto almejei,
em sonhos que não tem fim,
estava onde não busquei:
- perdida dentro de mim!

–Luiz Antonio Cardoso/SP–

Uma Trova Potiguar


Mais um ano se inicia,
e o tempo a gente é que faz;
quem quiser ter alegria,
plante a semente da paz.

–Djalma Mota/RN–

Uma Trova Premiada

2002 - Garibaldi/RS
Tema - FIM DE ANO - M/H


Muitos vultos tenho visto
nos anais com grande glória;
mas somente Jesus Cristo
dividiu a nossa história.

–Antonio Vogel Spanemberg/RS–

...E Suas Trovas Ficaram


Que o ano novo lhes traga,
ó meus irmãos Trovadores,
aquela mais alta vaga
no pódio dos vencedores!

–João Freire Filho/RJ–

U m a P o e s i a


Hoje eu pedi para o povo
em preces e em orações,
muita paz neste Ano Novo,
muito amor nos corações!
E fiz pra Deus uma carta
pedindo uma mesa farta
para o faminto comer;
mandei essa carta em nome
daquele que passa fome...
E que não sabe escrever!

–Ademar Macedo/RN–

Soneto do Dia

TRANSITÓRIO.
–Vanda Fagundes Queiroz/PR–


Trezentos e sessenta e cinco dias,
meu calendário, foi seu tempo exato.
Agora é estranho, quando então constato:
- É um bloco velho, já sem serventias.

Mas eu o estimo. As datas foram guias...
Cada lembrete compôs um retrato
do cotidiano que se fez, de fato,
de altos e baixos, sombras e alegrias.

Releio as notas... Dói-me concordar:
- Dever cumprido! Ceda o seu lugar
para o que chega e estreia no cenário.

Tão companheiro, em toda a minha lida
de um ano inteiro... para mim, tem vida!
– Adeus, meu velho amigo Calendário...

Teatro de Ontem e de Hoje (Greta Garbo, Quem Diria, Acabou no Irajá)

Em estilo realista, a peça de Fernando Mello faz um retrato da solidão humana na metrópole, por meio de um viciado que sonha ser Greta Garbo. Na função de coadjuvante, o jovem ator Mário Gomes conduz o espetáculo e surpreende a crítica.

A história, ambientada no subúrbio carioca, se passa no apartamento de Pedro, que sonha ser Greta Garbo. Pedro acolhe Renato, um jovem que chega do interior para estudar medicina. No primeiro ato, o jovem, que tem por amante uma prostituta, vive o conflito da definição sexual devido ao envolvimento com seu anfitrião.

Renato acaba roubando drogas na enfermaria onde trabalha para satisfazer Pedro, que nega abrigo à prostituta quando ela se vê perseguida pela polícia.

Greta Garbo, Quem Diria, Acabou no Irajá se sustenta na construção psicológica de Pedro, Renato e Mery, nos diálogos e no conflito que liga as três personagens. A trama, que começa como comédia e desemboca na crueldade e na amargura da relação entre os dois personagens masculinos, se conclui com a solidão do protagonista.

Em crítica para o Jornal do Brasil, Yan Michalski elogia a solidez do realismo construído pelo autor e a densidade dos personagens masculinos. Faz restrições ao esquematismo do papel da prostituta, que tem aparições episódicas, insuficientes para lhe atribuir densidade semelhante à de Pedro e Renato.

Aldomar Conrado, em crítica para o Diário de Notícias, escreve que na peça se encontram "as características muito especiais desse pernambucano radicado no Rio: seu humor ácido, seu diálogo incisivo, sua capacidade de, em rápidas pinceladas, definir toda uma situação".1

Sobre o espetáculo, depois de criticar algumas escolhas da direção, como o uso de slides para sublinhar a passagem de tempo, afirma: "Já no campo dos atores, Léo Jusi conseguiu um rendimento surpreendente. E algo de muito especial terminou acontecendo. Embora Nestor de Montemar e Arlete Salles possuam toda aquela experiência de teatro, Mario Gomes, ainda engatinhando no teatro e na televisão é que vai conduzir o espetáculo. Bonito de ver como este jovem ator consegue tirar rendimento da sua própria inexperiência. [...] Nestor de Montemar em seu melhor momento no teatro. A 'louca' amargurada que sonhava ser Greta Garbo, comove e convence".2

Notas

1. CONRADO, Aldomar. Greta Garbo de Irajá. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 08 jul. 1973.

2. CONRADO, Aldomar. Greta Garbo: o espetáculo. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 10 jul. 1973.

José de Alencar (Ao Correr da Pena) Rio, 7 de Outubro de 1855: Correi, minha pena

(Folhetins do “Diário do Rio” – de 7 de outubro de 1855 a 25 de novembro de 1855)

Correi, correi de novo, minha boa pena de folhetinista!

És livre, como tuas irmãs, que cortam os ares nas asaa ligeiras; abri o vôo, lançai-vos no espaço.

Avante.

Mas como estão mudados os tempos; como são diferentes os dias de agora, daquelas semanas em que brincavas sorrindo com os bailes, com as moças, com a música, com tudo que era belo e sedutor!

Então tudo eram flores, - flores mimosas que desabrochavam aos raios de um belo sol de primavera, - que brilhavam sob um céu azul perfumando aqueles dias tão tranqüilos e tão serenos.

Hoje as rosas murcharam, o céu turvou-se; e nesta sáfara da vida por que passamos atualmente, apenas florescem os cardos com seus espinhos, as saudades com a sua melancolia, e os goivos com o seu triste emblema.

Felizmente todo o deserto tem seus oásis, nos quais a natureza por um faceiro capricho, parece esmerar-se em criar um pequeno berço de flores e de verdura, concentrando nesses cantinhos de terra toda a força de seiva necessária para fecundar as vastas planícies.

Assim nesta quadra de amarguras e sofrimentos, encontram-se de espaço a espaço alguns corações ricos de virtudes e de sentimento; são os oásis deste tempo.

Aí sim; aí há flores; não as rosas brilhantes de outrora ou as camélias aveludadas dos salões; mas as flores modestas, filhas da sombra e do retiro, as flores do – sentimento, as violetas.

Vós, minhas leitoras, que sabeis sentir, bem compreendeis o que são estas violetas de que falo; são as flores singelas de vossa alma, - a caridade, a beneficência, o zelo e a abnegação.

Também me compreendem os pobres e infelizes, que tantas vezes durante estes tempos de provação tem sentido os perfumes suaves, a fragrância consoladora dessas flores do coração, - flores que desabrocham orvalhadas com as lágrimas da desgraça e do sofrimento.

E sobre tudo isto, há ainda a religião, - a nossa bela religião de Cristo, - mãe extremosa de todos os órfãos, - a irmã desvelada de todos os infelizes, - a amiga e companheira fiel dos pobres, - a consoladora de todas as misérias, e todas as aflições.

É ela que nos há de dar força e coragem para atravessarmos com resignação esses dias de atribuição, que felizmente parece irão pouco a pouco se acalmando, até nos deixarem aquela serenidade dos belos tempos de que hoje temos tanta saudade.

E agora, minhas leitoras, deixai-me dar-vos um conselho, que estou certo haveis de acolher com toda aquela amabilidade com que outrora acompanháveis os ziguezagues desta minha pena caprichosa, que bem vezes vos dava sérios motivos para um arrufo, para um enfado.

Voltemos porém ao conselho; não penseis já que é algum conselho muito grave, muito sério, vestido de calça e casaca preta com gravata branca, - à guisa de um antigo conselheiro da coroa.

Não; - é um pequeno conselho bem próprio para moças bonitas como sois, - um conselho que tem além de todas as outras vantagens, o merecimento de mostrar as pérolas de vossos dentes, e de fazer da vossa boca uma florzinha cor-de-rosa.

Aconselho-vos, que apesar dos tempos em que estamos, apesar de tanta tristeza e melancolia que envolve esta bela cidade, apesar de tudo, apesar mesmo das lágrimas, não deixeis de sorrir.

Notai porém que eu digo simplesmente sorrir e não rir.

O riso, é esta expressão vulgar com que exprimimos a alegria, e o humor; é muitas vezes mesmo um movimento nervoso, sem sentido sem significação, um hábito que se contrai como tantos outros, como o costume de estalar os dedos, de alisar o bigode, ou endireitar o colarinho.

Assim rir, quando alguém sofre, quando nossos irmãos padecem, é uma ofensa amarga, um insulto à dor e a desgraça; porque esse riso, se não é um escárnio, é uma indiferença fria. É uma insensibilidade estúpida.

Mas o sorriso, é diferente.

O sorriso, é esta exalação da alma, que nos momentos de calma e tranqüilidade vem desabrochar nos lábios, e abrir-se como uma dessas flores silvestres que o menor sopro desfolha.

Nunca vistes nas noites cálidas e límpidas, essas estrelas brilhantes que atravessam o horizonte, traçando no espaço um rasto luminoso, e brilhando um momento entre a escuridão das trevas?

Dizem que isto é um efeito da eletricidade. Pois o sorriso, - como as estrelas filantes, - é produzido também por esse choque de emoções, e de sentimentos, que se pode bem considerar como a eletricidade moral.

Portanto não há mal nenhum, minhas belas leitoras, em que deixeis vossos lábios sorrirem, e vossas almas expandirem-se no lindo rosto; há sorrisos alegres, porém, também os há serenos, tristes e melancólicos.

Demais, peço-vos isto também por nós. Que quereis que façamos, se nestes dias aflitos não virmos brilhar uma estrela, uma flor, um sorriso?

Quanto a mim, sou como o marinheiro do Mediterrâneo, perdido na vasta amplidão dos mares, batido pela procela, que no meio da escuridão e do vendaval, apenas vê brilhar no céu uma estrela furtiva, sente-se reanimado, cria novas forças, e murmura a sua prece. Ave Maria Stella.

Assim no meio dos desgostos e das tribulações, quando virdes um sorriso despontar nos lábios de uma linda mulher que vos ame, podeis fazer como o marinheiro; ajoelhai e murmurai a vossa prece. Ave Maria Stella.

Portanto, minhas belas leitoras, sorri, sorri sempre, como sorri o céu, o mar, e tudo que é belo; porque foi este o destino que deus deu as coisas mimosas: porque é esta a missão que representam neste mundo a beleza e a graça.

E quando quiserdes sorrir, não esquecei o vosso protegido, o Ginásio, aquele pequeno e lindo teatro, sobre o qual tantas vezes conversamos outrora, nos domingos.

Ainda é o mesmo; sempre digno da vossa solicitude, sempre esforçando-se em corresponder a amabilidade com que o tratais.

Depois que nos separamos tão repentinamente, tem havido nele muita coisa de novo, muita representação interessante; porém de tudo o que se me tem contado, a mais bela noite do Ginásio foi a de quinta-feira, - em que teve lugar o benefício dos pobres.

Se eu já não soubesse, minhas leitoras, que amais de coração este bom teatrinho, que vos dá tantas horas de agradável passatempo, podia contar que depois deste ato de beneficência, não lhe recusaríeis a vossa proteção, e sobretudo a vossa presença, que é a maior proteção que pode dar uma linda moça.

Não sei sobre que mais hei de falar-vos que já não tenha sido dito e repetido pôr tantas penas delicadas, que vos apresentam todos os domingos a história da semana.

Sobre Norma?

Quem é que não foi ver no teatro lírico esta criação de Emy La Grua; quem não ouviu esse canto inspirado e profundo que os faz correr pelo corpo um arrepio de emoção?

Norma, como a vi num desses dias no teatro lírico, fez-me compreender o episódio da Velleda dos Mártires de Chateaubriand, que, segundo dizem, forneceu o assunto deste pequeno poema de paixão violenta, de ciúme selvagem, e de amor sublime.

Falam por aí de algumas exagerações que pretendem haver na criação deste papel dramático; mas quem assim pensa, não tem uma verdadeira idéia da arte.

Por mim, não concebo que um crítico possa dizer ao poeta, ao artista, ao gênio, enfim como Deus disse ao mar: - Vós não passareis daqui.

Desde o momento em que o homem, nos vôos de sua inteligência se eleva acima das circunstâncias ordinárias da vida, desde que o seu pensamento se lança no espaço, possuído desse desejo ardente, dessa inspiração insaciável de atingir ao sublime, não é possível marcar-lhe um dique, um ponto que lhe sirva de marco.

Ide dizer ao poeta que não deixe correr a sua imaginação pelos espaços infinitos da fantasia, - ide dizer ao pintor que force o seu pincel quando corre inspirado sobre a tela, e eles vos responderão que o pensamento que os anima neste instante escraviza e esmaga a sua vontade; que a alma e o corpo cedem à força da inspiração que os arrebata neste momento.

Como o poeta, como o pintor, é o artista dramático, quando se acha possuído de seu papel, quando sente abrasar-se-lhe nas veias o fogo sagrado; é preciso ainda notar que este tem mais um motivo para deixar-se arrastar, tem os aplausos e os bravos de uma multidão inteira.

Assim, tudo isto a que vulgarmente chamam exagerações, são apenas os arrojos da imaginação do artista, os primeiros esboços de sua criação, que ele ainda não teve tempo de polir e de limar; pôr isso se houverdes visto a Norma todas as vezes como eu, de certo tereis reparado que cada dia uma dessas exagerações vai tomando nova forma, vai-se desenhando mais brilhante, mais luminosa, como um painel que se retoca.

Pôr tudo isso que tenho escrito, não penseis que me faço um defensor cego de La Grua, um defensor quand même da cantora que é hoje a estrela brilhante do teatro Lírico.

Não: - nem ao público, nem a ela, nem a nós, conviria uma admiração tão cega, que excluísse a franqueza, quando pôr acaso se tornasse necessária.

O artista, a quem julgo ofender dizendo-lhe a verdade, e apontando-lhe um erro, - é sempre um artista medíocre que vive da sombra da glória, sem merecimento real.

Por isso nós, com Emy La Grua, faremos, se for necessário, como dizia Afonso Karr a propósito das mulheres bonitas; faremos como o escultor que talha o mármore de uma estátua, não para ofende-la, mas para modelar-lhe as formas elegantes e arredondar-lhe os mimosos contornos.

Se for necessário, o dissemos nós, porque parece-nos que nunca teremos ocasião de fazer de nossa pena de folhetinista um buril de escultor.

Al.
Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.

I Concurso de Poesia 20 de Outubro - "Regina de Souza Marques Almeida" (Resultado Final)

Poesia Vencedora:

O amor e o Português
Autor: Fernanda Rezende Ramos
Uberlândia – Minas Gerais

Menção honrosa:

Os Reis
Autor: Renata Paccola
São Paulo – SP

Alinhavos sem conchavos
Autor: Geraldo Trombim
Americana – SP

Allegro com Polaroid
Autor: Flávio Lanzarini
Rio de Janeiro – RJ

Pintura
Maria de Fátima de Barros Neves
Villenave d’Ornon - França

Da vuvuzela à Beethoven
Autor: Denivaldo Piaia
Campinas – SP

Mãos Negras
Autor: Vânia Aparecida Melo Coelho Oliveira
Ituiutaba – MG

Pernanbuquês
Autor: Camila Pereira dos Santos
Ituiutaba – MG

Arestas
Autor: Márcio Dison
Trindade – SC

O vestido
Autor: Reginaldo Costa de Albuquerque
Campo Grande – MS

Fonte:
Http://concursos-literarios.blogspot.com

4º Prêmio Literário Sérgio Farina (Resultado Final)

Elton Rodrigues (autor da ilustração da capa do livro do Concurso), Sirlei dos Reis (Crônica 'Cinderela"),
Cristina Duarte (1º lugar Contos "A mala vermelha') e Aderbal Saldanha (Conto 'O Sumiço de Rafaela')
CONTOS 

1º LUGAR

A mala vermelha
Cristina Duarte (Porto Alegre RS)

2º LUGAR
Aromas
Eni Allgayer (Sapucaia do Sul RS)

3º LUGAR
Xadrez
Ana Cristina Mendes Gomes (São Pedro da Aldeia RJ)

Quando tudo está ruim – Tatiana Eiko Ikeda (Curitiba PR)
Como se constrói um túmulo – Amado Reksona (São Leopoldo RS)
E assim se fez o mar – Tiago André Vargas (Caxias do Sul RS)
A tentação – José Ronaldo Siqueira Mendes (Mutum MG)
Manequim – Reginaldo Costa de Albuquerque (Campo Grande MS)
No colo da história – Marcus Vinicius Quiroga (Rio de Janeiro)
Spinosaurus Aegipticus – Alexandra Lopes da Cunha (Porto Alegre RS)
Essa sobra de mim – Reginaldo da Luz Pujol Filho (Porto Alegre RS)
Papo de louco – Luiza Maria de Lima Horta Barbosa (Brasília DF)
O sumiço de Rafaela – Aderbal Farias Saldanha (São Leopoldo RS)

POESIAS

1º LUGAR

Promessas vãs de uma rainha
Leandro Noronha da Fonseca (São Paulo SP)

2º LUGAR
Saudade da dor
Anderson Soares Freixo (Salvador BA)

3º LUGAR
Eu e o mar
Ana Cristina Mendes Gomes (São Pedro da Aldeia RJ)

Ode inversa a julian – Rafael Luiz Zen (Brusque SC)
Soneto da noite cheia – Pedro Laurentino Reis Pereira (Teresina PI)
O espelho – Simone da Silva Pereira (São José dos Pinhais PR)
Sitiada – Rodrigo Domit (Rio de Janeiro RJ)
Véspera – Marco Aurélio Pinotti Catalão (Campinas SP)
O vácuo – Fabio Pereira Gomes (Ramos RJ)
Descompasso – Estela Elisabete Reichert (São Leopoldo RS)
A Califórnia de Foucault – Anderson de Oliveira Menezes (Salvador BA)
A última valsa – Eduardo de Paula Nascimento (Franca SP)
Habito o tumultuado trânsito de me tornar quem sou – Marília Silveira (Porto Alegre RS)

CRÔNICAS

1º LUGAR

Dicionário para a vida inteira
Carlos Augusto de Almeida (Três Rios RJ)

2º LUGAR
Brincos
Manoela Franco Prado de Andrade (Feira de Santana BA)

3º LUGAR
Provas
Júnia Paixão Mendes de Castro (Carmo da Mata MG)

Veterana – Wellington de Sousa Oliveira (Magé RJ)
O parto da gata – João Carlos Marcon (Guarapuava PR)
No quartinho de despejo – Regina Nadaes Marques (Rio de Janeiro RJ)
(Des)receita de crônica – Tarlei Martins Ferreira (Brasília DF)
Carta à civilização – Marcelo Ricioli (São Paulo SP)
Congresso individual da culpa – Éder Rodrigues (Pouso Alegre MG)
Meu 7 de setembro – José Carlos Barbosa de Aragão (Belo Horizonte MG)
A casa da minha infância – Jurema Couto Vasques Hélcias (Santos SP)
Evolução – Gladis Berriel (Canoas RS)
Cinderela – Sirlei Terezinha da Silva dos Reis (São Leopoldo RS)
Neruda – Nilson de Carvalho Lattari (Juiz de Fora MG)

PRATA DA CASA

A centopeia Onomatopeia – Pricilla de Oliveira Henz (São Leopoldo RS)

Fontes:
Http://concursos-literarios.blogspot.com
Foto: http://texticulosdojari.blogspot.com.br/

Clevane Pessoa entre Os Cem Mais 2012 - Prêmio zaP!

Abaixo a relação dos CEM MAIS do Prêmio zaP de 2012.

Apresentação
Por Elizabeth Misciasci


A proposta apresentada à UNESCO (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO A CIÊNCIA E A CULTURA) pretendeu para mais esse Projeto *Prêmio zaP!, deferimento com reconhecimento e Referenda por priorizar, (atuar e objetivar principalmente dando dimensão, pela forma compartilhada e abrangente), a fim de incansavelmente contribuir com a cidadania, ao Promover a Cultura.

Para anuir nomes declinados, assentindo indicações, reconhecendo estes, através:

- Homenagens aos que exercem (não ignorando, mas sim), orientando e ofertando assistência social indiscriminada.

- Valorizando e reconhecendo os que atentos reivindicam e clamam por Justiça social.

- Respeitando, e com louvor manifestando honra aos que de alguma forma, promovem, (sem concorrência e rivalidade) a cultura, atuantes, propagando nossas artes e artistas, (não pela ascensão pessoal, nem para se autopromoverem), e sim, para difusão possibilitando o reconhecimento das classes, obras, autores e, seus representantes.

- Denotando valores eméritos, aos cidadãos que focando as serias e problemáticas gerais, demonstram solidariedade, e as compartilham com anseio de reversão e solução.

- Priorizando todos aqueles que promovendo, criando, propondo, manifestando, incentivando, divulgando, colaborando, construindo, respeitando, publicando, propagando, apoiando, seja por ações, criações artísticas, trabalhos sociais, comunicações, voluntariado, praticas religiosas, ativismo, enfim, representam a grandeza humana, de forma geral pelo bem comum, com pensamento e atitudes em favor de todas as classes sociais, respeitando os respectivos princípios de cada qual, sempre e indiscriminadamente, pelo coletivo.

Por conseguinte,

- A todos os que verdadeiramente voltados ao bem comum, rogando clamam, indignados bradam, em respeito protestam, e pelo direito a dignidade da pessoa humana, exigem. Numa total demonstração de coragem, trabalham, com garra, para a construção de um mundo melhor, ansiando, colaborando e buscando com fervor a Paz Universal!

Este deve ser o perfil dos candidatos, e possíveis selecionados.
Chegando a final, e pelo percentual de votos e indicações, serão então os laureados pelo Prêmio zaP!, Exemplificamos com temas explanados, demonstrados, e devidamente descritos. Por fim, delineamos em pouquinho de nossos Homenageados, suas ações, condutas ilibadas e, altruísmo. Descrevemos os critérios, que utilizamos, bem como, os requisitos, obrigatórios, pelas regras parciais exigidas e critérios. * O Prêmio zaP!.

Mais uma Vez, Neste Ato,

Eu, Elizabeth Misciasci, expresso em meu nome e em nome de todos os que se empenharam mais uma vez para que pudéssemos prestar esse humilde gesto, nossa gratidão, respeito, reconhecimento a todos vocês homenageados Profissionais da mais alta competência e Seres Humanos da Melhor qualidade, que nos Honram, como sempre engrandecendo e abrilhantando mais um capítulo dessa história!

Elizabeth Misciasci
São Paulo, 31 de Dezembro de 2012

Abaixo:
Relação dos Cem Mais do Ano de 2012 pelo Projeto e Revista zaP!

• • Aarão Castro
• • Abilio Pacheco
• • Aecio Kauffmann
• • Amyra El Khalili
• • Ana Carvalho
• • Andreia Aparecida Silva Donadon Leal
• • Angela Moura
• • Antonio Carlos De Luccas
• • Antonio Carlos Lousada
• • Antonio Carlos Santana
• • Arahilda Gomes Alves
• • Baby Garroux
• • Caco Barcellos
• • Cal Titanero
• • Carlos Leite Ribeiro
• • Carlos Lúcio Gontijo
• • Carmo Vasconcelos
• • Celia Pessoa
• • Celito Medeiros
• • Cesar Paes Leme
• • Cida Valadares
• • Claudia Gomes
• • Clevane Pessoa de Araújo Lopes
• • Delasnieve Daspet
• • Dioni Virtuoso
• • Diva Pavesi
• • Doroty Dimolitsas
• • Édison Pereira de Almeida
• • Edson Carlos Contar (Edson Alkontar)
• • Efigênia Coutinho
• • Eliane Gonçalves
• • Eliane Triska
• • Elizabeth Metynoski
• • Eugénio de Sá
• • Everi Rudinei Carrara
• • Faffi
• • Fátima Paraguassu
• • Gabrielle Simond
• • Gustavo Dourado
• • Ivan Ferretti Machado
• • Ivan Tolentino
• • Ivan Velasco Mendes
• • Jessiel Veloso
• • João Carlos Ribeiro
• • João Roberto Santos
• • João Roberto Selentiano
• • Jose Luiz Datena
• • Jose Luiz Roselen
• • José Luizonne
• • José Renato Guimarães
• • José Renato Sátiro Santiago Junior
• • Lanilde Soares
• • Lene Sousa
• • Lilian Maial
• • Malu Mourão
• • Marcia Regina Santos Pinho
• • Marcio Marcelo do Nascimento Sena
• • Maria Claudia (Pela Paz)
• • Maria Emilia Genovesi
• • Marilena Trujillo (Mary Trujillo)
• • Marilza Albuquerque de Castro
• • Marinês Bonacina
• • Mario Capelluto
• • Mario Carabajal Lopes
• • Maurilio Tadeu de Campos
• • Miguel Rubio
• • Myrian Benatti
• • Nadir D"Onofrio
• • Nancy Cobo
• • Naidaterra
• • Nara Lindouff Cunha
• • Natalia Pereira da Silva
• • Olegário Santos Neto
• • Ogui L. Mauri
• • Olguinha Miranda Mariucci
• • Patricia Montenegro
• • Raimundo Nonato
• • Regina Tieko
• • Renato Baptista
• • Rivkah Cohen
• • Roberto Jung
• • Roberto Soares Almeida
• • Rogério Salgado
• • Sá de Freitas
• • Sandra Antonioli
• • Sandra Cassaro
• • Sandra Domingues
• • Sergio Reis
• • Silas Correa Leite
• • Silvia Leite
• • Soninha Porto
• • Teka Nascimento
• • Valdeck Almeida de Jesus
• • Valmir Salaro - Jornalista
• • Vera Jarude
• • Vera Ramirez
• • Veronica Machado
• • Victoria Aristizabal
• • Zeca Avellar (ZecaFeliz)
• • Zenaide da Luz

Nota Pela Editora
Os respectivos certificados estarão sendo disponibilizados de acordo com a ciência de cada laureado, após entrarem em contato com nosso editorial, solicitando seu respectivo diploma.

Fonte:
http://www.eunanet.net/beth/news_coluna.php?col=58&pst=7181

domingo, 30 de dezembro de 2012

Baú de Trovas V

Inspirado na bonança,
de pensamentos diversos,
o poeta é uma criança
brincando de fazer versos.
Adolfo Macedo

Que exemplo o do vaga-lume
que vive na noite escura;
quanto maior é o negrume,
mais ele voa e fulgura!
Albertina Moreira Pedro

Quem vive ofensas perdoando
e por amor tudo faz,
vai sempre em punho levando
uma bandeira de paz!
Analice Feitosa de Lima

Qual fantasia perdida
que se desfaz na amplidão,
tudo é efêmero na vida,
feito bolha de sabão!
Antônio Coutinho

Ralha o chefe, quando chego
atrasado e irritadiço...
Eu até gosto do emprego;
só não gosto é de serviço!
Antonio V. Rufatto

Sede balança amiúde
ao pesar os vossos feitos;
vereis gramas de virtude,
toneladas de defeitos.
Aristóteles Lacerda Júnior

Garimpeiro, pelos vãos
dos teus dedos que envelhecem,
muda as riquezas de mãos
para mãos que não merecem!...
Arlindo Tadeu Hagen

Destino é força que esmaga...
– Credor austero, tremendo,
manda a conta e a gente paga
sem saber que está devendo.
Barreto Coutinho

Traça os rumos com carinho,
pondo firmeza nos traços,
que a retidão do caminho
dá segurança aos teus passos.
Carolina Ramos

Veleiro de vela panda,
perdeste o rumo e, a bailar,
vais brincando de ciranda
nas águas verdes do mar!
Célio Grunewald

Já com cabelos grisalhos,
mas inda pensando em ti,
vejo a saudade em retalhos
nas cartas que recebi.
Cidoca da Silva Velho

Range a carroça, à distância,
e o boi num passo indolente
me traz lembranças da infância,
faz do passado... presente.
Cincinato Palmas Azevedo

Um abajur sobre a mesa,
na velha jarra uma flor;
um “Tango para Teresa”,
saudades de um velho amor.
Dalmir Pena

Tenho, sim, muito mais ouro
e fortuna que um ricaço:
não há no mundo tesouro
que pague as trovas que eu faço!
Darly Angélica O. Barros

Num reino que tanto mata,
onde a ambição desatina,
mesmo sem ouro e sem prata,
o rei... é quem se domina!
Diche Galvão Campos

A união se faz maior
em noite fria que tenha
uma família ao redor
de um velho fogão de lenha!
Eduardo A. O. Toledo

Assim é este mundo,
todo cheinho de loucos...
E mais este vagabundo
que te quer bem como poucos!
Francisco C. Rocha

Nem sempre a briga é conflito
quando o bom senso a conduz;
certas pedras, em atrito,
soltam centelhas de luz!
Haroldo Rodrigues de Castro

Eu prefiro a arte caduca,
pois receio a evolução.
Quanto mais ela se educa,
mais aumenta a confusão.
Humberto Del Maestro

Virtude é fazer o bem
pelo prazer de fazê-lo,
mesmo sendo para alguém
que não faz por merecê-lo.
Izo Goldman

Responde, ó Deus, pela mão
que podes ver, calejada:
– Por que há de ter tanto chão
quem nele não planta nada?
Jaime Pina da Silveira

Sacudiram minha vida,
duas coisas, te confesso:
a tua triste partida
e o teu alegre regresso.
João Batista Serra

Se alguém brigou por amor,
ou é ciúme, ou intriga...
– Quem ama não tem rancor,
e por amor ninguém briga!
José Vitor de Paiva

Se aos outros deres bom trato,
respeito, a qualquer momento,
receberás – de imediato,
o mesmo e igual tratamento.
Josias Paiva Pinheiro

Ai, meu Brasil, quem me dera
eu partir de Portugal
numa linda caravela
bem ao lado de Cabral!...
Manoel Fernandes Menendez

Respeita o empenho constante,
o eterno recomeçar
de quem erra e segue avante,
na esperança de acertar.
Maria H. C. M. Duarte

De um cantinho da Bahia,
chamado Porto Seguro,
parte o Brasil – sob a guia
de Iemanjá – rumo ao futuro.
Maria Madalena Ferreira

Numa alegria sem fim,
o meu coração criança
faz da ilusão trampolim
e mergulha na esperança...
Marta Maria P. Barros

Na epopéia de Cabral
eu bendigo a calmaria,
que, do imenso Litoral,
fê-lo aportar na Bahia.
Newton Meyer Azevedo

Sobre mulher não discutam;
seus impulsos não se medem,
as mais fracas também lutam,
as mais fortes também cedem.
Nydia Iaggi Martins

Duas lindas borboletas
persigo, em nossos idílios:
as tuas pupilas pretas,
batendo as asas dos cílios.
Orlando Brito

Saudade – espelho encantado
que mostra, aos olhos da gente,
toda a imagem do passado
revivendo no presente...
P. de Petrus

Num tormento incontrolado,
meu ciúme amaldiçoa
o teu retrato falado
nos lábios de outra pessoa.
Paulo César Ouverney

Pelas veredas singelas
da Trova e da Poesia,
se difundem as mais belas
lições de filosofia.
Roberto R. Vilela

Cansado de fazer trovas
sem que me ouvisses jamais
tentei usar armas novas
quem sabe atenda haicais.
Sérgio Serra

Pranto da noite chorosa,
orvalho feito diamante,
natureza caprichosa,
cristalizou num instante.
Silvia Reis

Nós precisamos sorrir,
mesmo sendo vergastados,
pois ninguém leva, ao partir,
os patrimônios roubados.
Swami Vivekananda

Se a família é rica ou pobre
e se o lar é acolhedor,
a gente sempre descobre
pela grandeza do amor!
Therezinha D Brisolla

Fontes:
Manoel Fernandes Menendes:
Seleções em Folha. Ano 4. N.1 – janeiro 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.2 – fevereiro 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.3 – março 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.4 – abril 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.5 – maio 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.6 – junho 2000. São Paulo/SP
Seleções em Folha. Ano 4. N.7 – julho 2000. São Paulo/SP