quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Cornélio Pires (1884 – 1958)


Cornélio Pires (Tietê, 13 de julho de 1884 — São Paulo, 17 de fevereiro de 1958) foi um jornalista, escritor, folclorista e espírita brasileiro. Foi um importante etnógrafo da cultura caipira e do dialeto caipira.

Cornélio Pires nasceu na cidade de Tietê, Estado de São Paulo, no dia 13 de julho de 1884, e a sua desencarnação aconteceu na cidade de S. Paulo, no dia 17 de fevereiro de 1958.

Homem de personalidade inconfundível, tornou-se figura popular e de bastante destaque em todo o Brasil, graças ao trabalho, por ele encetado, de viajar pelas cidades do Interior do Estado de S. Paulo e outros Estados, estreando na condição de caipira humorista.

Em 1910, Cornélio Pires, apresentou no Colégio Mackenzie hoje Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, um espetáculo que reuniu catireiros, cururueiros, e duplas de cantadores do interior. O Colégio Mackenzie foi fundado e sempre mantido pela Igreja Presbiteriana, à qual Cornélio Pires pertencia.

Em sua juventude aspirava participar de um concurso de admissão numa Faculdade de Farmácia. Animado desse propósito viajou de Tietê para S. Paulo, a fim de se inscrever como candidato a um desses concursos, porém, apesar do seu desempenho não logrou êxito nesse seu intento.

Ambicionando cursar a Faculdade de Farmácia, deslocou-se de Tietê para a cidade de São Paulo, a fim de prestar concurso de admissão. Não teve sucesso em seu intento.

Tomou então a deliberação de dedicar-se ao jornalismo, passando a trabalhar na redação do jornal O Comércio de São Paulo, em cujo cargo desenvolveu um aprendizado bastante estafante. Posteriormente passou a exercer atividades nos jornais O São Paulo e O Estado de São Paulo, tradicional órgão da imprensa paulista, onde desempenhou a função de revisor e, finalmente, no ano de 1914, passou a dar a sua contribuição ao órgão O Pirralho.

Numerosos escritores teceram comentários sobre a personalidade de Cornélio Pires e, para ilustração, passemos a citar Joffre Martins Veiga, que em seu trabalho A Vida Pitoresca de Cornélio Pires, escreveu " Ninguém amou tanto a sua gente como Cornélio Pires; ninguém se preocupou tanto com seus semelhantes como esse homem, que foi, antes de tudo, um Bom". O famosos poeta Martins Fontes, por sua vez, escrevendo sobre ele, afirmou: "é um bandeirante puro, um artista incansável, enobrecedor da Pátria e enriquecedor da língua".

Admirado também pelo grande jornalista Amadeu Amaral, este deu-lhe a sugestão de tornasse um dos maiores divulgadores do folclore brasileiro.

Pelos idos de 1910, Cornélio Pires lançou o livro Musa Caipira, obra que foi largamente saudada pela crítica, graças ao seu conteúdo tipicamente brasileiro. Sílvio Romero tornou-se um dos seus mais salientes críticos, comentando da seguinte forma o lançamento dessa obra: " Apreciei imensamente o chiste, a cor local, a graça, a espontaneidade de suas produções que, além do seu valor intrínseco, são um ótimo documento para o estudo dos brasileirismos da nossa linguagem".

Foi autor de mais de vinte livros, nos quais procurou registrar o vocabulário, as músicas, os termos e expressões usadas pelos caipiras. No livro "Conversas ao Pé do Fogo", Cornélio Pires faz uma descrição detalhada dos diversos tipos de caipiras e, ainda no mesmo livro, ele publica o seu "Dicionário do Caipira". Na obra "Sambas e Cateretês" recolhe inúmeras letras de composições populares, muitas das quais hoje teriam caído no esquecimento se não tivessem sido registradas nesse livro. A importância de sua pesquisa começa a ser reconhecida nos meios acadêmicos no uso e nas citações que de sua obra faz Antonio Candido, professor na Universidade de São Paulo, o nosso maior estudioso da sociedade e da cultura caipira, especialmente no livro Os Parceiros do Rio Bonito.

Foi o primeiro a conseguir que a indústria fonográfica brasileira lançasse, em 1928, em discos de 78 Rpm, a música caipira. Segundo José de Souza Martins, Cornélio Pires foi o criador da música sertaneja, mediante a adaptação da música caipira ao formato fonográfico e à natureza do espetáculo circense, já que a música caipira é originalmente música litúrgica do catolicismo popular, presente nas folias do Divino, no cateretê e na catira (dança ritual indígena, durante muito tempo vedada às mulheres, catolicizada no século XVI pelos padres jesuítas), no cururu (dança indígena que os missionários transformaram na dança de Santa Cruz, ainda hoje dançada no terreiro da igreja da Aldeia de Carapicuíba, em São Paulo, por descendentes dos antigos índios aldeados, nos primeiros dias de maio, na Festa da Santa Cruz, a mais caipira das festas rurais de São Paulo).

A criação de Cornélio Pires permitiu à nascente música caipira comercial, que chegou aos discos 78rpm libertar-se da antiga música caipira original, ganhar vida própria e diversificar seu estilo. Atualmente a música caipira é chamada de música raiz para se diferenciar da música sertaneja. A música caipira dos discos 78rpm nasce, no final da década de 1920, como o último episódio de afirmação de uma identidade paulista após a abolição da escravatura, em 1888, que teve seu primeiro grande episódio na pintura, especialmente a do piracicabano Almeida Júnior, expressa em obras como "Caipira picando fumo", "Amolação interrompida", dentre outras. A ironia e a crítica social da música sertaneja originalmente proposta por Cornélio Pires, situa-se na formação do nosso pensamento conservador, que se difundiu como crítica da modernidade urbana. O melhor exemplo disso é a "Moda do bonde camarão", uma das primeiras músicas sertanejas e uma ferina ironia sobre o mundo moderno.

No início do presente século, Cornélio Pires começou a freqüentar a Igreja Presbiteriana, entretanto não conseguiu conciliar os ensinamentos dessa religião com o seu modo de pensar. Ele não admitia a existência das penas eternas e de um Deus que desse preferência aos seguidores de determinadas religiões. O demasiado apego aos formalismos da letra, na interpretação dos textos evangélicos fez com que ele quase descambasse para o materialismo.

Nessa época ele desconhecia o que era Espiritismo, entretanto, durante as suas viagens ao Interior, aconteceram com ele vários fenômenos mediúnicos, inclusive algumas comunicações do Espírito Emilio de Menezes, as quais muito o impressionaram. Como conseqüência ele passou a estudar obras espíritas principalmente as de Allan Kardec, Leon Denis, Albert de Rochas e alguns livros psicografados pelo médium Francisco Cândido Xavier.

Dali por diante integrou-se decididamente no Espiritismo, interessando-se muito pelos fenômenos de efeitos físicos. Nos anos de 1944 a 1947 ele escreveu os livros Coisas do Outro Mundo e Onde estás, ó morte?, tendo desencarnado quando escrevia Coletânea Espírita.

De sua vasta bibliografia destacamos: Musa Caipira, Versos Velhos, Cenas e Paisagens de minha Terra, Monturo, Quem conta um conto, Conversas ao Pé do Fogo, Estrambóticas Aventuras de Joaquim Bentinho - O Queima Campo, Tragédia Cabocla, Patacoadas, Seleta Caipira, Almanaque do Saci, Mixórdias, Meu Samburá, Sambas e Cateretês, Tarrafas, Chorando e Rindo, De Roupa Nova, Só Rindo, Ta no Bocó, Quem conta um Conto e outros Contos..., Enciclopédia de anedotas e Curiosidades, além dos dois livros espíritas acima citados.

Num de dos seus escritos sobre o Espiritismo, dizia ele: " O Espiritismo, mais cedo ou mais tarde, fará aos católicos romanos, aos protestantes e aos adeptos de outros credos, a caridade de robustecer-lhes a Fé, com os fatos que provam a imortalidade da Alma, que se transforma em Espírito ao deixar o invólucro material" e mais adiante " O Espiritismo nos proporciona a FÉ RACIOCINADA, nos arrebata ao jugo do dogma e nos ensina a compreender DEUS como Ele é".

Pouco antes de sua morte, Cornélio Pires, demonstrando que havia assimilado o preceito de Jesus Cristo: " Amai ao próximo como a ti mesmo", voltou para a cidade do Tietê e ali comprou uma chácara, onde fundou a " Granja de Jesus", lar destinado a crianças desamparadas. Infelizmente ele não chegou a ver a conclusão da obra.

Cornélio Pires chegou a organizar o " Teatro Ambulante Cornélio Pires" perambulando de cidade em cidade, sendo aplaudido por toda a população brasileira por onde passava. Esse intento foi concretizado após ter abandonado a carreira jornalística.

Causos sobre Cornélio

Cornélio foi descendente de Bandeirantes, era filho de Raimundo Pires de Campos e de Ana Joaquina de Campos Pinto, (D. Nicota), nasceu antes do tempo, pois Tia Nicota, grávida de Cornélio, escorregou em uma casca de laranja, caiu sentada e passou a sentir fortes dores, acabou indo para a cama por volta das 11 horas. Quando Tio Raimundo chegou da roça, teve que cortar o cordão umbilical do recém nascido.

Como vê, nascido antes do tempo e ainda com o nome trocado. E o próprio escritor diz: "Meu nome tem a sua historia". Uma de minhas tias maternas andava de namoro com um parente chamado Rogério Daunt, e foi ela que me levou a Pia Batismal. Ao me batizar, Padre Gaudêncio de Campos, que era nosso parente, e nesta época já bem velho e muito surdo, pergunta: "Como se chama o inocente?". Ao que responde sua Tia, "Rogério". E o Padre – "Eu te batizo, Cornélio...".

E Cornélio crescia, porém desde cedo revelou-se um chorão de primeira, por qualquer motivo soltava as lágrimas. Certa feita, sua mãe o levou para visitar alguns parentes, e em meio a conversa com os adultos, ele começou a chorar sem nenhuma razão. A dona da casa, muito preocupada, desdobrou-se para acalmá-lo dizendo: -Que é isso Cornélio..., o que você tem? – Perguntou ela com ternura, alisou-lhe os cabelos loiros e deu-lhe uma moeda de alguns reis. – Tá, tome este presentinho pra calar o bico. Coitadinho! O menino parou de chorar, limpou as lágrimas com as costas das mãos e exclamou. – Ah! A senhora pensa que eu choro por dinheiro? E bem rápido, agarrou o níquel, enfiou no bolso da calça de brim e iniciou outra choradeira.

De outra feita, um outro tio, muito zombeteiro, sempre que o encontrava, dava-lhe amáveis e doidos piparotes na cabeça. A brincadeira tornou-se monótona pela repetição. O menino não gostava dos gracejos, porém, nunca se queixou aos pais. D. Nicota, contudo, soube dos que se passava e recomendou ao filho, entre divertida e indignada. – Quando ele bater outra vez, você responda que não foi batizado por Cabeçudo. Certo domingo, o garoto se dirigia ao jardim, quando se encontrou com o parente e este repetiu o gesto e usou da mesma expressão. Cornélio, pensando no que sua mãe lhe disse, foi logo dizendo todo atrapalhado. – "Não fui BATIZUDO por CABECADO! E saiu de cara amarrada entre risos dos presentes.

Outra passagem, ocorreu em uma das tentativas de alfabetização de Cornélio. Seus pais já cansados em tentativas frustradas, conheceram um grande sábio dinamarquês, Alexandre Hummel, um professor ideal para o filho, pensavam os pais. Hummel era pobre, solteiro, sóbrio, vivia em hotéis quando podia, altivo de caráter. Vivia baixando em fazendas, lecionando quase que só a troca de cama e mesa. Ensinava tudo o que lhe pediam e dominava muito bem o português. Com a morte de Ruy Barbosa, o jornal "O Tietê" encomendou-lhe uma reportagem. O sábio Dinamarquês, sentou-se a mesa da redação e redigiu um bonito artigo sobre Ruy Barbosa, sem consultar livros ou biografias. Hummel era dono de uma memória prodigiosa, dominador de vários idiomas, tinha um bom senso de humor, porém não era humorista, no sentido popular. Isto não lhe deixava entender ou tolerar um menino gordo, muito feio, cheio de vontades. Talvez no seu íntimo, vendo a desatenção do caipirinha, às vezes o tachasse de burro. Mas não foi o que disse um dia irritado. – "CORRRNELIO PIRRES", você e muito "INTELICHENTE, mas e muito "IGNORRANTE"!.

Já crescido, por volta de 1907, conhecido como Tibúrcio, este apelido, ele ganhou na passagem de um circo pela cidade, que possuía um orangotango chamado de Tibúrcio, seus amigos achando alguma semelhança, passaram então a chamá-lo de Tibúrcio. Cornélio foi trabalhar, a convite de um tal Dr.Vieira, na redação do jornal "O Movimento", semanário político que circulava na cidade de São Manoel, em S.P. Certa noite, alguém lançou um concurso de feiúra e divulgou pela cidade. Poucas semanas depois, o redator do jornal de Dr. Vieira, anunciou que, Cornélio Pires, ele mesmo, ganhara o concurso – por unanimidade! - O tieteense sempre brincalhão, achou graça e cooperou no certame para sua melhor performance. No dia da entrega do premio, lá estava o vencedor pronto para receber seu premio: "Uma corda para se enforcar"!

Esta outra ocorreu pelo ano de 1933, já beirando os 49 anos, com a afamada superstição do numero 13. Um grande amigo das noitadas de Cornélio o encontrou sentado em um banco na Praça do Patriarca muito pensativo. Começaram a conversar e em pouco tempo estava formada a tradicional roda em volta dos dois. Alguém fez referências ao acaso de certas pessoas serem perseguidas pelo numero 13. Cornélio com aquele jeitão, achando sempre um "a propósito" para todos os casos, chamou a atenção da roda. – Pois saibam vocês que tenho grande predileção pelo número 13, e sou por ele fartamente retribuído. E Cornélio começou sua descritiva:

Cornélio Pires – 13 letras. Vi a luz em Julho – 13 letras. Nasci no dia treze – 13 letras. Século passado – 13 letras. Eu sou paulista – 13 letras. Sou brasileiro – 13 letras. Nasci no Brasil – 13 letras. Sul de São Paulo – 13 letras. Cidade de Tietê – 13 letras. D.Anna Joaquina (minha mãe) – 13 letras. Raimundo Pires (meu pai) – 13 letras. Poeta e caipira – 13 letras. Poeta e "conteur" 13 letras. Conferencista – 13 letras. Escrevo livros – 13 letras. Sou muito pobre – 13 letras. Sou muito feliz – 13 letras. Eu sou solteiro – 13 letras. Amei treze "emes" (o M e a 13 letra do alfabeto) – 13 letras. E o escritor regionalista concluiu: Não cito os nomes das minhas 13 namoradas, porque, vocês compreendem... E com esta, até logo. – Para aonde vais? - Vou tomar Bonde! – E note uma coisa, que sua pergunta e minha resposta, ambas tem 13 letras!

Até doente Cornélio ainda mostrava sua veia de humorista. Esta aconteceu no hospital que Cornélio estava internado, em São Paulo. Ele recebia visitas de parentes, em seu quarto, quando entrou uma enfermeira com sua medicação diária. Era composta de comprimidos e de uma injeção. Tomou os comprimidos enquanto a enfermeira preparava a seringa. Virou-se ela e perguntou. – Sr. Cornélio, aonde quer que aplique esta injeção? Cornélio olhou para os braços já todos picados, olhou para cima, para os lados e sem cerimônia disse: - Pode aplicar ali na parede mesmo!

Algum tempo depois, em 17 de Fevereiro de 1958, as 2:30 h , falecia Cornélio Pires no Hospital das Clínicas de São Paulo, vítima de câncer na laringe. Seus restos mortais foram trasladados no mesmo dia para sua cidade natal e sepultados no cemitério local. Faleceu solteiro convicto e em plena lucidez, tinha 74 anos incompletos. Foi enterrado de pijamas e descalço, conforme sua vontade.

Fontes:
http://www.widesoft.com.br/users/pcastro4/biogrcp.htm
http://www.espiritismogi.com.br/biografias/cornelio.htm
http://pt.wikipedia.org/

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