segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

A. A. de Assis (Revista de Trovas "Trovia" n. 197) Dezembro de 2016



Neste Natal eu vou pôr 
minha boca na janela
para você, por favor,
deixar o seu beijo nela...
Antônio Roberto Fernandes

Deus de amor, eu vos suplico:
dai-me a glória deste dom:
não de afirmar: "– Eu sou rico!",
mas de sentir: "– Eu sou bom!"
Aparício Fernandes

Neste mundo desumano,
em que brinquei de sonhar,
fui simples bola de pano
para o destino chutar!...
Célio Grünevald

Suplico a Deus em voz alta,
inundado de pesares,
que tudo quanto me falta
não falte nos outros lares.
Colbert Rangel Coelho

Não é só fazer carinho
nem, tampouco, dar presente.
Bondade é dar o caminho
para a criança ser gente.
Edgard Barcellos Cerqueira

Amor – feliz fantasia
que os nossos sonhos inspira...
Que triste a vida seria
sem essa doce mentira!
Élton Carvalho

Olhando, na infância doce,
aquela bola de luz,
pensava que a lua fosse
um brinquedo de Jesus...
José Maria M. de Araújo

Bondade!... Bem pouca gente
quer imitar as raízes,
que lutam, secretamente,
fazendo as rosas felizes!
Luiz Otávio

Vai-se a vida... O tempo avança...
Tudo muda... O globo roda.
Mas com lastros na esperança
sonhar nunca sai de moda.
Miguel Russowsky

Senhor, escuta os cicios
dos excluídos, sem teto...
Troca seus ninhos vazios
por ninhos cheios de afeto!
Milton Nunes Loureiro

No Ano Novo passado
tanto juraste, meu bem,
que espero tudo, ao teu lado,
– no Ano Novo que vem!...
Newton Meyer

Trovia entra em férias de verão. Em março a gente volta. Feliz Natal!!!


A madame era tão chique
e de tão fina linhagem,
que até para ter chilique
retocava a maquiagem!
Arlindo Tadeu Hagen – MG

Muito esquisito esse "muso",
o ancião com quem se casou:
da fortuna ela faz uso,
mas o resto... nunca usou!...
José Ouverney – SP

Quando a mulher não sacia
sua “fome de leão”,
come na sogra ou na tia...
boas de forno e fogão!
Maria Madalena Ferreira – RJ

Separou-se... e com mais pique
justifica encabulada:
marido que dá chilique
não consegue dar mais nada...
Maria Nascimento – RJ

“Tem quantas partes o crânio?”,
pergunta a mestra à piazada.
Responde unzinho, instantâneo:
“Depende da cacetada!”
Osvaldo Reis – PR

Fraquinho e cheio de dor,
ele diz que idade é “dose”:
Quem já foi um “pegador”
hoje só pega...virose...
Pedro Melo – PR

Se todo peru soubesse
seu destino no Natal,
pedia aos céus numa prece
pra virar pavão real!...
Thalma Tavares – SP

Ao vê-la, sente que a odeia,
fica tenso e encolhe a pança...
Todo dia a briga é feia
entre um gordo... e uma balança!
Therezinha Brisolla – SP
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Toda criança é um presente,
porém vem junto um recado:
– Frágil. Cuidado. Alimente.
Ame ao máximo. Obrigado!
A. A. de Assis – PR

Namorando a natureza,
como quando era menino,
sigo a trilha na certeza
de encontrar novo destino.
Agostinho Rodrigues – RJ

No meu barco repentino,
vou remando sem estrilo:
eu não sei o meu destino,
Deus sabe, mas faz sigilo...
Ailto Rodrigues – RJ

Na busca eterna da paz,
a humanidade se enterra;
seus próprios sonhos desfaz
na luta inglória da guerra!
Amaryllis Schloenbach – SP

A vida segue de arrasto,
do sonho nada me resta...
E o que sentia tão vasto,
vejo agora que não presta.
A.M.A. Sardenberg – RJ

E’ um fato mais que evidente,
e que a própria Bíblia ensina:
que “a língua do imprudente
é a sua própria ruína”.
Amílton Monteiro – SP

Mesmo estando contra o vento...
assim é a pipa a subir -
mostrando o feliz momento
para a criança  sorrir!
Ana Maria Gouveia – SP

Quem tem pai tem um irmão,
um herói, amigo tem.
Oh bom Deus, ao coração
do meu pai dai paz... Amém!
André Ricardo – PR

Nos jardins, bela e vaidosa,
enfeita-se a natureza:
recende a aroma de rosa
e põe brincos-de-princesa!
Angélica Vilella Santos – SP

Fraternidade – eu bendigo, / pois sinto, de coração, /
em cada ser um amigo, / em cada amigo um irmão! (Luiz Otávio)

Feito um lírio em minha sala,
o teu corpo, sedutor,
quanto mais se despetala,
tanto mais parece flor !
Antônio de Oliveira – SP

Minha vida está tão linda...      
vivo que nem um bebê.
– Felicidade não finda,
quando junto de você!...
Ari Santos de Campos – SC

Se alguém te humilha, perdoa,
e se alguém te fere, esquece.
Ódio guardado magoa,
só o amor envolve e aquece.
Arlene Lima – PR

Meu coração não precisa
sofrer a angústia dos sós,
pois sente, na voz da brisa,
o afago da tua voz!
Carolina Ramos – SP

Não vens... O dia é sombrio,
mas ouso, na espera vã,
superar o meu vazio
para esperar o amanhã!...
Clenir Neves Ribeiro – RJ

Eu  guardo  com  tanto  enlevo
este  enredo  que  é  só  nosso...
– Posso contá-lo?  Não devo!
– Devo contá-lo?  Não posso...
Colavite Filho – SP

Ter sempre a palavra certa
e a mão em paz estender;
ter a mente sempre aberta:
isso se chama viver!
Conceição Assis – MG

Senhor, neste amanhecer,
louvo a tua criação:
da aurora ao entardecer,
eu te encontro em meu irmão!
Cônego Telles – PR
Parte superior do formulário

No emaranhado das linhas,
pelo avesso desta lida,
descobri, nas entrelinhas,
Deus bordando o chão da vida.
Dáguima Verônica – MG

Perdão, eu peço, Senhor,
por não ter dado atenção
e nem  repartido amor
com o meu carente irmão!
Delcy Canalles – RS

Quero roubar dos teus lábios
sublimes beijos com ardor;
depois compor os mais sábios
versos floridos de amor.
Djalma da Mota – RN

Das ofensas de um irmão
não guardes nenhum rancor,
que um minuto de perdão
vale uma vida de amor!
Domitilla Borges Beltrame – SP

Ora eloquente, ora mudo,
teu olhar é uma charada:
promessa sutil de tudo,
no fútil revés... do nada!
Dorothy Jansson Moretti – SP

Não julgues a sorte ingrata,
pois Deus, que tudo divisa,
bem sabe a medida exata
da ajuda de quem precisa...
Edmar Japiassú Maia – RJ

Parte inferior do formulário
Generosa em seu agir,
que poder tem essa Mão
que deixa a chuva cair
e faz voar o avião!
Edy Soares – ES

Pelas estradas da vida,
vou de cidade em cidade,
levando, em cada partida,
a bagagem da saudade.
Edweine Loureiro – Japão

Bons sentimentos semeio,
não sou da inveja refém;
porque o bem-estar alheio
é o meu bem maior também.
Eliana Jimenez – SC


Natal... a fé se renova... / E, ao som festivo do sino, /
deponho a flor de uma trova / aos pés do Deus pequenino! (Antonieta Borges)

Minha saudade é um desvio
que a solidão me propõe
para fugir ao vazio
que a tua ausência me impõe!
Elisabeth Sousa Cruz – RJ

Renúncia é uma ponte estreita,
onde das extremidades,
pode-se ouvir sempre à espreita,
chorando duas saudades...
Ercy Marques de Faria – SP

Minha casa é meu cantinho,
onde tudo é natural;
no beiral fizeram ninho
as aves do meu quintal.
Evandro Sarmento – RJ

Minha alma tão pequena
perto de um mar tão profundo
torna-se grande e serena
para as ressacas do mundo.
Fátima Panisset – RJ

As pedras do meu caminho
vou transpondo-as com ardor
e cada dia um trechinho
vira caminho de amor!
Flávio Stefani – RS

Revendo entulhos e tacos,
na tapera dos meus sonhos,
chorei por ver tantos cacos
dos meus dias mais risonhos!
Francisco Garcia –  RN

Aquela rede que um dia
foi nosso ninho perfeito,
hoje balança vazia
na varanda do meu peito.
Francisco Pessoa – CE

O meu mar não tem mais onda
nem meu bar tem mais bebida,
mas a trova, quando ronda,
estremece a minha vida!
Geraldo Trombin – SP

Nossa solidão a dois,
é tão grande, tão sem fim,
que eu sinto o nosso depois
bem antes morrer em mim...
Gislaine Canales – SC

Braços erguidos à espera,
veio o sertão povoar,
abraçar a primavera,
cantar modas ao luar.
Hulda Ramos – PR

Cadeirante e bem feliz!
 Mulher doce... sonhadora...
 Eu tenho dó de quem diz
 que tu não és vencedora!
Jaqueline Machado – RS

Não importa a circunstância,
cuidado ao dar o teu passo.
É muito curta a distância
entre sucesso e fracasso!
JB Xavier – SP

De exuberância suprema,
que nos encanta e extasia,
cada alvorada é um poema
que Deus compõe todo dia.
João Costa – RJ

Somos dois versos rimados,
uma só sonoridade...
mas vivendo intercalados
num poema de saudade.
Joaquim Carlos – RJ

Nada melhor que o exemplo
para o seu filho educar;
pai é herói, é um templo
de luz no seu caminhar.
Jorge Fregadolli – PR

Quando estás a caminhar
na praia, invejo as marés,
que são desculpas do mar
para beijar os teus pés!
José Fabiano – MG

Dê-se a novas descobertas
sem, entretanto, esquecer
de fazer as coisas certas,
não certas coisas fazer.
José Lira – PE

Junto do berço que a luz / da fé cristã alumia, /
toda criança é Jesus / e toda mãe é Maria! (Pe. Celso de Carvalho)

É troca de amor fecundo
a toda mãe concedida:
ela põe vida no mundo,
nela o mundo põe mais vida!
Lucília Decarli – PR

Não foi perto, nem distante:
o nosso amor, ideal,
nasceu da luz de um instante
e se tornou imortal!
Luiz Carlos Abritta – MG

Quando lembrares de mim,
lembra de mim com saudade...
Se me lembrares assim,
me lembrarás de verdade.
Luiz Poeta – RJ

Vamos cantar o Natal,
partilhando com o irmão
o nosso amor fraternal
na ceia... do coração!
Maria Conceição Fagundes – PR

Assim é a simplicidade
do homem lá do sertão:
exibe com vaidade
os calos da sua mão.
Maria Lúcia Fernandes Rocha – RJ

Se as trilhas estão nevadas,
maior risco a gente assume,
mas, se estamos de mãos dadas,
chegamos sem medo ao cume.
Maria Luiza Walendowsky – SC

Neste abrigo, prisioneiro
do meu desvario antigo,
quero acordar verdadeiro
e levar você comigo.
Maryland Faillace – SP

Nadando contra a corrente,
mantenho esperança plena:
cansaço a gente só sente
se a luta não vale a pena...
Mílton Souza – RS

Nós somos como o diamante
que está na rocha escondido,
e que fica cintilante
só se for bem esculpido.
Nei Garcez – PR

Com as palavras brincando,
vou colocando-as à prova;
meus olhos ficam brilhando,
quando organizo uma trova.
Neiva Fernandes – RJ

Sobre o palco de um teatro,
mostra-se o ator por inteiro;
mas na vida é o diabo-a-quatro:
nunca é tudo verdadeiro...
Olga Agulhon – PR

Trovador que espalha o sonho
que lhe mora n’alma inquieta
revela ao mundo tristonho
a bênção que é ser um poeta!
Renato Alves – RJ

Tu lês os versos que eu faço,
e nem sequer adivinhas
o segredo que eu te passo,
no espaço das entrelinhas...
Selma Patti Spinelli – SP

Surgem da simplicidade
aprendizagens da vida.
Não é com celebridade
que a lição se consolida.
Talita Batista – RJ

Cultivada no seu peito,
desejo ser um jasmim.
Sei não ser o amor perfeito,
mas me queira mesmo assim.
Vanda Alves – PR

Nunca morre o trovador;
se afasta fisicamente...
Sobrevivem trova e autor
no dia-a-dia da gente!
Vânia Ennes – PR

Não agregue à sua viagem
as mágoas e os dissabores.
São excessos de bagagem
pagos ao preço das dores.
Wandira Fagundes Queiroz – PR

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segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Trova 276 - A. A. de Assis (Maringá/PR)


Mitologia Grega (A Caixa de Pandora)

O céu e a terra já estavam criados com o firmamento onde habitavam plantas e animais. Mas faltava a criatura onde pudesse habitar o espírito divino. Foi então que chegou à  terra o titã Prometeu (aquele que pensa antes) descendente da antiga raça de deuses destronada por Zeus. O gigante sabia que na terra estava "adormecida" a semente dos céus. Por isso, apanhou um bocado de argila e molhou-a com um pouco de água de um rio. Com essa matéria fez o homem à semelhança dos deuses para que este fosse o senhor da terra. Escolheu das almas dos animais as características boas e más, animando sua "criatura".

Atena, deusa da sabedoria, admirou a criação do filho dos titãs e insuflou naquela imagem de argila o espírito, o sopro divino. Foi assim que surgiram os primeiros seres humanos que de imediato povoaram a terra. Mas faltava-lhes o conhecimento sobre os assuntos da terra e do céu. Vagueavam sem conhecer a arte da construção, da agricultura, da filosofia. Não sabiam caçar ou pescar e nada sabiam da sua origem divina. Prometeu aproximou-se e ensinou-lhes todos esses segredos. Inventou o arado para que o homem plantasse, a cunhagem das moedas para que houvesse o comércio, a escrita e a mineração. Ensinou-lhes a arte da profecia e da astronomia; enfim, todas as artes necessárias ao desenvolvimento da humanidade. Ainda lhes faltava um último dom para que se pudessem manter vivos: o fogo. Este dom, entretanto, havia sido negado à humanidade pelo grande Zeus. Porém, Prometeu "amigo dos homens" roubou uma centelha do fogo celeste e trouxe-a para a terra, reanimando os homens. Este fogo dava à humanidade a possibilidade de dominar o mundo e os seus habitantes. Ao descobrir o roubo, Zeus irritou-se pois verificou que a sua vontade fora contrariada e decidiu punir tanto o ladrão quanto os beneficiados. Por isso, tramou no Olimpo a sua vingança. Mandou que Hefaístos fizesse uma estátua de uma linda donzela e, chamou-a de Pandora - "a que possui todos os dons", que seria enviada como presente a Epimeteu, irmão de Prometeu e, para a tornar perfeita fez com que cada um dos deuses oferecessem à donzela um dom. Afrodite deu-lhe a beleza, Hermes o dom da fala, Apolo, a música; outros deuses outros encantos acrescentaram na criatura. Zeus pediu ainda que cada imortal reservasse um malefício para a humanidade. Esses presentes maléficos foram guardados numa caixa, que a donzela levava nas mãos.

Zeus enviou então Pandora que desceu à terra conduzida por Hermes e aproximou-se de Epimeteu - "o que pensa depois", o irmão de Prometeu - o qual, esquecendo-se da recomendação do seu irmão de que nunca recebesse um presente de Zeus, aceitou-o e, quando Pandora abriu diante dele a tampa do presente a humanidade que até aquele momento habitava um mundo sem doenças ou sofrimentos viu-se assaltada por inúmeros malefícios que atormentam os homens até aos dias de hoje. Pandora tornou a fechar a caixa rapidamente antes que o único benefício que havia nela escapasse: a esperança. Zeus dirigiu então a sua fúria contra o próprio Prometeu, mandando que Hefaístos e os seus serviçais Crato e Bia (o poder e a violência) acorrentassem o titã a um despenhadeiro do monte Cáucaso. Mandou ainda uma águia para devorar diariamente o seu fígado que, por ser ele um titã, regenerava-se sempre. O seu sofrimento prolongou-se por inúmeras eras, até que Hércules passou por ali e viu o sofrimento do gigante. Abateu a gigantesca águia com uma flecha certeira e libertou o prisioneiro das suas correntes. Entretanto, para que Zeus tivesse a sua vontade cumprida, o gigante passou a usar um anel com uma pedra retirada do monte. Assim, Zeus poderia sempre afirmar que Prometeu mantinha-se preso ao Cáucaso.

Pandora é a deusa da ressurreição. Ela por não nascer como a divindade é conhecida como uma semi-deusa. Pandora era uma humana ligada a Hades. Sua ambição em tornar-se a deusa do Olimpo e esposa de Zeus fez com que ela abrisse a caixa divina. Zeus para castiga-la tirou-lhe a vida. Hades com interesse nas ambições de Pandora, procurou as pacas (dominadoras do tempo) e pediu para que o tempo voltasse, sem permissão de Zeus; elas nada puderam fazer. Hades convenceu o irmão a ressuscitar Pandora e devido aos seus argumentos Zeus ressuscitou-a, dando-lhe a divindade que ela sempre desejara. Assim, Pandora tornou-se a deusa da ressurreição.

Para um espírito ressuscitar Pandora entrega-lhe uma tarefa; Se o espírito a cumprir ele ressuscita. Pandora com ódio de Zeus por ele a ter tornado uma deusa sem importância, entrega aos espíritos somente tarefas impossíveis. Assim nenhum espírito conseguiu e nem conseguirá ressuscitar.

Fonte:
Contos de encantar

domingo, 16 de outubro de 2016

Trova 275 - A. A. de Assis


Lenda do Moçambique (Lenda do Rato e do Caçador)

Antigamente havia um caçador que usava armadilhas, abrindo covas no chão. Ele tinha uma mulher que era cega e fizera com ela três filhos. Um dia, quando visitava as suas armadilhas, encontrou-se com um leão:

"Bom dia, senhor! Que fazes por aqui no meu território?" (perguntou o leão)

"Ando a ver se as minhas armadilhas apanharam alguma coisa", respondeu o homem.

"Tu tens de pagar um tributo, pois esta região pertence-me. O primeiro animal que apanhares é teu e o segundo é meu e assim sucessivamente".

O homem concordou e convidou o leão a visitar as armadilhas, uma das quais tinha uma presa, uma gazela. Conforme o combinado, o animal ficou para o dono das armadilhas. Passado algum tempo, o caçador foi visitar os seus familiares e não voltou no mesmo dia. A mulher, necessitando de carne, resolveu ir ver se alguma das armadilhas tinha presa. Ao tentar encontrar as armadilhas, caiu numa delas com a criança que trazia ao colo. O leão que estava à espreita entre os arbustos, viu que a presa era uma pessoa, e ficou à espera que o caçador viesse para este lhe entregar o animal, conforme o contrato.

No dia seguinte, o homem chegou a sua casa e não encontrou nem a mulher nem o filho mais novo. Resolveu, então, seguir as pegadas que a sua mulher tinha deixado, que o guiaram até à zona das armadilhas. Quando aí chegou, viu que a presa do dia era a sua mulher e o filho. O leão, lá de longe, exclamou ao ver o homem a aproximar-se:

"Bom dia amigo! Hoje é a minha vez! A armadilha apanhou dois animais ao mesmo tempo. Já tenho os dentes afiados para os comer!"

"Amigo leão, conversemos sentados. A presa é a minha mulher e o meu filho."

"Não quero saber de nada. Hoje a caçada é minha, como rei da selva e conforme o combinado", protestou o leão.

De súbito, apareceu o rato.

"Bom dia titios! O que se passa?", disse o pequeno animal.

"Este homem está a recusar-se a pagar o seu tributo em carne, segundo o combinado." Respondeu o leão.

"Titio, se concordaram assim, porque não cumpres? Pode ser a tua mulher ou o teu filho, mas deves entregá-los. Deixa isso e vai-te embora", disse o rato ao homem.

Muito contrariado, o caçador retirou-se do local da conversa, ficando o rato, a mulher, o filho e o leão.

"Ouve, tio leão, nós já convencemos o homem a dar-te as presas. Agora deves-me explicar como é que a mulher foi apanhada. Temos que experimentar como é que esta mulher caiu na armadilha" (e levou o leão para perto de outra armadilha). Ao fazer a experiência, o leão caiu na armadilha. Então, o rato salvou a mulher e o filho, mandando-os para casa.

A mulher, vendo-se salva de perigo, convidou o rato a ir viver para a sua casa, comendo tudo o que ela e a sua família comiam. Foi a partir daqui que o rato passou a viver em casa do homem, roendo tudo quanto existe...

Fonte:
Contos de Encantar

Aparecido Raimundo de Souza (Sufoco)

   
Tibúrcio Carequinha, o mais novo louco do pedaço, havia chegado de outro sanatório não fazia uma semana. Viera transferido, pois aprontara além dos limites e o diretor não aguentava mais olhar para a cara dele. O sujeito não parecia um doido desses que se veem todos os dias, ao contrário, às vezes fazia coisas de gente normal, noutras perdia o controle e mordia os próprios olhos, arrancando da boca uma velha dentadura, e, com ela, dando a entender que mastigava os órgãos da visão como se tivesse saboreando um delicioso naco de carne. Tão logo se viu solto, no pátio, para o banho de sol, junto com os demais internos, achou, no chão, não se sabe como (talvez por descuido de algum funcionário), uma dessas facas enormes de cozinha, bem afiada, jogada num canto, perto do portão que acessava um imenso jardim. De posse dela, o primeiro que cruzou na frente resolveu correr atrás. O infeliz era o Benedito Torrado, um sujeitinho boa praça, que prestava serviços na enfermaria. Tibúrcio correu para cima dele, a arma na mão, atitude ameaçadora.

— Em guarda! Vou te pegar para fazer picadinho!


Benedito Torrado, ao se deparar com o sujeito vindo em sua direção jogou para o alto umas caixas de remédios que trazia e danou a correr e a gritar:— Socorro, pelo amor de Deus, alguém me ajude!

O alerta chamou a atenção dos demais. O pátio inteiro, repleto de doentes, se transformou numa plateia muda e indiferente, cheia de rostos desfigurados, a maioria com a boca aberta, alguns babando, outros dialogando como vento, mas, no geral, todos sem denotar um pingo de calor humano.

Na verdade Benedito estava desesperado, temeroso, as faces petrificadas, as pernas bambas. Tibúrcio não queria saber de nada. Com a faca na mão esquerda, dava a impressão, não de um louco varrido, mais se assemelhava a um animal sanguinário à cata da sua presa.

— Por tudo quanto é mais sagrado: alguém faça alguma coisa!

Os que trabalhavam em outros pavilhões, bem como os da administração, pararam com seus afazeres, levados pelo clamor dos berros de Tibúrcio, e, mais ainda, pelo sufoco do pobre do enfermeiro. Sem exceção, todos arregaçaram as mangas e se puseram a acudir, ou pelo menos tentar obstacular que o aloprado transformasse o desditoso numa vítima fatal.

De um minuto para outro, uma pequena multidão corria, estabanada, de um lado para outro, na esperança de deter o desmiolado do Tibúrcio. Todavia, a criatura, com a arma empunhada, se esquivava ligeira, arisca, ao tempo que desenhava golpes no ar, e, por essa razão, não havia quem ousasse chegar muito perto. O diretor geral foi acionado. Largou o café e voou para o hospital. Enquanto isso, nada parecia deter Tibúrcio e a sua faca de lâmina afiada.

— Vou te pegar! Vou te pegar!

A cena, não fosse por demais hilariante, poderia até ser filmada,e, certamente, daria uma boa vídeo– cacetada, num desses programas de televisão onde seus apresentadores fazem chacota e ganham ibope exibindo as mazelas de seus consanguíneos, tirando, claro, a agonia do enfermeiro com Tibúrcio grudado nas costas dele, rindo, gesticulando e fazendo caretas esquisitas. A galera tentava, em vão, botar as mãos no maluco, mas o desgraçado demonstrava uma agilidade com as pernas e um raciocínio muito rápido e acima de qualquer suspeita. Benedito Torrado, por seu turno, não aguentava mais lutar, ou melhor, correr em círculos, voltando sempre ao mesmo ponto de partida, sem achar uma saída segura. Sentia que a vida estava por um fio, que os seus trinta anos andavam prestes a ser arrancados pelo corte certeiro de uma faca de cozinha nas mãos de um débil mental completamente fora de si.

Atônito e sem saída, se debulhava em lágrimas copiosamente.Quase sem ar, urinara nas calças e não via como se livrar daquela figura hostil que, a cada minuto, mais e mais se aproximava, para lhe desfechar o golpe de misericórdia.Certo que não morreria só. A turma de amigos, o diretor, a secretária do diretor, os estagiários da seção de informática e até dois seguranças se puseram em auxílio, mas ninguém, na verdade, se atrevia a peitar Tibúrcio e lhe tomar a coragem que carregava na mão fortemente armada pela presença fatídica da faca assassina. Acionaram a polícia militar. Dezoito soldados fortemente armados partiram para o hospício.

— Nada de revólveres. Esse Zé Mané é apenas um louco. Não atirem, por favor…

O médico psiquiatra também deu as caras assim que telefonaram para o consultório dele:

— Doutor, o que fazemos?

— Tragam a camisa de força.

— Sem violência.

— Sem violência? E o que é que estamos assistindo aqui? Por acaso os dois mocinhos ali resolveram brincar de pega-pega?

Completamente baqueado e sem forças, finalmente o louco do Tibúrcio conseguiu encurralar o Benedito Torrado num canto em que não havia por onde escapar. Ou o cidadão morria de susto ou se deixava matar. Foi exatamente nessa hora que o enfermeiro perdeu o controle, a compostura, a vergonha. Vendo Tibúrcio, a dois passos dele, a faca reluzindo apontada em sua direção, caiu de joelhos e implorou:

— Não me mate, amigo. Não me mate. Não lhe fiz nada. Leve em conta que tenho mulher e uma filhinha com menos de uma semana de vida para criar.

Na cauda de Tibúrcio uma massa de amedrontados estancara, sem ação, parada, colada ao chão, estática, sem respirar. Nem a polícia que deveria entrar em ação teve o bom senso de fazer alguma coisa útil que colocasse um fim definitivo naquele martírio.

Aconteceu, então, o inesperado, o imprevisível. Tibúrcio entregou a faca na mão trêmula do enfermeiro, e, na maior cara de pau, disse para o desgraçado:

— Tome. Agora é a sua vez. Eu saio desembestado e você dispara nos meus calcanhares!

Fonte:
SOUZA, Aparecido Raimundo de. Parada de Sucessos. SP: Ed. Sucesso, 2012.

sábado, 15 de outubro de 2016

Lenda do Moçambique (A Lenda do Coelho)

Houve um tempo em que não chovia e os animais estavam a morrer de muita sede. Então, resolveram todos se reunir a fim de solucionar o problema. O coelho recusou-se a participar das tentativas de encontrar água. Os outros animais, cavaram, cortaram árvores, até que, uma tartaruga encontrou água, suficiente para formar uma pequena lagoa. Fizeram logo uma festa, tocaram batuque durante três semanas, pois não sentiriam mais sede.

O leão sugeriu que não deixassem o coelho beber a água deles e todos concordaram. Quando os animais saíram para a caça, deixaram a gazela tomar conta da lagoa. Sentindo sede, o coelho colocou mel dentro de uma cabaça, foi até à gazela e chamou-a. A gazela perguntou quem era e o que queria. O coelho respondeu que lhe trouxera mel de presente. Sem saber o que era o mel, o coelho convenceu que ela provasse. Ela gostou tanto que implorou mais ao coelho. Este, então, lhe disse que ela ainda não havia sentido todo o sabor do mel, pois isso só aconteceria se ela o comesse atada a uma árvore.

Dessa forma, a gazela deixou-se amarrar. O coelho não deu mais mel à gazela e, ainda, foi à lagoa beber água e tomar banho, sujando toda a lagoa. Quando chegaram os outros animais, repreenderam a gazela e puseram o macaco de guarda.

No dia seguinte, o coelho, novamente, chamou o macaco e este respondeu que não perdesse o seu tempo, pois todos os seus artifícios já eram conhecidos. O coelho disse que era uma pena, pois trazia consigo uma coisa muito saborosa, e fingiu ir-se embora. O macaco pediu para ver ao menos do que se tratava. O coelho passou um pouco de mel em seus lábios e o macaco ficou maravilhado com o sabor. Quando o macaco implorou mais um pouco, o coelho disse-lhe que não poderia dar-lhe, pois tinha medo que depois ele o seguisse para descobrir onde ele obtinha o mel. O macaco jurou que não faria isso e o coelho pediu-lhe, como prova, que o deixasse atar-lhe a uma árvore.

Louco pelo mel, o macaco permitiu, repetindo-se com ele o mesmo que com a gazela. Ao retornarem, os animais ficaram enfurecidos. O mesmo sucedeu com o búfalo, o hipopótamo, o elefante e com os demais bichos, deixando o leão desesperado. Até que a tartaruga ofereceu-se para ficar de guarda. Ela, então, resolveu ficar de vigia dentro da lagoa, escondendo-se debaixo da água.

Chegando à lagoa, o coelho pensou que os outros tivessem desistido de enfrentá-lo. Entrou na lagoa e fez a festa. Quando ia sair da água, a tartaruga agarrou-lhe a perna. Ele implorava que a tartaruga lhe largasse a perna e ela nada. Quando os outros animais retornaram, ficaram muito contentes, julgando o coelho e condenando-o à morte.

O condenado exigiu o seu direito a uma última vontade: ser executado ao colo da mulher do chefe. No momento em que ia atirar uma seta, o coelho começou a fazer gracinhas, fazendo-a rir e errar o alvo, acertando na mulher do chefe, possibilitando a fuga do coelho. Por isso, todos os animais o procuram, a fim de executa-lo. Desde então, têm-se visto o coelho, sempre sozinho, correndo de um lado para o outro, aos saltos e aos ziguezagues.

Fonte:
Contos de Encantar

Miguel Russowsky (Baú de Trovas)



1
A humanidade até gosta
de não saber a verdade,
quando a mentira, bem posta,
lhe trouxer felicidade.
2
A saudade às vezes fala,
e até grita - quem diria? -
quando a rede, a sós, se embala
numa varanda vazia.
3
A vila reza, orvalhada,
tendo o sol por capelão...
- Homem no cabo da enxada
é uma espécie de oração!
4
A vingança do chulé
não lavado há vinte dias,
é deixar meias em pé
mesmo que estejam vazias!
5
Chora a chuva na vidraça...
chora o vento em frenesí
e a solidão, por pirraça,
está dizendo:- Eis-me aquí!
 6            
  Chove e não vens... a tristeza
faz escurecer meu dia
e a solidão - vela acesa -
em silêncio me alumia.
7
Como cultivo amizades
e sou bom agricultor,
irão escrever: "SAUDADES",
na campa aonde eu me for.
8
Cupido avisa aos poetas
e também aos namorados
que seus estoques de setas
foram todos renovados!
9
Cupido sempre intercala
alguma perda em desejos:
se me beijas... perco a fala;
se me falas... perco os beijos!
10
Dos fados em que sou réu,
há sucessos tão estranhos...
Chego a ver o azul do céu
morar em olhos castanhos...
11
Dou às trovas que componho
tempo, amor, astúcia, empenho,
mais as asas do que sonho...
Mais não dou, porque não tenho.
12
Enquanto a nau Esperança
singrar os mares da vida,
minha Quimera não cansa
e nem se dá por vencida.
13
Este dístico singelo
a verdade satisfaz:
caneta, arado e martelo
são os arautos da paz.
14
Estrofes são caravelas
que singram os pensamentos.
Com as rimas, faço as velas,
com as sílabas, os ventos.
15
Estudo trovas a fundo,
mas persisto na suspeita,
que a trova melhor do mundo
até hoje não foi feita.
16
Flerte, romance de olhares
dizendo, em forma elegante
mil promessas de luares
traduzidas num instante.
17
Há balanços conflitantes
em vidas fúteis e loucas:
os outonos são bastantes
e as primaveras bem poucas.
18
Meu cupido é deus macabro,
põe milagres no lampejo.
Não estás, se os olhos abro...
fecho os olhos e te vejo.
19
Na blusa prendes a rosa
à altura do coração.
Como pode ser viçosa
uma flor sobre um vulcão?
20
– Não bebo mais!… – diz o Souza,
com intentos bons e plenos.
Discorda deles a esposa:
– Não bebe mais … e nem menos!
21
Naquele amor que resiste
às invernias da idade,
a lembrança é órfão triste
nos asilos da saudade.
22
Na trova, às vezes, invento
emoções e não as sinto.
Mas creia no meu talento,
sou sincero quando minto!
23
Nesta vida hostil e azeda
e desespero sem par,
rogo a Deus que me conceda
a coragem de sonhar.
24
Ninho de felicidade
com gravetos de ilusão,
se faz com facilidade
mas tem curta duração.
25
O amor no moço é fogueira,
em ardente combustão,
mas no velho é uma lareirta
com mais cinzas que carvão.
26
O papel é a carruagem
que eu dirijo da boleia.
Tomo as rédeas da viagem
dando açoites numa ideia.
27
O poema é luz imensa
que se espalha em frenesi.
Por isso o poeta pensa
ter um deus dentro de si.
28
O silêncio às vezes fala
de saudades - Quem diria!
quando a rede, a sós, se embala
numa varanda vazia.
29
Os murmúrios das gaivotas,
em noites de lua cheia,
são canções deixando as notas
nas pautas brancas da areia.
30
O tamanho dos abismos
que puseste em nossas vidas
não se mede em algarismos
mas em lágrimas vertidas.
31
O tempo escreve a seu gosto
no passar do dia a dia,
muitas rugas no meu rosto,
mas... tem má caligrafia.
32
O tempo não traz perigo
à verdadeira amizade.
Quem não é mais teu amigo,
jamais o foi de verdade.
33
Pelas ciladas que trama,
a Insônia é mulher-perigo:
– marca encontro em minha cama,
mas não quer dormir comigo!
34
Pela vida me foi dado
um conselho em que me alerto:
antes rir desafinado
que soluçar no tom certo.
35
Quanto mais o tempo avança,
mais eu fico a perceber
que a saudade é uma lembrança
que se esqueceu de morrer.
36
Quatro versos num estojo,
mas além desta embalagem,
a trova deve, em seu bojo,
comportar uma mensagem.
37
Ser caule, flor ou ser folha
não é sorte nem é sina,
pois de antemão tal escolha
se fez por ordem divina.
38
Se te serves de mentiras
para cresceres em ganho,
é bom que logo confiras
que encurtaste no tamanho!
39
Sob o sol, a voz do arado,
no início da semeadura,
vai anunciando o noivado
entre o suor e a fartura.
40
Tendo à mão uma caneta
mais o empenho a manejá-la,
vou mesmo a qualquer planeta
sem sair daqui da sala.
41
Vai para o mar a jangada
tendo um sonho por escolta.
Volta sem peixes, sem nada,
nem o sonho traz de volta.