sábado, 2 de novembro de 2024

Vereda da Poesia = 147 =


Soneto de
LUIZ POETA
Rio de Janeiro/RJ

Lírico artefato

Não sigo a frota, quando a rota é sem destino.
Que poliglota fala a linguagem do mar?
... sei velejar com a inocência de um menino:
Faço um barquinho... e deixo o vento me levar.

A ingenuidade foi meu ponto de partida
Busquei amar sem questionar a alma alheia,
Fui enganado... ou me enganei, pois minha vida,
É mais que o canto sedutor de uma sereia.

Há, na candura, essa espécie de contato
Que sempre foge da frieza de um retrato
E mostra um rosto que sorri à revelia

Da poesia que se torna um artefato,
No exato instante em que o dragão foge o rato
E a explosão do amor detona a fantasia.
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Trova de
FLÁVIO ROBERTO STEFANI
Porto Alegre/RS

Reunião, hoje em dia,
neste mundo a balançar,
é, senhores, quem diria,
ao redor de um...celular!...
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Soneto de
JOÃO BATISTA XAVIER OLIVEIRA
Bauru/SP

Isolado encanto

Salão repleto, nobre de artes belas,
murmúrios, gestos, ares estilistas.
O afago forte nos pincéis de artistas
moldura abraços, traços, luz nas telas.

A flor disposta à porta em todas vistas
exala as auras plácidas, singelas.
Porém as vistas todas são aquelas
voltadas às paredes tão benquistas.

Se os quadros levam ao encantamento
no brilho mais audaz de um só momento...
o vaso à entrada ampara, preterida,

a forma que transforma a transparência:
- a tela estampa a vida, é consequência;
a flor no entanto é causa, pois tem vida!
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Trova Premiada no Japão
RELVA DO EGYPTO REZENDE SILVEIRA
Belo Horizonte/MG

Nós fios de luz – as pautas –
são as notas musicais
aves migrantes, incautas,
arpejando madrigais.
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Poema de
MARIA LÚCIA SIQUEIRA
Curitiba/PR

A janela

Vem de outras eras as fontes do espírito.
Os jasmins renascem nos canteiros,
a chuva já deu badaladas no telhado.
E quem sou? Me pergunto na noite morna.
Talvez uma ave noturna lenta demais
para atravessar as planícies.
Toda imensidão termina no ocaso.
E para além do sol... onde estão os meus olhos amados?
Sempre atravesso essas sombras ao anoitecer,
diante do quartel de estrelas que me policia.
E a janela é um avental que me convida
a continuar servindo.
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Fábula em Versos
adaptada dos Contos e Lendas da África
JOSÉ FELDMAN
Campo Mourão/PR

A Lenda do Macaco e do Crocodilo

No rio profundo, um crocodilo esperava,
um macaco travesso, sua fruta roubava.
“Venha, amigo, venha aqui me contar,
sobre a vida no fundo, onde o sol não vai brilhar.”
O macaco, astuto, viu a armadilha,
mas decidiu brincar, com uma brilhante artimanha.

“Vou te levar, se me prometer,
que nunca mais vais tentar me comer!”
O crocodilo riu, achando que era um jogo,
mas o macaco pulou, e escapou como um fogo.
Aprendeu uma lição, sobre a esperteza,
e nunca mais quis saber de certeza.

A esperteza pode salvar, dos perigos que rondem,
mesmo os mais fortes devem saber que se escondem.
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Trova Popular

Ó morte, ó tirana morte,
contra ti tenho mil queixas
quem hás de levar, não levas,
quem deves deixar, não deixas!
= = = = = = 

Soneto de
JERSON BRITO
Porto Velho/RO

Instinto

Escondes nesse corpo, fino manto
As cores da mais pura donzelice
Permitas que navegue em tal encanto
Fascina-me a candura, essa meiguice

Do teu fatal sabor estou faminto
Desejo fenecer no doce enlace
Não posso resistir ao meu instinto
O brilho do querer tomou a face

Armaste uma delícia... Oh, nobre teia!
É natural, princesa, que me atraia
O meu pensar em ti, ledo, passeia

Tu és o mar revolto, eu sou a praia
Um beijo teu em mim, decerto enleia
De laço assim não há, amor, quem saia
= = = = = = 

Trova de
AUTA DE SOUZA
Macaíba/RN (1876 – 1901) Natal/RN

Paixão é diamante bruto,
que burilado, a rigor,
surge mudado no tempo
em linda estrela de amor. 
= = = = = = 

Poema de
CECY BARBOSA CAMPOS
Juiz de Fora/MG

Invasão 

A primavera chegou de madrugada 
e entrou pela janela do meu quarto 
vestida de prateado. 
Enluarando a minha cama 
cobriu o meu corpo insone 
e anestesiou os meus sentidos. 
= = = = = = 

Trova de
VICENTE LILES DE ARAÚJO PEREIRA
São Simão/SP

O sol pela rocha aberta
parece aviso divino,
indicando a rota certa
ao barqueiro sem destino.
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Soneto de 
ALFREDO SANTOS MENDES
Lisboa/Portugal

O embrião

Mãe! Por que não me deixas ver teu mundo?
Por que acabas assim com minha vida?
Por que será que estás tão decidida,
a praticar tal ato tão imundo!

Mãe! Eu não sou um ser nauseabundo!
Não sou uma doença contraída!
Faço parte de ti, fui concebida!
Sou vida no teu útero fecundo!

Não queiras destruir-me por favor!
Não transformes em ódio, aquele amor,
do momento da minha concepção!

Eu sei que não pensavas conceber…
Mas, por favor mãe, deixa-me nascer,
eu sou um ser humano em formação!
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Trova do
Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ, 1916 – 1977, Santos/SP

Como Colombo, singrando
esta vida - incerto mar,
vivo no mundo esperando
um Novo Mundo encontrar...
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Soneto de
FLORBELA ESPANCA 
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

Horas rubras

Horas profundas, lentas e caladas
feitas de beijos sensuais e ardentes,
de noites de volúpia, noites quentes
onde há risos de virgens desmaiadas.

Ouço as olaias rindo desgrenhadas...
tombas astros em fogo, astros dementes
e do luar, os beijos languescentes
são pedaços de prata pelas estradas...

Os meus lábios são brancos como lagos...
os meus braços são leves como afagos,
vestiu-os o luar de sedas puras...

Sou chama e neve branca misteriosa...
e sou talvez na noite voluptuosa
ó meu poeta, o beijo que procuras.
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Sou triste como a caveira
no cemitério rolando,
que vai com o correr do tempo
em negro pó se tornando.
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Spina de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

Olhares que Sorriem 

Ainda que cubram
os belos sorrisos, 
sejamos em brilho 

as janelas do novo estribilho.
Ainda que tirem nossas asas
sejamos o som do andarilho. 
Mesmo que os dias anuviem,
brindemos à paz nesse trilho.
= = = = = = 

Trova de 
SINCLAIR POZZA CASEMIRO
Campo Mourão/PR

O instante existe e convém
a quem procura harmonia,
ter consciência e, por bem,
renovar-se a cada dia!
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Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Catorze versos

Ah, se compor sonetos não tivesse
tão complicadas regras a seguir,
não sairia agora dessa messe,
deixando outras missões para o porvir!

Porém, comigo, às vezes acontece
de me insurgir demais contra o exigir...
Não vou correr atrás de uma benesse,
dar meu suor sem nada conseguir...

Já que não posso, assim, bem sonetear,
eu me distraio com catorze versos,
mas sem, sequer, seu nome mencionar.

Meu coração não mais fica tristonho,
nem aborreço ilustres controversos;
e posso acalentar, enfim, meu sonho!
= = = = = = 

Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Como se diz lá na roça, 
o amor é um bichim-de-pé: 
quanto mais a gente coça, 
mais boa a coceira é...
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/SP

Meu verso

Meu verso vem do Nordeste,
vem do roçado, vem do Sertão,
vem das veredas lá do agreste,
vem das cacimbas e dos grotões.

Meu verso vem dos garimpos,
das catras dos garimpeiros,
da coragem dos vaqueiros
vestidos no seu gibão,
vem do sereno da noite
do perfume do Sertão.

Meu verso simples, sem medo,
vem do sítio, do rochedo,
vem do povo do Sertão,
que com a luz do arrebol
trabalha de sol a sol
para ganhar o seu pão.

Vem da Serra do Carranca
onde a beleza não manca,
e a onça faz sentinela.
Da Serra da Mangabeira
onde a Lua vem brejeira
tecer a renda mais bela.

Meu verso vem da goiaba,
do puçá e da mangaba,
da seriguela e do mamão.
Da pinha e da acerola,
da atemóia e graviola
plantadas no roçadão.

Nasceu na bela Umbaúba,
Boa Vista, Bela Sombra,
na Lagoa de Prudente,
na Chiquita e no Vanique,
onde há muito xique-xique
e o sol parece mais quente.

Brejões, Lagoa do Barro,
Santo Antonio, Traçadal,
Olho D´Água, Rio Verde,
Baixa dos Marques, Coxim,
Ibipetum, depois Pintada,
onde passa a velha estrada,
Zequinha e Lamarca morreram.

Sodrelândia, Deus me Livre,
Pé de Serra, Poço da Areia,
Riacho das Telhas também.
Poço do Cavalo, Matinha,
Mata do Evaristo e Veríssimo,
Olhodaguinha e Ipupiara.

Meu verso nasceu no mato,
não tem brilho, nem ornato,
vem do Morro do Mocó,
da Serra do Sincorá,
vem do morro do Araçá,
nasceu pobre e vive só…
= = = = = = 

Poetrix de
ELIANA MORA
Rio de Janeiro/RJ

sentimento clandestino

Tu, em viagens ao mundo,
Eu, ali, sempre escondida,
nos porões do teu navio.
= = = = = = 

Soneto de
JOSÉ XAVIER BORGES JUNIOR
São Paulo/SP

Esquecimento
 
Tu te esqueceste que esqueci de te esquecer
Mas me lembrei de relembrar tua partida
E o esquecimento na lembrança tem poder
De relembrar que possuíste minha vida.
 
E por lembrar-te não consigo compreender
Por que não posso me esquecer desta ferida
Que o esquecimento da lembrança vem trazer
Me relembrando que jazias esquecida.
 
E vou lembrando e te esquecendo enquanto sigo
Revigorando o esquecimento da lembrança
Enquanto lembro como era estar contigo.
 
Até que um dia eu me lembrei de ter-te aqui
E fui eu mesmo me esquecendo nesta dança
E me lembrando de esquecer que te esqueci…
= = = = = = 

Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/ SP

Pra cantá, estudamo um meis
e num é que nóis se gabe:
nóis quebra um galho em ingleis
e portugueis... nóis já sabe!
= = = = = = 

Poema de 
ANTONIO BATICÃ FERREIRA
Canchungo/Guiné-Bissau

Infância

Eu corria através dos bosques e das florestas
Eu ouvia o ruído vibrante de um bosque desvendado,
Eu via belos pássaros voando pelos campos
E parecia ser levado por seus cantos.

Subitamente, desviei os meus olhos
Para o alto mar e para os grandes celeiros
Cheios da colheita dos bravos camponeses
Que, terminando o dia, regressavam à noite entoando

Canções tradicionais das selvas africanas
Que lhes lembravam os ódios ardentes
Dos velhos. Subitamente, uma corça gritou
Fugindo na frente dos leões esfomeados.

Aos saltos, os leões perseguiram a corça
Derrubando as lianas e afugentando os pássaros.
A desgraçada atingiu a planície
E os dois reis breve a alcançaram
= = = = = = 

Trova Humorística de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

O nosso amor vem de quando
Deus criou o amanhecer...
E ainda estarei te amando,
quando Deus envelhecer...
= = = = = = 

Hino de 
Cruzeiro do Sul/AC

No regaço da Selva assombrosa
onde outrora espumava o Tapi
Uma Bela Cidade Ruidosa
Vimos hoje fagueira surgir.

Para o seio da Mata orvalhada
as aragens correndo lá vão
E no cimo da Selva ondulada
Thaumaturgo Azevedo dirão.

Pasma o índio bravio confundido
Empolgando uma flecha nos ares
Ao ouvir que é tão repetido
Vosso nome nos nossos palmares.

O lampejo do sol do progresso
D’ouro ufano este alcantil
Contemplado será no universo
Novo estado no chão do Brasil.

E do trono dos seus esplendores
Sobre nuvens bordados de azul
Deus semeia cascata de flores
E abençoa o Cruzeiro do Sul.
= = = = = = 

Trova de
DOMITILLA BORGES BELTRAME
São Paulo/SP

A mamãe cura o dodói,
afaga, põe atadura…
e o rosto do seu herói
se lambuza de ternura!
= = = = = = 

Soneto de 
FRANCISCA JÚLIA
(Francisca Júlia da Silva Munster)
Eldorado/SP (antiga Xiririca) 1874 –  1920, São Paulo/SP

Musa impassível

Musa! um gesto sequer de dor ou de sincero
Luto jamais te afeie o cândido semblante!
Diante de um Jó conserva o mesmo orgulho e diante
De um morto o mesmo olhar e sobrecenho austero.

Em teus olhos não quero a lágrima; não quero
Em tua boca o suave e idílico descante.
Celebra ora um fantasma anguiforme de Dante,
Ora o vulto marcial de um guerreiro de Homero.

Dá-me o hemistíquio d'ouro, a imagem atrativa;
A rima cujo som, de uma harmonia crebra*,
Cante aos ouvidos d'alma; a estrofe limpa e viva;

Versos que lembrem, com seus bárbaros ruídos,
Ora o áspero rumor de um calhau que se quebra,
Ora o surdo rumor de mármores partidos!
= = = = = = 
* crebra = frequente
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Num jogo da fantasia
entre a loucura e a razão,
vislumbro na cama fria
teu corpo que busco, em vão.
= = = = = = 

Recordando Velhas Canções
Meu mundo caiu 
(samba-canção, 1958) 

Meu mundo caiu
E me fez ficar assim
Você conseguiu e agora
Diz que tem pena de mim
Não sei se me explico bem
Eu nada pedi
Nem a você, nem a ninguém
Não fui eu que caí

Não sei se você me entendeu
Sei também que não vai se importar
Se meu mundo caiu
Eu que aprenda a levantar
= = = = = = = = = = = = = 

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Levo a prosa e a poesia,
através de um boletim,
e também toda a magia
que elas trazem para mim.