domingo, 29 de abril de 2018

Olivaldo Júnior (4 Sonetilhos e 2 Glosas)


ESSA VIDA E SEUS MILAGRES
Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria não faz mais do que existir. 
Oscar Wilde

Dos milagres dessa vida,
o maior foi ver a mim,
tão pequeno e sem saída,
ter o sol desse jardim. 

Dos milagres dessa vida,
o melhor foi crer no fim
dessa (e)terna despedida
e no início do "Sem-fim".

Pois milagres acontecem
com os servos que resistem
e confiam no que tecem!...

Que o tecido dessa prece
seja leve aos que persistem
nos milagres que Ele tece!
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UM AMOR PRA RECORDAR
(Sobre o romance de Nicholas Sparks)

Num enredo de cinema,
num romance juvenil,
um casal se torna o tema
dum amor primaveril...

Ele custa a compreender
que ela é luz em sua vida;
e os dois custam a saber
que viver tem despedida...

Da canção que enluarar
Jamie e Landon no salão,
uma estrada vai brilhar!...

Quando Deus os separar,
vão ser dois num coração:
- "Um amor pra recordar".
________________________

DAS ESTRELAS QUE CRIEI

Das estrelas que criei,
uma delas inda brilha
e me faz lembrar do rei
que ficou naquela ilha...

Que ficou naquela ilha,
sem saber o que eu já sei
e pressinto nessa trilha
que, plebeu, me destinei.

Das estrelas que criei,
a mais velha sei que serve
de lanterna para o rei,

este ser que destronei,
mas me dera toda a verve
desse reino, que forjei.
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NO CANTEIRO DA MEMÓRIA

No jardim da consciência,
no canteiro da memória,
nasce a flor da paciência,
flor aberta para a glória.

Para aguá-la, a sapiência
se fez água (Que vitória!),
no jardim da consciência,
no canteiro da memória.

Pelo 'espelho' dessa flor,
vejo a face de quem fui
e de quem se fez rancor.

Na verdade, aquela flor,
paciente, em si conclui
que ser flor exige amor.
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Glosando Luiz Otávio 
(18/07/1916 - 31/01/1977)

MÁGOA SECRETA

MOTE:
Nessas angústias que oprimem,
que trazem o medo e o pranto,
há gritos que nada exprimem,
silêncios que dizem tanto!
(Luiz Otávio)

GLOSA:
Nessas angústias que oprimem
o coração do Poeta,
nascem as trovas que imprimem
a sua mágoa secreta...

Com as lágrimas que se impõe,
que trazem o medo e o pranto,
faz versos e enfim compõe
com redondilhas seu canto...

Nos lábios que se comprimem
contra os da voz predileta,
há gritos que nada exprimem
da mágoa atroz do Poeta...

Que a mágoa se decompõe 
nas trovas... num acalanto,
segredos que o bem dispõe,
silêncios que dizem tanto!
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Glosando Vanda Alves da Silva

MINHA ESPERANÇA

MOTE:
Em meus tempos de criança,
pelas poças, num tropel...
lançava minha esperança
em barquinhos de papel...
(Vanda Alves da Silva/Curitiba-PR)

GLOSA:
Em meus tempos de criança,
sossegado e até baldio,
só queria ser quem lança
novas redes para o rio!...

Numa intrépida "ignorãça",
pelas poças, num tropel,
tropeçava em quem alcança
seu sertão num carrossel...

Na calçada, Sancho Pança
sem Quixote (tão vazio!),
lançava minha esperança,
minha rede, ao meio-fio!...

Céu azul que não se cansa,
nuvens brancas a granel,
dava a vida em confiança,
em barquinhos de papel...

Fonte: O Autor

sábado, 28 de abril de 2018

Trova 297 - Edy Soares (Vila Velha/ES)

Fonte: Facebook (Bonde Trova)

Antonio Florêncio Ferreira (Livro D’Ouro da Poesia Portuguesa vol.1) II

IX

Deixa-me num frágil barco
Nas vagas de iroso mar,
Uma vez que nelas ouça,
Mesmo ao longe, o teu cantar!

Lancem-me na horrenda chama
Da cratera d'um vulcão,
Uma vez que assim o indique
Tua nivea, linda mão!

O morrer por ti é vida;
Que importa viver sem ti?...
Nem sequer um ai sonhaste,
Quando em tantos me exaurí!

X

Qual viajante nos desertos,
Que nunca a sede perdeu,
Encontrar em vão procuro
Amor que se iguale ao meu!

XI

Dize que seja ao sol-posto
Que me devem enterrar,
Para do sol e das aves
A despedida aceitar.

Quero guardar bem guardados
Esses mimos de ternura,
E dar-t'os quando gelada
Baixares á sepultura.

XII

Em horas tristes minh'alma
Vai ao encontro da tua,
Qual noturno caminhante
Ansioso da luz da lua.

E fico não sei que tempos
A teu lado, sem saber
Se nessa vida é que existo,
Se na que torno a volver!

XIII

O que for da nossa índole
Não se pode aniquilar;
Digam às rolas que matem,
Aos lobos que vão rolar...

Consegue-se por semanas
Á inexperiência mentir,
Mas, ou mais cedo, ou mais tarde,
Bom, ou mau, tem de surgir.

XIV

Tlim, tlim, tlim, tlim, tlim! – Quem bate?
-«O Amor.» -Que pretende? -«Entrar.»
– Vá-se embora! – «Então é gelo
O que a tantos vai queimar?...»

XV

Ai Coimbra, ó minha terra,
Não me encantas! Salgueiral,
Estas veias do Mondego,
Tempos idos, nada val'...

Meu coração está longe,
Oh! muito longe d'aqui!
Ela, tão distante, vejo-a!
Olho, e sempre a vejo a si!

XVI

Meu Amor, estás dormindo,
Não te quero despertar...
Ha de ser devagarinho
Que trovas te vou soltar.

De musgo, lírios e rosas
Uma cama irei fazer;
De jasmins e de saudades
O travesseiro há de ser.

Quero que vejas nos sonhos,
Lindos, belos, perfumados,
Os meus olhos, da vigília,
Tristes, lânguidos, magoados...

XVII

Como são belos os campos
Com esta luz verde e ouro!
Que namorados gorjeios!
E de frutos, que tesouro!

O que me trouxe indeciso,
O que me faz vacilar,
É se do sol se douraram,
Se tu que os foste enfeitar!

XVIII

Sinto por vezes morderem-me
Remorsos...– visão pungente!
Ditoso de quem for justo!
Feliz do que não os sente!

Mas nunca tive nem ódios,
Nem invejas, nem rancores!
Remorso é de arrependidos,
Do inferno aqueles horrores!

XIX

Teus beijos são diferentes
Dos que costumo trocar:
Falam, suspiram, seduzem,
Querem minh'alma arrancar!

São demorados, contínuos;
Encerram tanta doçura,
Que me parece abrangerem
Dos anjos toda a ternura!

XX

Quando, saído o meu catre,
Fui contemplar o portal
Da residência que logras,
Supus ver lá um rival.

Antes das feras as garras,
Condenado, morto, emfim,
Que imaginar que te roubam,
Que te separam de mim!

XXI

A noite! a noite!... as estrelas!...
Foi o sol que se escondeu,
Ou teu corpo, exceto os olhos,
Que num manto se envolveu?

XXII

Afirmas ser meu amigo;
D'aquele, que não és tal...
Achas bem o que pratico,
Do que faz me dizes mal.

Reunidos, todos o bajulas,
Pelas mãos metes os pés...
Leve o "demo" tais amigos,
Amigos como tu és!

XXIII

Olha aquela pobrezinha;
Coitada! chorosa vem!
Pede esmola... dão-lh'a, alegra-se,
Talvez pensando n'alguém!

Se me faltasses, não via
Nenhuma esp'rança luzir!
Tinha inveja da mendiga,
Não mais tornava a sorrir!

XXIV

Leva o amor ao sacrifício,
Mas – firmeza – é de amizade;
Não gostava d'este acerto
No vigor da mocidade...

XXV

Já reparaste que entramos,
Todos, no mundo a chorar?
D'ele também não saimos
Sem um suspiro exalar!

Choramos o apartamento
Do ventre de nossa mãe...
Suspiramos pelas glórias
Que outra vida em si contem!

Fonte:
Antonio Florencio Ferreira. Trovas: canções de amor. 
Lisboa: Imprensa de Libanio Silva, 1906

Olivaldo Júnior (Três Microcontos sobre Ilusão Amorosa)

FLOR DE LARANJEIRA 

Maria tinha vinte e cinco anos de idade e morava na roça, num velho ranchinho, à beira de Deus. Seu destino era o altar. Não, não era ser santa, mas noiva. Sonhava com isso. 

José não sabia de nada a não ser capinar e sonhar com sua noiva, a Maria. Homem bom, mandava ver no trabalho, para ver se juntava o suficiente para começar a vida em paz. 

Faltavam três dias para o segundo grande dia na vida de Maria e José. A igreja, tomada de flor de laranjeira, não sabia de nada. José caiu no mundo com Rosa e sem Maria. 

A ESTRELA D'ALVA 

Cristiano era um fã incondicional de histórias de ficção científica. Sonhava em ser astronauta desde sempre. Hoje, em época de pré-vestibular, não sabe bem o que quer ser. 

Nosso amigo, na verdade, era mesmo um fã incondicional das estrelas. De uma delas, em especial, a primeira que vemos mal cai o sol e sobe a lua: a tão cantada estrela d'alva! 

Formar-se em Astronomia parecia um salto concreto demais para um amor tão abstrato quanto o seu pela estrela vésper. Decidiu-se por Letras. Da d'alva, ele fará poesia. 

O CRAVO E A ROSA 

Era um homem sem rosa que o quisesse afagar. Sabia que quase toda rosa tem espinhos, mas era homem e não se importava em quebrar o pote para ter o mel. Era firme. 

A rosa daquele homem não havia chegado. Talvez já tivesse nascido, mas ele não sabia onde. Olhava de esguelho pelas ruas enquanto fingia ter apenas um rumo: a solidão. 

Um dia, embaixo de uma velha laranjeira, já de noite, viu um pé de cravo solitário e triste como ele. Num átimo, roubou um pé de rosa do lado e o plantou juntinho do cravo!... 

Fonte:
O Autor 

Neida Rocha (Lançamento do Projeto Sacola Literária sobre Rodas 30 de Abril)

A Câmara Literária de Pomerode – CLiP lança mais um projeto de incentivo à leitura, seguindo um dos parâmetros do Plano Nacional do Livro, Leitura e Literatura (PNLL) que é a democratização de acesso aos livros.

Temos hoje uma árida realidade em termos de leitura no cenário nacional, pois segundo o PNLL, 2007, em 2007, a média anual de leitura do brasileiro era de 1,8 livro per capita.

Para que possamos mudar essa realidade, é necessário aproximar a literatura dos leitores em potencial.

O PROJETO SACOLA LITERÁRIA SOBRE RODAS propõe a exposição de livros dos Escritores Andrea Gustmann Gomes, Cícero Pedro de Melo e Neida Rocha, vinculados à Câmara Literária de Pomerode – CLiP e outros autores, para os usuários da Empresa Volkmann, através do empréstimo desses livros nos coletivos da linha Pomerode/Blumenau/Pomerode, para leitura durante o trajeto da viagem.

Os passageiros poderão levar emprestados os livros e após a leitura dos mesmos, devolverão à bolsa, para que outros leitores tenham acesso a eles.

O lançamento do projeto acontecerá dia 30 de abril, às 15:00 horas, no pátio da Empresa Volkmann, com a colocação das sacolas nos coletivos que fazem a linha Pomerode/Blumenau/Pomerode.

Ao todo serão 14 (quatorze) ônibus que fazem o trajeto cerca de 50 (cinquenta) vezes ao dia.

A viabilização do projeto realizou-se com a parceria de empresas privadas do município e com doação de livros por parte da comunidade, no espaço disponível no Supermercado Mocam, da Rede Top.

Câmara Literária de Pomerode - CLiP
Neida Rocha, IWA
(47)99227-2202  
Pomerode/SC
www.neidarocha.com.br

Fonte:
Neida Rocha

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Trova 296 - Thalma Tavares (São Simão/SP)

Fonte: Facebook (Meus Irmãos Trovadores)

Gislaine Canales (Glosando Delcy Canalles) III


BOM DIA MANHÃ!

MOTE:
Quando a manhã vem surgindo,
no horizonte e diz: Bom-Dia,
minha alma fica sorrindo
e se desdobra em poesia!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Quando a manhã vem surgindo,
com aquele sol tão dourado,
a noite escura fugindo
vai se ocultar do outro lado!

E a manhã nasce triunfante
no horizonte e diz: Bom-Dia,
um Bom-Dia, tão galante
que nos enche de alegria!

Vejo um sorriso cobrindo
esta minha solidão,
minha alma fica sorrindo
toda cheia de emoção!

Nessa manhã deslumbrante
que acorda minha utopia,
minha alma explode radiante
e se desdobra em poesia!
__________________

BUENOS AIRES

MOTE:
Sinto os dias mais risonhos,
pois te vi, como queria,
Buenos Aires dos meus sonhos,
dos tangos e da poesia!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Sinto os dias mais risonhos.
Eu estou realizada!
Adeus, ó dias tristonhos,
vos tirei de minha estrada!

Buenos Aires, mais te adoro,
pois te vi, como queria,
qual um pássaro canoro
transbordante de alegria!

Vivi dias entressonhos
que marcaram minha vida,
Buenos Aires dos meus sonhos,
jamais serás esquecida!

A tua hospitalidade
recordarei, cada dia,
minha querida cidade
dos tangos e da poesia!
________________________

CALENDÁRIO...

MOTE:
Procura contar teus dias
só pelas horas douradas
e colherás alegrias,
em vez de nuvens pesadas!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Procura contar teus dias
pelos momentos de paz.
Esquecendo as nostalgias,
só ventura, encontrarás!

Faze, então, teu calendário
só pelas horas douradas
e comporás um rosário
de "continhas"encantadas!

Viver num mar de poesias
te dará muita emoção,
e colherás alegrias,
se plantares afeição!

E no teu céu multicor,
vivenciarás alvoradas.
Terás um ninho de amor
em vez de nuvens pesadas.
___________________________

CAVALGANDO A ILUSÃO ..

MOTE:
Cheguei tropeando a magia,
vim cavalgando a ilusão,
e "apeei" com galhardia,
nos campos do coração!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Cheguei tropeando a magia,
com laços de faz-de-conta
e enlacei minha alegria
a cada nova reponta!

No meu sonho incontrolado
vim cavalgando a ilusão;
tristezas, deixei de lado,
para viver de paixão!

Galopando noite e dia
eu cheguei ao paraíso
e "apeei" com galhardia,
entre muita festa e riso!

Feliz e realizada,
cheia de amor e emoção,
fiz minha nova morada
nos campos do coração!

Fonte:
Gislaine Canales glosando Delcy Canalles. In Carlos Leite Ribeiro 
(produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. Janeiro de 2004.

Artur de Azevedo (A "Não - me - Toques")

I

 Passavam-se os anos, e Antonieta ia ficando para tia, - não que lhe faltassem candidatos, mas - infeliz moça! - naquela capital de província não havia um homem, um só, que ela considerasse digno de ser seu marido.

Ao Comendador Costa começavam a inquietar seriamente as exigências da filha, que repelira, já, com desdenhosos muxoxos, uma boa dúzia de pretendentes cobiçados pelas principais donzelas da cidade. Nenhuma destas se casou com rapaz que não fosse primeiramente enjeitado pela altiva Antonieta.

- Que diabo! dizia o comendador à sua mulher, D. Guilhermina, - estou vendo que será preciso encomendar-lhe um príncipe!

- Ou então, acrescentava D. Guilhermina, esperar que algum estrangeiro ilustre, de passagem nesta cidade.

- Está você bem arranjada! Em quarenta anos que aqui estou, só dois estrangeiros ilustres cá têm vindo: o Agassiz e o Herman.

 Entretanto, eram os pais os culpados daquele orgulho indomável. Suficientemente ricos tinham dado à filha uma educação de fidalga, habituando-a desde pequenina a ver imediatamente satisfeitos os seus mais custosos e extravagantes caprichos.

 Bonita, rica, elegante, vestindo-se pelo último figurino, falando correntemente o francês e o inglês, tocando muito bem o piano, cantando que nem uma prima-dona, tinha Antonieta razões sobejas para se julgar um “avis” rara na sociedade em que vivia, e não encontrar em nenhuma classe homem que merecesse a honra insigne de acompanhá-la ao altar.

 Uma grande viagem à Europa, empreendida pelo comendador em companhia da esposa e da filha, completara a obra. Ter estado em Paris constituía, naquela boa terra, um título de superioridade.

 Ao cabo de algum tempo, ninguém mais se atrevia a erguer os olhos para a filha do Comendador Costa, contra a qual se estabeleceu pouco a pouco certa corrente de animadversão.

 Começaram todos a notar-lhe defeitos parecidos com os das uvas de La Fontaine, e, como a qualquer indivíduo, macho ou fêmea, que estivesse em tal ou qual evidência, era difícil escapar ali a uma alcunha, em breve Antonieta se tornou conhecida pela "Não-me-toques".

 II

 Teria sido realmente amada? Não, mas apenas desejada, - tanto assim que todos os seus namorados se esqueceram dela...

Todos, menos o mais discreto, o mais humilde, o único talvez, que jamais se atrevera a revelar os seus sentimentos.

 Chamava-se José Fernandes, e era o primeiro empregado da casa do Comendador Costa, onde entrara aos dez anos de idade, no mesmo dia em que chegara de Portugal.

 Por esse tempo veio ao mundo Antonieta. Ele vira-a nascer, crescer, instruir-se, fazer-se altiva e bela. Quantas vezes a trouxera ao colo, quantas vezes a acalentara nos braços ou a embalara no berço! E, alguns anos depois, era ainda ele quem todas as manhãs a levava e todas as tardes ia buscá-la no colégio.

 Quando Antonieta chegou aos quinze anos e ele aos vinte e cinco, "Seu José" (era assim que lhe chamavam) notou que a sua afeição por aquela menina se transformava, tomando um caráter estranho e indefinível; mas calou-se, e começou de então por diante a viver do seu sonho e do seu tormento Mais tarde, todas as vezes que aparecia um novo pretendente à mão da moça, ele assustava-se, tremia, tinha acessos de ciúmes, que lhe causavam febre, mas o pretendente era, como todos os outros, repelido, e ele exultava na solidão e no silêncio do seu platonismo.

 Materialmente, Seu José sacrificara-se pelo seu amor. Era ele, como se costuma dizer (não sei com que propriedade) o "tombo" da casa comercial do Comendador Costa; entretanto, depois de tantos anos de dedicação e amizade, a sua situação era ainda a de um simples empregado; o patrão, ingrato e egoísta, pagava-lhe em consideração e elogios o que lhe devia em fortuna. Mais de uma vez apareceram a Seu José ocasiões de trocar aquele emprego por uma situação mais vantajosa; ele, porém, não tinha ânimo de deixar a casa onde ao seu lado Antonieta nascera e crescera.

III

 Um dia, tudo mudou de repente.

 Sem dar ouvidos a Seu José, que lhe aconselhava o contrário, o Comendador Costa empenhou a sua casa numa grande especulação, cujos efeitos foram desastrosos, e, para não fechar a porta, viu-se obrigado a fazer uma concordata com os credores. Foi este o primeiro golpe atirado pelo destino contra a altivez da "Não-me-toques".

 A casa ia de novo se levantando, e já estava quase livre dos seus compromissos de honra, quando o Comendador Costa, adoecendo gravemente, faleceu, deixando a família numa situação embaraçosa.

Um verdadeiro deus “ex machina” apareceu então na figura de Seu José que, reunindo as suadas economias que ajuntara durante trinta anos, e associando-se a D. Guilhermina, fundou a firma Viúva Costa & Fernandes, e salvou de uma ruína iminente a casa do seu finado patrão.

 IV

 O estabelecimento prosperava a olhos vistos e era apontado como uma prova eloquente de quanto podem a inteligência, a boa fé e a força de vontade, quando o falecimento da viúva D. Guilhermina veio colocar a filha numa situação difícil...

 Sozinha, sem pai nem mãe, nem amigos, aos trinta e dois anos de idade, sempre bela e arrogante em que pesasse a todos os seus dissabores, aonde iria a "Não-me-toques"?

 Antonieta foi a primeira a pensar que o seu casamento com José Fernandes era um ato que as circunstâncias impunham...

 Antes da sua orfandade, jamais semelhante coisa lhe passaria pela cabeça. Não que Seu José lhe repugnasse: bem sabia quanto esse homem era digno e honrado; estimava-o, porém, como a um tio, ou a um irmão mais velho, - e ela, que recusara a mão de tantos doutores, não podia afazer-se a ideia de se casar com ele.

Entretanto, esse casamento era necessário, era fatal. Demais, a "Não-me-toques" lembrava-se de que o pai, irritado contra os seus contínuos e impertinentes muxoxos, um dia lhe dissera:

 - Não sei o que supões que tu és, ou o que nós somos! Culpa tive eu em dar-te a educação que te dei! Sabes qual é o marido que te convinha? Seu José! Seria um continuador da minha casa e da minha raça!

 Tratava-se por conseguinte, de homologar uma sentença paterna. A continuação da casa já estava confiada a Seu José: era preciso confiar-lhe também a continuação da raça.

 Assim, pois, uma noite ela chamou-o e, com muita gravidade, pesando as palavras, mas friamente, como se tratasse de uma simples operação comercial, lhe deu a entender que desejava ser sua mulher, e ele, que secretamente alimentava a esperança desse desenlace, confessou-lhe trêmulo, e com os olhos inundados de pranto, que esse tinha sido o sonho de toda a sua vida.

 V

 Casaram-se.

 Nunca um marido amou tão apaixonadamente a sua esposa. Seu José levou à Antonieta um coração virgem de outra mulher que não fosse ela; fora das suas obrigações materiais, amá-la, adorá-la, idolatrá-la, tinha sempre sido e continuava a ser a única preocupação do seu espírito...

Entretanto, não era feliz; sentia que ela o não amava, que se entregara a ele apenas para satisfazer a uma conveniência doméstica: era apática; sem querer, fazia-lhe sentir a cada instante a superioridade terrível das suas prendas. Ninguém melhor que ele, tendo sido, aliás, até então, o único homem que lhe tocara, se convenceu de quanto era bem aplicada aquela ridícula alcunha de "Não-me-toques".

O pobre diabo tinha agora saudades do tempo em que a amava em silêncio, sem que ninguém o soubesse, sem que ela própria o suspeitasse.

 VI

 Antonieta aborrecia-se mortalmente naquele casarão onde nascera, e onde ninguém a visitava, porque o seu caráter a incompatibilizara com toda a gente.

 O marido, avisado e solícito, bem o percebeu. Admitiu um bom sócio na sua casa comercial, que prosperava sempre, e levou Antonieta à Europa, atordoando-a com o bulício das primeiras capitais do Velho Mundo.

 De volta, ao cabo de um ano, construiu uma bela casa no bairro mais elegante da cidade, encheu-a de mobílias e adornos trazidos de Paris, e inaugurou-a com um baile para o qual convidou as famílias mais distintas.

 Começou então uma nova existência para Antonieta, que, não obstante aproximar-se da medonha casa dos quarenta, era sempre formosa, com o seu porte de rainha e o seu colo opulento, de uma brandura de cisne.

 As suas salas, profundamente iluminadas, abriam-se quase todas as noites para grandes e pequenas recepções: eram festas sobre festas.

 Agora já lhe não chamavam a "Não-me-toques"; ela tornara-se acessível, amável, insinuante, com um sorriso sempre novo e espontâneo para cada visita.

Fizeram-lhe a corte, e ela, outrora impassível diante dos galanteios, escutava-os agora com prazer.

 Um galã, mais atrevido que os outros, aproveitou o momento psicológico e conseguiu uma entrevista - Esse primeiro amante foi prontamente substituído. Seguiu-se outro, mais outro, seguiram-se muitos...

VII

E quando Seu José, desesperado, fez saltar os miolos com uma bala, deixou esta frase escrita num pedaço de papel:

"Enquanto foi solteira, achava minha mulher que nenhum homem era digno de ser seu marido; depois de casada (por conveniência) achou que todos eles eram dignos de ser seus amantes. Mato-me."

 Fonte:
Correio da Manhã, 12 de outubro de 1902.

Concurso de Trovas Cidade de Curitiba (Prazo: 30 de Junho de 2018)


1. Do Tema. - Trovas líricas ou filosóficas

- Âmbitos Nacional/Internacional/Estadual (Brasil e demais países de língua portuguesa)
Tema: “Bruma”

- Âmbito Regional/Estudantil: (Ensino Fundamental e Médio): 
“Paz” (Lírico-filosófica);

1.1. - A palavra tema não precisa constar do corpo da trova. 

1.2. - Nos âmbitos Nacional/internacional e Estadual, serão contemplados trovadores das categorias Novo Trovador e Veterano. 

1.2.1. - Será considerado Novo Trovador aquele trovador que não obteve até a divulgação deste regulamento 03 (três) classificações em concursos de trova oficiais da UBT em nível nacional. 

2 - Modo de Envio. –

As trovas deverão ser no máximo 02 (duas) por participante, inéditas, de autoria do próprio remetente e, enviadas:

– Por sistema de envelopes, ou

– Por e-mail.

2.1. - Pelo sistema de envelope, deverá constar no envelope pequeno a categoria pela qual concorre o trovador. As trovas deverão ser digitadas ou datilografadas. Não serão aceitas Trovas manuscritas, mesmo que sejam em letra de forma, tampouco envelopes coloridos.

2.2. - Por e-mail, devem ser encaminhadas aos cuidados da Fiel depositária do presente Concurso, as trovas, bem como, a categoria pela qual concorre o trovador deverão constar no corpo do e-mail.

2.3. – É obrigatória a informação pelo participante, sob pena de desclassificação, do nome e endereço postal completo (inclusive CEP e Telefones).

3. - Endereço para remessa:

3.1.: Todos os âmbitos e categorias - Sistema de envelopes:

Concurso de Trovas Cidade de Curitiba
A/C Centro de Letras do Paraná.
Rua Fernando Moreira, 370. Centro. 
CEP 80.410-120. Curitiba – Paraná.

3.1.1.: Para todas as categorias âmbito nacional/internacional/estadual e estudantil, deverá constar no envelope como remetente Luiz Otávio, e o mesmo endereço do destinatário.

3.2.: Todos os âmbitos e categorias - Por E-mail: As trovas deverão ser encaminhadas para: poesiaemtrovas@gmail.com

4. Do Prazo
Todos os Âmbitos: Serão consideradas as trovas que chegarem até 30/06/2018.

5 – Da Premiação
A premiação acontecerá no mês de setembro de 2018 em data, local e horário a ser definido.

5.1. - Será concedida – a Medalha Cidade de Curitiba aos classificados em Primeiro Lugar em cada categoria e Diploma para todos os classificados. 

5.2. - A UBT-Curitiba não se responsabilizará por quaisquer despesas de locomoção e/ou hospedagem dos classificados para o recebimento dos prêmios. 

5. - Da Comissão Organizadora

5.1 A Comissão Organizadora resolverá os casos omissos e suas decisões serão definitivas e irrecorríveis.

5.2 As trovas remetidas em desacordo com qualquer item, serão eliminadas automaticamente do concurso.

5.3 A simples remessa das trovas significa total conhecimento e completa aceitação deste Regulamento.

Maiores informações pelo e-mail: ubtctba@gmail.com

Ou pelo telefone (41) 99787-9485 (TIM)