quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Irmãos Grimm (Tamborzinho)


Uma noite, um jovem tocador de tambor, Tamborzinho, ia indo pelos campos e passou à margem de um grande lago. Na beira do lago, viu três pequenas peças de linho muito alvo e fino.

– Que fino linho - disse ele e guardou uma no bolso.

Foi para casa e não pensou mais no achado. Deitou-se para dormir e já estava quase adormecendo, quando teve a impressão de que alguém o chamava pelo nome. Sentou-se na cama e prestou atenção. Uma vozinha delicada chamava-o de mansinho:

– Tamborzinho, Tamborzinho, acorda!

Não conseguiu distinguir nada em meio àquelas trevas mas, subitamente, pareceu-lhe ver um vulto pairando no espaço, como se estivesse voando de um lado para outro da cama. Então perguntou:

– Que desejas?

– Devolve-me a minha camisinha, - respondeu a voz – que ontem à tarde apanhaste à beira do lago.

– Tê-la-a, - respondeu ele - se me disseres quem és.

– Eu sou a filha de um poderoso rei - responde a vozinha - tive a infelicidade de cair nas garras de uma terrível bruxa e agora vivo encerrada na montanha de vidro. Todos os dias devo banhar-me no lago junto com minhas irmãs mas, sem a minha camisinha, não poderei voar para a montanha. Minhas irmãs já se foram e eu tive de ficar. Suplico-te, Tamborzinho, restitui-me a minha camisinha!

– Tranquiliza-te, pobre menina, - disse o Tamborzinho - eu a restituo com a maior boa vontade!

Tirou a camisinha do bolso e entregou-lha. Apanhando-a rapidamente, ela tratou de sair correndo, mas ele a deteve:

– Espera um momento, quem sabe se te poderei ajudar!

– Só me poderás ajudar se conseguires subir na montanha de vidro e libertar-me do jugo da bruxa. Mas na montanha não chegarás, mesmo que chegasses ao pé dela, não poderias subir até no alto.

– O que eu quero, sempre posso, - disse o Tamborzinho - tenho muita pena de ti e não receio coisa alguma. Só que não conheço o caminho que conduz até lá.

– A estrada passa através da grande floresta, onde habitam os papões, - respondeu ela - e mais não posso dizer-te.

O rapaz ouviu como que um adejar de asas e o vulto desapareceu. Ao despontar a aurora, ele se pôs a caminho, com o tamborzinho a tiracolo e, sem sombra de medo, meteu-se pela floresta a dentro. Após ter caminhado bastante tempo sem avistar gigante algum, ele pensou consigo mesmo: "tenho que despertar esses dorminhocos!" e, ajeitando o tambor, pôs-se a tocar tão fortemente que os pássaros fugiram voando das árvores, soltando gritos espavoridos. Daí a pouco, levantou-se, também, um gigante que estava dormindo, deitado no chão, o qual era tão alto como o maior pinheiro.

– Olá, anãozinho! - gritou - que é que vens tamborilar aqui e despertar-me no melhor do sono?

– Estou rufando o tambor, - respondeu o rapaz – porque atrás de mim vêm vindo milhares de companheiros e devo ensinar-lhes o caminho.

– E que vêm fazer teus companheiros aqui na minha floresta? - indagou o gigante.

– Querem liquidar-te a fim de limpar a floresta de um monstro como tu!

– Oh, - disse o gigante - pois eu vos esmigalharei todos como formigas.

– Acreditas que podes fazer alguma coisa contra eles? – disse zombeteiro o rapaz - Quando te inclinares para pegar um deles, este te escorregará por entre os dedos e irá esconder-se, e se voltares a te deitar para dormir, todos eles pularão do meio das moitas e treparão no teu corpo. Cada qual traz um martelo de aço preso ao cinto e com ele te farão mil rombos na cabeça!

O gigante ficou preocupado e matutou: "Se me meto com estes danados, poderei sair-me mal. Lobos e ursos posso estrangular facilmente, mas contra vermes desta espécie não sei como me defender!"

– Escuta aqui, amostra de gente, - disse o gigante – volta para tua casa. Prometo-te que daqui por diante te deixarei em paz e, também, a teus companheiros. Agora, se desejas alguma coisa, podes pedir. Por ti farei tudo o que estiver ao meu alcance.

Tamborzinho não hesitou, foi logo dizendo:

– Tu tens as pernas bem mais compridas que as minhas e podes correr mais depressa do que eu. Leva-me sobre a montanha de vidro, assim poderei dar aos meus companheiros o sinal de retirada e, por esta vez, ficarás em paz.

– Então sobe aqui, vermículo, - disse o gigante – senta-te no meu ombro, eu te levarei aonde quiseres.

Assim dizendo, pegou o Tamborzinho e sentou-o no ombro. De lá de cima, o rapaz começou a tocar o tambor com quantas forças tinha. O gigante deduziu: "Deve ser o toque de retirar para os companheiros."

Depois de andar um bom trecho, encontraram no caminho outro gigante. Este pegou o rapaz no ombro do companheiro e colocou-o na lapela do paletó. Tamborzinho agarrou o botão da lapela, que era do tamanho de uma bacia, e segurando-se firmemente nele, divertia-se a olhar para todos os lados. Pouco mais adiante, encontraram um terceiro gigante, o qual tirou o rapaz da lapela do segundo e colocou-o na aba do chapéu. Lá em cima, o rapazinho divertia-se ainda mais. Andava para diante e para trás, espiando por sobre as copas dos arvoredos. De repente, avistou além das árvores uma alta montanha. Alegrou-se pensando: "Deve ser a montanha de vidro." E era mesmo.

O gigante só teve que dar mais dois passos para chegar até ela. Pegou o rapaz e depositou-o no chão. Este, então, pediu-lhe que o levasse até ao cume da montanha, mas o gigante meneou a cabeça, resmungou qualquer coisa entre dentes e voltou a embrenhar-se na floresta. O pobre do Tamborzinho ficou a olhar para a montanha, tão alta quanto três montanhas sobrepostas e, além do mais, lisa como um espelho, sem saber como pudesse subir lá no topo. Tentou escalá-la, mas em vão. Cada vez que o tentava, escorregava para baixo. "Ah, se eu fosse um passarinho!" - murmurava ele. Mas nada adiantava esse desejo, as asas não lhe nasciam nas costas!

Estava ele assim, sem saber o que fazer e nem para que santo apelar, quando viu a certa distância dois homens lutando ferozmente. Aproximou-se-lhes e ficou sabendo que brigavam por causa de uma sela que estava no chão, perto deles, e a razão por que cada qual a desejava para si.

– Mas que grande tolice, - disse-lhes - brigar por causa de uma sela quando não tendes sequer o cavalo para usá-la!

– A sela vale bem esta briga! - respondeu um dos contendores - pois quem sentar nela e desejar ir a qualquer lugar, mesmo que seja ao fim do mundo, chegará no instante que acabar de expressar o desejo. A sela pertence aos dois igualmente e agora chegou a minha vez de montar nela, porém o meu companheiro não quer admitir.

– Pois bem, - disse o rapaz - vou decidir essa questão.

Andou algumas dezenas de passos, fincou uma estaca branca no chão, voltou sobre os passos e disse:

-Agora correi até aquela estaca. Quem chegar primeiro montará na sela.

Os dois saíram a toda velocidade, porém, mal se haviam distanciado um pouco, Tamborzinho, mais que depressa montou na sela e desejou ser levado ao cume da montanha de vidro. Num abrir e fechar de olhos, achou-se lá em cima.

No cume da montanha, havia um planalto e no centro dele uma velha casa de pedra, diante da qual se via um enorme tanque e, do lado oposto, uma floresta gigantesca. Mas não viu homens nem animais. Por toda parte, reinava um pesado silêncio, somente o vento gemia por entre o arvoredo e as nuvens desfilavam tão baixo que quase lhe roçavam a cabeça. O rapaz foi até à porta e bateu. Na terceira vez que bateu, veio abrir uma velha de rosto escuro e olhos vermelhos. Trazia os óculos encarapitados sobre o nariz adunco e, através das lentes, fitou-o agressivamente, de alto abaixo, e por fim perguntou o que desejava.

– Quero entrar, comer e dormir esta noite, - respondeu o rapaz.

– Terás tudo isso, - disse a velha - se em troca fizeres três coisas.

– Como não? - respondeu o rapaz - trabalho nenhum me assusta, por mais árduo que seja!

A velha deixou-o entrar, serviu-lhe comida e à noite deu-lhe uma boa cama para dormir. Pela manhã, ao despertar, a velha tirou um dedal que usava no dedo ressequido e disse-lhe:

– Agora vai trabalhar! Aqui tens este dedal, com ele deves esvaziar o tanque e precisas terminar antes do anoitecer. Todos os peixes que estão dentro devem ser retirados, selecionados e colocados um ao lado do outro, de acordo com a própria espécie e tamanho.

– É uma tarefa muito esquisita! - disse o rapaz, mas foi ao tanque e começou a tirar a água. 

Passou a manhã toda nesse trabalho, mas que é que se pode fazer com um pequeno dedal diante de tanta água? Nem mesmo no espaço de mil anos conseguiria levar a termo a empreitada! Ao soar meio-dia, ele pensou: "É inteiramente inútil o meu esforço, tanto faz que trabalhe ou não!" Desanimado, desistiu de trabalhar e sentou-se aí ao lado. Nisso, da casa veio uma jovem trazendo-lhe o almoço num cestinho e lhe disse:

– Parece que estás muito triste; que tens?

Ele ergueu os olhos e viu que a moça era belíssima.

– Ah! - suspirou - A primeira das três tarefas que me foram impostas não consigo levar a termo. Que será das outras? Ando à procura de uma princesa que, suponho, deve encontra-se nesta casa, mas não a encontrei. Acho melhor, portanto, continuar a minha viagem até encontrá-la.

– Não te vás, não! Fica aqui, eu te ajudarei a executares a tua tarefa. Vejo que estás fatigado. Deita a tua cabeça no meu regaço e dorme um pouco! Ao acordar, verás o trabalho terminado.

Tamborzinho não esperou que lhe dissesse duas vezes, deitou-se e dormiu placidamente. Quando viu que estava com os olhos fechados, a moça girou um anel mágico que tinha no dedo e ordenou:

– Água para cima, peixes para fora!

Imediatamente a água começou a evaporar-se e, como uma névoa branca, foi juntar-se às nuvens, e os peixes, de um salto pularam para a beirada, colocando-se um ao lado do outro, de acordo com a própria espécie e tamanho.

Ao despertar, o rapaz viu com assombro a tarefa terminada. A jovem disse-lhe:

– Um dos peixes não se juntou aos seus semelhantes e ficou de lado, sozinho. À tarde, quando chegar a velha e vir que tudo foi feito conforme as suas ordens, ela te perguntará: - Que significa esse peixe aí sozinho? - Tu, então, atira-lho no rosto e dize: "Este é para ti, velha bruxa!"

E assim foi. À tarde, a velha chegou e fez a tal pergunta, então o rapaz atirou-lhe o peixe no rosto. Ela fingiu não dar por isso, calou-se, lançando-lhe apenas um olhar ameaçador. Na manhã seguinte, chamou-o e disse-lhe:

– Ontem te arranjaste mui facilmente, hoje vou dar-te uma tarefa mais difícil. Tens que cortar todas as árvores da floresta, picar a lenha e arranjá-la em pilhas. Tudo deve ficar pronto antes do anoitecer. 

E entregou-lhe um machado, um malho e uma cunha, mas o machado era de chumbo, o malho e a cunha eram de lata. Portanto, ao dar a primeira machadada, o machado ficou amassado, o malho e a cunha entortaram-se. O rapaz não sabia onde dar com a cabeça. Entretanto, ao meio-dia, chegou a jovem com o almoço e animou-o dizendo:

– Repousa a tua cabeça no meu regaço e dorme, quando acordares, teu trabalho estará pronto.

Quando ele fechou os olhos, ela deu uma volta no anel mágico e eis que a floresta inteira ruiu por terra fragorosamente, a lenha partiu-se por si mesma e empilhou-se sozinha. Parecia que numerosos gigantes invisíveis estivessem realizando aquilo tudo. Quando o rapaz despertou, ela lhe disse:

– Estás vendo? A lenha já está toda empilhada em boa ordem, salvo aquele galho. Hoje à tarde, quando a velha chegar e perguntar a razão disso, tu deves pegar o galho e fustigá-la bem, dizendo: – Isto é para ti, velha bruxa!

De fato, ao entardecer, chegou a velha e foi dizendo: – Viste como era fácil o trabalho? Mas para quem ficou esse galho aí solto?

– É para ti, velha bruxa! - respondeu o rapaz e fustigou-a em cheio no rosto.

A bruxa fez de conta que nada sentira. Sorriu sarcasticamente e disse:

– Amanhã bem cedo, tens de fazer uma só pilha, com toda esta lenha, depois tens de atear-lhe fogo e queimá-las antes do anoitecer.

Assim que raiou o dia, o rapaz levantou-se da cama e foi juntar a lenha na floresta. Mas quem consegue, sozinho, empilhar a lenha de uma floresta inteira? O trabalho não progredia nada. A jovem, porém, não o abandonou naquela angústia. Ao meio-dia, levou- lhe o almoço. Depois de ter almoçado, ele deitou a cabeça no seu regaço e adormeceu. Ao despertar, um pouco mais tarde, a imensa pilha de lenha, toda a lenha da floresta, ardia numa vertiginosa labareda que elevava línguas rubras até ao céu.

– Escuta, - disse-lhe a jovem - quando a bruxa vier, vai exigir de ti as coisas mais absurdas. Não tenhas medo e faze tudo o que ela te ordenar, pois nada de mal poderá fazer-te! Se, porém, ficares com medo, então o fogo te destruirá. Depois de feito tudo o que ela ordenou, agarra-a com as duas mãos e atira-a no meio das chamas.

A jovem foi-se embora e, pouco depois, chegou cautelosamente a velha.

– Uh, que frio! Mas temos aqui um belo fogo. Vou aquecer meus velhos ossos ao calor destas chamas. Como me sinto bem aqui! Vejo lá um tronco que não está ardendo, vai buscá-lo e traze-me! Se conseguires tirá-lo de dentro do fogo, ficarás livre e poderás ir para onde te aprouver. Anda, pula depressa na fogueira!

Sem hesitar, Tamborzinho deu um pulo no meio das chamas e estas não lhe fizeram o menor mal, nem mesmo lhe sapecaram o cabelo, pegou rapidamente o tronco e colocou-o no chão, no lugar indicado por ela. Mal tocou o chão, o tronco, que não se queimara, transformou-se instantaneamente na bela jovem que o vinha auxiliando nas mais difíceis conjunturas. O rapaz não teve dificuldade em reconhecer nela, pelos ricos trajes bordados a outro e cintilantes de pedrarias, a princesa encantada. A velha, porém, riu-se escarninha mente e disse:

– Tu pensas que ela já é tua! Mas não é ainda!

Ia avançar para a moça, a fim de levá-la dali, mas o rapaz agarrou-a com as duas mãos e atirou-a no meio das chamas, que a envolveram completamente, e pareciam felizes de poderem, enfim, devorar a bruxa.

A princesa contemplou Tamborzinho e achou-o bem bonito. Lembrou-se, também, que ele estivera todo o tempo arriscando a própria vida para libertá-la da bruxa, então estendeu-lhe a mão e disse:

– Tu ousaste tudo por mim. Eu também quero fazer por ti tudo o que me for possível. Se juras manter-te fiel ao meu amor, serás meu esposo. Riquezas não nos faltam. Teremos muitíssimo com o que a velha acumulou aqui.

Depois levou-o para casa e mostrou-lhe a enorme quantidade de arcas onde a velha guardava os tesouros. Desprezando o ouro, os dois encheram os bolsos de pedras preciosas e não quiseram demorar-se mais naquela montanha de vidro. Tamborzinho disse à princesa:

– Senta-te comigo na sela e juntos voaremos para a planície como dois pássaros.

– Não me agrada montar nessa velha sela! - disse a jovem - é bastante que eu dê uma volta no meu anel mágico para chegarmos felizmente em casa.

– Está bem, - respondeu o rapaz - então formula o desejo de chegarmos até a porta da cidade.

Num bater de olhos, acharam-se lá. Aí Tamborzinho disse:

– Antes de mais nada, preciso ver meus pais e dar-lhes minhas notícias. Espera-me aqui no campo, voltarei em poucas horas.

– Por favor, - disse a princesa - peço-te que tomes cuidado e não beijes teus pais na face direita, quando lá chegares, senão esquecerás tudo o que se passou e me deixarás abandonada aqui no campo.

– Como poderei esquecer-te? - respondeu o rapaz, e jurou que estaria de volta o mais cedo possível.

Entretanto, chegando em casa ninguém o reconheceu e não sabiam quem era, porque o tempo passado na montanha de vidro, que a ele pareceu terem sido apenas três dias, foram na verdade três anos e, nesse período, ele havia mudado bastante. Deu-se a conhecer aos velhos pais e estes, no auge da alegria, abraçaram-no e beijaram-no nas duas faces. O rapaz estava tão feliz que esqueceu, completamente, a promessa feita à princesa e beijou todo mundo nas duas faces. Mal beijou os pais na face direita, de sua mente apagou-se tudo o que se passara e, também, a princesa.

Sem pensar em nada mais, despejou sobre a mesa as pedras que lhe enchiam os bolsos. Os pais ficaram tão boquiabertos que não sabiam o que fazer com tamanha riqueza. Então o velho construiu um esplêndido palácio, cercado de belos jardins, bosques e prados, exatamente como se nele tivesse que habitar um rei. Uma vez concluído o palácio, a mãe disse:

– Escolhi uma noiva para ti. Daqui a três dias festejaremos as bodas.

O filho concordou e achou certo tudo o que decidiam os pais. Enquanto isso, a pobre princesa esperara um tempo enorme, junto da porta da cidade, que seu noivo regressasse. E quando anoiteceu, logo imaginou: – Com certeza Tamborzinho beijou os pais na face direita e me esqueceu.

Seu coração encheu-se de tristeza. Desejou estar numa casinha solitária no meio da floresta, não querendo voltar à casa do pai, o anel realizou o seu desejo. Mas dirigia-se, diariamente, à cidade e passava diante da casa do rapaz. Ele a viu algumas vezes passando por lá, mas não a reconheceu. Até que um dia, ela ouviu o povo comentar:

– Amanhã, casa-se Tamborzinho.

Seu desespero aumentou e decidiu consigo mesma: "Quero tentar, ainda uma vez, reconquistar seu coração!"

Assim pois, no primeiro dia da festa nupcial, ela deu uma volta no anel mágico e pediu um vestido brilhante como o sol. No mesmo instante, o vestido estava diante de seus olhos, era tão brilhante que parecia tecido com puros raios de sol. Ela se vestiu e foi à festa. Quando entrou na sala, os convidados lá reunidos ficaram deslumbrados com aquele magnífico vestido, especialmente a noiva que, tendo grande paixão pelos trajes suntuosos, dirigiu-se à desconhecida para que lhe vendesse aquele lindo vestido.

– Não o venderei por dinheiro algum! - respondeu a princesa - mas, se me permitires passar a primeira noite junto da porta do quarto de teu noivo, o vestido será teu.

A noiva, não podendo dominar o seu desejo, concordou, mas teve o cuidado de deitar narcótico no vinho do noivo e assim ele dormiu pesadamente. Quando reinou o silêncio na casa, a princesa acocorou-se diante da porta, abriu uma pequena fresta e chamou:

-Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

Mas o lamento foi inútil. O rapaz não acordou e nada ouviu. Ao romper do dia, a princesa teve que retirar-se sem nada ter conseguido.

Na segunda noite, ela deu uma volta no anel e pediu: "Quero um vestido prateado como o luar," e o vestido lhe foi entregue.

Desta vez, também, ao entrar no salão da festa com o maravilhoso vestido delicado como o luar, despertou a cobiça da noiva, que o obteve em troca da permissão dada à princesa de passar à noite na soleira do quarto do noivo. E, na quietude da noite, seu lamento foi o mesmo da noite anterior:

- Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

Mas Tamborzinho, entorpecido pelo narcótico, não acordou do profundo sono. Muito triste, assim que rompeu a manhã, ela teve que partir sem ter conseguido nada, indo chorar as mágoas na casinha da floresta.

Alguns criados, porém, tinham ouvido as palavras da jovem desconhecida e foram comunicá-las ao noivo, dizendo que ele nada ouvira porque lhe fora ministrado um narcótico no vinho.

Na terceira noite, a princesa girou mais uma vez o anel e pediu: "Quero um vestido rutilante como as estrelas." E, quando ela surgiu na festa, com esse vestido esplendoroso, a noiva ficou fora de si pelo desejo de
possui-lo, e murmurou:

– Hei de possuí-lo, custe o que custar!

De fato, deu a permissão solicitada pela princesa e obteve o cobiçado vestido. Nessa noite, porém, o noivo não bebeu o vinho que lhe foi oferecido antes de deitar, disfarçadamente jogou-o fora, e assim, quando reinou silêncio na casa, ele ouviu uma voz meiga e delicada dizer:

-Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

No mesmo instante, Tamborzinho sentiu reavivar-se-lhe a memória.

- Ah, - exclamou - como pude agir tão perversamente? A culpa foi do beijo que, sem pensar, dei na face direita de meus pais, foi ele quem me fez esquecer tudo! 

Pulou da cama, correu para a princesa e tomando-lhe a mão, conduziu-a ao quarto de seus pais.

– Esta é a minha verdadeira noiva, - disse - se me casar com outra, cometerei a mais atroz das injustiças.

Após tomarem conhecimento de tudo quanto ocorrera, os pais acharam justo o casamento, então mandaram iluminar novamente a casa, chamaram os tocadores de tímpanos e alaúdes, convidaram todos os parentes e amigos e as núpcias verdadeiras foram realizadas entre festas e grande alegria.

A outra noiva, como compensação, ficou com os maravilhosos vestidos e deu-se por satisfeita.

Fonte:

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Vinicius de Moraes (Da solidão)


Sequioso de escrever um poema que exprimisse a maior dor do mundo, Poe chegou, por exclusão, à ideia da morte da mulher amada. Nada lhe pareceu mais definitivamente doloroso. Assim nasceu "O corvo": o pássaro agoureiro a repetir ao homem sozinho em sua saudade a pungente litania do "nunca mais". 

Será esta a maior das solidões? Realmente, o que pode existir de pior que a impossibilidade de arrancar à morte o ser amado, que fez Orfeu descer aos Infernos em busca de Eurídice e acabou por lhe calar a lira mágica? Distante, separado, prisioneiro, ainda pode aquele que ama alimentar sua paixão com o sentimento de que o objeto amado está vivo. Morto este, só lhe restam dois caminhos: o suicídio, físico ou moral, ou uma fé qualquer. E como tal fé constitui uma possibilidade - que outra coisa é a Divina comédia para Dante senão a morte de Beatriz? - cabe uma consideração também dolorosa: a solidão que a morte da mulher amada deixa não é, porquanto absoluta, a maior solidão. 

Qual será maior então? Os grandes momentos de solidão, a de Jó, a de Cristo no Horto, tinham a exaltá-la uma fé. A solidão de Carlitos, naquela incrível imagem em que ele aparece na eterna esquina no final de Luzes da cidade, tinha a justificá-la o sacrifício feito pela mulher amada. Penso com mais frio n'alma na solidão dos últimos dias do pintor Toulouse-Lautrec, em seu leito de moribundo, lúcido, fechado em si mesmo, e no duro olhar de ódio que deitou ao pai, segundos antes de morrer, como a culpá-lo de o ter gerado um monstro. Penso com mais frio n'alma ainda na solidão total dos poucos minutos que terão restado ao poeta Hart Crane, quando, no auge da neurastenia, depois de se ter jogado ao mar, numa viagem de regresso do México para os Estados Unidos, viu sobre si mesmo a imensa noite do oceano imenso à sua volta, e ao longe as luzes do navio que se afastava. O que se terão dito o poeta e a eternidade nesses poucos instantes em que ele, quem sabe banhado de poesia total, boiou a esmo sobre a negra massa líquida, à espera do abandono? 

Solidão inenarrável, quem sabe povoada de beleza... Mas será ela, também, a maior solidão? A solidão do poeta Rilke, quando, na alta escarpa sobre o Adriático, ouviu no vento a música do primeiro verso que desencadeou as Elegias de Duino, será ela a maior solidão? 

Não, a maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a do ser que se ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida humana. A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si mesmo, e que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de socorro. O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e de ferir-se, o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo. Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes da emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto da sua fria e desolada torre.

Fonte:
Vinicius de Moraes. Para viver um grande amor.

terça-feira, 23 de outubro de 2018

Concurso Internacional de Trovas do México (Resultado Final) Corrigido


Tema: GRATIDÃO  

Categoria: VETERANOS

VENCEDORES

1º Lugar 
Não retribua um favor
com presentes ou dinheiro:
só pagamento em amor
é gratidão por inteiro !
Alba Helena Corrêa
Niterói/RJ

2º Lugar 
Deixo a quantos na bonança
ou na dor deram-me a mão,
ante a falta de outra herança,
minha eterna gratidão!
Antonio Augusto de Assis
Maringá/PR

3º Lugar
Se recebo qualquer bem
que alegre meu coração,
sinto-me feliz também,
se demonstro gratidão!
Amilton Maciel Monteiro
São José dos Campos/SP

4º Lugar 
Pela fé a cada prova...
pela graça da oração...
por tudo... e mais esta trova,
a Deus, minha gratidão.
Mário Moura Marinho
Sorriso/MT

5º Lugar 
Divide o pão sem receio
e multiplica o teu pão;
que o teu pão partido ao meio
dobra a tua gratidão!
Professor Garcia
Caicó/RN

MENÇÃO HONROSA

1º Lugar 
Quando um ser com alma pura,
parte com outro o seu pão,
põe fermento de ternura
na massa da gratidão.
Francisco Gabriel Ribeiro
Natal/RN

2º Lugar 
Minha gratidão é ter,
o rosto terno de Deus
ante cada alvorecer,
nos olhos dos filhos meus.
José Almir Loures 
Astolfo Dutra/MG

3º Lugar 
Mãe! Pelo amor extremado,
deixaste em meu coração
dulçor jamais olvidado,
mar de eterna gratidão.
Márcia Jaber 
Juiz de Fora/MG

4º Lugar
Gratidão, ainda que incerta,
Deus provê nos desagrados
quando vou de mão aberta
e me vêm punhos cerrados!
Cezar Augusto Defilippo
Astolfo Dutra/MG

5º Lugar 
- Onde estão os outros nove?
Jesus diz à multidão
e assim, Ele nos comove,
ensinando a gratidão.
Lóla Prata
Bragança Paulista/SP 

MENÇÃO ESPECIAL

1º Lugar 
- Gratidão, ensejo doce
das almas que são floridas ...
Vendo o amor como se fosse
um presente de outras vidas ...
Jaqueline Machado
Cachoeira do Sul/RS

2º Lugar 
Nossa gratidão, Senhor,
pelas manhãs e o porvir,
pela semente do amor
que faz a vida florir!
Dulcídio de Barros Moreira Sobrinho
Juiz de Fora/MG

3º Lugar 
Neste mar de desamor,
abençoado coração,
que se curva ante um favor
numa eterna gratidão !
Maria Nelsi Sales Dias
Santos/SP

4º Lugar 
A gratidão deve estar
sempre a serviço do Bem
sem jamais se transformar
em fardo para ninguém!
Arlindo Tadeu Hagen
Juiz de Fora/MG

5º  Lugar
Pelo dom da nossa vida,
Deus aguarda uma oração
e, por Ele, sempre ouvida,
chega a vez da gratidão!...
Glória Tabet Marson

São José dos Campos/SP
Categoria: NOVOS TROVADORES

VENCEDORES

1º lugar 
Enquanto estivermos vivos,
vamos mostrar gratidão,
pois sempre temos motivos
guardados no coração!
Maura Helena de Oliveira Faingezycht
Santos/SP

2º lugar 
Aos "sem reconhecimento"
da bondade de um irmão...
que Deus dê o entendimento
do quão faz bem "gratidão.
Valcilene Coelho
Sinop/Mato Grosso

3º lugar 
Gratidão, grande conceito,
todos devem comungar...
Seu poder faz tanto efeito
que o mundo pode mudar.
Archimino Braz de Campos
Balneário Camboriú/SC

4º lugar 
Quão beleza tem a vida
quando se busca união
numa troca sem medida
exercendo a gratidão.
Iria Sueli Belchior
Santos/SP

5º lugar 
Com a sena acumulada
aumentando meu quinhão,
não quero pensar mais nada,
só na eterna gratidão.
Luis Parellada Ruiz
Londrina/PR

Fonte: Resultado enviado por A. A. de Assis

domingo, 21 de outubro de 2018

Trova 324 - Leonilda Yvonneti Spina (Londrina/PR)


Gislaine Canales (Glosas Diversas) 8


MILHÕES DE ESTRELAS

Mote:
Milhões E Milhões De Estrelas...
Que Utilidade Terão?
- Só Sei, Meu Irmão, Que Ao Vê-las
sinto Deus No Coração!
A. A. de Assis (Maringá/PR)

Glosa:
Milhões e milhões de estrelas
enfeitam nosso Universo...
Vou tentando descrevê-las
na humildade do meu verso!

Me interrogo a cada dia:
que utilidade terão?
E me responde a alegria:
- Iluminam a emoção!

Eu não consigo entendê-las
e a sua real beleza?
- Só sei, meu irmão, que ao vê-las
foge p’ra longe, a tristeza!

Ao contemplá-las, sorrio
em terna meditação,
e nessa paz, me extasio:
Sinto Deus No Coração!
_____________

JARDINEIRO...

Mote:
Sou jardineiro imperfeito,
pois no jardim da amizade,
quando planto amor perfeito
nasce sempre uma saudade...
Adelmar Tavares (Recife/PE, 1888 – 1963, Rio de Janeiro/RJ)

Glosa:
Sou jardineiro imperfeito,
mas meu adubo é o amor,
eu amo sem preconceito,
dou a todos, meu calor!

Eu colho muito carinho,
pois no jardim da amizade,
que encontro no meu caminho
existe a felicidade!

Vivo feliz, satisfeito,
espero que o tempo passe...
Quando planto amor perfeito
é um perfeito amor, que nasce!

Mas junto de tantas flores,
às vezes, contra a vontade,
recordando os meus amores,
nasce sempre uma saudade…
__________________

TEMA DE MINHA VIDA

Mote:
Meu verso não se renova,
pois esta angústia sofrida,
mais do que tema de trova,
é o tema da minha vida!
Arlindo Tadeu Hagen (Juiz de Fora/MG)

Glosa:
Meu verso não se renova,
se repete, indefinido,
pois nenhuma emoção nova
vem a ele dar sentido!

Vivo em prantos, sempre triste,
pois esta angústia sofrida,
me faz ver, que nada existe,
nem a esperança... perdida!

Esta tristeza comprova
que vivo na solidão!
Mais do que tema de trova,
é tema do coração!

Dor, tristeza, angústia, enfim
e o pranto da despedida
foi o que sobrou pra mim...
É o tema da minha vida!
_________________

ILUSÕES

Mote:
Ferem, sim, mas quero tê-las,
ao longo da caminhada.
Ilusões! Cacos de estrelas,
que enchem de luz minha estrada!
Carolina Ramos (Santos/SP)

Glosa:
Ferem, sim, mas quero tê-las,
agridoces ilusões,
quero também merecê-las,
sentir suas emoções!

Quero que sigam comigo
ao longo da caminhada,
me amparando, dando abrigo,
enchendo de tudo, o nada!

Quero, em meu peito, acendê-las
e deixá-las crepitar...
Ilusões! Cacos de estrelas,
que não cansam de brilhar!

Seguindo nessa ilusão,
me sentirei muito amada,
com luzes no coração
que enchem de luz minha estrada!

Fonte:
Gislaine Canales. Glosas Virtuais de Trovas XVIII. 
In Carlos Leite Ribeiro (produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. 
http://www.portalcen.org. junho de 2004.

Olivaldo Júnior (Dois Microcontos sobre a Verdade)


SINCERIDADE

Havia sido ensinada a mentir. Por isso, desde menina, mentia para todos, compulsivamente. Não havia quem a fizesse dizer a verdade. Casou-se porque mentiu ao pretendente que o amava e, quando engravidou, mentiu para si mesma que queria filhos.

Trabalhava num emprego que detestava e dizia para todos que o adorava. Assim como tomar chá com suas amigas, a cada quinze dias. Aliás, tinha mesmo amigas?

Velhinha, convenceu-se de que tinha sido alegre. E o pior de tudo: acreditou nisso.

A MAIS PURA VERDADE

O menino só dizia verdade. Nunca lhe passou pela cabeça que, no mundo dito civilizado, isso pudesse ser uma falha de caráter. A mentira social se insinuara e já se constituía bem aceita entre os viventes. Assim, a mais pura verdade do menino era vã.

Na escola, numa autêntica aula de Escrita, o Mestre do pobre identificou nele um jovem talento a surgir. E o incentivou a fazer da suposta mentira uma sincera aliada.

Hoje, autor de renome, escreve, sim, a mais pura verdade, e todos juram que não.

Fonte:
textos enviados pelo autor

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Trova 323 - Nilsa Alves de Melo (Maringá/PR)

Imagem: hermesfernandes.blogspot.com

Olivaldo Junior (Um professor..)


"Quero falar de uma coisa / Adivinha onde ela anda / Deve estar dentro do peito / Ou caminha pelo ar"... Quem não se lembra dessa linda música de Milton Nascimento e de Wagner Tiso? Pois ela acabou virando um hino quase obrigatório em todas as formaturas Brasil afora desde que fora lançada, em 1983, além de se tornar a música que marcou a morte do ex-presidente Tancredo Neves, sendo executada inclusive durante o seu funeral. Coração de Estudante... Existe ideia mais pura de coração, mais genuína de real interesse pelo mundo, pela vida, por tudo o que existe e pode ser melhorado? Se há um estudante, há um professor.

Um professor que se desvela em mil cuidados pelo ingressante na Educação Infantil, continuação de pai e de mãe, antigamente chamada (sim, eram e ainda são quase todas mulheres) de "tia". Hoje, muitas vezes, apenas "prô". Mas o que importa é que, muitas vezes, é a "prô" quem dá o carinho que a criança não tem em casa e acaba assumindo no coração infantil um papel ainda maior que o esperado. É a mãe, a tia e até a prô numa só professora!

Um professor que ensina as primeiras letras, o alfabeto todo e se distancia, para que o aluno aprenda a escrever seu destino com as próprias mãos. Mãos que, amanhã, serão de médicos, engenheiros, administradores, comerciantes e de muitos outros profissionais, até de professores. Mãos que, com certeza, se emocionarão quando pensarem no rosto de quem às vezes ficava bravo e pegava no pé do menino e da menina que não queria aprender com ele.

Um professor que domina uma sala de adolescentes, todos conectados, em mil redes sociais, com a atenção difusa, dispersa, tendo que chamar a atenção para uma matéria que, para os jovens, nem sempre tem graça, nem sempre faz sentido. Alguém que acaba caricaturado, com sua característica própria em lente de aumento, por algum aluno, mestre em sátira. Um professor que, apesar da desvalorização geral, consegue passar o que é preciso.

Um professor que lida com alunos universitários, adultos, mas que, ao se sentarem na cadeira de uma sala de aula, voltam a ter oito, nove, ou treze anos, porque aluno é sempre aluno, não importa a idade. Mesmo com toda a tecnologia e com o "poder" de formação de texto em nossas mãos, quando se vê sob as mãos de um professor, um aluno espera dele a mão da professora do início, que tantas vezes lhe guiou a mão pelo papel, hábil na conduta.

Um professor que também educa jovens e adultos que não puderam aprender na "idade certa" (entre aspas, porque, na verdade, toda idade é a mais certa para aprender). Professor que tenta suprir a falta de tantos outros professores, lacunas de tantos outros ensinamentos que ficaram pelo caminho. O aluno da E.J.A. requer o carinho, o apoio de quem é professor, um professor de verdade, e ensine os seus olhos a lerem o mundo com olhos letrados, ágeis.

Um professor que ensina o que ele sabe e domina. Um professor que muda sua comunidade e respira modernidade. Um professor que é pura poesia para o aluno que só teve conversa fiada. Um professor que se torna com o tempo o próprio tempo, veloz em saber a resposta, mas ainda mais rápido em saber que ninguém sabe tudo. Um professor que se chama de amigo, de eterno, de mestre. Um professor que demonstra respeito e o recebe também.

"Coração de estudante / Há que se cuidar da vida / Há que se cuidar do mundo / Tomar conta da amizade"... Amizade. Amizade de um professor que seja estudante a vida inteira. Um professor que não se veja parte de pesquisa sobre o crescimento da violência também em sala de aula. Um professor que seja a coruja e (por que não?) a águia que inspirará seu aluno a novos céus de alegria. Um professor que eu poderia ter sido. Um professor que posso ser?...

* Texto originalmente publicado na edição de sábado, dia 14/10/2017, no jornal impresso Gazeta Guaçuana, de Mogi Guaçu, São Paulo, para o Dia do Professor (15 de Outubro).

Fonte:
Texto enviado pelo autor 

João Batista Xavier Oliveira (Poemas Recolhidos) I


À LÁGRIMA

Quando a esperança acorda um sonho leve
e o som da natureza se aprimora;
penumbras do passado vão embora
e o toque do relógio não se atreve...

Quando o aperto de mão à paz aflora
e a dúvida do amor torna-se breve;
o gelo da pintura vira neve
e o justo com justiça não demora...

Ressurgem as latentes pradarias;
os olhos não se enganam com a fala
e a liberdade enfim mais aparece.

Tertúlias fraternais noites e dias
lapidam o poeta que se exala
e à lágrima fervente desfalece!

JOIO

Por que nós complicamos singelezas
pelo simples sabor de afirmação;
por que não escutar o coração
que pulsa as vibrações das incertezas...

se temos ao alcance o corrimão;
degraus que facilitam mãos coesas;
o dom de emocionarmos às belezas...
Por que só ver a luz na escuridão?

Estamos de passagem simplesmente.
Abrindo com desvelo nossa mente
o mundo é bem maior em nosso espaço.

Por que nós complicamos as passagens
seguindo a realidade das miragens?
A vida é bela e o tempo é bem escasso! 

HARMONIA DO OLHAR

Um mavioso som espargiu-me à mente
de repente, alucinadamente,
ao deparar-me no alarme do olhar
do teu mundo de olhar.
No ínfimo espaço do nosso íntimo
apenas o som das veias
que incendeias nas entranhas.
Uma canção acaricia
Os nossos tatos dos olhos.
Latente harmonia
explode em êxtases...
E deparamo-nos no santuário
onde a pauta é infinita.
É o coral do suprassumo!
Ali mesmo se chega às estrelas!
Nossos corpos são nossos olhos!
Adentramos nas almas
e purificamos a eternidade!!

ESCRAVO DO ADEUS

Um lenço branco ao longe é uma constante
na solidão que eu mesmo construí,
escravo do meu ego ao seu talante;
verdugo da humildade que perdi.

No pensamento agora tão errante
vislumbro espelho frágil que parti.
Malgrado a juventude me acalante
macróbio em lassidão detenho aqui.

Foi tudo uma serpente intempestiva.
Fugimos em veredas dolorosas...
mas hoje estás feliz, muito bem viva.

Divides teu caminho com as rosas...
e eu somo à solidão a minha vida
multiplicando as mãos da despedida!

...E A VIDA CONTINUA

Aos poucos meus amigos vão embora...
Saudade hospitaleira abre janelas
e os ares das paisagens amarelas
aumentam o vazio que devora.

As mãos saudosas ficam sem aquelas
que tanto me afagaram mundo afora
nas horas tristes bem fora de hora
e nos momentos das tertúlias belas.

E assim eu sinto que também vou indo
na esteira da fatal apoteose.
Sublime é caminhar sempre sorrindo

sabendo que ao beber da mesma dose
os planos das paisagens verdejantes
ressurgirão sorrindo como antes

Fonte:
Poemas enviados pelo autor

Isabel Furini (Línguas Viperinas)


Minha amiga J. adora bons restaurantes. E quem não adora?... O problema é que minha amiga gasta a maior parte de seu polpudo salário em restaurantes. Há quatro meses ele decidiu mudar. Iniciou um regime. Continuava frequentando restaurantes chiques, mas em vez de pedir carnes e massas, começou a se conformar com saladas e alguma carne magra de frango ou de peixe. E os resultados começaram já estavam presente no primeiro mês. Aquele início tímido, poucos notado pelos outros, mas notado pela roupa que passa de apertada a um pouco folgada. E como dá alegria!

Pois bem, amiga ligou, convidou-me para almoçar em um shopping. Nos encontramos lá, olhamos lojas e depois fomos até a praça da alimentação. Ela, orgulhosa, só colocou no prato frango grelhado e salada variada. Na mesa do lado havia uma senhora sentada olhando para o prato de minha amiga. Mexia a cabeça para um lado e para outro com ar de reprovação. O que seria?

De repente, com voz de mãe autoritária dirigiu-se a minha amiga dizendo: “Não adianta querida, já não adianta, não vai dar resultado, você deveria ter pensado antes... agora é obesa não tem mais nada para fazer”. Depois dessa frase maldosa, levantou-se e saiu como de cabeça erguida, orgulhosa de seu ato de maldade.

Minha amiga olhou o prato, observou a própria barriga proeminente, e eu percebi que seus olhos se enchiam de lágrimas.

Tentei animá-la: - “Deixe falar, nem se preocupe”. E ela secou a lágrimas e sorriu - foi um sorriso forçado.

Antes de sair do shopping comprou um bombom e o deglutiu com prazer. Dias depois, ligou dizendo que não valia a pena fazer regime... só cirurgia de estômago podia ser uma solução. - “Mas você estava indo tão bem!” – exclamei.

- “Não sei não”, disse ela, “a mulher do restaurante tem razão não regimes não dão resultado”.

Minha primeira reação foi dizer que a mulher do restaurante, essa cobra com forma humana, deveria olhar para a própria vida, em vez de meter o nariz onde não é chamada. Eu deveria ter jogado o prato na cabeça dela - falei para minha amiga e ela riu.

Ao desligar fiquei pensando o que ganham essas pessoas de língua viperina que estão sempre procurando humilhar, ofender, e fazer desistir a quem tem um objetivo. Será que antes de dormir contabilizam os danos provocados com suas palavras e gritam:

- “Hoje consegui destruir três pessoas. Uauu! Eu sou demais! Qual será o triste dividendo que essas pessoas estão ganhando?…”

Fonte:

Academia Ituana de Letras (Convite para 20 de outubro)


A Academia Ituana de Letras e o Museu da Energia de Itu convidam para o Encontro Cultural “Poesia Brasileira” que contará com a participação de Acadêmicos e do cantor Edson D’aísa em performance com poetas da ACADIL. 

Entrada franca.

20 de outubro de 2018, sábado, 10h
Museu da Energia de Itu
Rua Paula Souza, 669, Itu/SP

Convite para Premiação em Formiga/MG (19 out - 19h30)

Solenidade de Entrega de Prêmios do nosso "7º Troféu Formiga de Letras", a ocorrer no dia 19/10/18 às 19:30 horas, no Auditório 1 do UNIFOR-MG.



Fonte:
Paulo José de Oliveira
Presidente do Clube Literário Marconi Montoli - CLMM

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Leandro Bertoldo Silva (Mentiroso Profissional… Quem?)


Uma vez fui arrebatado por um pensamento de João Ubaldo Ribeiro: “todo escritor é um mentiroso profissional”! Logo me lembrei de alguns, cuja vida – ou fim dela – já parecia uma embustice. Guimarães Rosa, por exemplo, ao ser aceito na Academia Brasileira de Letras, levou 4 anos para tomar posse com medo de morrer, pois foi advertido por um pai de santo que seu exício se daria logo após um grande acontecimento. Morreu sozinho em seu apartamento, no Rio de Janeiro, de um infarto fulminante dois dias depois a tão adiada posse... O que dizer de Monteiro Lobato? Uma boneca de pano falante e um sabugo de milho sabido, vá lá! Mas um porco marquês?! Bem, levando-se em conta que sempre inventamos histórias e até quando as recontamos fazemos jus àquela velha máxima de “quem conta um conto aumenta um ponto”, quem sabe até dois ou três, é bem possível que isso seja verdade. Mas nada se compara ao que um dia me aconteceu...

Estava eu em meu computador enveredando-me por entre palavras e acentuações, pondo pontos semânticos em ilusões gramaticais à espera de uma história que teimava em não vir, quando ouço um chamado no portão. Justo agora em que uma vírgula brigava com os dois pontos e a enfastiada história esperava inerte a sua vez quase desistindo de vir á luz? Mesmo assim, dei cabo à discussão e não muito com vontade fui ver quem era.

— Bom dia! — disse-me uma voz vinda de um homem não muito alto, não muito baixo, de bigodes e barba bem aparadas aparentando seus 45 anos de idade de uma vida que, se bem vivida, não daria para afirmar.

— Bom dia. O que deseja?

— O senhor é escritor, não é?

A pergunta veio direta, firme, sem rodeios. Reparei que o homem trazia um livro nas mãos: “As Areias do Imperador”, de Mia Couto. Antes mesmo que eu pudesse responder, ele se adiantou:

— Na verdade, seu Mia, fiz essa pergunta apenas para dar início ao motivo pelo qual vim a sua casa. Sei muito bem quem é o senhor. Acabei de ler este seu livro e o achei magnífico.

Tive um sobressalto. Por alguns segundos que mais me pareceram horas, não sabia o que dizer nem o que fazer; se olhava para o senhor, se olhava para o livro. Certamente fiz as duas coisas seguida de uma puxada de ar preparando-me para desfazer a ilusão maluca daquele pobre homem que, só não era lunático, pelo fato desse acontecimento de sermos confundidos ser algo até natural entre os escritores, acredite se quiser.

A bem da verdade isso já havia acontecido comigo outras vezes, o que jogou outra ideia semântica na minha puxada de ar de há pouco, dando a ela um tantozinho de raiva somente abrandada por ter sido confundido não com um escritorzinho qualquer... O peixe dessa vez era bem grande! Confesso que fiquei até lisonjeado pela patuscada criada pelo homem, tanto porque tenho muita fé no meu taco, mas daí a ser o Mia morando no Brasil... E, assim, era preciso jogar o peixe de volta ao mar. Mas antes mesmo de abrir o anzol, o homem já havia recolhido a vara – era rápido o danado – e, enumerando comentários e passagens do livro, já foi entrando portão adentro, acomodando-se na cadeira da varanda e convidando-me a fazer o mesmo. Não pude deixar de lembrar-me mais uma vez do João Ubaldo ao dizer que “não há de haver profissão mais louca do que a de escritor".

Aquele homem já estava me parecendo um personagem. E eu ali estranho em minha própria casa. Como isso era possível, como é que eu era dono da casa um minuto antes e visita um minuto depois? O fato é que ali estava eu sendo convidado a me sentar por um homem que, cordialmente, me pedia para ficar a vontade. Por um milésimo de segundo achei-o cretino, irresistivelmente cretino e resolvi naquele instante devolver a cretinice assumindo quem ele me delegava. Aquilo já me parecia um enredo de uma história, dessas tiradas não se sabe de onde nem por que, mas com um personagem que começava a ditar a ordem dos acontecimentos. Como é assim mesmo que me acontece ao escrever, indo sempre os cavalos a frente do imperador, resolvi dar sequência à situação:

— Muito bem... Quer dizer que gosta mesmo do que escrevo? – perguntei fazendo a maior cara de escritor.

— Oh, muito! Já li todos os seus livros. O acompanho há bastante tempo.

— Não diga...

Aquele homem não era cretino, era louco e aquilo uma maluquice de pedra. Tinha mesmo uma pedra em meu caminho ou no meu caminho tinha uma pedra? Sei lá, mas sei que entre eu e o homem tinha um livro que era tido como meu sem nunca ter sido. Não sabia bem por que não acabava logo com aquilo, não jogava ao vento toda aquela história e dizia logo ao homem: “meu filho, eu não sou quem você pensa!” Misericórdia! Isso soava terrivelmente clichê, bem aos moldes de novela mexicana e isso eu não podia admitir. Começava ali um verdadeiro pesadelo, pois desistira completamente da brincadeira cretina e tudo o que eu mais desejava era me ver livre do homem. Porém, o fato de vê-lo magoado em sua fantasia reprimia-me, sem dizer que o pobre coitado ficaria extremamente sem graça. O que fazer? Eis que veio uma luz! A foto! Na orelha dos livros do Mia sempre tem a sua foto. Era só o homem comparar e estava tudo resolvido. Mas um outro pensamento me ocorreu... Era bem provável que acontecesse uma inversão de constrangimentos, pois seria ele a ficar sem jeito de ter que reconstruir aquela bagatela achando que seria eu o magoado. Mas vá lá! É assim ou de jeito nenhum...

— O senhor vai me desculpar, mas...

Já disse que o homem era rápido? Pois parecia a fome com a vontade de comer. No que eu estava pronunciando o “mas”, o sujeito sacou do bolso uma caneta, abriu o livro e quis me ditar enternecido uma dedicatória – sim, isso acontece – algumas pessoas ditam o que querem que escrevamos para elas, como se fôssemos grandes amigos. E agora? Frente à alegria do homem que me tinha como alguém que ele acreditava que eu fosse, poderia escrever a tal dedicatória e educadamente dizer que estava ocupado, que ele me desculpasse... Ele entenderia, sairia feliz e eu me livraria daquela fantasia paranoica de uma vez por todas.

— Certo! – disse decidido para o homem – vamos lá...

— Escreva aí! – sentenciou ele – “para o meu grande amigo Bartolomeu, companheiro de muitas batalhas, lembrando dos tempos em Moçambique...”

Ah, não! Já era demais! Eu nunca havia ido a Moçambique, aquilo não estava certo e definitivamente já tinha passado dos limites. Diplomacia à parte, mas, embora um “mentiroso profissional”, uma coisa era inventar gente que não existia, outra era me passar por alguém que não fosse. Enchi-me de coragem e disse finalmente:

— Olha, você vai me desculpar, mas eu vou ter que ser franco com você. Eu não sou o Mia Couto.

O homem ficou meio assim... Arqueou a sobrancelha, e após um breve silêncio, num gesto de desembaraço olhando para mim, arrematou:

— Ora, não faz mal! Eu também não sou o Bartolomeu…

Fonte:
Texto enviado pelo autor, editor do blog literário Árvore das Letras

Antonio Brás Constante (Bem versus mal [façam suas apostas])


O bem e o mal. Para alguns estes conceitos antagônicos vivem em eterna guerra. Uma guerra que começa em vida e termina na morte. Onde a partir daí, cada um vai para o seu reduto. Uns seguem iluminados, embalados pelo som de harpas tocadas por anjos voando rumo ao céu azul. Outros compram passagem expressa para descida sem volta aos confins do inferno. Cada um seguindo de acordo com sua escolha de vida.

Mas, discordo dos que dizem que existe uma luta entre o bem e o mal. Afinal, o bem não luta. Prefere uma saída diplomática e pacífica para a situação. Não acredita que violência seja a solução para qualquer tipo de conflito. Etc. O mal, por sua vez, também evita qualquer tipo de duelo, pois, apesar de perverso, é covarde (e covardes não lutam). Prefere uma tocaia básica. Um tiro pelas costas. Um veneninho servido em alguma salada, ou outra ideia traiçoeira qualquer, para que as suas chances de vitória sejam obtidas de forma fácil e sem muito esforço.

Apesar do que as pessoas pensam, o pior inimigo do mal é o próprio mal. O bem compartilha. Doa. Ampara. Algo detestável para aqueles que têm pretensões maléficas. Porém, de muita valia para se arrebanhar os bens do bem. E em matéria de surrupiar, o mal é muito bom. Nos embates entre essas duas forças, surgem junções pouco amistosas, pois, a partir de seus confrontos, tudo fica bem mal. Mas como alguns males vêm pra bem, as coisas acabam voltando ao normal, deixando para a próxima batalha uma possível decisão para o sempre fatídico “confronto final”.

O mal não gosta do trabalho, pois dizem que o trabalho enobrece, e enobrecer não está nos planos de quem quer ser mal. Para ele a semana deveria ter cinco dias de descanso, e dois de feriado. Isso demonstra que mesmo o mal tem o seu lado bom de viver, com pensamentos próximos aos anseios da maioria das pessoas.

O ser vil não gosta de servir. Prefere ser servido. Adorado. Retribuindo com toda maldade possível de se praticar. Todos esses atributos detestáveis o deixam em desvantagem frente ao sucesso. Mas o mal é esperto, e está sempre querendo se dar bem, achando formas inovadoras que impeçam os seus planos de irem mal.

O mal é o doce veneno que mata. O bem é o amargo remédio que cura. O mal é uma floresta escura, cheia de perigos e encantos, com lobos espreitando em cada um de seus recantos. O bem é campo florido, lugar onde pastam ovelhas, bezerros e vaquinhas malhadas. O bem é o amor puro e iluminado. O mal é a essência do pecado, vontade insaciável de supremo poder. É fogo que arde envolto em sombras, que chama para junto de suas chamas, incendiando vontades com promessas de prazer. O bem é o lugar seguro, é serenidade. Consciência que nos faz refletir. É estender a mão aos que precisam. É mesmo triste ter coragem de sorrir. O mal é inquieto, sem raízes onde se fixar. Segue nômade, procurando vítimas para atacar. É sedutor. Alegre em ser amoral. Superficial. Gosta de estender a mão para empurrar. Sorrir das tristezas que possa provocar.

Nós, seres humanos, somos invólucros que contêm generosas parcelas do bem e do mal, que estão gravadas em nossa existência, sussurrando em nossos ouvidos em cada decisão a ser tomada. Dizendo-nos para fazer assim ou assado. Sinalizando caminhos a seguir, na incerteza de chegar. A decisão final é nossa. O bem e o mal ficam guardados em nossas entranhas, esperando uma brecha para tomar as rédeas de nossas vidas e passar enfim a guiá-las rumo à essência de suas (ou nossas?) próprias vontades.

Fonte:
Constante, Antonio Brás.  Hoje é o seu aniversário! “Prepare-se” : e outras histórias. 
Porto Alegre, RS : AGE, 2009.