segunda-feira, 17 de julho de 2017

Olga Maria Dias Ferreira (Trovas)


A bela estátua consagra,
na perícia do escultor,
intensa arte que deflagra
cinzel de mágico autor.

À sombra da juventude,
vejo meu tempo passar,
e sinto, nesta amplitude,
a longa idade avançar...

As trovas mais desejadas
nesta vida sonhadora,
manifestam-se rimadas,
em minha alma trovadora...

A vida só nos ensina
o que ela mesmo contém,
e nem sempre nos destina
aquilo que nos convém...

Belos gestos de inocência,
bênçãos de amor despertaram,
e, nos trilhos da existência,
só saudade carregaram...

Bons momentos escondidos,
nas taças em esplendor,
revelam sonhos vividos,
nas asas tênues do amor...

Das chaminés do passado,
em uma bruma sem fim,
ressurge o sol decantado,
a trazer  vida pra mim...

Denso grito das entranhas
ergue gemidos de dor,
toda vez que te emaranhas
nas raízes deste amor.

De tal crime sou culpada,
afirmo ser ré confessa.
Por desejo dominada
eu descumpri a promessa.

Do teu relógio os ponteiros,
marcam com exatidão,
tantos momentos fagueiros
vividos com emoção.

É meu desejo ser tua,
na mais doce e pura essência,
pois a verdade mais crua
é tua, minha existência.

Em meu retorno ao passado,
fantasias, ilusão,
ainda corro a teu lado,
nas ondas do coração...

Em teu olhar fascinante,
meu coração se perdeu,
e, mantém minha alma errante,
plena do amor que é só teu...

Enlaçados numa rede,
co’os pés à beira do mar,
saciamos a nossa sede,
na doida sede de amar...

Esquece o vento cortante,
desfeito em chuva e cansaços,
vem ninar minha alma errante
no aconchego dos teus braços.

Fitando o espelho do lago,
onde formosa eu a vi,
lembro a ternura que trago
dos momentos que vivi.

Grilhões, um dia partidos,
pela voraz servidão,
ressoam como estampidos
da vida sem solução.

Hoje sonhei acordada,
estava enfim delirante
e de tão apaixonada
até te fiz meu amante.

Incríveis fachos de luz
brilhavam de forma intensa,
na silhueta da cruz,
em sua forma mais densa...

Lampeiro o nobre gaúcho,
galopeia na fronteira,
ao trazer, com brilho e luxo,
amor por nossa bandeira

Lanço um grito à liberdade,
arranco-te do meu peito,
prefiro a dor da saudade
que o cativeiro em teu leito.

Meus sonhos, em grandes asas,
voam no azul infinito,
e fulgem tal como brasas,
por este céu tão bonito.

Minha mão em tua face,
teu corpo junto do meu,
não é verdade, é disfarce
de um sonho que já morreu.

Na defesa da floresta,
com arroubo e galhardia,
todo ser humano atesta
nobreza e cidadania.

Não te moleste o cansaço,
quando me houveres perdido.
Eu testemunho o fracasso
deste amor enlouquecido.

Nas tardes de primavera,
plenas de luzes e cores,
relembro aquela tapera
toda enfeitada de flores...

Navegando pelos mares
agitados da procela,
treme a nau dos meus pesares,
trazendo saudades dela...

Nobre gaúcho largado
campeia pela coxilha
e traz no peito encilhado
o santo amor farroupilha...

Numa noite enluarada,
de bela praia sem fim,
sinto a imagem ondulada
das vagas batendo em mim...

O eletrônico faz tudo.
Traz imagem, bonitinho,
porém me deixa mudo
e cada vez mais sozinho...

Ó meu doce canarinho,
abre as asas contra o vento
e leva, pelo caminho,
nas asas, meu pensamento...

O sol, em pano de fundo,
grande navio ancorado,
relembram rastros do mundo,
n’algum baú do passado.

Revolta a nada conduz,
impõe-se docilidade,
segundo de Deus a luz,
surge límpida a verdade.

Sendo tua, não importa
que destino eu possa ter.
A minha alma não suporta
o medo de te perder.

Se tu me amares querido,
sem o menor preconceito,
meu sonho tão proibido
há de voltar ao meu peito.

Solto, no mar, o barquinho,
no horizonte refletido,
vaga, nas águas, mansinho,
buscando o rumo perdido...

Suplico com humildade
permissão para te amar.
Porém se o medo te invade,
deixa-me ao menos sonhar.

Toda saudade guardada,
maciça dentro do peito,
estampa-se revelada
na solidão do meu leito.

Tristonho vento assobia
uma dolente canção
que se faz luz, melodia
na pauta do coração.

Vagando em revolto mar,
a embarcação solitária
lembrava um cisne a chorar,
numa ilha imaginária.

Maria Thereza Cavalheiro (O Bom Trovar : Como contar as sílabas poéticas - Escansão)

Vimos que cada verso da trova deve ter sete sílabas poéticas, que não são contadas da mesma forma que as gramaticais. As poéticas contam-se pela emissão de voz (fusão ou junção de sons), agrupando-se as sílabas, geralmente quando há o encontro de duas ou mais vogais fracas, ou, pelo menos, quando apenas uma delas é forte.

As sílabas poéticas de cada verso são contadas até a última sílaba forte, também chamada tônica, aguda ou longa. Convém ler os versos em voz alta, contá-los nos dedos e seguir o ouvido. Quando houver dúvida, fazer a escansão do verso para ver se não está de pé quebrado (nota do CDV: pé quebrado é quando o verso tem menos de 7 sílabas). Escandir um verso é dividi-lo em seus elementos métricos. Na contagem das sílabas, procede-se como se não houvesse pontuação.

Vamos escandir uma trova como exemplo, colocando barra entre as sílabas poéticas (cada uma com uma emissão de voz), e pondo duas barras após a última sílaba tônica:

Felicidade, surpresa
que a vida às vezes nos faz…
Não tem base nem firmeza,
e, como é linda, é fugaz.
COLOMBINA

Fe/li/ci/da/de/ sur/pre//sa
quea/ vi/dás/ve/zes/ nos/ faz//
Não/ tem/ ba/se/ nem/ fir/me//za
e/co/moé/ lin/ dé/ fu/gaz//

Observe-se que as sílabas de cada verso são contadas até a última tônica (pre, faz, me, gaz) e cada verso tem sete sílabas poéticas, contadas pela emissão de voz. No 1o e 3o verso do exemplo não se conta a última sílaba gramatical de cada uma (sa, za), que vem depois das duas barras por ser fraca. A sílaba fraca, aquela que não tem acento tônico, é também chamada átona, grave ou breve.

Assim, o 1o e 3o verso são versos graves, enquanto o 2o e o 4o são versos agudos. Os agudos são os que terminam por sílaba tônica, acentuada. Do ponto de vista gramatical, as últimas palavras do 1o e 3o verso são paroxítanas; no 2o e no 4o, oxítonas. Em trova, são muito pouco usados os versos esdrúxulos, que é quando o acento tônico cai na antepenúltima sílaba, caso das palavras proparoxítonas,e, aí, desprezam-se as duas últimas sílabas gramaticais, como no no 1o e no 3o verso da trova a seguir:

É todo prazer do vândalo
destruir o que é sagrado:
“o machado fere o sândalo
para ficar perfumado”.
RODOLFO C. CAVALCANTE


 Fonte: CAVALHEIRO, Maria Thereza. Trovas para refletir. SP: Edição do Autor, 2009.

domingo, 16 de julho de 2017

Conto de Papua-Guiné (Indigam Toruai – O grande peixe)

Há muitos dias que não chovia. A água estava límpida, o rio baixo. Não podia haver melhor altura para a pesca.

Os rapazes de Kamberap preparavam as azagaias.

— É trabalho em vão — diziam os homens. — Não ides apanhar nada. Até as garças sabem que no rio Xilil já não há peixe.

— Mas nós queremos subir o rio até à foz do Troali — disseram os rapazes.

— Trabalho ainda mais inútil — disseram os homens. — Mas ide lá e tentai a sorte.

Os rapazes foram sentar-se à sombra dos hibiscos que rodeavam a praça da aldeia. Estavam em silêncio. Cada qual pensava para si se valeria ou não a pena levar a cabo a planeada pescaria.

Foi então que surgiu Bonifo com um grande peixe.

Yamandau foi o primeiro a vê-lo.

— Indigam! — gritou. — Indigam toruai! (Um peixe grande!)

Os rapazes levantaram-se de repente e correram para Bonifo, cercaram-no, admiraram e apalparam o peixe, queriam saber quando, onde e como é que Bonifo o tinha apanhado e assediavam-no com perguntas.

Bonifo não respondia. Só se ria e segurava o peixe no ar para o manter fora do alcance dos rapazes. Eles deram um passo para trás. O círculo à volta de Bonifo alargou-se e a confusão das vozes calou-se. Só Yamandau perguntava insistentemente:

— Diz-nos lá, Bonifo, onde é que o arranjaste?

— No sítio onde há muitos como este — respondeu Bonifo sorrindo de contente e pondo-se novamente a andar.

Agora já nada detinha os rapazes. Dispararam para casa, trouxeram as setas, correram para junto de Koere a pedir-lhe cestos para apanhar peixe, e em seguida abalaram todos para o rio.

O resto do dia foi passado no Yilil. Koere, que viera com eles, também ficou e ajudou os rapazes no que pôde. Preparou as setas, substituiu as pontas partidas por outras de tapioca, novas e duras, ensinou-os a atirar as setas e mergulhou nas partes mais fundas do rio para verificar pessoalmente se aí havia peixe ou não.

Havia peixes … aqui e ali, mas eram tão minúsculos que não valia a pena apontar-lhes uma seta nem perder tempo a pôr os cestos. O entrançado era demasiado imperfeito, de modo que os cestos não reteriam peixe algum. Para Koere isto era evidente.

Mas para os rapazes é que não. Estavam confiantes e não iriam desistir. Mesmo que todos os meios falhassem, restava sempre uma outra possibilidade: a magia!

Mesmo que os rapazes nunca tivessem visto, todos sabiam que os velhos da tribo conheciam uma forma de enfeitiçar os peixes através de fórmulas e canções mágicas. O líquido atordoante das lianas venenosas deixava os peixes cansados e sem forças, e tornava-se até possível apanhá-los à mão.

— Porque não tentamos? — perguntou Yamandau. — Já experimentámos tudo o resto, porque não a magia com as lianas?

Koere meneou a cabeça:

— Aqui não há as lianas certas para isso. Só nas montanhas, lá em cima.

— Não faz mal — disse Yamandau. — Usamos lianas daqui e fazemos nós a nossa magia.

Koere voltou a menear a cabeça.

— Não sabemos as palavras mágicas — disse.

— Não faz mal — insistiu Yamandau. — Inventamos nós as palavras mágicas.

Koere foi buscar lianas. Cortou-as em pedaços, atou-as e deu a cada rapaz um feixe de caules duros mas maleáveis. Os rapazes estenderam os feixes nas pedras da margem, procuraram seixos duros do tamanho de um punho e bateram com eles nos caules até as lianas se desfazerem e o sumo começar a escorrer.

Procediam exatamente como faziam os velhos com a magia autêntica das lianas, só que não eram nem as lianas certas nem as palavras mágicas certas.

Ainda assim, enquanto Yamandau batia no feixe de lianas, lembrou-se de uma canção que de certeza seria tão boa como qualquer outra fórmula mágica:

Indigan tangane O peixe está aqui
Kolop, kolop venham, venham
Kawaikare muitos!

Yamandau cantava com todas as suas forças, enquanto batia na água, tão cheio de raiva e de desapontamento pelo fracasso daquele dia passado no rio, que até fazia espuma e salpicava tudo à sua volta. A sua canção ecoava no barranco, misturando a voz de Yamandau com a de Koere e a dos outros rapazes, e com o eco que vinha de todos os lados. O bater das lianas na água marcava o compasso da música, como fazem os tambores nas festas da aldeia.

Antes do sol se pôr, os rapazes fizeram-se a casa. Estavam cansados e esfomeados. O máximo que tinham conseguido apanhar nesse dia foram sete caranguejos.

Assaram-nos num pequeno fogo à beira do rio e comeram-nos antes de subirem o monte a caminho da aldeia, já de noite.

Mas não foram logo para casa. Primeiro, passaram pela casa de Bonifo para ver se este já tinha comido o peixe. Ainda não! Ali estava ele, numa folha de bananeira, ao lado do fogão, assado, aloirado e tostado. Os rapazes ficaram de olhos perdidos no peixe.

Do fundo da varanda, Bonifácio exclamou:

— Até que enfim! Deixaram-me à tanto tempo à vossa espera! Subam.

Subiram à varanda. Bonifo foi ter com eles. Debruçou-se sobre o peixe, partiu-o e deu a cada um deles um pedaço de carne branca e bem cheirosa, e ainda uma porção de purê de tapioca.

— Que bem que isto sabe! — disse Yamandau. E passado algum tempo:

— Diz-nos lá, Bonifo, como é que apanhaste o peixe! Foi com magia?

— Não — respondeu Bonifo.

— Então? — exclamaram os rapazes.

— Com cocos — disse Bonifo, rindo-se divertido.

Os rapazes não perceberam. Bonifo soltou uma gargalhada e explicou-lhes. Tinha trocado o peixe por dois cocos… no mercado de Green River…

Fonte:
Lene Mayer-Skumanz (org.). Hoffentlich bald. Wien, Herder Verlag, 1986. Disponível em Contos de Encantar

sábado, 15 de julho de 2017

Olivaldo Júnior (O catador)

Fazia um frio descomunal na Cidade. Quatro, cinco horas da manhã, e lá se ia. Não era velho nem jovem. Estava ao meio da vida e à margem de si. Sussurro seu nome, mas ele não ouve. Nem a ninguém, nem a mim. Sua única preocupação é passar a madrugada nas ruas fazendo o menor barulho possível. Assim, é fácil catar o lixo das casas, que dormem, sonham, esperam o dia. Para ele, o dia não vem. Quando chega, está em casa, na cama, coruja humana que só vai despertar com o primeiro raio lunar em seu rosto. Então, como se fosse um artista, paramenta-se todo e, com a cara limpa, palhaço às avessas, conversa com o cão que cria com restos de janta e se vai. Logo, não é nem mais visto com seu carrinho de lata, com sua cara de quem já teve outra vida. Vivo, fareja a sucata que pode lhe dar um pão mais quentinho, um leite mais puro no dia seguinte. Tento esperá-lo, mas o sono me vence e nunca o encontro. Triste, me deito e, de vez em quando, num sonho qualquer, lá está ele, o catador que se infiltra nas latas de lixo, em nossas calçadas, no vão das lixeiras, em busca de... Não, não pode ser! Detrás de seu rosto, outro rosto se vê! Não, não pode ser!... O catador de meus sonhos, quem diria, sou eu!

Fonte:
O Autor

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Chico Jó (Poemas Escolhidos)

CENAS DAQUELA FESTA

E é só vê-la outra vez... E é só fitá-la
Para em mim renascer o antigo ardor,
O mesmo antigo e apaixonado amor
Que de repente o coração me abala.

Os pares se entrelaçam pela sala,
A música maltrata a minha dor.
— Peço a todos silêncio, por favor,
Quero ouvir novamente a sua fala!

Mas ela não demonstra haver notado
Que busco o seu olhar, desesperado,
Nem parece entender minha aflição.

E alguém a chama e ela se vai, dançando,
Pisando tão de leve, mas pisando
Os restos de minha alma pelo chão!
__________________________
CONTRIÇÃO

Com migalhas de amor me satisfaço,
De nada, ou pouco menos, me sustento:
Vejo-te — e já venci todo o cansaço,
Sorris — e já esqueci todo tormento.

Na mesa farta em que te serves, passo
Por bem do que me dás, a teu contento:
Se me deixares o menor pedaço,
Será esse meu único alimento.

Não exijo, não peço, não suplico:
Espero - e se tu ficas, também fico,
E se foges de mim, eu te procuro.

Da luz que há nos teus olhos me cobriste:
Uma réstia de sol num dia triste,
Um raio de luar no céu escuro.
__________________________
DEPOIS DA TEMPESTADE

Nessas noites incertas e terríveis
Em que a farsa da vida me amedronta,
Dentro em meu ser um temporal aponta,
Rasgado por relâmpagos horríveis.

Chove; a água borbulha nos desníveis;
Não vê o sol que outra manhã desponta;
Monstro malsão de assombrações sem conta,
O vento inventa sons inexprimíveis.

Porém eu sei que essa aflição termina
E em minha alma lavada e cristalina,
Depois que a paz de espírito vier,

A brisa irá, como um clarim plangente,
Passando entre as folhagens, suavemente,
A murmurar um nome de mulher.
__________________________
EXILIUM

Muito tempo depois que neste mundo
Eu distante estiver, noutro lugar,
Quando alguém te sorrir, por um segundo,
Meu sorriso haverás de recordar.

Depois, muito depois que neste mundo
Eu esquecido for, em outro olhar
Qualquer coisa acharás, por um segundo,
Para a cor dos meus olhos relembrar.

E já longe, e depois de muito tempo,
Conhecerás alguém tímido e triste
Que te fará pensar que eu era assim.

E ouvirás dele o que de mim ouviste,
E notarás — depois de tanto tempo —
Que sem querer estás falando em mim!
__________________________
LINHA RETA

Por seres tu mulher e eu ser poeta
Foi que um dia juramos, com fervor,
Traçando a diretriz de nosso amor,
Seguir juntinhos uma linha reta.

Na geometria do viver, repleta
De curvas, com desvelo e sem temor,
Afrontei desengano e dissabor
E consegui manter a linha reta.

Mas, de juras e votos esquecida,
Foste aquela afinal que nesta vida
Perpendicularmente se afastou.

E hoje — trágica ideia desastrosa —
Tu vais como uma linha sinuosa
E eu... paralelo a tua vida vou!
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PIANO ANTIGO
Na penumbra de um canto da saleta,
Ex-amante infeliz e desprezado,
O teu piano de madeira preta
Esquecido ficou, velho e quebrado.

Mal se vê sua escura silhueta
Escondida no vão do cortinado;
Lá deixaste os papéis sobre a banqueta
E a poeira e o bolor sobre o teclado.

Mas em noites de lua e de surdina
Uma sombra saudosa, feminina,
Pairar nos ares, solitária, vem

E ele recorda, enternecido, quando,
Ao se entregar a tuas mãos, chorando,
Murmurava noturnos para alguém.
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TOUJOURS LA MÊME CHOSE

Hoje se foi minha última alegria:
Estou mais miserável do que Jó.
Vida, que enfim não passas de ironia...
Bem que dizia a minha sábia avó:

— À margem de qualquer filosofia,
Volvem, como o homem volve para o pó,
Todos os dias para o mesmo dia
E os sentimentos todos para um só.

Ontem, hoje, amanhã — depois de tudo,
Que é que resta, afinal? E por que a fútil
Dor de não entender que é sempre assim?

Por buscar e querer já não me iludo,
Ah! vi que tudo, em suma, é vão, é inútil,
Porque tudo há de ter o mesmo fim!
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VERÔNICA

Recordo agora os já desfeitos laços
Que nos uniram pela vida afora:
Ardentes confissões, doces abraços,
Eternidades gastas numa hora.

Vivos me surgem na memória os traços
Daquelas loucas emoções de outrora —
Lágrimas, risos, êxitos, fracassos,
Tudo que nos uniu recordo agora.

Ah! bem melhor seria o esquecimento,
Que essas evocações só desalento
Trazem, só desprazer, e não prazer,

E só me deixam na alma esta agonia,
Esta inquietude de quem não queria
Mas não mata a vontade de querer.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Silmar Bohrer (Caderno de Versos)

MEUS TRASTES

De onde tiras os trastes
daqueles teus ditos versos,
não digas que os encontrastes
nas vastidões dos universos.

Nas alturas, nas amplidões
só há pureza hialina
e comparas os teus bordões
a um Dante na relancina.

Vivências baças no mundo
jamais chegarão à luz,
compreenderás algum dia...

Este iluminar profundo
que traz vida e que seduz
só se encontra na divina Poesia.

NOITE

Dissipada a sidérea luz crepuscular
que em escuridão se vai convertendo,
um mistério sombrio está concebendo
em brumas espessas todo esse avatar.

Na calada da noite agora em repouso
a lua surge risonha atrás da colina,
invadindo o espaço todo e a campina,
que mais parece um cenário luminoso.

Repassa uma calmaria noite adentro
ouvindo-se o bulício suave do vento
a cantar para uma silente madrugada.

Nestas horas de sombras nos caminhos
os seres dormem serenos pelos ninhos
até o evolver da esplêndida alvorada.

A VOZ DO SILÊNCIO

Nas horas mais doces do teu viver
quando o interior está em bonança,
procura ao recôndito então volver,
fazendo contigo mesmo uma aliança.

Dentro do ser encontrarás solução
para criar teu mundo sem arremedo,
penetra nos escaninhos do coração,
dentro de ti mesmo está o segredo.

O divino silêncio torna soberana
essa crisálida que aciona silente
o âmago da tua consciência humana.

Nos teus vagares foventes e a sós
procura ouvir essa musa aliciante
que fala no esconso de todos nós.

POETA

Ser poeta!  Que esplêndida alegria
sentir a doçura das coisas amenas
para semeá-las nos mádidos poemas
que são versos nossos de cada dia.

Ser poeta!  Que estranha felicidade
cantar da vida as mais rudes penas,
liças. misérias, queixumes... dezenas
que abundam neste antro de maldade.

Ser poeta !  Que insólita dualidade
determinar nas rimas com harmonia
os quadros diversos da humanidade.

Ser poeta !  Qual arauto que anuncia
entre os males da vida e da bondade
um mundo eivado pela divina Poesia.

LÁGRIMAS

A nossa vida é um padecer incessante.
Em cada lágrima um mistério profundo
verte nos olhos o tormento constante
que aflige a alma humana neste mundo.

Em cada lágrima sangra com ardimento
a ferida duma paixão que silenciamos
e escorre da intimidade o sofrimento
pelo delírio do amor que alimentamos.

Em cada lágrima vivemos a desventura
dum adeus tristonho e o mais sagrado
anseio da volta esperada com ternura.

 Em cada lágrima existe uma constância
a instruir que só após termos chorado
aprendemos a ver melhor uma distância.

AS NEBULOSAS

Ôba! o solzinho trigueiro
arrebentou as nebulosas,
aquelas nuvens grandiosas
que escondiam o dia inteiro.

Pequenas nesgas de céu
na vastidão das alturas
dão conta que iluminuras
vem chegando pra dedéu.

Igualmente em nossas vidas
vivemos pedindo guaridas
com raios de esperança,

Átimos, faíscas, lampejos,
consolidando nossos desejos
de dias com mais bonança.

Fonte:
http://www.recantodasletras.com.br/autor_textos.php?id=43868

quarta-feira, 28 de junho de 2017

João Batista Xavier Oliveira (Trovas de quem entende de trovas)

1
A essência da liberdade
todo ser pode senti-la:
o fluido do amor invade
a consciência tranquila.
2
A fé tem luz invisível
que brilha no coração
iluminando o possível
no caminho da oração.
3
Amor, dádiva Divina,
semente humilde e perfeita;
a luz que nos ilumina
pela caminhada estreita!
4
A vida é maravilhosa;
divina luz que nos traz
com a beleza da rosa
meros eflúvios de paz!
5
Bandeiras em mãos amigas
seguindo ao mesmo portal
revelam o fim de intrigas
consagrando paz mundial !
6
Como sou tão distraído!
Após você ir embora
notei quem tinha fugido:
eu de mim... somente agora!
7
Coração desiludido
não culpe ninguém por isso;
se agora vive esquecido
é porque já foi omisso!
8
Cultivar rosas consiste
em saber do espinho oculto.
A ilusão dorida existe
na vida envolta num vulto.
9
Dinheiro não cai do céu
e de pedra não sai leite.
Quem espera sempre ao léu
não passa de um mero enfeite!
10
Diógenes, hoje em dia,
alerta à corrupção,
a lanterna acenderia:
- os honestos, onde estão?
11
Do além cantos eu ouvi
em tons de grande emoção
ao receberem CAUBY
nos braços de "Conceição
(Homenagem a Cauby Peixoto)
12
Façam o povo feliz:
a mente aberta é capaz
de saber o que se diz
por saber o que se faz!
13
Foi excesso de cautela
a causa do meu tormento:
guardei o retrato dela
dentro do meu pensamento!
14
Nas noites esperançosas
meu sonho... apenas um vulto...
é um jardineiro entre as rosas
nos seus espinhos oculto!
15
Oxalá flores nascentes
em vergéis adormecidos
despertem as novas mentes
aos caminhos coloridos.
16
Para segui-la de fato
livrando-me dos abrolhos
vou tirá-la do retrato
e guardá-la nos meus olhos!
17
Pés na calçada da fama,
mãos abanando fortuna...
porém sua alma reclama
na solidão que importuna!
18
Por que o poeta é sensível
de tal forma a sofrer tanto?
- Seus olhos, em qualquer nível,
represam dor... flui o pranto!
19
Pranto, rio que desliza
em pedras, curvas, escolhos
às carícias de uma brisa
que externa o brilho dos olhos!
20
Quanto mais a idade avança
mais minha alma se aprimora;
meu coração de criança
brinca de saudade agora!
21
Se palavras são em vão
ao amigo, no fracasso,
externo toda emoção
no silêncio de um abraço!
22
Teatral, muito fagueira,
a trova não é pequena:
representa a peça inteira
em uma única cena!
23
Um dos milagres celestes
que a nossa vida germina
é a nossa mãe com as vestes
da providência divina!
24
Volto a crer no amor... senti-lo;
bastou o exemplo que ouvi
partindo de um simples grilo
o estridular: - CRI ! CRI ! CRI !

terça-feira, 27 de junho de 2017

Olivaldo Junior (Dia de João!)


Fontes:
Poema enviado pelo poeta.
Montagem com figuras obtidas em http://mirhyamcanto.blogspot.com/ e http://www.nudelmania.com.br 

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Mifori (Obra Prima do Criador)

(Todos trovadores desta postagem são da UBT-Seção São José dos Campos/SP)

Numa bela tarde me vejo passeando pela praia... Magnífico é o pôr do Sol!
O céu se enfeita. A brisa acaricia minha face. As folhas das palmeiras, em alvoroço, preparam-se para se despedir do Astro Rei. Sou grata à vida!...

Bendigo a vida que vivo
que me foi dada a viver;
sem colocar nenhum crivo,
vivo alegre e com prazer.
(Mifori)

Vida – obra prima do Criador. Pelas dádivas e bênçãos que recebemos a cada amanhecer, sabemos que Deus jamais desiste de nós, nem nos desampara! Cada anoitecer é uma bênção, cada amanhecer é um milagre arrebatador!
                                     
Toda a noite, quando saio,
vendo o céu luminescente,
sinto a paz que é como um raio
de luar dentro da gente.
(Myrthes Mazza Masiero)

Como é importante saber viver... Reconhecer o valor das pequenas coisas! Valorizar a vida, esse presente de Nosso Senhor! Quanta beleza, riqueza de detalhes; quantas preciosidades, quanta vibração. A Natureza é sábia, mostra o Poder de Deus. Jamais desiste. Assim soubéssemos nós, nunca desistiríamos dos nossos objetivos, nem dos nossos amigos.
                                       
Esse trem chamado vida
leva a gente na ilusão;
só tem porta de saída
para a última estação.
(Luiz Moraes)

Surpresa e admirada, via pessoas passando apressadas, preocupadas,  sem se darem conta do prazer que eu sentia naquele momento, da paixão, da alegria que degustava e que fazia bem a minha existência e ao meu espírito.

Quando a paixão acontece
é maravilhosa a VIDA!
Porém, quando se esvanece, 
que saudade na partida!
(Lora Saliba)

 As pessoas direcionavam o olhar para a paisagem, mas como o pensamento se encontrava longe dali, olhavam-na e nada viam... Para se enxergar realmente, não basta olhar, há que se "VER", sentir, registrar o sentir. Eu caminhava sentindo a areia massagear a sola de meus pés refrescados pelas águas do mar...

Água de imensa frescura,
cristalina, tão bendita,
com a límpida textura,
e  utilidade infinita!
(Nadir Giovanelli)

 É um constante marulhar de ondas que se arrebentam, bordando com espumas as areias prateadas da praia. A vida é tão colorida, tão vibrante e arrebatadora!
                                 
É verão, a natureza
se aprimora: o sol ardente,
o azul do céu... e a certeza
desse Deus onipotente!
(Glória Tabet  Marson)

Faz bem ao nosso existir! Ás vezes, é necessário largarmos tudo e ficarmos apenas a olhar um pôr do sol! O vento balançando os verdes galhos do arvoredo, de onde se desprendem folhas e pétalas coloridas de flores que bailam no ar, perfumando e criando um visual surrealista e agradável! O canto dos pássaros! O alvorecer! Tudo o que a vida nos dá! A VIDA! – obra do Criador, como também a POESIA, a TROVA- obra dos nossos amigos- irmãos  trovadores, que dão também mais colorido à existência, espalhados que estão, por esse mundão de Deus, afora...

Passarada em sintonia
com o dia que clareia,
faz do seu canto a alegria
de quem bem cedo passeia! 
(Glória Tabet  Marson)
                                       
Nos mares da poesia
boiam flores da amizade,
poetas, em sintonia,
vibram criatividade! 
(Mifori)

Fontes:
Texto e trovas enviados por Mifori

sábado, 24 de junho de 2017

Angélica Villela Santos (Trovas)

1
À astúcia utilizada, 
bato palmas, brindo a vinho, 
se a mentira, derrotada, 
à verdade abrir caminho! 
2
A Belinha, mãe solteira, 
disse ao padre, em confissão: 
- Nunca fui namoradeira; 
a culpa...foi do "apagão"...! 
3
Abraçadas, as crianças
que contemplam o infinito,
representam esperanças
de um futuro sem conflito!
4
Abre-se o chão e recebe
as sementes do plantio
e fertilmente concebe
frutos no colo macio.
5
A correnteza da idade
é mutável, já se disse:
revolta na mocidade,
calma na infância e velhice.
6
A formiga, em seu carreiro,
trabalho e força revela;
pelo bem do formigueiro
constantemente ela zela.
7
A inspiração, num abraço, 
arrebata os escritores, 
aos poetas dá o compasso, 
faz vencer os trovadores. 
8
A lembrança, na velhice,
sempre traz a mocidade,
que, qual sombra, com meiguice,
abraça a terceira idade...
9
A lua cheia é artista
que em sombras pinta uma tela
de beleza nunca vista
e só mostrada por ela.
10
A mocinha reclamou
mas o ceguinho, no baile,
passando a mão, explicou:
- A minha dança é em braile!!!
11
À noite, após a enxurrada
que o meu barquinho levou,
eu fico olhando, encantada,
o céu que Deus enfeitou...
12
Ante as portas, lado a lado,
a que está aberta nos tenta.
Porém, tenhamos cuidado:
nem sempre é o fácil que alenta!
13
Ao Brasil e Portugal, 
- elos que ligam carinho - 
num brinde internacional 
ergamos taças de vinho 
14
A pipa que a nossa infância
faz ao mais alto chegar,
representa a nossa ânsia
de nossa vida elevar.
15
Após noite tenebrosa,
envolta em forte neblina,
chega ao porto a nau, garbosa,
que o sol nascente ilumina!
16
A praça enfeita a cidade,
é o seu cartão de visita;
representa, na verdade,
seu coração, que palpita.
17
Apreciando a natureza,
- belo por-do-sol no mar -
um casal, vendo a beleza,
mais amor vai externar.
18
A queimada, tão nociva,
para a terra é uma agressão;
vai-se a floresta nativa,
fica só desolação…
19
A redenção dos escravos
 foi de Isabel um presente
 para pôr fim aos agravos
 sofridos por essa gente.
20
Às vezes a caridade,
que a paz e a esperança aspira,
põe no lugar da verdade
uma piedosa mentira...
21
Até ao bebermos vinho,
procuramos ser iguais,
mostrando o nosso carinho,
que não acaba jamais!
22
A vovó foi assaltada 
numa viagem de turismo 
e passou a temporada 
numa praia de nudismo!!! 
23
Batida por forte vento,
quer minha nau soçobrar;
porém, na fé tenho alento
para em meu Deus me apoiar.
24
Buscando a Felicidade
ao longo dos dias meus,
sigo a seta da Verdade,
que indica o reino de Deus!
25
Cantando na chuva, o ator,
fez sucesso no passado.
Também bom sapateador,
o Gene Kelly é lembrado.
26
Céu e mata refletindo
nas águas claras de um rio,
a nós estão exibindo
um meio-ambiente sadio!
27
Com amor sempre presente
e a força da educação,
livraremos o carente
dos grilhões da exploração!
28
Com um grito de alegria
e uma passagem na mão,
o retirante anuncia
que já chove no sertão!
29
Com tudo desmoronando 
na batalha pela vida, 
só a Fé fica amparando 
a coragem combalida. 
30
Com versos a se espalharem,
eu subo morros, ao léu,
para meus sonhos se alçarem
até as nuvens do céu!
31
Crianças são como flores
que enfeitam na Primavera.
São buquês de várias cores
que a natureza libera.
32
Dança a nuvem, descuidada, 
ignorando a sua sina. 
Porém, depois, já pesada, 
morre, em chuva repentina... 
33
Das janelas da memória 
que ainda consigo abrir, 
só do amor revejo a história 
que ficou, a me iludir... 
34
Da UBT é o fundador, 
pela trova batalhou; 
Luiz Otávio, vencedor, 
ao pódio a trova levou! 
35
De manhã, formando um elo, 
jangadas singram o anil, 
compondo o quadro mais belo 
dos mares do meu Brasil! 
36
Devagar, mas com prazer,
o homem, sem ficar a esmo,
usa o cinzel do Saber,
vai modelando a si mesmo.
37
Doce sorriso, olhar terno,
minha sogra, tão querida,
ocupa um lugar materno
nas trilhas de minha vida.
38
Do coreto “ela” saiu
sob apupos e sem jeito
pois a peruca caiu
e a “cantora”... era o prefeito!
39
Em festa branca e amarela,
embelezando o jardim,
margaridas, numa tela,
abrem-se todas pra mim!
40
Em frente ao computador
a namorada moderna
manda beijos ao amor
e com mensagens alterna.
41
Estas fotos que estou vendo
me remetem ao passado:
é uma viagem, percorrendo
o que me foi muito amado...
42
Eu senti, na despedida, 
( e a verdade constatei) 
o gosto de sal, querida, 
quando teus olhos beijei... 
43
Fugindo pela janela,
o “Don Juan” quis “dar no pé”.
- Um fantasma! gritou ela.
E o marido: - Agora é!
44
Fui passear na Argentina
e logo o tango aprendi.
Porém, sou má bailarina
e o meu parceiro perdi...
45
Guaratinguetá, querida,
és deste Vale a rainha!
E eu carrego em minha vida
o orgulho de seres minha!
46
Hoje é diferente o lar:
não compartilha e encolheu,...
Pois quem manda é o celular
e até o Lulu tem o seu!!!
47
Humilde e sempre sorrindo,
levando a pomba da paz,
vai Francisco, distribuindo
a esperança que nos traz!
48
Já não mais sonha o excluído 
em ser feliz na cidade, 
pois, na favela, abatido, 
vive a dura realidade! 
49
Junto à bola, uma criança,
na pobreza do sertão,
sonha e acalenta a esperança
de um dia ser campeão...
50
Lá... no fim da caminhada, 
as lembranças sobraçando, 
a saudade está postada, 
nossa chegada aguardando... 
51
Lembro que quando eu, menino,
meu carro quebrou na estrada,
voltou pra casa o cão Bino
e trouxe a ajuda almejada!
52
Meia noite...ou meio dia?
O meu relógio quebrei.
E, na minha nostalgia,
se é dia ou noite...não sei...
53
Meu coração, na gaiola
do teu amor, ficou preso;
mas, ali, ele estiola,
na tortura do desprezo...
54
Na caravana da vida,
 se sou levada ao deserto,
 procuro a trilha batida
 que Deus deixou em aberto.
55
Na história da Humanidade, 
sempre lutas, desavenças... 
Mas só a fraternidade 
porá fim às malquerenças. 
56
Nada maior eu ordeno 
para meus versos compor, 
que um espaço bem pequeno 
para pôr trovas de amor! 
57
Na manhã que vai surgindo, 
nada há que mais encante, 
que o orvalho a relva cobrindo 
como um manto cintilante! 
58
Não sou mais celibatário
e vou encontrar meu bem,
nem que seja necessário
eu correr atrás do trem!
59
Nas longas noites de estio,
eu ouço estranha canção:
São os lamentos do rio
morrendo de poluição...
60
Nas ruas, negros dançando,
 nas senzalas, emoção;
 sons de grilhões se soltando,
 anunciando a redenção!
61
No belo painel pintado 
pelo Sol, no fim do dia, 
o horizonte é transformado 
num cenário de magia! 
62
No céu azul de verão, 
se espreguiça nuvem bela: 
ora uma flor...um pavão... 
que a imaginação modela... 
63
No circo ele era o palhaço, 
mas, ao perder seu amor, 
todo aquele estardalhaço 
foi o disfarce da dor. 
64
Nos jardins, bela e vaidosa,
enfeita-se a natureza:
recende a aroma de rosa
e põe brincos-de-princesa!
65
No sonho do trovador,
há sempre um mar e uma lua,
que o inspiram a compor
a mais bela trova sua !
66
O bruxulear de uma chama
de vela, gasta e mortiça,
lembra o excluído que clama
por respeito e por justiça!
67
O chão dourado do outono, 
sua beleza exibindo, 
é o leito que vela o sono 
das folhas que vão caindo... 
68
O ladrão sentiu fraqueza 
quando nos muros corria; 
escorregou e...ó surpresa! 
Caiu... na Delegacia! 
69
O modelo achou-se esperto 
e desfilou de pirata. 
Mas, logo foi descoberto, 
ao fugir de uma barata... 
70
O trem, em sua passagem, 
pela estação da cidade, 
de um amor leva a mensagem 
e faz descer a saudade... 
71
Pela luz da abolição
 por Isabel proclamada,
 das trevas da escravidão
 a Pátria foi libertada! 
72
Pelo ciúme acuada, 
sem pensar no que fazia, 
eu apaguei a pegada 
que ao teu amor conduzia. 
73
Planta nas leiras da lida
as sementes dos teus dons,
e terás, por toda a vida,
fartura de frutos bons!
74
Por entre o verde da mata,
permeia o rio azulado,
que nas cheias arrebata
árvores, casas e o gado.
75
Por este gesto tão nobre,
foi chamada Redenção,
para que o ato desdobre
lembranças da Abolição!
76
Presente é como migalha
que mal se nota cair,
pois é um fio de navalha
entre o passado e o porvir...
77
Quando a montanha escalar,
buscando sucesso e glória,
deixe a humildade levar
a bandeira da vitória!
78
Quando eu lembro e se avantaja
minha vida de criança,
só a saudade viaja
nos trens da minha lembrança...
79
Quando ilusões apagaram 
as luzes daquele encanto, 
meus olhos se transformaram 
numa vertente de pranto... 
80
Quando o outono bate às portas
de um cansado coração,
sonhos viram folhas mortas
sarabandeando no chão...
81
Reticência...nada dizes 
ao coração de quem ama; 
só pões ali cicatrizes 
que a dúvida mais inflama! 
82
Salve, Monteiro Lobato, 
pois Taubaté elevaste! 
O teu talento eu constato 
na grande obra que deixaste! 
83
São as mãos do mundo inteiro
que, numa união fraternal,
formam sustento altaneiro
para a paz universal!
84
Se a Humanidade souber 
sobre o bem que a trova faz, 
dela fará, se quiser, 
o maior elo da paz! 
85
Se todo homem semear 
somente o amor verdadeiro, 
vai, por certo, abarrotar 
de paz, um amplo celeiro! 
86
Só o poeta vai poder 
com seu dom puro e singelo, 
a realidade envolver 
no sonho mais suave e belo! 
87
Sou mochileiro constante,
sempre um amor a buscar,
mesmo sabendo que adiante
só névoas vou encontrar.
88
Tão logo a chuva chegou, 
trazendo vida ao sertão, 
o retirante vibrou, 
com a passagem na mão! 
89
Toma a trova, por inteiro,
todos nós, os trovadores.
de Luiz Otávio, o pioneiro,
somos todos seguidores.
90
Tudo acabou em quimera
na tarde chuvosa e fria
e a grande perda me espera
dentro da casa vazia...
91
Um bom livro nos envolve, 
dá prazer e distração; 
é um amigo que dissolve 
o amargor da solidão! 
92
Um passeio no canal,
numa gôndola, em Veneza,
envolve qualquer casal
em romantismo e beleza!
93
Um tropeço desastrado 
na bengala do compadre, 
jogou o noivo, assustado, 
direto em cima do padre! 
94
Vai-se o dia, vem a noite 
e a minha dor não descansa, 
pois a saudade é um açoite 
brandido pela lembrança! 
95
Velha ponte de madeira
ligando a roça à cidade,
foi a passagem primeira
do meu sonho à realidade.
96
Vendo na imagem de um santo, 
que lhe faltavam os dentes, 
diz a devota, com espanto: 
- Que dentistas mais descrentes!! 
97
Zumbindo sobre as corolas,
de delicada beleza,
os insetos são violas
na orquestra da Natureza!