MARIA LUÍZA WALENDOWSKY
Brusque/SC
A Sombra
A certeza do caminho
na minha frente
motivava sonhos
ainda indeterminados,
mas não menos desejados.
A Beleza de tudo a minha volta
inspirava coragem
de explorar a aventura espontânea,
mas os mesmos olhos
que atentavam
para todo aquele deslumbre,
também revelavam algo além.
As águas do belo rio,
ao lado da estrada,
corriam em direção contrária,
e o vento soprava,
me empurrando de volta.
Uma nuvem,
cruzando minha luz,
uma sombra
desenhou-me na estrada.
Passei por cima,
segui em frente.
Eu sabia onde ir,
sabia onde chegar,
mas tudo parecia contra,
de acordo com meu olhar.
Por um instante hesitei,
por um instante refleti.
Seria aquele o sentido certo?
Parei, avistei a sombra,
agora deixada para trás.
Lembrei-me
que por cima dela passei,
então, assim seguirei.
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Poema de
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/PR
Permuta de amor
"Tua voz é doce, e delicado o teu rosto”
(Ct. 2.14)
Permutarei contigo um bem precioso,
Façamos, em cartório, um bom negócio;
Que o digam a razão e o sentimento,
Porque serei de ti bem mais que sócio.
Que o poderoso cérebro, qual juiz,
Testemunhe também o nosso engenho;
Se me deres pra sempre o teu amor,
Dar-te-ei eternamente o amor que tenho.
Para não acontecer alguma dúvida,
Com tintas arteriais fiquem gravados
Os termos do contrato, ultra* "sui generis"**,
Em duas almas gêmeas registrados;
"Com ternura exclusiva visceral,
Quero que o teu amor sempre me ame;
E o véu da tua sombra bem me cubra,
Com puro pensamento, por mim, clame.
Irei viver - viver por teu amor,
Vencerei este mundo em torvelinho;
Serei gigante à frente das procelas,
Farei do leão um mero cordeirinho.
Quão milagrosa a força deste amor,
Que vai lançar o mal na sepultura;
Fará do vingador mundo perverso
Parnaso*** colorido de aventura.
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* Ultra: Além.
** Sui generis: Locução adjetiva latina: Aquilo que não apresenta analogia com nenhuma outra (pessoa ou coisa). Inédito.
*** Parnaso: Fig. - Lugar de delícias.
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Soneto de
LUIZ POETA
Rio de Janeiro/RJ
Lírico artefato
Não sigo a frota, quando a rota é sem destino.
Que poliglota fala a linguagem do mar?
... sei velejar com a inocência de um menino:
Faço um barquinho... e deixo o vento me levar.
A ingenuidade foi meu ponto de partida
Busquei amar sem questionar a alma alheia,
Fui enganado... ou me enganei, pois minha vida,
É mais que o canto sedutor de uma sereia.
Há, na candura, essa espécie de contato
Que sempre foge da frieza de um retrato
E mostra um rosto que sorri à revelia
Da poesia que se torna um artefato,
No exato instante em que o dragão foge o rato
E a explosão do amor detona a fantasia.
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Soneto de
JOÃO BATISTA XAVIER OLIVEIRA
Presidente Alves/SP, 1947 – 2025, Bauru/SP
Isolado encanto
Salão repleto, nobre de artes belas,
murmúrios, gestos, ares estilistas.
O afago forte nos pincéis de artistas
moldura abraços, traços, luz nas telas.
A flor disposta à porta em todas vistas
exala as auras plácidas, singelas.
Porém as vistas todas são aquelas
voltadas às paredes tão benquistas.
Se os quadros levam ao encantamento
no brilho mais audaz de um só momento...
o vaso à entrada ampara, preterida,
a forma que transforma a transparência:
- a tela estampa a vida, é consequência;
a flor no entanto é causa, pois tem vida!
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Poema de
MARIA LÚCIA SIQUEIRA
Curitiba/PR
A janela
Vem de outras eras as fontes do espírito.
Os jasmins renascem nos canteiros,
a chuva já deu badaladas no telhado.
E quem sou? Me pergunto na noite morna.
Talvez uma ave noturna lenta demais
para atravessar as planícies.
Toda imensidão termina no ocaso.
E para além do sol... onde estão os meus olhos amados?
Sempre atravesso essas sombras ao anoitecer,
diante do quartel de estrelas que me policia.
E a janela é um avental que me convida
a continuar servindo.
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Fábula em Versos
adaptada dos Contos e Lendas da África
JOSÉ FELDMAN
Floresta/PR
A Lenda do Macaco e do Crocodilo
No rio profundo, um crocodilo esperava,
um macaco travesso, sua fruta roubava.
“Venha, amigo, venha aqui me contar,
sobre a vida no fundo, onde o sol não vai brilhar.”
O macaco, astuto, viu a artimanha,
mas decidiu brincar, com uma brilhante patranha.
“Vou te levar, se me prometer,
que nunca mais vais tentar me comer!”
O crocodilo riu, achando que era um jogo,
mas o macaco pulou, e escapou como um fogo.
Aprendeu uma lição, sobre a esperteza,
e nunca mais quis saber de certeza.
A esperteza pode salvar, dos perigos que rondem,
mesmo os mais fortes devem saber que se escondem.
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Quadra Popular
Ó morte, ó tirana morte,
contra ti tenho mil queixas
quem hás de levar, não levas,
quem deves deixar, não deixas!
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Soneto de
JERSON BRITO
Porto Velho/RO
Instinto
Escondes nesse corpo, fino manto
As cores da mais pura donzelice
Permitas que navegue em tal encanto
Fascina-me a candura, essa meiguice
Do teu fatal sabor estou faminto
Desejo fenecer no doce enlace
Não posso resistir ao meu instinto
O brilho do querer tomou a face
Armaste uma delícia... Oh, nobre teia!
É natural, princesa, que me atraia
O meu pensar em ti, ledo, passeia
Tu és o mar revolto, eu sou a praia
Um beijo teu em mim, decerto enleia
De laço assim não há, amor, quem saia
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Poema de
CECY BARBOSA CAMPOS
Juiz de Fora/MG
Invasão
A primavera chegou de madrugada
e entrou pela janela do meu quarto
vestida de prateado.
Enluarando a minha cama
cobriu o meu corpo insone
e anestesiou os meus sentidos.
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Soneto de
ALFREDO SANTOS MENDES
Lisboa/Portugal
O embrião
Mãe! Por que não me deixas ver teu mundo?
Por que acabas assim com minha vida?
Por que será que estás tão decidida,
a praticar tal ato tão imundo!
Mãe! Eu não sou um ser nauseabundo!
Não sou uma doença contraída!
Faço parte de ti, fui concebida!
Sou vida no teu útero fecundo!
Não queiras destruir-me por favor!
Não transformes em ódio, aquele amor,
do momento da minha concepção!
Eu sei que não pensavas conceber…
Mas, por favor mãe, deixa-me nascer,
eu sou um ser humano em formação!
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Soneto de
FLORBELA ESPANCA
Vila Viçosa/Portugal, 1894 – 1930, Matosinhos/Portugal
Horas rubras
Horas profundas, lentas e caladas
feitas de beijos sensuais e ardentes,
de noites de volúpia, noites quentes
onde há risos de virgens desmaiadas.
Ouço as olaias rindo desgrenhadas...
tombas astros em fogo, astros dementes
e do luar, os beijos languescentes
são pedaços de prata pelas estradas...
Os meus lábios são brancos como lagos...
os meus braços são leves como afagos,
vestiu-os o luar de sedas puras...
Sou chama e neve branca misteriosa...
e sou talvez na noite voluptuosa
ó meu poeta, o beijo que procuras.
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Hino de
ÓBIDOS/ PA
Sentinela que guarda riqueza
deste vale imenso sem par;
podes bem ser chamada princesa,
das belezas do grande Rio-Mar.
Os teus filhos são bem brasileiros,
são valentes e sabem lutar.
E trabalham ao sol altaneiros,
sempre avante, não sabem parar!
Óbidos, és minha terra,
Óbidos, és meu torrão,
Óbidos, estás inteira,
dentro do meu coração.
Já tens glória passada que a história,
podes bem com justiça assentar;
não são gestos falazes que a vitória,
que soubeste tão bem conquistar.
És a filha do Rio Amazonas
e conheces o seu murmurar:
onde estás é a única zona,
por onde ele tem que passar !
Óbidos, és minha terra,
Óbidos, és meu torrão,
Óbidos, estás inteira,
dentro do meu coração.
Tuas noites são bem estreladas,
e o teu céu é mais puro azul.
E são claras as tuas madrugadas,
quando sopra o vento taful.
És rincão da terra brasileira,
na Amazônia és forte e viril,
vives sob a mesma bandeira,
que tremula em todo o Brasil!
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Spina de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP
Olhares que Sorriem
Ainda que cubram
os belos sorrisos,
sejamos em brilho
as janelas do novo estribilho.
Ainda que tirem nossas asas
sejamos o som do andarilho.
Mesmo que os dias anuviem,
brindemos à paz nesse trilho.
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Poema de
ANTONIO BATICÃ FERREIRA
Canchungo/Guiné-Bissau
Infância
Eu corria através dos bosques e das florestas
Eu ouvia o ruído vibrante de um bosque desvendado,
Eu via belos pássaros voando pelos campos
E parecia ser levado por seus cantos.
Subitamente, desviei os meus olhos
Para o alto mar e para os grandes celeiros
Cheios da colheita dos bravos camponeses
Que, terminando o dia, regressavam à noite entoando
Canções tradicionais das selvas africanas
Que lhes lembravam os ódios ardentes
Dos velhos. Subitamente, uma corça gritou
Fugindo na frente dos leões esfomeados.
Aos saltos, os leões perseguiram a corça
Derrubando as lianas e afugentando os pássaros.
A desgraçada atingiu a planície
E os dois reis breve a alcançaram
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Recordando Velhas Canções
MEU MUNDO CAIU
(samba-canção, 1958)
Meu mundo caiu
E me fez ficar assim
Você conseguiu e agora
Diz que tem pena de mim
Não sei se me explico bem
Eu nada pedi
Nem a você, nem a ninguém
Não fui eu que caí
Não sei se você me entendeu
Sei também que não vai se importar
Se meu mundo caiu
Eu que aprenda a levantar
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