segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Rachel de Queiroz (As Menininhas)

    
Elas têm entre dezoito e vinte e cinco anos. Usam calça Lee, fumam desesperadamente, dizem palavrão. Cursam o científico ou a universidade, muitas possuem o seu Fusca ganho de presente. Em casa ninguém mais as controla, mesmo que o tentem; pelo menos é o que elas blasonam*. E com a liberdade de ir e vir, dia e noite, com a liquidação do tabu da virgindade, com a fácil aquisição da pílula, as menininhas, além da liberação da autoridade doméstica, também se consideram libertas sexualmente.

O curioso é que essas almas livres, estudantes que são, não cogitam em liberdade econômica, Mesmo as diplomadas perdem-se em vagos cursos de pós-graduação, aulas de línguas e arte — no que lhes possa dar por mais tempo a irresponsabilidade estudantil.

Afetam grande desenvoltura, mostram-se extrovertidas e conversadeiras; algumas declaram que já puxaram erva, não sei. Aliás, as que entraram por essa senda sinistra já não são as nossas, fazem parte de outra história. Aqui se fala das menininhas que estão conosco a toda hora, colegas e possíveis namoradas dos nossos meninos.

E acontece que a petulância assumida é leve máscara que mal lhes esconde os problemas — e quantos. Pois são as menininhas em verdade extremamente vulneráveis e inseguras; e os meninos seus parceiros, muito mais imaturos que elas, a pouca habilitação que têm para a vida é dentro dos velhos padrões do machismo — incompatíveis de todo com os novos padrões das moças.

Eles se declaram partidários dos ideais da permissividade moderna, mas, por uma questão de perspectiva pessoal, as menininhas hão de ter da permissividade uma visão muito diversa da visão dos rapazes. Para eles, permissividade é permissividade mesmo — eu te gosto, você me gosta, então que é que tem, acabou sai pra outra, não há grilo. Enquanto elas, ainda trazem no sangue, nos ossos e nas suas entranhas de mulher, a convicção de que aqueles começos são as primícias de uma relação recíproca e durável. Quase nenhuma aceita com plenitude a ideia da simples fornicação lúdica, sem compromisso ulterior. Ou pelo menos, passadas as curiosidades da fase de descoberta, quase todas caem no velho trilho de sexo-filho-casamento, que aliás é o verdadeiro, porque é o chamado da espécie. Só de fingimento elas se prestam ao jogo de pega-e-larga e, depois de cada experiência, saem frustradas e profundamente ressentidas; frustradas até mesmo com a ideia de sexo em si, que sempre lhes foi descrito como algo sublime e maravilhosamente gratificante. Mas que elas foram conhecer através de exercícios improvisados, com parceiros pouco hábeis, em condições de desconforto e sem higiene, consumado às pressas em locais de acaso; não admira que isso tudo as deixe decepcionadas e, pior, assustadas, porque há sempre as consequências a temer.

Algumas que falam comigo mostram-se sempre inquietas, vulneradas, magoadas. Sente-se que o seu padecimento básico é uma perigosa insegurança — quanto a si, quanto ao mundo, quanto aos namorados. Tão insatisfatórios os pobres garotos, igualmente assustados com o que fizeram, passada a hora primeira e irresistível. Sabem os meninos que, até por razões biológicas, elas são muito mais maduras do que eles, o que ressentem; e então partem para as promessas de casamento, prematuros e impraticáveis; ou saem para o cinismo e para a fuga — e é aí que as menininhas procuram um ombro compreensivo onde possam se apoiar e chorar. Ou, fartas dos garotos, se atiram às aventuras com homens mais velhos, experientes e estabelecidos na vida.

Em ocasiões raríssimas têm sorte, o homem se apaixona e transforma o caso em casamento. Ou, o que é mais geral, elas vão passando de mão em mão, se desgastando, se decepcionando cada dia mais fundo; as que podem pagar se atiram ao divã dos analistas, e é comovente e grotesco vê-las disputar entre si quem tem mais anos de análise! As que têm vocação artística ou profissional, salvam-se da solidão e do desespero por esses caminhos; e se não contam com tal saída, resta-lhes mesmo a que ainda se chama a mais velha das profissões. Umas dão para beber, outras se suicidam, é forçoso constatar, embora não se queira forçar a nota da tragédia. Porque em verdade tudo é mesmo uma tragédia. As menininhas, por mais atrevidas, são pateticamente frágeis, pela sua própria condição de mulher, dentro do mundo que as espera.

Seus meninos namorados não têm a necessária segurança para lhes dar, tão inseguros eles próprios, coitados.

Ah, a vida é difícil, uma aventura arriscada. Com todas as garantias tradicionais que tinham outrora, já as meninas naufragavam; que dirá agora, que se atiram à correnteza sem barco nem corda, só dispondo dos braços e do lindo corpo, contra a onda tão funda, tão bruta.
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Vocabulário:
Blasonar – agir ou expressar-se com orgulho ou vaidade a respeito de algo, ou para chamar a atenção sobre si, especialmente alardeando qualidades, virtudes, feitos etc., de modo mentiroso ou exagerado


Fonte:
Rachel de Queiroz. As Menininhas e outras crônicas. RJ: J. Olympio, 1976.

Nilto Maciel(O Homenzinho Alado e Suas Lucubrações)


Transformado em pássaro, o homenzinho não conseguia lembrar exatamente o momento em que lhe nasceram asas. E ora repousava nos galhos mais grossos das árvores, ora aproveitava o dia para voar ao lado da passarada miúda.

Decididamente, sua memória não andava em ordem. Talvez em consequência da grave transformação física sofrida. Não se lembrava até mesmo se percebera logo a novidade, se sentira medo, alegria ou desespero, se experimentara voar imediatamente após se sentir alado. Recordava apenas de se ter perguntado onde se achavam seus braços, até se convencer da simples conversão deles em asas.

Não conseguia esquecer, no entanto, o momento em que sobrevoava um extenso parque, em voos rasantes e lentos, como um planador, deliciado com o panorama visto do alto. Avistava uma clareira e sentia vontade de repousar, voltar a terra, pousar no chão. Além do mais, duas figuras minúsculas, talvez presas fáceis para aves de rapina, se mantinham entretidas uma com a outra, sentadas à borda de uma grande pedra.

Feito um bem-te-vi, o homenzinho sustentou-se acima das cabeças das duas criaturas terrestres e, a muito custo, conseguiu reconhecê-las. Sim, podiam ser Eduardo e Batista, dois de seus melhores amigos, companheiros inseparáveis de ideias e ações.

Os dois rapazes conversavam e conversavam, e nem se davam conta da presença daquela figura maiúscula sobre suas cabeças, como uma ameaça. Nada percebiam e nada perceberam, nem mesmo quando o homenzinho alado pousou diante deles e recolheu as asas. Com certeza, não o viam, pois nem sequer se assustaram, nem sequer interromperam a conversa.

Por um minuto, o homem de asas imaginou estarem cegos seus ex-amigos. Sim, talvez não enxergassem mais e só se comunicassem pela fala. E resolveu dirigir-lhes a palavra: "Vocês me viram voando?" Nenhuma resposta. “E como estão vocês aqui na Terra?” Nada ouviam, além das próprias vozes. A conversa entre os dois não tinha fim. Falavam de transformações sociais.

O homenzinho não perdeu a paciência. Eduardo e Batista teriam ficado surdos. Não, não podia ser isto. Ora, se fossem surdos, não conversariam um com outro. Mais provavelmente não conseguiam ouvir a sua voz de pássaro humano, talvez baixa demais, talvez excessivamente alta. Sim, os ouvidos deles ouviriam outros sons. Como o bater de asas. Sobretudo asas grandes, como as suas. E pôs-se a bater as asas, como um galo a cantar. Nada cantou, porém. E nem os rapazes notaram o seu esforço.

Decepcionado, dirigiu-se de novo a seus antigos companheiros, agora aos gritos: "Vocês estão perdendo tempo." Encheu os pulmões e voltou a gritar: "Isto não leva a nada, meus amigos." E era como se ninguém estivesse diante deles, como se um micróbio declamasse versos em latim.

Com certeza, Eduardo e Batista não tomavam conhecimento da presença de seu ex-amigo. Ou os ausentes seriam eles? E se os dois não acreditassem na sua existência? Sim, corria um boato segundo o qual ele fora morto. Ou os inexistentes, os mortos seriam os outros dois?

O homenzinho se afastou, a passos lentos, dos rapazes. Continuassem a conversa. Transformassem o mundo, tudo. E não acreditassem nunca na possibilidade da existência de um homem alado. Esquecessem todas as lendas, todos os mitos estudados na escola.

E alçou voo, deixando para trás o bosque, os antigos amigos, a cidade, e foi pousar num matagal distante, depois de longas horas de vadiação pelo céu. Feito um animal lendário, mitológico.

Fonte:
Nilto Maciel. Tempos de Mula Preta, contos. Secretaria da Cultura do Ceará: 1981.

domingo, 3 de novembro de 2019

Varal de Trovas n. 106


Isabel Furini (Semelhante)


Renato Benvindo Frata (O Amigo)

Ajeita a tralha e latinhas no isopor, a vara no bagageiro da Brasília. Pescaria promete.

Dia com sol, bonito, vento fraco.

Telefone toca, é Maurício dizendo que não vai.

"Que pena". Amigo bom taí, deu as cervejas, não pode pescar.

"A que horas volta?"- mulher pergunta.

"Seis, ou mais"- é a resposta.

Se apressa.

Chega no rio. Joga a isca na água.

Anzol enrosca numa rede.

Puxa devagar.

"Tá cheia". 32 lambaris, 9 bagrinhos, vivos.

Rede rodou à noite.

"Que sorte!”

Não vê ninguém que possa ser o dono.

Põe no embornal e sai,

"Amigo deu as cervejas, darei a peixada".

Chega, entra, nota silêncio e fogão frio,

"Será que foi almoçar na mãe?"

Escuta ruído.

Abre a porta do quarto, mulher trêmula na cama.

Debaixo, parte de perna.

Manda sair.

É o Maurício.

Fonte:
Renato Benvindo Prata. Azarinho e o caga-fogo. Paranavaí/PR: Eg. Gráf. Paranavaí, 2014.

Livro enviado pelo autor.

Luiz Gonzaga da Silva (Trova e Cidadania) 1 - Conceito de cidadania


 
Nota do blog:
Esta semana recebi do trovador potiguar Gonzaga da Silva o livro Trova e Cidadania, onde ele organiza uma compilação de trovas de trovadores de diversas regiões referentes a tópicos que envolvem a Cidadania. A partir de hoje coloco no blog, periodicamente alguns tópicos em trovas do excelente livro deste trovador. Contatos com o autor podem ser realizados em gonzagadasilva.natal@gmail.com

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CONCEITO DE CIDADANIA

O termo cidadania deriva do latim civitas, cidade. O conceito tem origem na Grécia antiga e designava o exercício dos direitos e deveres de cidadão, ou seja, do sujeito que vivia na cidade e que participava ativamente dos negócios e das decisões políticas. Entretanto, mesmo na Grécia, nem todos eram considerados cidadãos, ficando excluídos desta categoria os escravos, as mulheres, as crianças e os estrangeiros.

Atualmente, o termo cidadania está mais relacionado ao exercício dos chamados direitos fundamentais ou direitos humanos, previstos nos Tratados internacionais e nas Constituições dos estados. Mas esta previsão não assegura, por si só, o direito de cidadania.


Neste mundo de defeito,
no perpassar destes anos,
vivemos sem ter direito
aos tais "direitos humanos"!
Aloísio Bezerra - CE

Para os que seguem sozinhos,
descalços e combalidos,
que importa ter mil caminhos
se todos são proibidos?
Amália Max - PR

É necessário um esforço contínuo dos cidadãos para que os seus direitos sejam efetivados e respeitados. Nossos trovadores dizem o que é cidadania e como ela pode ser exercida.

Cidadania é civismo;
sobretudo é comunhão:
é ajuda mútua, é altruísmo,
partilha Justa do pão!
A. A. de Assis - PR

Exerce a cidadania
quem faz valer seu direito
e luta, no dia a dia,
por um mundo mais perfeito!
Renata Paccola - SP

Exercer cidadania,
em meio à desigualdade,
é conquistar, dia a dia,
um quinhão de liberdade!
Marisa Vieira Olivaes - RS

Exercer cidadania
é postar-se vigilante,
e com serena ousadia
lutar pelo semelhante.
Gonzaga da Silva - RN

Cidadania é o dever
do ser humano exemplar
gritar, com o seu poder,
por quem não pode gritar!
José Valdez de Castro Moura - SP

Com sentimento profundo
de pura cidadania
é que um povo afirma ao mundo
a sua soberania.
Sandro Pereira Rebel - RJ

Cidadania, em seus pleitos,
toda a grandeza contém
no conjunto dos direitos,
mas de deveres também.
Alonso Rocha - PA

Cidadania se exerce
com consciência e respeito,
pois se assenta no alicerce
do dever e do direito...
Élbea Priscila Souza e Silva - SP

Fonte:
Luiz Gonzaga da Silva (org.). Trova e Cidadania. Natal/RN, abril de 2019.
Livro enviado pelo autor.

Malba Tahan (Parábola das Mães Felizes)



(De um poema árabe do século XII)

Jovem mãe ia, enfim, iniciar a grande jornada pela estrada incerta da vida. E perguntou, muito tímida, ao Anjo Bom do Destino:

- É longo o caminho a percorrer, Senhor? Serei feliz com meus filhos que tanto amo e estremeço?

Paciente e benévolo e com voz cheia de meiguice, respondeu-lhe o Anjo Bom do Destino:

- O caminho, que se abre diante de ti, é longo muito longo, semeado de angústias, recortado de dores e atapetado de fadigas. Antes de alcançares a curva extrema, virá a impiedosa velhice ao teu encontro. Ainda assim, asseguro-te que os teus derradeiros passos serão mais cheios de alegria e ternura do que os primeiros.

E a jovem mãe partiu. Sentia-se extremamente ditosa em companhia de seus filhinhos. 

- O caminho, que se abre diante de ti. é longo, muito longo, semeado de angústias, recortado de dores e atapetado de fadigas.
    
A existência lhe decorria sob o véu de um delicioso encantamento. Brincava com os pequeninos; colhia para eles, unicamente para eles, as mais lindas flores que adornavam os caminhos do mundo. E o sol brilhava, inundando a terra com a bênção de suas torrentes de luz.

E o dia se escoava tão sereno, que a jovem mãe murmurou, fitando, enternecida, o céu azul:

- Nada haverá, Senhor, de mais belo! Jamais serei, na companhia de meus filhos, mais feliz do que o sou agora!

A noite veio, porém, alongando sobre a terra o seu manto pesado e sombrio. Nuvens disformes amontoaram-se no firmamento; desabou o temporal. O vento norte uivava como um chacal faminto correndo tonto pelos areais sem fim. Os pequeninos, tolhidos de frio, trêmulos de medo, soluçavam. A jovem mãe destemida aconchegou-os a si, agasalhando-os sob sua túnica; e as crianças, bem abrigadas e protegidas, murmuraram docemente, docemente murmuraram:

- Ó mãezinha querida! O medo já não se abriga em nossos corações! A teu lado, mãezinha adorada, nenhum mal nos alcançará!

E a jovem mãe exclamou num ímpeto de alegria:

- Isto para mim, ó Deus! É mais belo e grandioso do que a jornada pelo caminho tranquilo, sob o esplendor do dia! Sinto-me, realmente, feliz! Mais feliz do que ontem! Contra a tormenta protegi meus filhos e lancei, para sempre, em seus corações, a semente do destemor, da confiança e da coragem!

Passou a noite. Louvado seja Deus! A noite passou. Raiou, esplêndida e balsâmica, a alvorada. A estrada, naquele terceiro dia, se estendia, ladeirenta, pelo dorso de uma montanha alcantilada e perigosa. Era forçoso subir. Subir muito. Os pequeninos sentiam-se fatigados. A jovem mãe, quase desfalecida de sede e de cansaço. 

Fazendo, porém, das fibras coração, mostrava-se animada, e, sem cessar, dizia aos filhos:

- Vamos! Para cima! Breve chegaremos ao alto! Vamos! Subamos sempre! Subamos!

E essas palavras multiplicavam energias que o esforço constante e excessivo queria aniquilar. E as crianças iam subindo, subindo... Chegaram, finalmente, ao cimo da montanha. A jovem mãe os enlaçou, então, em seus braços carinhosos. E eles lhe disseram:

- Ó mãezinha querida, sem ti não teríamos conseguido vencer estas escarpas, contornar estes abismos e levar a bom termo esta jornada. Sem o teu auxílio incomparável  sucumbiríamos em meio da escalada. Sabemos, agora, como superar os grandes obstáculos da sorte!

E a delicada mãe, ao repousar naquele dia, semimorta, exclamou arrebatada:

- Ó Deus, clemente e justo! O dia de hoje foi para mim melhor ainda do que o de ontem! Sinto-me mais feliz! Mais feliz do que nunca! Ensinei meus filhos a enfrentar bravamente os revezes e as tristezas da vida!

No quarto dia, estranhas nuvens cor-de-chumbo cruzaram o céu. Um rugido surdo, que parecia partir das profundezas ignoradas da terra, enchia o ar soturnamente. De súbito, a imensa montanha tremeu; rochas descomunais desprenderam-se e rolaram com estrondo para os abismos apavorantes.

Era o cataclismo que começava. Tão altas e densas erguiam-se as colunas de pó, que chegavam a cobrir a face do sol. E as trevas da noite desceram sobre a terra em pleno dia. A morte, com suas garras de fogo, rondava por toda a parte. Nem tenda havia nem caverna ou abrigo, onde um ser humano pudesse ter segura a curta vida. 

As crianças, presas de cruciante pavor, choravam. E a jovem mãe, serena e forte, lhes dizia:

- Em Deus confiai, meus filhos! Olhai para cima! Deus não nos abandonará!

E os pequenos confiaram em Deus. E Deus os livrou da fúria infrene. Ao findar aquele dia a mãe exclamou, em Êxtase, erguendo humilde para os céus os seus olhos cheios de gratidão:

- Este foi o dia melhor da minha vida. Senhor! Ensinei a meus filhos a crer em Vós, a confiar em Vós, só em Vós, ó Deus misericordioso!

Amontoaram-se os dias: sucederam-se os meses; os anos passaram. E a mãe, toda entregue à felicidade e ao bem-estar dos filhos, não sentiu o rolar intérmino do tempo. Os seus formosos cabelos fizeram-se brancos como a neve; o brilho desapareceu-lhe dos olhos; a face tracejou-se-lhe de rugas. Era, enfim, a velhice. Mas, que encanto para sua vida de mãe! Os filhos crescidos, fortes, cheios de alegria, pareciam redobrar neles a boa seiva que dela partira. Ela, a mãe feliz, curvada ao peso da vida, já mal podia caminhar. Os filhos, porém, ali estavam, a seu lado, para servi-la, honrá-la e obedecer-lhe!

O mais velho dizia-lhe, carinhoso e com desbordante afeto:

- Mãezinha! Quero hoje carregar-te em meus braços! Estás tão fraca e cansada!

Protestava o mais moço com entusiasmo:

- Que egoísmo é esse, meu caro! Hoje é meu dia. Eu, sim, é que irei carregar a mãezinha querida!

E a mãe feliz sorria a um, abraçava a outro; beijava a ambos.

Que bons e dedicados lhe eram os filhos. Sim, para o coração materno, fizera pausa o tempo. Eles eram ainda os seus filhinhos, os filhinhos ternos, estremecidos... E ela sentia-se tão feliz, tão feliz, que não achava palavras com que agradecer a Deus!

Um dia, afinal, a mãe ditosa reuniu os filhos e disse-lhe, num fiozinho de voz:

- A minha tarefa está finda, meus filhos. Vou deixar-vos. Irei para longe, para muito longe daqui ...

O mais velho acudiu logo, carinhoso:

- Pois iremos contigo, mãezinha! Ninguém nos poderá separar de ti!

Ela não sustentou as lágrimas e deixando-as deslizar, insistiu com meiguice:

- Não, queridos. Desta vez terei de ir só. Sozinha partirei.

E eles, afeitos à obediência, mais uma vez obedeceram. E a boa velhinha partiu. Foi indo, vagarosamente, toda encurvada, trêmula...

Diante dela, no extremo do caminho, abriram-se dois largos portões que refulgiam cheios de luz. Entrou. Uma voz, que mais parecia um cântico de glória, lhe dizia com infinita mansuetude:

- Vinde a mim, ó mãe feliz! Vinde a mim!

Os filhos, que a vigiavam de longe, viram-na de repente desaparecer:

- Ela partiu para sempre! Não a veremos nunca mais! Nunca mais! - exclamaram emocionados. - Mas a santa lembrança dessa mãe querida viverá para sempre em nossos corações! Eduquemos nossos filhos como ela nos educou: na bondade, na obediência, no amor...

E no silêncio da tarde que caía, lentamente, ouvia-se o sussurro de um chorar longínquo. Calaram-se todos.

Que seria? 

Era o filho mais moço. O rosto entre as mãos, inconsolável, soluçava de joelhos, à margem da vida, com a dor da saudade a negrejar-lhe o coração:

- Minha Mãe! Minha Mãe querida!...

Fonte:
Malba Tahan. Os Segredos da Alma Feminina nas Lendas do Oriente.

sábado, 2 de novembro de 2019

Varal de Trovas n. 105


Olivaldo Júnior (Trovas sobre Saudade)


02 de novembro: Dia de Finados

No caminho da existência,
vão-se as flores da saudade!...
Todas unas pela essência,
mas, na essência, sem idade...

Cemitério, no Finados,
vira, enfim, contradição:
bate pelos sepultados,
mas 'sepulta' o coração.

Cada lágrima que escorre
por aquilo que eu não tive
vira a benção que socorre
quem, por mim, ainda vive...

Por não ter quem eu queria,
fui querer quem não me quis;
mas, ao largo, eu nunca via
que, no fundo, eu fui... feliz.

Sob a lápide, e sem flores,
jaz meu corpo já sem sangue;
feito céu sem beija-flores,
ou palmeiras sem o mangue...

Meu amor não crê no fim,
mas bem sabe que jamais
sobre as ondas do jardim
nosso barco chega ao cais...

Minha lágrima, meu bem,
faz de um pobre o vencedor;
venço a morte, sigo além,
quando choro, e é por amor.

Antonio Carlos de Barros (Lenda de Imembuí)


MITOS E LENDAS DO RIO GRANDE DO SUL

Mito – segundo o dicionário da língua Portuguesa de Silveira Bueno,  seria coisa inacreditável, sem realidade.

Lenda – segundo o mesmo dicionário, é conto, história fantástica, imaginosa.

Temos também a definição do escritor, pesquisador, folclorista, poeta, Antônio Augusto Fagundes, onde afirma que Mitos e Lendas são partes importantes do folclore de um povo e estuda-los é fundamental para o aprofundamento na alma popular. Os mitos e as lendas são a história do País, (em seu verdadeiro sentido), contada pelo seu povo.  Enquanto o Mito é Universal, a Lenda é Local.

A 100 km de Rosário do Sul, localiza-se a bela Cidade de Santa Maria da Boca do Monte ou simplesmente Santa Maria. Foi de lá que soubemos dessa Lenda.

A LENDA DE IMEMBUÍ

Uma tribo de fala Guarani habitava a região rodeada de cerros, onde hoje está a cidade de Santa Maria, também conhecida como Santa Maria da Boca do Monte e cuja localização, os Gaúchos dizem: No Coração do Rio Grande.
Conta a lenda que na tribo dos Minuanos, um dos grupos indígenas habitantes nas margens do Arroio Itaimbé, morava Imembuí, uma índia muito bonita, de tez clara, cabelos longos e olhos muito negros. Seu nome significa a salva das águas, pois ela nasceu quando sua mãe, a índia Yboquitã, banhava-se nas águas do Arroio Itaimbé.

Era uma jovem muito querida e admirada por todos de sua tribo e despertava interesse dos jovens índios das tribos vizinhas. Acangatu, um jovem índio da tribo dos Tapes, que habitavam a outra margem do Arroio Itaimbé, apaixonou-se por Imembuí, e para testemunhar seu amor e sua coragem, todos os dias, trazia-lhe uma caça como presente. Porém, a jovem índia tinha por ele somente uma afeição de irmã. Certo dia encheu-se de coragem e disse a Acangatu o que sentia por ele. O índio, decepcionado, ferido em seu amor próprio, embrenhou-se na floresta e ninguém mais o viu na aldeia.

Nessa época, um grupo de Bandeirantes que regressava da Colônia do Sacramento, provavelmente, na segunda metade do século XVII, onde haviam ido levar provisões para a Guarnição Portuguesa, avistou a Aldeia dos Minuanos e julgaram eles presa fácil, pois só avistaram de longe, uma manada de cavalos, pacificamente pastando. Os Bandeirantes costumavam apreender índios, escravizá-los e levá-los para São Paulo, a fim de trabalharem nas lavouras. De longe, viram apenas uma cavalhada tranquila. E atacaram a Aldeia. Entretanto, surpreendente engano: em cada cavalo, um guerreiro escondia-se no flanco oculto da montaria. Os minuanos, avisados por seu vigia, do perigo que se avizinhava, em violenta carga dizimaram os atacantes. Os que não foram mortos fugiram, ou foram feitos prisioneiros.

O Bandeirante Português, Rodrigo, que estava entre os prisioneiros, foi também condenado à morte. O prisioneiro tocava uma música dolente no seu violão e cantava a saudade de sua terra e o destino triste que o levava a um doloroso fim. Era um moço simpático e valente.

Imembui, ouvindo seu canto e admirando aquele rosto bonito, comoveu-se e sempre se aproximava dele para ouvi-lo cantar. Seu coração jovem e sensível apaixonou-se por Rodrigo, e sabendo do destino cruel que o aguardava, foi suplicar a seu pai, o Cacique Apacani, para que o poupasse da dura sorte. Este que não negava nenhum pedido de sua filha, atendeu, tendo Rodrigo passado a viver com os índios.

Foi realizado o casamento de Imembuí e Rodrigo, em grandes festas, de acordo com o ritual indígena. A partir daí, Rodrigo passou a chamar-se Morotin que significa branco na linguagem Guarani. Casaram-se mais tarde nas Missões, onde também foi batizado o filho deles José.

O indiozinho José tornou-se um jovem forte e corajoso, e começou a afastar-se de casa, exercitando-se como caçador. Sua mãe sempre o recomendava para que tomasse cuidado, pois, como ele ainda era um menino, poderia ser uma presa fácil a alguma fera faminta.

Um dia, José embrenhou-se na mata para caçar e se perdeu. Não conseguiu encontrar o caminho de volta. Seus pais procuraram-no por toda a parte em vão. O menino havia desaparecido. Talvez um animal o tivesse ferido, ou uma cobra venenosa o tivesse picado.

Imembuí muito chorou o desaparecimento do filho. José, perdendo o caminho de casa, foi andando, andando pela mata, até que anoiteceu. Aconchegou-se no oco de uma árvore, abrigando-se do frio e das feras e aí passou a noite. E no dia seguinte, continuou a andar. Muito andou, até que chegou às margens de um grande rio, encontrando uma choupana, habitada por um índio que o acolheu.

Conversando com o índio, José contou-lhe sua história. O homem, comovido, dispôs-se a ajudá-lo, conduzindo José até a sua aldeia. José, considerado perdido, teve um retorno alegremente comemorado por toda a sua aldeia.

Imembuí e Morotin, agradecidos ao homem que encontrara o seu filho, convidaram-no a participar da alegria de toda a tribo. Reconheceram nesse homem, o índio Acangatu que já havia se curado de sua paixão por Imembuí.

De acordo com essa lenda, Santa Maria teve sua origem no amor que uniu uma índia com um branco, nas margens do Arroio Itaimbé, que hoje corre canalizado sob o calçamento do Parque Itaimbé nessa cidade.

Esse parque até hoje possui o formato de quando iniciava o rio. Eu sempre que posso, dou uma passada lá, costumo saudar os antigos que ali moravam, pois a sensação de paz e tranquilidade que esse local nos passa é imensamente incrível.

No Coração do Rio Grande
Interprete: Délcio Tavares

No coração do Rio Grande
Um dia eu fui morar
Lá encontrei muito amor
Lá aprendi a amar
Naqueles pagos chegado
Qual aconchego de um lar
Domei a força gauderia
E me apeguei ao lugar.

Nas entranhas do Rio Grande
A cultura e a tradição
Os valores se entrelaçam
Em confraternização
Lá eu vi a gauchinha
Vi também o velho peão
A cantar a prenda minha
A cantar a prenda minha
Com sua canha e o chimarrão

Na convivência crioula
O Rio Grande me mostrou
Toda a beleza da vida
O seu sentido e o que sou
Vi o guasca e a chinoca
O minuano e o pampeiro
Vi bandos de quero-quero
O chicote e o cavalo do Negro do Pastoreio.
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NOTAS
O Major João Cezimbra Jacques, que era Santa-Mariense de nascimento, publicou uma versão romanceada da Lenda de Imembuí, em seu “Assumptos do Rio Grande do Sul” (Officinas Graphicas da Escola de Engenharia, Porto Alegre, 1912, pag. 110 a 133). As coletâneas de Dante de Laytano “Lendas do Rio Grande do Sul. Coletânea de mais de 80 lendas dos diversos ciclos do folclore Gaúcho conforme os textos de sua literatura regionalista”. Publicação nº 9 da Comissão Estadual do Folclore do RGS, Rio de Janeiro, 1956. O autor faz a sistematização das lendas Gaúchas. A lenda de Imembuí está no Ciclo do Índio (p.44 a 46). E republicou o ensaio em seu livro “Folclore do Rio Grande do Sul” (Martins Livreiro, Porto Alegre, 1984, Capitulo V) e de Luiz Carlos Barbosa Lessa (Estórias e Lendas do Rio Grande do Sul”, Literart, São Paulo, 1960, “A Índia Missioneira e o Prisioneiro Paulista”, p. 151 a 155) apoiam-se declaradamente em Cezimbra Jacques.
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VOCABULÁRIO:

Arroio – riacho
Canha – cachaça
Cerros – monte, morro.
Chinoca – caboclinha, filha de china (mulheres que apresentam características de indígena).
Crioula – natural de determinado lugar.
Gaudéria(o) – denominação dada aos antigos gaúchos
Guasca – tem duplo sentido. Nesse caso era assim que os habitantes da cidade grande chamavam aos moradores do interior.
Minuano – vento frio e seco que sopra do sudoeste no inverno.
Pagos – lugar em que se nasceu.
Pampeiro – vento impetuoso que sopra de sudoeste, vindos dos pampas Argentinos.
Quero Quero – ave símbolo do Rio Grande do Sul

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
Imagem da Lenda – https://santamariafoto.blogspot.com/lenda-de-imembui.html

Retalhos Poéticos I


Amilton Maciel Monteiro
São José dos Campos/SP

MINHAS QUATRO ESTAÇÕES


Foi plena Primavera a minha infância
vivida com carinhos de meus pais ,
sentindo sempre, em toda circunstância,
que o amor dos dois é o que valia mais!

Na juventude tive a incrível ânsia
de tudo ver bem rápido demais!
E abrasador Verão, em discordância
ao que hoje sei que não terei jamais!

E todo o Outono meu, de certa forma
foi de pacata vida cidadã:
fiel marido e pai, dentro da norma...

E agora neste inverno em que convivo
com as dores próprias de minha alma anciã,
traço poesia como lenitivo!

Elisa Alderani
Ribeirão Preto/SP

CREPÚSCULO


Quantas vezes nos surpreendemos
à frente da realidade...
Inútil a fuga...
estragos do tempo
vestem nossos corpos
cansados...

Mas, em nosso olhar
o brilho da alma aparece
mantém acesa
a chama dos sonhos
que jamais se apagam!

A idade nos dá liberdade...
cada dia bem vivido
com novo sabor!
No crepúsculo tem
do dia, a mais bela luz!

O sopro divino
mistura-se com a realidade
doando-nos sabedoria,
brilha igual as estrelas
em nosso olhar!

Francisco José Pessoa
Fortaleza/CE

UMA DÉCIMA


Resolvi apagar a solidão
E acender uma luz dentro do peito
Renegar que problema não tem jeito
E parti pra encontrar a solução
Sob a luz do farol da intuição
Entreguei meu destino, meu porvir,
Aprendi que a dor ensina a sorrir
E nesse labirinto que é a vida
Você hoje não tem mais a saída
A não ser que me chame pra dormir

João Batista Xavier Oliveira
Bauru/SP

DESPERTAR


Nesta esfera conturbada
onde o tempo é açodamento,
o amor é flor digital,
auroras sem firmamento...
o poeta resvalando
vai catando os resquícios
das cantigas de ninar...
vai juntando, vai formando,
e um anjo vai despertar!

Desenha um bosque florido,
redes e meditações.
Os arrebóis agradecem,
tecem elucubrações...
O poeta continua
vai catando os pingos d´ouro
das cantigas de viver...
vai amando, vai criando,
e um novo céu vem soer!

Assim é o ciclo da vida:
o amor é o cerne de tudo,
nesta esfera conturbada
que forja um poema mudo...
mas os eflúvios são fortes;
não há resquício que morra
nas cantigas de ninar...
a esperança fortalece
e até o anjo faz chorar!!

Olivaldo Júnior
Mogi Guaçu/SP

UM RESTINHO DE POESIA

31 de outubro: Dia Nacional da Poesia
Contra tudo o que é ruim,
no balcão do dia a dia,
um vislumbre do sem-fim,
um restinho de poesia...

Cravo e rosa no jardim,
um João e mais Maria,
um travesso querubim,
um restinho de poesia...

Voz em prol dos oprimidos,
tão valentes pe(s)cadores,
a poesia em meus ouvidos!...

Não bastante, só rumores,
um restinho dos sentidos,
a poesia, os seus cantores.

Pedro Du Bois
Balneário Camboriú/SC

EXIGÊNCIAS


O rito exige o desassossego
do artista no plano
em que se apresentam
cenas improvisadas

o rito exige respeito ao momento
em que o poeta desrespeita
o tempo na hora em que palavras
atropelam o rigor e o texto explode
no papel

o rito exige o cumprimento
negado ao que ocorre
na memória recuperada
quando me vejo em você.

SÁ de Carvalho
Angra dos Reis/RJ

VOCÊ


Eu sou você, mas não tenho você.
Você me possui, mas não possuo você.
Você arrebata-me, nocauteia-me, abate-me
e de mim se apossa por inteiro.
Prisioneira desse algoz,
recolho toda dor chorada,
enrosco em mim a tristeza, mergulho num poço de fel
e tenho de mim muita pena.
Por que meu coração não me obedece?
Por que meus olhos ficam opacos
quando não vejo a luz dos olhos teus?
Por que devo sentir-me um trapo
quando tantos outros ,de mim, querem um trato?
por que é para você minha vontade, minha vida?
Então, sem respostas, em prece, rogo,
que você se entregue a mim,
que nos meus braços se abandone,
que retribua os meus beijos,
que se delicie com meus afagos,
enfim, que se deixe amar por mim..
Tendo você assim subjugado, inerte, impotente
ficarei feliz por finalmente tê-lo como meu prisioneiro!

Samuel da Costa
Itajaí/SC

CAMPOS ELÍSEOS


Eu ainda lembro...
Das partidas & dos desencontros
Do nosso ocaso
Do amor
Como se fosse hoje…

E você não está mais ao meu lado
Contudo, eu ainda lembro
Mas não deveria lembrar
Da minha hora do ocaso
Das partidas...
Das despedidas...
Dos encontros casuais...
Ali no meio da rua
De você na minha vida...
Da minha vida
Sem sua doce presença

Eu ainda lembro
De você na minha vida
Mas não deveria lembrar...
Mesmo assim ainda lembro
Do seu sorriso
Da sua hora do ocaso
Da sua doce presença na minha vida
Sempre marcante...
Das suas marcas
Do seu sorriso marcado
Do seu corpo marcado
Eu sempre lembrarei
Mas não deveria
Mesmo assim, ainda lembro...
Da sua doce presença
Na minha vida...

Silmar Bohrer
Caçador/SC

quem lê
sabe mais
e
não vai atrás
de tantos mitos
que contaminam
os mundos
nos tornando
mais moribundos

Teresinka Pereira
Estados Unidos

NÓS


Nós que escrevemos no papel,
no computador, no guardanapo,
no recibo do mercado,
na beirada do jornal,
no prato ou nas árvores,
nós que falamos ao vento
com voz de poesia
e palavras de pedra,
somos incansáveis
transeuntes da noite,
nômades sem sono
loucos e defeituosos
bruxos descuidados.
Nós vamos sonhando
e seguimos acreditando
no poder do amor.

Vivaldo Terres
Itajaí/SC

ALMA ILUDIDA


Como é bela a juventude,
Nos áureos tempos da vida.
Enche-nos de esperanças,
E nos deixa a alma iludida.

Pensando que essa alegria,
E plena felicidade...
Seguira por toda vida,
Sem tristeza e sem saudade.

Pobres jovens desconhecem.
O transcorrer da existência,
Depois de muita alegria.
Dos amores do passado,
Vem-nos a melancolia...
A angústia e o desagrado.

Ah! Se a vida nos fosse sempre,
O fulgor da juventude.
De alegria e felicidade,
Sem tristeza e sem saudade.

Fonte:
Poemas enviados pelos poetas

Luiz Poeta (O Homem Importante)


O homem importante chega e os aplausos explodem no grande teatro. Os aplausos estavam preparados para o homem importante e os espaços entre as mãos separadas fechar-se-iam a cada palavra bonita ou idiota que o homem importante proferisse.

O homem importante começou a discursar e cada sílaba ecoava mais grave e musical que a outra.

Os aplausos espocavam e o homem importante prosseguia entusiasmado com suas próprias palavras, que tornavam-se brados e seus brados tornavam-se explosões emotivas e suas emoções atraiam outras emoções.

Abruptamente, entretanto, uma voz soou mais alto que a mais alta voz do homem importante: era a voz de um homem sem importância.

Alguém o interrompeu, outro censurou-o, mais um xingou-o - o homem sem importância continuou a falar.

O homem importante silenciou, sorriu seu riso irônico como se não se importasse com o homem sem importância; os outros, ensaiados, riram com ele. Mas o homem sem importância continuava e suas palavras sem crédito atravessaram os ouvidos feitos para ouvir sem sensibilidade, entretanto o ouvir deixou, paulatinamente, de ser fisiológico para ser gradativamente metafísico.

O homem sem importância falava e agora eram suas sílabas que se tornavam vibrantes, sonoras... e eram suas frases que inundavam todos os espaços auriculares do teatro.

Os ruídos alheios foram sumindo a cada sussurro subordinado à síncope do estupor.

O homem importante afundava-se na soberba poltrona reclinável reservada para sua importância e as palavras do homem sem importância perfuravam-lhe os tímpanos e a pele gelada, suada e pálida.

O homem importante quis interromper, mas seus argumentos arranhavam-lhe a garganta e seus dedos trêmulos e indecisos impossibilitavam-no de gesticular.

O homem sem importância falava e suas palavras feias pela sua própria condição de homem sem importância eram compreendidas por todos que o cercavam e que, repentinamente, perceberam-se também homens igualmente "desimportantes".

Um aplauso ecoou na carona de uma das frases emitidas pelo homem sem importância; outro juntou-se ao primeiro, mais outro, outro mais... todo o teatro explodiu freneticamente na unanimidade da compreensão e da aceitação, e o homem sem importância tomou-se impetuosamente importante e continuou a falar, a gritar, a bradar coisas que todos entendiam.

O homem que "era importante" sumiu na escuridão das galerias e bastidores do teatro e de si mesmo porque, agora, ele não era mais importante; sua roupa importada já não era importante, suas parábolas e paráfrases copiadas não eram importantes; não era importante o fio de ouro que tinha em um dos caninos... suas palavras debilitaram-se na reação espontânea de cada um dos presentes; tomaram-se indigentes nas marquises de sua amarga solidão silenciosa... sua gravata de seda, suas abotoaduras de cristal, seu relógio Cartier, seu documentos microfilmados, suas teorias decoradas previamente aos discursos, nada disso importava mais.

O outro indivíduo, "o ex-homem sem importância" não mais precisava falar, porque as palavras saídas dele fizeram-se de todas as bocas e o seu nome e sua imagem sem nome elevaram-se no ar e se propagaram como oxigênio purificado.

Quando o teatro esvaziou-se, uma vassoura movida por dois braços sem importância empurraram para a lata de lixo, o impecável discurso do homem... Importante.

Fonte:
Luiz Gilberto de Barros (Luiz Poeta). Canção de Ninar Estátuas. 1.ed. Ilhéus/BA: Mondrongo, 2014.
Livro enviado pelo autor.

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Varal de Trovas n. 104


Vinicius de Moraes (A Arca de Noé)


Sete em cores, de repente
O arco-íris se desata
Na água límpida e contente
Do ribeirinho da mata.

O sol, ao véu transparente
Da chuva de ouro e de prata
Resplandece resplendente
No céu, no chão, na cascata.

E abre-se a porta da Arca
De par em par: surgem francas
A alegria e as barbas brancas
Do prudente patriarca

Noé, o inventor da uva
E que, por justo e temente
Jeová, clementemente
Salvou da praga da chuva.

Tão verde se alteia a serra
Pelas planuras vizinhas
Que diz Noé: "Boa terra
Para plantar minhas vinhas!"

E sai levando a família
A ver; enquanto, em bonança
Colorida maravilha
Brilha o arco da aliança.

Ora vai, na porta aberta
De repente, vacilante
Surge lenta, longa e incerta
Uma tromba de elefante.

E logo após, no buraco
De uma janela, aparece
Uma cara de macaco
Que espia e desaparece.

Enquanto, entre as altas vigas
Das janelinhas do sótão
Duas girafas amigas
De fora as cabeças botam.

Grita uma arara, e se escuta
De dentro um miado e um zurro
Late um cachorro em disputa
Com um gato, escouceia um burro.

A Arca desconjuntada
Parece que vai ruir
Aos pulos da bicharada
Toda querendo sair.

Vai! Não vai! Quem vai primeiro?
As aves, por mais espertas
Saem voando ligeiro
Pelas janelas abertas.

Enquanto, em grande atropelo
Junto à porta de saída
Lutam os bichos de pelo
Pela terra prometida.

"Os bosques são todos meus!"
Ruge soberbo o leão
"Também sou filho de Deus!"
Um protesta; e o tigre - "Não!"

Afinal, e não sem custo
Em longa fila, aos casais
Uns com raiva, outros com susto
Vão saindo os animais.

Os maiores vêm à frente
Trazendo a cabeça erguida
E os fracos, humildemente
Vêm atrás, como na vida.

Conduzidos por Noé
Ei-los em terra benquista
Que passam, passam até
Onde a vista não avista.

Na serra o arco-íris se esvai...
E... desde que houve essa história
Quando o véu da noite cai
Na terra, e os astros em glória

Enchem o céu de seus caprichos
É doce ouvir na calada
A fala mansa dos bichos
Na terra repovoada.

Francisco José Pessoa (Se eu fosse…)


Um Malba Tahan, calcularia em segundos as horas de alegria que a vida nos dá.

Um Einstein, criaria um antídoto para entibiar a bomba que certo dia flamejou o céu de Hiroshima.

Um Alexandre, o grande, teria conquistado o cotação do incrédulo, fazendo-o crer no Grande Arquiteto.

Um Ataúlfo Alves, no meu arrependimento, diria como ele disse: aquilo sim, é que era mulher.

Um Graham Bell, teria inventado um telefone que, pudesse eu, sentir o odor dos teus lábios, e que minhas frases ouvisse maviosas.

Um Braille, transportaria os dedos para uma zona do cérebro.

Um Barnard, só transplantaria coração de um homem bom para um homem de bem.

Um Bill Gates, tornaria virtual a violência que envolve os povos.

Um Karl Marx, repensaria nos seus propósitos, pois, minha mulher é só minha.

Um Pedro, teria registrado a Igreja para alguém não tomar posse.

Um Santos Dumont, não me contentaria em dar só uma voltinha em torno da Torre Eiffel.

Uma Iemanjá, ordenaria que suas sereias retirassem suas escamas para nosso bel-prazer.

Um Fernando, nunca queria ter Cardoso como sobrenome.

O sol, tiraria umas férias para o deleite dos enamorados.

A lua, tiraria umas férias para não aumentar a população chinesa.

Um Salomão, eu seria um sábio e teria trezentas mulheres... acorda, Pessoinha!

Fonte:
Francisco José Pessoa de Andrade Reis. Isso é coisa do Pessoa: em prosa e verso. Fortaleza/CE: Íris, 2013.
Livro enviado pelo autor.

Cecim Calixto (Cajado de Sonetos) II


DOIS AMORES
( Ao trovador A. A. de Assis)

Vou postergar toda ventura minha
E dedicar-me, inteiramente, à trova.
Toda obsessão que no passado eu tinha
Deixou meu senso e suportou a prova.

Mas, por amá-lo o deixarei na linha
E semi-aberta vou manter a cova.
E sei que o irmão, com todo afeto, aninha
No relicário sua irmã mais nova.

Os quatro versos me darão a glória
De pela frente penetrar na história,
Levando ao colo primorosa filha.

E no esplendor da fama em seu coreto,
Verei passar a trova e o irmão soneto
De braços dados pela nova trilha.

FIDELIDADE

Ao me deitar um doce aroma sinto
Que se desprende do lençol vetusto.
Ao velho amigo, tudo a mais consinto,
Pois fez de mim um ser humano justo.

Mantenho-o limpo e com rigor distinto,
Dou-lhe aparência de servente augusto,
Tanto me vela que eu até pressinto
Certa promessa de elevado custo.

Leito vazio... companheira ausente...
O possessivo, sei, jamais consente
Estranha fêmea se deitar na cama.

Se por acaso, ingenuamente aceito,
Ele de pronto desarruma o leito
Na injusta ausência da primeira dama.

ÚLTIMO DESEJO

Quando eu morrer quero caixão de pobre,
Sem adereço, sem jargão de luto.
Não quero tampa de madeira nobre
E nem legenda de mortal tributo.

A terra roxa que o defunto cobre
Será por certo, meu final reduto.
E na capela, que o sineiro dobre
O sino agudo, só por um minuto.

Carro de luxo para o meu transporte;
Vileza certa pela minha morte;
Versão perversa repudiada um dia.

Mas quero sim a musa ao meu redor,
A declamar sonetos meus de cor
Na solidão da minha tumba fria.

FRUSTRADA TENTAÇÃO
A honestidade justifica a luta,
Não vou ceder-lhe o cobiçado espaço.
E não me afeta essa trivial conduta
Na exposição do seu perfil devasso.

Mentira existe - carcomida astuta. -
Fidelidade eu sei fazer e faço.
Meu coração não me propõe permuta
E outro carinho, com prazer, rechaço.

Do meu enlace, ante o Senhor legado,
O anel ostenta este cristão honrado
De cuja cama um só perfume exala.

Não me atormente, cortesã vulgar,
Não vou quebrar o que jurei no altar:
Ser dela sempre e eternamente amá-la.

REVIVESCÊNCIA

A verve explode no quintal da mente,
Replanta a flor que o menestrel almeja.
No espaço surge a floração nascente
Num colorido que a emoção corteja.

A natureza tudo aplaude e sente
Quanto lirismo o trovador planeja,
No sentimento de espalhar semente
Se enche de orgulho e na doação sobeja.

Cuida da messe em devoção constante,
Escreve e lê sem nunca achar bastante
Raros sonetos que em sua alma abriga.

Eis o recado ao escritor moderno:
Que busque a luz do parnasiano eterno
Na revivência da canção antiga.

CORAÇÃO MATERNO

A vida dela se partiu ao meio
Por um amor que glorifica a gente.
Faz tanto bem ao coração alheio
E aquece o meu com afeição ardente.

Acolhe o pobre sem nenhum receio,
Tranquila atende a quem se diz carente.
Seu cofre santo de bondade cheio
Doa saúde ao sofredor doente.

Consolo e amparo é tudo que ela dá
Para os carentes que passam por lá
No desespero de comer um pão.

Ela no seio tem, do leite, a fonte
Para a criança que o destino afronte
E todo arrimo ao desprezado ancião.

SACERDÓCIO

Veementemente eu agradeço a graça
Da convivência fraternal, bendita!
Além de tudo, sem nenhuma jaça,
Na minha casa a paz perene habita.

Bendigo e muito a exuberante raça
Que a venturança ao santo Ser credita,
E o meu caráter manda que eu refaça
O nobre gesto que a emoção agita.

Visito o pobre assim preciso
Para ensinar-lhe o singular sorriso
Que eu aprendi na festival igreja.

No cumprimento de afagar alguém,
Minha missão inclui doar também
Sem permitir que a mão esquerda veja!

Fonte:
Cecim Calixto. Flores do meu cajado: sonetos. Curitiba: Juruá, 2015.
Livro enviado por Vania Ennes.

Carolina Ramos (Conto Natalino)


– Papai Noel não existe!

— Existe, sim! Já disse que existe!

— Deixa disso, vô. Se Pai Noel existisse, eu "tava" assim de presentes! E o que é que eu ganho todo o ano?! — Nada de nada!

O velho engoliu em seco. Verdade! Todo final de ano, era sempre a mesma coisa. Um bruto remorso, como bola de gude das grandes, vinha rolando, rolando e embocava, certinho no seu coração. Remorso de tanta coisa... principalmente, das visitas ao bar do Maneco, à tardinha. Juntasse o que deixava por lá, e, talvez a bola cobiçada pelo neto estivesse ao alcance do seu bolso. Mas, o amor próprio logo arranjava jeito de dividir a culpa. Era isso: — Por que tinha o neto de ser complicado?! Não pedia uma bola qualquer, não! Tinha que ser uma bola fabulosamente colorida! E colorida com todas as cores do arco-íris! Sem faltar nenhuma! Que bobeira! Lá isso existia? Talvez fosse mais fácil encontrar na rua o bom velhinho de barbas brancas comandando o seu trenó de renas, do que achar aquela bola maluca! Maluco era o neto! Onde se viu?

— Queria todas as cores numa bola só, para, num chute, riscar no céu o mais lindo arco-íris e, correndo, cruzá-lo, em seguida, só para ver se do lado de lá havia, realmente, uma vida melhor!

— Tá loco, seu! — para um sonho impossível, só mesmo um possível desinteresse! E era o que acontecia todos os anos. Depois do Natal é que o desaponto do garoto lhe pesava no coração.

Neste ano, até que o vô andara alerta. Vasculhara todos os cantos e não vira bola alguma semelhante à sonhada pelo neto. Até a roubá-la se dispusera, caso a encontrasse. As sobras no bolso, não eram bem sobras e, sim, carências. Faltava tanto para isto; faltava, outro tanto para aquilo. Sobras que poderiam ser o princípio de tudo, mas, não davam para nada.

Coçou a barba encardida. Parou no barzinho do Maneco. Se as sobras não davam para nada, uma paradinha a mais ou a menos, não alteraria o orçamento familiar. Família pequena. Ele e o neto. E o garoto não passava fome nunca. A vizinhança era pobre, mas, sempre restava algo para o guri de olhos negros, brilhantes, pernas finas e ligeiras. E as sobras de um neto chegavam para fartar o fastio de um velho vô.

Na véspera do Natal, o velho, barba encardida, alargou seu giro pelas redondezas. Terra de contrastes! Suntuosos casarões esbanjando luxo pelas portas e janelas. Não longe dali, velhos cortiços e casebres empilhados nas favelas amparavam-se uns aos outros para não beijarem o chão. Chão esse, terra essa, que merecia mesmo ser beijada. Beijada com amor. Beijada como rosto de mãe que tudo dá e nada pede. Os filhos, sim, ingratos ou tolos, tendo tudo à mão, preferiam a miséria.

Parou de filosofar à sua moda, frente a um casarão ostensivo:

— Céus! Que festival de luzes! O largo portal entreaberto convidava. Descuido, talvez. O velho esgueirou-se, contornando o prédio.

A escalada não foi difícil. Não era tão velho assim. A pinga é que lhe pesava feio nas pemas! Ninguém por perto. Todos ocupados. O espírito do Natal borbulhando nas taças. Em algum lugar daquela casa, haveria um Menino entre palhas e presentes. Onde?

No terraço superior, forçou a porta. Com jeito, cedeu. Fácil!

Para vencer a penumbra, apertou os olhos ao invadir o quarto.

Um espelho refletiu-lhe a imagem. Atrás de si, um leito. A decoração não mentia. Quarto de criança. E dois olhos de criança, negros como os do neto, seguiam-lhe atentamente os movimentos.

A mão pequenina apagou a luz de cabeceira. Voz frágil quebrou o silêncio:

— Pai Noel, você enxerga mesmo no escuro?!

O velho pasmou. Pai Noel? Ele?! E por que não?! Era a saída,..

Não... não, garoto… deixa essa luzinha acesa… sempre ajuda... sabes, eu já sou muito velhinho...

— Cadê a sua roupa vermelha, Pai Noel?

— O calor… É… o calor brasileiro… quem aguenta?! Fui obrigado a trocar de roupa ou não poderia entregar os brinquedos.

— E os brinquedos? Pai Noel? Onde estão?

— Tudo entregue. Tudinho!

— Então… o que é que você veio fazer aqui?!

Pai Noel pensou rápido: — Bem, o negócio é o seguinte: Todas as crianças deste mundo já ganharam presentes. Mas, faltou unzinho só. Um guri, assim da tua idade. Obediente, bonzinho... que também merece ganhar alguma coisa. E não tenho nada... nada mesmo, para dar a ele. Como és um menino bom... com certeza já ganhaste muitos presentes, não é verdade? Vim pedir a tua ajuda. Pode ser? Eu só quero um presentinho à toa... qualquer coisinha... aquilo que menos te agrade. Tá?

O garoto ouvia iluminado: — Pai Noel, abra aquele armário. Pegue aquela bola linda que você me trouxe no ano passado. Está novinha! Sabe, eu não gosto muito dela. Ela sempre foge de mim... rolando pra longe...

Só então o velho notou as botas ortopédicas, encostadas ao leito.

Sentiu as lágrimas afogarem a imagem do menino triste. Enxugou-as com a barba encardida. Abriu o armário. Exultou! Lá estava a bola mais bonita que jamais vira! Todas as cores do arco-íris, sem faltar uma sequer e muita bem casadas! O sonho do neto! Beijou-a sonoramente. Ao ouvir passos, despediu-se apressado:

~ Tchau... menino bonzinho... Obrigado! Sara logo que, no ano que vem, Pai Noel vai te trazer a bola do mundo de presente!

Por um instante, o olhar tristonho da criança, rodeada de mimos, mas, tremendamente solitária, trouxe-lhe à memória a lembrança de um certo Menino, de quase dois mil anos, esquecido entre palhas, em plena noite de Natal!

Na rua, o velho coração batia apressado... leve... leve... nem mesmo o bar do Maneco logrou alterar-lhe o ritmo. Em casa, enfatizava:

— Eu não te disse que Pai Noel existe? Taí, garoto teimoso, olha o teu sapato... olha!

Os olhos do neto brilhavam mais do que a Estrela de Belém! A custo, conseguiu balbuciar: - A bola... a bola que eu queria!... como é que ele adivinhou?! Ah!?, vô, agora eu sei que Pai Noel existe! Existe, sim! Desta vez eu nem pedi nada, mas, ele adivinhou direitinho o que eu queria!

Triunfante, o coração do velho deu um pinote e piscou, maroto, para o próprio dono.

"Pai Noel" de barba encardida, sorria feliz... Feliz como nunca, imaginando o arco-íris, mais lindo do mundo que um garoto de olhos negros, pernas finas e ligeiras, iria riscar no céu... logo... logo...

Fonte:
Carolina Ramos. Feliz Natal: contos natalinos. São Paulo/SP: EditorAção, 2015.
Livro enviado pela autora.