Era um alfaiate muito poltrão, que estava a trabalhar à porta da rua. Como ele tinha medo de tudo, o seu maior gosto era fingir de valente. Vai de uma vez, viu muitas moscas juntas e de uma pancada matou sete. Daqui em diante, não fazia senão gabar-se:
- Eu cá mato sete de uma vez!
Ora, o rei andava muito triste, porque lhe tinha morrido na guerra o seu general D. Caio, que era o maior valente que havia. Como sabiam que o país não tinha quem mandasse combatê-las, as tropas inimigas puseram-se a caminho. Os que ouviam o alfaiate andar a dizer por toda a parte «Eu cá mato sete de uma vez!» foram logo contá-lo ao rei. Este lembrou-se de que quem era assim tão valente seria capaz de ocupar o posto de D. Caio. Assim, o gabola foi levado à presença do rei, que lhe perguntou:
- E verdade que matas sete de uma vez?
- Saberá Vossa Majestade que sim.
– Então que vás comandar as minhas tropas e atacar o inimigo, que já nos está a cercar.
Mandou vir o fardamento de D. Caio e fez-lo vestir ao alfaiate, que era muito baixinho, e ficou com o chapéu de dois bicos enterrado até às orelhas. Depois disse que trouxessem o cavalo branco de D. Caio para o alfaiate montar. Ajudaram-no a subir para o cavalo, e ele já estava a tremer como varas verdes. E, assim que o cavalo sentiu as esporas, botou à desfilada. Aflito, o alfaiate desatou a gritar:
- Eu caio! Eu caio!
Todos os que o ouviam por onde ele passava diziam:
- Ele agora diz que é o D. Caio! Já temos homem!
O cavalo, que andava acostumado às batalhas, correu para o sítio em que estavam os soldados já a lutar, e o alfaiate sempre com medo de cair, a gritar como um desesperado:
- Eu caio! Eu caio!
O inimigo, assim que viu vir o cavalo branco do general valente e temido e ouviu o grito «Eu caio! Eu caio!», conheceu o perigo em que estava. Logo disseram os soldados uns para os outros:
- Estamos perdidos, que lá vem D. Caio! Lá vem D. Caio!
E deitaram a fugir em debandada. Os soldados do rei foram-lhe no encalço e mataram eles.
O alfaiate ganhou a batalha assim só a agarrar-se ao pescoço do cavalo e a gritar «Eu caio!».
O rei ficou muito contente com ele e em paga da vitória deu-lhe a princesa em casamento, e a verdade é que ninguém regateava os maiores louvores à bravura do sucessor do general D. Caio...
Fonte:
Viale Moutinho (org.) . Contos Populares Portugueses. 2.ed. Portugal: Publicações Europa-América.
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