segunda-feira, 13 de outubro de 2025

Contos e Lendas de Portugal (Lenda do Bálsamo na Mão)


 Na freguesia de Chapim, concelho de Macedo de Cavaleiros, existiu outrora um rei mouro que exercia o seu domínio sobre aquela região. Este rei tinha muito mau feitio e aproveitava todas as oportunidades para humilhar os seus súditos.

Um dia, decidiu instituir um novo tributo, diferente de todos aqueles que tinha mandado executar antes: todos os homens que se casassem eram obrigados a entregar-lhe a noiva logo após a cerimônia do casamento. Este tributo tornou-se um hábito que gerou ódios e vergonha. Mas quem se atrevesse a contestar as ordens do rei seria severamente castigado.

Um dia o cristão Joaquim resolveu casar-se com Marianinha, a moça mais bela de toda a região. Marianinha nem queria pensar em pagar o infame tributo, mas Joaquim disse-lhe que não se preocupasse porque tinha um plano e, com a ajuda de Nossa Senhora, Marianinha não cairia nas mãos do cruel rei mouro.

Casaram-se numa pequena igreja e, logo à saída, estavam os soldados à espera de Marianinha. Joaquim convenceu-os a juntarem-se a ele e a alguns amigos com o propósito de levarem ofertas ao senhor mouro daquelas terras.

O rei mouro já tinha ouvido falar da beleza de Marianinha e mal podia esperar para tê-la nos seus braços. Porém, quando lhe retirou o véu, verificou que não era ela mas Joaquim que apertava nos braços.

Desembaraçando-se das suas roupas de mulher, Joaquim retirou um punhal que tinha escondido e cravou-o no peito do rei mouro antes de fugir. Agonizante, o rei pediu as cabeças de Joaquim e de Marianinha para as pisar antes de morrer.

Os guerreiros mouros lançaram-se na caça ao homem. Joaquim e os seus amigos ainda lhes fizeram resistência mas a desproporção era grande e foram quase todos dizimados.

Marianinha prometia fervorosamente um novo templo à Virgem enquanto Joaquim caía no chão ferido de morte. Então, por milagre, Joaquim reparou que nas suas mãos nascia um bálsamo que curava as feridas e começou a gritar aos seus companheiros moribundos que esfregassem as mãos com aquela substância.

Os guerreiros mouros, aterrorizados, viram os mortos e os moribundos a erguerem-se do chão, a pegarem nas armas e entregarem-se à luta com uma paixão desmedida. Apesar da desvantagem numérica, os cristãos conseguiram fazer com que os mouros partissem em debandada.

Desde então, aquela terra conquistada aos mouros ficou a ser conhecida como Terra de Nossa Senhora de Bálsamo na Mão e, mais tarde, Lugar de Balsemão onde ainda hoje existe uma ermida em honra de Nossa Senhora de Balsemão, no alto do Monte Carrascal.

Fontes:
Porto Editora. in Infopédia
https://www.infopedia.pt/recursos/lendas-portuguesas/$lenda-do-balsamo-na-mao
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Cecy Barbosa Campos (Lançamento de Livro) Dia 21 de outubro em Juiz de Fora/MG

Dia 21/10/25- 3ª feira, às 19 hs. 
Na Biblioteca Municipal.
Av. Getúlio Vargas, 200 (Acesso pela Praça Antônio Carlos)


Cecy Barbosa Campos nasceu em Juiz de Fora-MG. Possui graduação em Direito e Letras (UFJF), especializaçâo em Teoria Literária, Mestrado em Teoria Literária (UFJF) e diversos cursos de Aperfeiçoamento em inglês em diferentes Centros de Língua, nos Estados Unidos e na Inglaterra, formaram o perfil acadêmico desta brilhante professora-pesquisadora de Língua e Literaturas de Língua Inglesa na UFJF, onde se aposentou em 1991, e no Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. A esses estudos, acrescente-se a pesquisa que desenvolve sobre escritores afro-descendentes. Sua participação em diversas associações culturais, comissões julgadoras, Congressos nacionais e internacionais e encontros literários. Tem artigos de pesquisa literária pulicados em revistas especializadas e anais de congressos e trabalhos em prosa verso premiados em concursos de várias academias tais como: Academia Pontagrossense de Letras, a Academia Dorense de Letras, a Academia de Letras do Estado do Rio de Janeiro, o Ateneu Angrense de Letras e Artes e outras.
Membro da Academia Juiz-forana de Letras; Academia Panamericana de Letras; Academia Granberyense de Letras, Artes e Ciências; Academia de Letras Rio-Cidade Maravilhosa; Academia Rio Pombense de Letras, Ciências e Artes; Clube de Escritores de Piracicaba; Conselho de Amigos do Museu Mariano Procópio; União Brasileira de Escritores/RJ; Associação de Jornalistas e Escritores do Brasil/RJ; Confraria Brasileira de Letras/PR; International Writers and Artists Association (Estaos Unidos).
Publicou The iceman cometh: a carnavalização na tragédia (2000); O reverso do mito e outros ensaios (2002); Recortes de vida (2009); Crepusculares (2013); Animais encantados na poesia (2014); Caleidoscópio (2014); In…versos (2015); Visões do cotidiano (2016); Redoma de Aldravias (2017); Versos perplexos (2019);
Capítulo na A poética de Conceição Evaristo, que compõe o livro, organizado por Edimílson de Almeida Pereira, Um tigre na floresta de signos: estudos sobre poesia e demandas sociais no Brasil (2010).
Alguns trabalhos em Congressos e Encontros literários: Maya Angelou`s and Conceição Evaristo`s Social Poetry. São José do Rio Preto, 2009; O Teatro do Absurdo nos Estados Unidos: uma visão comparativa. Juiz de Fora, 2008; Escritores Afro-descencentes. Belo Horizonte, 2007; Conceição Evaristo e Toni Morrison: convergências e divergências; Toni Morrison`s Beloved: from novel to film. Fortaleza, 2005; O Teatro Inglês. Muriaé, MG, 2004; A presença ausente de personagens femininas em peças de O`Neill. Londrina,PR, 2001; Women Characters in some of Flannery O`Connor`s short-stories: the reversal of the myth. Gadsden, Alabama, USA. 2000, e outros.
Participação na Coleção Prosa e Verso, do Grupo Sul-mineiro de Poesia e Academia Varginhense de Letras; Modernos Contos Brasileiros; Antologia da Academia Dorense de Letras; Antologia Letras Contemporâneas; Prêmio Missões; Antologia del`Secchi; Antologia da Academia Chapecoense de Letras.

Fontes:
Facebook da escritora.
Biografia na Confraria Brasileira de Letras/PR.
https://confrariabrasilletras.blogspot.com/2023/09/cadeira-n-29-membro-titular-cecy.html

Estante de Livros (“Kalki”, de Gore Vidal”)


1. Contexto e informações gerais

Gore Vidal (1925–2012), escritor estadunidense conhecido por romances, ensaios, peças e forte presença pública. Vidal transitou entre sátira social, crítica política e reinterpretações históricas.

Kalki foi publicado em 1978. Surge no fim da década de 1970, num período pós-Vietnã, pós-Watergate, com crise de confiança nas instituições dos EUA e crescimento de discórdias culturais (direita x esquerda, religião e ciência, etc.).

É um romance satírico/fábula apocalíptica. Vidal emprega humor mordaz, sarcasmo e linguagem erudita para tratar de temas filosóficos e sociopolíticos.

2. Enredo (visão geral, sem revelar todos os spoilers)

Kalki é uma narrativa que mistura política, religião e fantasia filosófica em tom satírico. O enredo gira em torno da figura-título — Kalki — uma espécie de messias ou figura apocalíptica inspirada no conceito hindu de Kalki (o décimo e último avatar de Vishnu, que aparece no fim do kali yuga para restaurar a ordem). Vidal reimagina esse arquétipo dentro de uma trama moderna: líderes, conspiradores e intelectuais que manipulam crenças religiosas, mídia em massa e poderio tecnológico para refazer o mundo. O romance combina intriga internacional, ideologias conflitantes e questões existenciais.

3. Estrutura narrativa e técnica

- Narrador/voz: 
Vidal usa o narrador em terceira pessoa com forte presença autoral — ironia e comentários meta-textuais atravessam o relato. A voz narrativa é muitas vezes ensaística, intervindo para julgar um personagem e tecer reflexões.

- Ritmo: 
Alterna momentos de diálogo afiado e exposição filosófica com episódios de ação e intriga. A cadência é deliberada; Vidal privilegia digressões eruditas que iluminam o pano de fundo intelectual dos conflitos.

- Organização: 
Episódica, com várias cenas que distanciam e aproximam leitores das consequências sociais e políticas das ações dos protagonistas. Há também pequenas unidades — conversas, ensaios dentro da narrativa — que funcionam como micro-exposições de ideias.

4. Personagens principais (arquétipos e função narrativa)

- Kalki (figura-título): Não é apenas um indivíduo, mas um símbolo/força. Representa a tensão entre a promessa de salvação e o risco de tirania messiânica quando poder secular e carisma religioso se combinam.

- Líderes políticos/intelectuais: Servem de contraponto — às vezes cínicos, às vezes idealistas — mostrando como a manipulação de símbolos e do medo pode ser usada para fins de poder.

- Figura(s) feminina(s) e secundárias: São instrumentalizadas tanto para expor hipocrisias quanto para humanizar o enredo; Vidal, porém, foi criticado por retratos femininos por vezes estereotipados ou situados em função do homem.

- Coletivo/“massa”: Mantém papel essencial como receptor da propaganda, da religião e da tecnologia, evidenciando a crítica de Vidal à passividade e ao conformismo.

5. Temas centrais

a) Messianismo e carisma político
- Vidal explora como o desejo humano por salvação e sentido se presta a exploração política. Kalki simboliza a ambiguidade do messias: libertador ou tirano? O romance mostra a facilidade com que sociedades fragilizadas aceitam figuras providenciais.

b) Religião vs. racionalidade
- Conflito entre mitos religiosos e explicações científicas/espírito crítico. Vidal não apenas descreve uma oposição; ele mostra uma fusão perversa: a religião instrumentalizada por estruturas de poder e suportada por tecnologia e mídia.

c) Manipulação das massas e comunicação de massa
- O livro examina a mídia como ferramenta de fabricação de consenso e formação de mitos. A era moderna (a partir do rádio, TV e imprensa) amplia o alcance de líderes carismáticos e cria um ambiente propício para doutrinação.

d) Apocalipse moral/político
- A ideia de um “fim” que será tanto renovação quanto destruição percorre o texto. Vidal penetra no significado do apocalipse moderno: não necessariamente um fim literal, mas um colapso de instituições e valores.

e) Poder, violência e utopia
- Crítica das utopias autoritárias que prometem ordem e progresso, mas exigem coerção. Vidal mostra como discursos de salvação podem mascarar o apelo por controle totalizante.

f) Ironia, cinismo e o papel do intelectual
- Vidal coloca o intelectual como observador crítico — às vezes impotente, às vezes cúmplice. Há uma reflexão sobre responsabilidade moral de escritores e pensadores.

6. Estilo e linguagem

- Linguagem: Erudita, afiada, com saltos irônicos. Vidal mistura referências históricas e filosóficas com brincadeiras satíricas.

- Humor: Sátira cáustica; o humor suaviza a gravidade do enredo, mas também marca o julgamento moral do autor.

- Intertextualidade: Referências a mitologia, história e cultura política ocidental. A escolha do nome “Kalki” é uma recuperação deliberada de mitos orientais para criticar fenômenos ocidentais.

- Didatismo: O romance tem explanações ensaísticas que podem parecer pedagógicas, mas que enriquecem o debate temático.

7. Leituras críticas e simbologias

- Kalki como figura ambivalente: se lido literalmente, é um salvador; simbolicamente, é a personificação do enviesamento humano pelo apelo ao sobrenatural. Vidal sugere que qualquer promessa totalizante de redenção tem potencial destrutivo.

- A fusão tecnologia/religião: A modernidade cria novas “milagres” (distribuição massiva de informação, manipulação psicológica em escala), tornando antigas categorias religiosas perigosamente reconfiguradas.

- O papel da performance: Lideranças carismáticas dependem de encenação. Vidal explora o teatro do poder — discursos, rituais, media training — como mecanismo de produção de fé pública.

- Paródia da política real: Embora a ação não trate diretamente de figuras históricas específicas, a sátira remete ao clima político dos anos 1970 (desilusão com elites, medo de totalitarismos, progressões carismáticas).

8. Críticas possíveis / limitações

- Figuras femininas: Crítica frequente em análises de Vidal é a representação das personagens femininas com menos profundidade ou como instrumentos narrativos.

- Tonalidade moralizante: Alguns leitores podem achar o tom demasiado moralista ou didático, com digressões que interrompem a fluidez do romance.

- Acesso cultural: A exploração de um conceito hindu (Kalki) por um autor ocidental levanta questões de apropriação cultural e leitura reduzida de tradições não-ocidentais. A representação pode ser interpretada como instrumentalização do mito oriental para fins retóricos ocidentais.

- Distanciamento emocional: A ironia constante e o sarcasmo podem criar um distanciamento emocional que limita empatia por personagens.

9. Relevância histórica e cultural

Em 1978, Kalki refletia temores pós-modernos sobre liderança messiânica e a fragilidade das democracias ocidentais. O livro ressoa com lutas políticas da época — e antecipa debates contemporâneos sobre populismo, fake news e culto à personalidade.

Hoje, o romance é relevante ao examinar ascendência de lideranças populistas, uso de mídia social para criação de mitos e a conflagração entre ciência, religião e política.

10. Leituras contemporâneas e atualizações interpretativas

- Populismo e redes sociais: A dinâmica mostrada por Vidal se atualiza no contexto das plataformas digitais, onde algoritmos e bolhas informativas amplificam vozes carismáticas e consolidam narrativas apocalípticas.

- Conspiranóias e pós-verdade: A instrumentalização da verdade (ou sua negação) nas mãos de líderes carismáticos é uma continuação temática clara e perturbadora.

- Ambientalismo e apocalipse: Hoje, o “fim do mundo” é frequentemente discutido em termos ecológicos. Kalki pode ser relido como reflexão sobre como, frente a emergências reais, as respostas políticas podem ser autoritárias sob pretexto de salvação.

11. Interpretação final

Kalki de Gore Vidal é uma fábula satírica e filosófica que usa a figura messiânica para criticar a combinação perigosa de carisma, tecnologia e poder institucional. A narrativa funciona como advertência: a busca por salvação coletiva, quando alimentada por medo e fedida de promessas simplistas, abre caminho a regimes autoritários e a erosão das liberdades. Vidal, com sua ironia e erudição, provoca reflexão sobre responsabilidade intelectual, a fragilidade das instituições modernas e o papel da mídia na construção de mitos políticos.

domingo, 12 de outubro de 2025

Chafariz de Trovas * 27 *

 

Newton Sampaio (Estio)

Frederico carrega ao alpendre a velha cadeira de balanço. Recosta-se, indolente.

— Mormaço, hein? Pergunta a mãe.

— É mesmo. Só que eu não estranho muito. O calor de lá me imunizou.

Dona Adelaide franze a testa.

— Já vem você com as coisas do Rio.

(Põe na voz uma intenção misteriosa).

— Você deve mais é esquecer aquilo. Cidade grande não presta. Cidade grande estraga a mocidade.

— Minha mocidade foi feita pra ser estragada. Não me interessa a velhice.

— Credo, menino! Deixe de blasfêmia! Então você quer morrer cedo?

— Mais ou menos.

Dona Adelaide fica perdida. Só sabe repetir.

— Deixe de blasfêmia. Deus castiga.

Frederico toma consciência da resposta imprudente. Iria amargar, inutilmente, o coração da velha.

— Desculpe, mamãe. Eu falava bobagens, só queria brincar.

— Logo vi. Isso não é coisa que se diga. A morte vem quando Deus quer. Ninguém morre na véspera.

Frederico fez que sim com a cabeça. Dona Adelaide se lembra:

— Vou botar a canjica no fogo. 

— A canjica? Boa ideia.

Olha o céu. Tudo limpinho. Sem uma nuvem. O sol apenas. Medonho, incansável. Tostando as folhas. E coriscando no rio sereno. E pondo diademas na testa do paredão grande.

Vem da outra esquina um som. A oficina do alemão em pleno funcionamento.

O martelo sobe e desce. A bigorna resiste. O ferro em brasas solta faíscas. E obedece: “ten-ten-ten-ten”. Depois o som fica mais agudo: “tin-tin-tin-tin”. O mesmo de vinte anos atrás.

“Tin... tin... ten... ten...”

Recorda a cena cotidiana da meninice. O mormaço pesando; o alemão bigornando, bigornando; e ele, de barriga pra cima, derramando na cama, estudando o céu, estudando.

No retângulo da janela, as nuvens se sucediam lentamente. Fixava uma com vontade. E a nuvem realizava morfologias engraçadas. Virava boi. Depois: montanha, navio, mulher, um leão de boca aberta, um santo puxando duas crianças, outra vez o boi, um leão de boca fechada...

Levava horas assim. Era mesmo que fita de cinema aquele pedaço do céu. A nuvem fazia tudo, desenhava tudo. Os urubus ajudavam de vez em quando. Os urubus descreviam curvas penosas, fechavam circunferências grandes e pequenas.

Um carro de boi canta monotonamente no extremo da cidadezinha. A cantiga do carro pesa, cansa, dá sono.

— Preciso fugir ao sono.

Busca um livro. O livro joga ditirambos à trepidação permanente das coisas, no dinamismo perene das espécies. O livro diz que o movimento é vida e acha que o espírito vive em função da inquietude. O livro exibe argumentos, discute. Mas o céu está sem nuvens. E os urubus, lá no alto, executam de repente uma fermata muito escura. E o paredão grande só sabe reluzir. E o rio é quieto, sonolento, mudo.

E a cantiga do carro cresce em monotonia. E a oficina do alemão não muda: “tin-tin-ten-ten...” E o mormaço desce, aborrece, abafa. “Tintin-ten-ten”... O carro... Os urubus... O céu limpinho, limpinho...

O livro joga ditirambos ao dinamismo permanente das coisas.
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(Publicado originalmente em O Dia. Curitiba, 29/12/1936)
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Newton Sampaio natural de Tomazina/PR, 1913 e falecido na Lapa, em 1938,  foi um médico, ensaísta, escritor e jornalista brasileiro. Newton é considerado um dos mais importantes contistas paranaenses sendo o precursor do conto urbano moderno. Em 1925, saindo da pequena Tomazina foi estudar no Ginásio Paranaense, em Curitiba, e precocemente, passou a lecionar nesta instituição, além de colaborar para alguns jornais da capital paranaense, principalmente o "O Dia". Ao ser admitido na Faculdade Fluminense de Medicina, transferiu-se para a cidade de Niterói. Após formado em Medicina, permanece na capital do país, porém, com a saúde bastante abalada, retornou a Curitiba e em seguida internou-se em um sanatório na cidade da Lapa onde faleceu no dia 12 de julho de 1938. Duas semanas após o seu falecimento, recebeu o Prêmio Contos e Fantasias concedido pela Academia Brasileira de Letras, pelo livro Irmandade. Newton Sampaio pertenceu ao Círculo de Estudos Bandeirantes de Curitiba e como homenagem ao jovem modernista, um dos principais prêmios de contos do Brasil leva o seu nome: Concurso Nacional de Contos Newton Sampaio. Algumas obras:  Romance “Trapo”: trechos publicados em jornais e revistas; Novela “Remorso”, 1935; “Cria de alugado”, 1935; Contos: “Irmandade”, 1938, “Contos do Sertão Paranaense”, 1939; “Reportagem de Ideias”: contos incompletos, etc.

Fontes:
Newton Sampaio. Ficções. Secretaria de Estado da Cultura: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. Disponível em Domínio Público.
Biografia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Newton_Sampaio
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Dicas de Escrita (Uso de aspas ou travessão nos diálogos)


O uso de diálogos em romances e contos é uma ferramenta poderosa para dar vida às personagens, desenvolver a trama e trazer dinamismo à narrativa. Saber como estruturá-los corretamente, utilizando aspas ou travessão, é essencial para garantir clareza e engajamento. Abaixo, explico detalhadamente como usar diálogos, com exemplos e orientações práticas.

A. Diálogos com aspas

Quando usar:
- Esse formato é mais comum em textos de origem anglo-saxônica, mas também é aceito em textos em português, especialmente em estilos literários modernos ou em traduções de obras estrangeiras.

Estrutura:
- As falas das personagens são colocadas entre aspas, geralmente aspas duplas (“ ”). 

- Quando há um verbo de elocução (disse, perguntou, respondeu, etc.), ele pode aparecer antes ou depois do diálogo, separado por vírgula.

Exemplos:

1. Fala simples com verbo de elocução:
   “Você vai sair agora?”, perguntou João.
   Mariana respondeu: “Não, acho que vou ficar em casa hoje.”

2. Fala seguida por uma ação ou descrição:
    “Isso não está certo.” Ela cruzou os braços e encarou-o, séria.
    Ele suspirou, cansado, e disse: “Já conversamos sobre isso tantas vezes.”

3. Falas intercaladas por verbos ou ações:
   “Se eu pudesse voltar no tempo”, disse ele, olhando para o chão, “talvez as coisas fossem diferentes.”
 “Não acredito que você fez isso!” exclamou ela. “Como pôde ser tão imprudente?”

4. Para destacar pensamentos:
   Ela pensou: “Será que ele sabe o que está fazendo?”

Dica: Em diálogos com aspas, evite usar travessões simultaneamente, para não confundir o leitor.

B. Diálogos com travessão

Quando usar:
O travessão (–) é amplamente utilizado em textos literários em português. É o formato mais tradicional e preferido em narrativas clássicas e contemporâneas no Brasil.

Estrutura:
O diálogo começa com um travessão.

Quando há um verbo de elocução, a fala e o verbo são separados por vírgula, e o verbo começa com letra minúscula.

Se o diálogo for interrompido por uma ação ou descrição, usa-se um novo travessão.

Exemplos:
1. Fala simples com verbo de elocução:
   – Você vai sair agora? – perguntou João.
   – Não, acho que vou ficar em casa hoje. – respondeu Mariana.

2. Fala seguida por uma ação ou descrição:
   – Isso não está certo. – Ela cruzou os braços e encarou-o, séria.
   – Já conversamos sobre isso tantas vezes. – Ele suspirou, cansado.

3. Falas intercaladas por verbos ou ações:
   – Se eu pudesse voltar no tempo, – disse ele, olhando para o chão – talvez as coisas fossem diferentes.
   – Não acredito que você fez isso! – exclamou ela. – Como pôde ser tão imprudente?

4. Falas sem verbo de elocução:
    – O que você quer?
    – Só vim buscar minhas coisas.

C. Combinação de diálogos e descrições

Diálogos não precisam ser isolados; eles podem integrar descrições e pensamentos para criar ritmo e profundidade. Veja como fazer isso:

Exemplo:
João se aproximou devagar, hesitante. Olhou para Mariana, que parecia distante, e falou com um tom quase inaudível:
  – Você ainda pensa em nós?
  Ela levantou os olhos e, por um instante, parecia que ia responder. Mas apenas balançou a cabeça, antes de dizer:
  – Não sei, João. Não sei mais o que pensar.

D. Dicas práticas para escrever diálogos envolventes

1. Dê uma voz única a cada personagem:
   Cada personagem deve ter uma forma de falar que reflita sua personalidade, contexto social e idade. Um jovem adolescente não falará como um professor universitário.

2. Evite exposições desnecessárias:
   - Não use os diálogos para despejar informações óbvias. Por exemplo:
     - Evite: “Como você sabe, João, temos que entregar o relatório amanhã.”
     - Prefira: “Já preparou o relatório para amanhã?”, perguntou João.

3. Use verbos de elocução com moderação:
Não exagere nos verbos rebuscados como “vociferou” ou “admoestou”. Palavras simples como “disse”, “perguntou” ou “respondeu” são suficientes na maioria dos casos.

Errado: – O que você quer? – vociferou ele, com os olhos em chamas.
Certo: – O que você quer? – perguntou ele, irritado.

4. Mostre, não conte:
Em vez de dizer que a personagem está nervosa, mostre isso no diálogo ou nas ações:

Errado: – Estou muito nervoso! – disse ele.
Certo: – Onde você estava? – Ele tamborilava os dedos na mesa, sem encará-la.

5. Evite diálogos longos e monótonos:
Intercale falas com ações, pensamentos ou descrições para manter o ritmo. 

Exemplo:
– Você não entende! – Ela levantou-se de súbito, derrubando a cadeira. – Tudo o que eu fiz foi por nós.

E. Quando usar aspas ou travessões?

A escolha depende do estilo do texto e do público-alvo:

Aspas: Preferidas em textos modernos, especialmente quando o autor quer um estilo mais próximo do inglês ou mais minimalista.

Travessões: Mais tradicionais, mantêm o texto alinhado às normas literárias em português e são amplamente aceitos por editoras brasileiras.

Ao dominar o uso de diálogos, você conseguirá enriquecer suas narrativas, tornando-as mais dinâmicas e cativantes!

VANTAGENS E DESVANTAGENS DO USO DOS DOIS FORMATOS

Os dois formatos mais usados para diálogos em narrativas – aspas e travessões – têm suas vantagens e desvantagens. A escolha entre eles depende do estilo do autor, do público-alvo e até do gênero literário. Abaixo, apresento uma análise detalhada para ajudar você a decidir quando e como usar cada formato.

1. USO DE ASPAS (“ ”)

VANTAGENS

1. Estilo Moderno e Internacional:
É amplamente utilizado em textos de língua inglesa e em traduções de obras estrangeiras. Se o objetivo é criar uma obra com apelo internacional ou mais moderna, as aspas podem ser uma boa escolha.

2. Clareza em diálogos curtos:
Aspas são visivelmente delimitadoras de fala, o que facilita a leitura em diálogos curtos e diretos.

Exemplo: “Você está bem?”, perguntou ela.

3. Flexibilidade com descrições:
Combina bem com estilos narrativos onde fala, pensamentos e descrições se misturam.

Exemplo:
“Eu não consigo fazer isso.” Ela suspirou, olhando para o chão. “Mas talvez você consiga.”

4. Leveza visual:
Aspas ocupam menos espaço visual na página, deixando o texto mais fluido e menos “carregado”.

5. Versatilidade em pensamentos ou citações:
Aspas funcionam bem para destacar pensamentos ou trechos de outros textos.

Exemplo: Ela pensou: “Será que ele está mesmo falando a verdade?”

DESVANTAGENS

1. Menor tradição em português:
Apesar de serem aceitas, as aspas não são o formato mais tradicional em obras literárias em português. Leitores acostumados a textos clássicos podem estranhar.

2. Confusão com citações dentro do diálogo:
Pode gerar ambiguidades quando é necessário incluir citações na fala de uma personagem.

Exemplo: “Ele disse: ‘Vou fazer isso amanhã’, mas eu não acredito.”

3. Menor destaque para falas longas:
Em diálogos extensos ou com muitas intervenções, aspas podem dificultar a legibilidade, pois não destacam tanto as falas como o travessão.

2. USO DE TRAVESSÃO OU HÍFEN (–)

VANTAGENS

1. Tradição literária em português:
É o formato mais tradicional nas narrativas em língua portuguesa, sendo amplamente aceito por editoras e leitores no Brasil e em Portugal.

2. Clareza visual em diálogos extensos:
O travessão destaca com mais força as falas das personagens, principalmente em textos com muitos diálogos.

Exemplo:
– Você está bem? – perguntou ela.
– Sim, só estou um pouco cansado.

3. Facilidade em intercalar ações e falas:
- O uso do travessão permite inserir ações ou descrições sem confundir o leitor.

Exemplo:
– Não vou fazer isso. – Ele cruzou os braços, firme. – Você não pode me obrigar.

4. Diferenciação clara entre narrativa e diálogo:
Em textos com muitos trechos narrativos entre as falas, o travessão ajuda a separar com clareza o que é diálogo e o que é descrição.

Exemplo:
João hesitou antes de responder.
– Eu acho que sim. – Sua voz era hesitante.

DESVANTAGENS

1. Visual mais “carregado”:
Como os travessões são visualmente mais marcantes, eles podem dar a impressão de que o texto é mais denso, especialmente em páginas cheias de diálogos.

2. Erros comuns no uso técnico:
Muitos escritores iniciantes confundem o uso do travessão com o hífen (-) ou não sabem como usá-lo corretamente com verbos de elocução e descrições.

Erro: – Eu acho que sim. Disse ele.
Correto: – Eu acho que sim – disse ele.

3. Menos versatilidade com pensamentos:
O travessão é menos usado para destacar pensamentos ou citações, o que pode limitar sua aplicação em narrativas introspectivas.

4. Dificuldade em traduções:
Se a obra for traduzida para outros idiomas, o formato com travessões pode não ser bem recebido, já que outras línguas, como o inglês, preferem aspas.

3. Quando escolher cada formato?

Use aspas (“ ”) se:
- Deseja um estilo mais moderno ou internacional.
- Está escrevendo para um público jovem ou acostumado com literatura traduzida.
- Pretende usar muitos pensamentos ou citações no texto.
- Prefere um visual mais leve e minimalista.

Use travessões (–) se:
- Deseja seguir a tradição literária em português.
- Está escrevendo romances ou contos com muitos diálogos longos.
- Quer clareza visual em obras com maior densidade narrativa.
- Prefere um estilo clássico ou mais formal.

Tanto as aspas quanto os travessões são ferramentas eficazes para destacar diálogos. A escolha depende do estilo que você deseja imprimir em sua obra e da experiência que quer proporcionar ao leitor. O ideal é experimentar ambos os formatos e decidir qual se encaixa melhor na narrativa e no público-alvo. Seja qual for a escolha, consistência é fundamental: “mantenha o mesmo formato ao longo de toda a obra”!

Fontes:
Como escrever? . Plat. Poe, 2025.
Imagem criada por JFeldman

Daniel Maurício (Lançamento de livros) 25 de outubro em Curitiba/PR

 


Daniel Mauricio nasceu em 1968, em Jaguariaíva/PR, radicado em Curitiba-PR. Graduado em Letras - UFPR; Administração de Empresas - FESP; Direito - FARESC; Pós-graduado em Gestão Administrativa e Tributária – PUC/PR; Pós-Graduado em Gestão de Pessoas e Qualidade no Setor Público - SPEI; Pós-Graduado em Gestão Pública de Tecnologia da Informação – PUC/PR; Pós-Graduado em Gestão Pública – FAEL. É Auditor de Tributos Municipais da Secretaria Municipal de Finanças da Prefeitura Municipal de Curitiba. Foi Diretor do Departamento de Rendas Mobiliárias da Secretaria Municipal de Finanças da Prefeitura Municipal de Curitiba; Professor da Rede Municipal de Curitiba; Monitor na área de Linguística na Universidade Federal do Paraná; Integrante do Projeto VARSUL – Variação Linguística da Região Sul desenvolvido pela Universidade Federal do Paraná em conjunto com a Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade Federal do Rio Grande do Sul; etc. 
Membro do Centro de Letras do Paraná – CLP; Academia de Cultura de Curitiba – ACCUR; - Academia de Artes, Ciências e Letras do Brasil; União Brasileira de Escritores – UBE; Confraria Brasileira de Letras/PR; - Academia Biblioteca Mundial de Letras y Poesía; Academia Luso-Brasileira – Seccional do Rio Grande do Sul;  Academia Poética Brasileira, entre outras.  
Publicou Mosaico de Sentimentos; Cacos e Retalhos; Gotas Poéticas; Origamis de Palavras; Palavras de Cheiro; Miudezas do Coração; Poemininos; Poesias da Madrugada; Leve-me; Alma Lírica; Olhares; e Amar É.
Participou de diversas coletâneas e antologias. Premiado nos Concurso Poemas Curtos (2014), Prêmio Marilda Confortin (2015), Prêmio Alice Ruiz (2016), promovidos pela Prefeitura Municipal de Curitiba. Participou de exposições de poesias na Argentina e Colômbia; teve poemas publicados na Revista Literária e Informação Eisfluencias em Lisboa-Portugal; no Blog Singrando Horizontes; na Revista Carlos Zemek; no Jornal Rondoniaovivo.

sábado, 11 de outubro de 2025

Asas da Poesia * 110 *


Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Saudade
é um
pedacinho
da gente
que ficou
pra trás.
= = = = = = 

Poema de
LUIZ POETA
Rio de Janeiro/RJ

Sudoeste

Olhando o mar, vi gaivotas, albatrozes,
garças, fragatas, pelicanos e golfinhos,
orcas, jubartes, tubarões... e vi peixinhos,
porém não vi, no horizonte, o teu veleiro.
... ventos uivantes, traiçoeiros e velozes
são os algozes do meu sonho aventureiro
e o meu olhar, fitando ondas tão ferozes,
sentiu a dor do meu amor chegar primeiro.

Se não te vi, meu doce amor, onde estarias?
...alçando velas ao sabor de alguma brisa?
... o sudoeste implacável não avisa
e é preciso conhecer sua emoção
pois, como o mar, amar nem sempre é calmaria,
porém o vento escolhe a própria direção
e quem não sabe conviver com a ventania
sequer conhece os vendavais de uma paixão.

Preso no cais, com meu olhar oceanando
abstrações nos horizontes passionais,
busquei sonhar, sentindo as brisas matinais
na minha na pele, qual tua boca tão macia
... brisa do mar... num sonho bom, acariciando
as emoções, quando o carinho faz poesia,
na areia clara que o mar vai apagando...
mas o desejo mais feliz sempre copia.

Fechei meus olhos e soltei meus devaneios
num céu azul... livre... no ar da esperança...
e quanto mais, no meu sonhar, me fiz criança,
mais eu voava e... quando... enfim... senti o mar,
tu me tocavas com a ternura dos teus seios
e eu percebi o quanto doce era te amar
num sudoeste que acordou os meus anseios,
e ainda trouxe a maciez... do teu olhar.
= = = = = = 

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Na curvatura dos teus cílios

Em tuas cristalinas e macias asas
O pôr do sol cintila -
Escrevo as inicias do teu nome
Em uma  nuvem, àquela... lembra?
Com formato de coração
E, busco
Nas linhas dos teus lábios
O beijo com gosto
Das manhãs... do anoitecer
Das aguadas,
Tingidas com chá de romã,
Deslizando no Canson,
E na curvatura dos teus cílios
Faço uma pausa,
Emociono-me com tua lágrima
E, sinto o pulsar do teu coração
Nas asas de cristal,
Em tons de azul
Tinta, ainda molhada -
Inebria-se o vento,
A umedecer meus olhos...
= = = = = = 

Quadra Popular

Ó alegria do mundo
por onde é que tens andado?
Tenho corrido mil terras,
e não te tenho encontrado...
= = = = = = 

Soneto de
JERSON BRITO
Porto Velho/RO

Tesouro brasileiro

As águas riscam mágico roteiro,
transformam-se na espuma alabastrina
e adornam com babados a cortina
que veste o colossal despenhadeiro.

No rasgo da floresta é rotineiro
o encanto derramado na retina
de quem conhece a graça que domina
a imagem do tesouro brasileiro.

Os cílios verdes dançam reverentes
ao firmamento preso na enxurrada
urdida pelas sôfregas correntes.

É justa toda láurea dedicada
às Cataratas do Iguaçu, presentes
da natureza, sempre desvelada.

(5° lugar no Concurso Literário-2023, pela Academia Literária do Oeste do Paraná)
= = = = = = 

Poema de
ELISA ALDERANI
Ribeirão Preto/SP

Pausa da natureza

Aprendi a seguir o exemplo da natureza...
Parar, observar todos os detalhes que a visão ainda me permite ver...
sentada no chão, sobre folhas mortas, caídas, já ressequidas
vejo a beleza do rio passar;
ele não para, é igual ao tempo que passa.
Ninguém pode parar suas águas que fluem,
agora lentas, ou rápidas, dependendo das estações...
Seguem seu percurso indiferente até chegar ao fim do vale,
quando abraçarão o mar...
A tarde passada olhando essa imagem calmamente,
até as árvores verdes fazem reverência ao rio,
as outras, com folhagem outonal, também estão na pausa,
logo o vento irá despi-las para o inverno passar...
Depois, para elas, virá a primavera mais uma vez.
Assim é a lei da natureza,
olho para o azul do céu,
nuvens brancas passando,
mudam a sintonia do meu pensamento.
Também reverencio minha pausa,
com gratidão ao tempo!
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Crepúsculo e aurora

Crepúsculo e aurora são dois marcos
suaves que norteiam meu viver;
seu lusco-fusco que nos lembram zarcos,
para o meu caso é fonte de prazer...

Mas esse par, de fato, são dois barcos:
um que me leva em pelo amanhecer...
e outro que, vendo os meus recursos parcos,
no ocaso, traz-me até meu bem-querer.

O sair e voltar, há longos anos
sempre esteve persente nos meus planos
de eterno amor por minha linda fada...

Saio bem cedo para trabalhar,
e à tardinha regresso ao doce lar,
para os beijos febris de minha amada.
= = = = = = 

Soneto de
FLORBELA ESPANCA 
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

Tarde no Mar

A tarde é de ouro rútilo: esbraseia
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,

Pousa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue ao seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia.
Desenha mãos sangrentas de assassino!

Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar...

E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas, 
São as asas do sol, agonizantes...
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Se queres saber se eu choro,
me empresta a tua mortalha,
com ela enxuga o meu pranto,
e o nosso filho agasalha.
= = = = = = 

Poemeto de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

Um olhar pode eternizar um momento
mas uma noite não dura para sempre.
Um sorriso às vezes é aconchego, ou
pode ser um retrospecto, um lamento.
Mas na noite... O sonho torna-se cura.
= = = = = = 

Poema de 
FABIANE BRAGA LIMA
Rio Claro/SP

A mais bela poesia

Páginas… minha escrita sem nexo, hoje gritam
Há uma certa repetição de palavras
Poemas incoerentes, sem lucidez...
Palavras aglomeradas, infindas e rimadas.
Leio um livro, talvez tenha inspiração
Mas a saudade me faz companhia
Sempre presente, me faz melancólica
Aonde se esconde...!? Não a vejo!
Leal e afável. De repente me deixou...
Palavras belas, tua essência incógnita
Formoso, não sei! Vasto de encanto...
Tento te decifrar, mas não consigo, não lhe ouço
Preciso recomeçar, viver. Largo tua mão!
Cativou-me, seremos a mais bela de todas as poesias...
= = = = = = 

Soneto de
GILSON FAUSTINO MAIA
Petrópolis/RJ

Meu Conselho

Eu não gostei, amigo, do seu vício.
É fumaça demais na atmosfera.
Deixe o tempo correr, é primavera,
não lance o seu futuro em precipício.

Não use, em sua vida, um artifício
para matar o tempo enquanto espera
o fechar da cortina e da quimera
que envolve o nosso mundo, desde o início.

Viva a paz, viva o amor, a natureza!
Seja o seu corpo rocha, fortaleza,
dê, então, ao seu vício longas férias.

Com saúde não faça brincadeira.
Para que entupir, dessa maneira,
o caminho do sangue nas artérias?
= = = = = = 

Poetrix de
RICARDO MANIERI
Porto Alegre/RS

do tempo

Contemplo o tempo
do alto de meus dias
e sinto alguma vertigem…
= = = = = = 

Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

Desilusão

Qualquer dia, qualquer hora,
ponho minha viola no saco,
pego um par de chinelos e sapatos,
arrumo a mochila e vou embora.

Não quero ficar pra assistir o final,
esforçar pro filme não acabar mal,
se não posso mudar o roteiro
tenho direito de querer estar fora.

Minha bagagem é mesmo pequena.
sou coadjuvante em qualquer cena,
e no fim, do longa, sempre alguém chora.

Nunca fui muito bom de comédia,
virou drama e eu perdi as rédeas.
Substitua-me que eu quero ir embora.
= = = = = = 

Poema de 
FERNANDO PESSOA
Lisboa/Portugal, 1888 – 1935

Tudo quanto penso 

Tudo quanto penso, 
Tudo quanto sou
É um deserto imenso 
Onde nem eu estou. 

Extensão parada 
Sem nada a estar ali, 
Areia peneirada 
Vou dar-lhe a ferroada 
Da vida que vivi.
= = = = = = 

Hino de 
Piracuruca/PI

Água que vem da terra fria
E no nosso peito deságua
Feliz daquele que um dia
Bebe dessa água

Terra da lenda e da magia
Das Sete Cidades encantadas
Onde as pedras são vivas esculturas
Que se movem pelas madrugadas

E Olho D’Água do Padre
Rua da Goela e majestosa Igreja
De Nossa Senhora Do Carmo
Que eu adoro onde quer que eu esteja

Por todo lugar onde passo
Hospitaleira ela me aninha
Do Casarão do Padre Sá Palácio
Ao regaço da Prainha

Fogo que é fé e chama e luz
E traduz a força do lugar
Piracuruca dos Tocarijus
Quero este teu ar

Teu ar de grandeza e liberdade
Que os Dantas heróis precursores
Legaram a toda cidade.
= = = = = = 

Sonetilho de 
OLIVALDO JUNIOR
Mogi-Guaçu/SP

No barzinho do Olivaldo

No barzinho do Olivaldo,
bebedor, só de poesia, 
que poesia que dá caldo 
para a nossa freguesia. 

No barzinho do Olivaldo, 
todo mundo tem valia, 
devedor, o eterno saldo 
que se paga dia a dia. 

Quem faz falta nesse bar 
é "cliente" para enchê-lo, 
gente amiga a papear. 

Um "Toquinho" pra tocar, 
e o Olivaldo, num "apelo", 
pode o bar inaugurar.
= = = = = = 

Poema de
MARIA LUÍZA WALENDOWSKY
Brusque/SC

Minha amiga Dona Hilna

Tão pequena,
tão forte;
uma mulher além do seu tempo 
que mudou seu destino,
determinada,
alegre,
com infinita sabedoria.

Como um bonsai sendo podado,
mudando de forma,
cada vez mais intelectual;
seus galhos eram seus braços;
sempre com uma palavra gentil e
confortante.

Um coração bondoso além da medida!

Ela frequentemente enxugava minhas lágrimas
com atenção, carinho e uma xícara de café.

Ela me incentivava a estudar,
a compartilhar a correção dos meus trabalhos escolares.

E como ela vibrava com minhas conquistas!

Ela participou da construção da minha casa;
tantas dicas para minha segurança,
tantas lembranças...
e quando a casa ficou pronta,
floresceu de alegria.

Como as folhas do bonsai
balançando ao vento,
ela me envolveu com amor.

Ela era minha confidente,
a mãe do meu coração.

Ela era uma alma generosa;
Com uma palavra de incentivo,
ela sempre recebia a todos
com um sorriso
e um pedaço do seu coração.
 
Hoje, a Sra. Hilna tem um novo endereço...

Ela está com o filho e meu pai;
Acho que ela está contando a ele todas as minhas conquistas,
meu amor pelo meu neto, meu livro, tantos sucessos...

Tenho certeza de que ambos estão falando
sobre a pessoa que me tornei,
porque sempre estive cercada de
pessoas corajosas, com caráter impecável, apoio 
e o quanto Deus é bom para mim.

O bonsai nutre a terra com fé e esperança!

Fecho os olhos e vejo aquele bonsai iluminando
um jardim multicolorido inteiro,
e não consigo deixar de sentir as lágrimas
como gotas d'água.

Oh, bonsai brilhante,
renascido em meu coração.

Eu te amo muito, Sra. Hilna!
Obrigada por tudo.
(tradução do espanhol por José Feldman)
= = = = = = = = =  

Fábula em Versos
adaptada das Fábulas de Monteiro Lobato 
JOSÉ FELDMAN
Floresta/PR

Fábula do Pato e da Garça 

Um pato nadava, feliz na lagoa, 
Enquanto a garça, elegante, voava à toa. 
“Venha comigo, vamos dançar!” 
Disse o pato, com jeito de encantar. 

Mas a garça, com graça, apenas sorriu, 
“Cada um tem seu jeito, sigo o meu.” Ela arguiu.
No final, aprenderam a respeitar, 
Que a beleza está em cada um, ao brilhar.
= = = = = = = = =