Marcadores

Mostrando postagens com marcador Contos e Lendas do Mundo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Contos e Lendas do Mundo. Mostrar todas as postagens

domingo, 10 de agosto de 2025

Contos e Lendas de Portugal (Algarve) As três nuvens

Era uma vez um lavrador muito rico e tinha três filhos: dois, os mais velhos, eram muito estimados pelos seus pais e andavam ricamente vestidos; o mais novo era desprezado. 
 
Tinha o lavrador uma rica propriedade, onde provocava um medo. 

Caseiro que lá se deixava dormir numa noite era encontrado morto no dia seguinte. Vendo o pai que a propriedade estava muito estragada, porque os vizinhos metiam nela os seus gados, resolveu mandar o filho mais novo guardá-la. Aceitou o mancebo a incumbência, pois era muito bom e obediente, mas pediu ao pai que mandasse no dia seguinte buscar o seu cadáver para não permanecer por muito tempo insepulto. 

Despediu-se do pai e dos irmãos e foi para o seu desterro, levando consigo uma cítara, seu instrumento favorito. 

O prédio onde o caseiro costumava dormir ficava no centro da propriedade. O rapaz chegou ali e tirou do prédio uma cama que colocou sobre um parque, de bonita vista, através do prédio. Logo que escureceu foi deitar-se, entretendo-se muito tempo a tocar o seu instrumento. Alta noite adormeceu. Tinha pegado no sono, sentiu-se afogado sob um grande peso; sentou-se na cama, pegou na cítara e disse em voz alta: 

 – Que peso é o que sinto? Olhem que parto a cabeça seja a quem  for. 

 E pôs-se a fazer um grande sarilho com a cítara, como se fora um alfange. 

 Então ouviu o mancebo uma voz: 

– Não me mates, dizia a voz, porque te faço bem. Eu sou a nuvem negra, e, quando tiveres necessidade de alguma coisa, chama por mim. 

No dia seguinte ergueu-se ele da cama e dirigiu-se para casa, onde era esperado por quatro homens com uma tumba para o levar ao cemitério. 

– Podem retirar-se: ainda não foi desta vez, disse o mancebo. 

 Na noite seguinte repetiu-se a mesma cena com a diferença da resposta: 

– Não me mates: eu sou a nuvem parda e, quando queiras alguma coisa, chama por mim. 

 Na terceira noite, e depois da mesma cena das noites antecedentes, ouviu: 

– Não me mates: sou a nuvem branca. Sempre que te seja preciso, chama por mim. Eu e as minhas irmãs estávamos aqui encantadas, foste tu que nos desencantaste com os maviosos sons do teu instrumento. 

E a nuvem branca desapareceu como tinham desaparecido as outras. 

Conservou-se o mancebo por algum tempo na propriedade, sendo raríssimas vezes visitado pelo pai e isso no mero intuito de examinar como o filho a administrava. 

Um dia teve saudades da família e foi visitá-la. Logo que entrou na casa paterna viu muitos alfaiates ocupados em talhar e fazer riquíssimos fatos de homem; soube então que o rei mandara anunciar que casaria com a princesa o cavalheiro que se saísse vitorioso de três torneios seguidos. 

 Entretida a família nos arranjos dos dois irmãos, que aspiravam à mão da princesa, nenhum caso fizeram do irmão mais novo. Este demorou-se pouco tempo na casa dos seus e retirou-se para a propriedade. 

Nessa noite pensou que ele poderia entrar nos torneios, e quando foram marcados os dias para as lutas já tinha formada a intenção de lá se apresentar. 

Na manhã do dia do primeiro torneio disse o mancebo: – Valha-me a nuvem preta. 

Apareceu logo uma nuvem e dela saiu uma jovem. – O que me queres? perguntou. 

– Entrar no torneio e sair vencedor. 

A jovem ergueu uma pequena vara, proferiu algumas palavras, e apareceu um cavalo negro, trazendo pequena mala, onde vinham riquíssimas vestes e armas de cavaleiro da mesma cor do cavalo. 

O mancebo vestiu-se, empunhou as armas, montou no cavalo e entrou no torneio, saindo vencedor. Logo que saiu da cidade desapareceram o cavalo, as vestes e as armas. 

No dia seguinte disse: 

– Valha-me a nuvem parda. 

Apareceu outra nuvem, de onde saiu uma jovem que perguntou ao mancebo o que queria. 

 – Entrar no torneio e sair vencedor. 

E sucedeu como no dia antecedente. Quando ele entrou na praça percebeu que a princesa o atendia com especial agrado. Ainda outra vez saiu vencedor, retirando-se logo para fora da cidade e desaparecendo o cavalo, as vestes e as armas. 

No terceiro dia invocou a nuvem branca e entrou no torneio montado em cavalo branco e com armas brancas bordadas a ouro. Saiu-se vencedor, e então viu-se cercado das pessoas da corte que o convidaram a ir à presença do rei. O mancebo foi. 

Na presença do rei e da princesa, tirou a viseira. E o rei e a princesa agradaram-se do jovem e logo foi ali resolvido o seu casamento. 

Os dois irmãos do mancebo conservavam-se a certa distância e, quando viram que estava resolvido o casamento com o seu irmão, tiveram grande desespero. Um deles lançou-se da janela à rua, morrendo despedaçado, o outro atravessou-se no próprio alfange. 

Houve grandes festas no palácio e em todo o reino por ocasião daquele casamento. 

Fontes:
Xavier Ataíde de Oliveira. Contos tradicionais do Algarve. edição Vega. 
Disponível no Estudio Raposa.
http://www.truca.pt/raposa_textos/historia_84_tres_nuvens.html
Imagem criada com Microsoft Bing 

sábado, 9 de agosto de 2025

Lourenço do Rosário ( Conto Moçambicano: O Coelho e o Macaco)

O coelho e o macaco eram muito amigos.

Um dia, o coelho disse: “Amigo, vamos abrir uma machamba de amendoim”. 

“Está bem”, respondeu o macaco.

Havia muita fome na povoação.

Quando começaram a abrir o campo, o macaco ria, saltava, brincava e trabalhava pouco. O coelho tirou o capim, cavou, semeou quase toda a machamba praticamente sozinho.

Chegou a altura da colheita. O coelho tirava o amendoim e punha no saco. O macaco tirava-o e comia imediatamente.

O coelho ficou furioso e resolveu castigar o companheiro porque se continuassem daquela forma, estava a ver que não tiraria qualquer proveito do seu trabalho. Aproveitou então uma altura em que o macaco estava a saborear uma grande quantidade de amendoim e enterrou-lhe a cauda de forma a que não pudesse tirá-la.

Na altura de largar o trabalho, disse o coelho: “Ó amigo macaco, hoje tenho para o jantar amendoim com carne. Aparece”.

O coelho fingiu que tinha muita pressa e foi-se embora logo daí. O macaco tentou também ir embora e viu que estava preso pela cauda.

O macaco gritou chamando por ajuda. Passado algum tempo, apareceu o coelho todo ofegante. 

“O que foi, amigo macaco?” 

“Tira-me daqui”, pediu o macaco. 

O coelho fingiu que o ajudava, fez algum esforço. 

De repente, desistiu: “Paciência, amigo macaco, não há nada a fazer, eu tenho pressa, o jantar está à espera. A cauda está muito enterrada, só cortando-a, senão ficas aí toda a noite e nunca se sabe quando é que passa por aqui o leopardo…” 

Quando o macaco ouviu o nome do leopardo, pôs-se aos gritos e suplicou ao coelho que lhe cortasse a cauda. 

“Prefiro viver sem a cauda do que ser comido…” 

Era o que o coelho queria. Cortou-lhe a cauda e levou-a consigo.

Quando chegou em sua casa, coseu-a juntamente com o amendoim que ia oferecer ao macaco. Este, apesar das dores, como era comilão, apresentou-se em casa do coelho para o jantar.

Começou a comer com sofreguidão até verificar que aquela carne não passava da sua própria cauda. Ficou furioso, quis agredir o coelho; este fugiu. 

A lamentar-se com as dores, foi-se embora.

Desde esse dia que o macaco e o coelho não cultivam juntos.

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
LOURENÇO JOAQUIM DA COSTA ROSÁRIO nasceu em Marromeu, província de Sofala, em 1949, quando Moçambique ainda era uma colônia portuguesa. Quando tinha oito anos de idade, emigrou para Malawi, onde prosseguiu os estudos. Continuou seus estudos em Luabo, na Zambézia. Entre 1970 e 1973, cumpriu o serviço militar sob o regime português. E depois foi para Maputo, onde começou a lecionar na Escola Preparatória do Noroeste. Com a Revolução de 25 de Abril de 1974, foi para Portugal, lecionar em uma Escola Secundária, onde depois da proclamação da Independência foi nomeado presidente do Conselho Diretivo da escola, de 1975 a 1977, sendo transferido para Universidade Eduardo Mondlane (UEM). Era ainda um simples bacharel até 1979. Depois, foi para o Centro 8 de Março, onde foi diretor até 1982. Concluiu a licenciatura (em Línguas e Literaturas Modernas, variante Português/Francês) em Portugal, Lecionou na Universidade Nova de Lisboa. Em 1987, fez doutoramento em Literaturas Africanas, pela Universidade de Coimbra, em Portugal. No ano seguinte, regressa ao país. A convite do Presidente da República, Joaquim Chissano, foi presidente do Fundo Bibliotecário da Língua Portuguesa (FBLP) e criou o Instituto Superior Politécnico e Universitário (ISPU), que hoje chama-se Universidade A Politécnica, uma das maiores instituições privadas de ensino em Moçambique. Lecionou em várias instituições de ensino superior de renome internacional como, Universidade de Hamburgo, na Alemanha; Universidade de Milão, em Itália; Universidade Federal de Minas Gerais, no Brasil; e Universidade Nova de Lisboa. É Reitor da Universidade Politécnica e atualmente preside o Fórum Nacional do Mecanismo Africano de Revisão de Pares (MARP).

Fontes:
Lourenço Joaquim da Costa Rosário. Contos moçambicanos do vale do Zambeze. Moçambique: Editora Texto/Leya, 2001.
Biografia = https://biografia.co.mz/?p=1694
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Folclore Grego (Gykia, a heroína de Chersonesos)

 Lamachos era um rico morador da cidade de Chersonesos. Era tão rico que seu gado tinha uma porta exclusiva para entrar na cidade. Ele tinha uma filha única, de nome Gykia, ela era a mais linda e inteligente da cidade, tendo o seu pai se esmerado em educá-la com os mais sábios professores. Gykia era uma boa moça e queria de alguma forma ser útil pra a sua cidade. Entretanto, na província de Bósporo reinava Asandros, que louco de ganância queria a cidade de Chersonesos para si. Ele tinha tentando tomar à força uma vez, só que falhou. Então armou o plano de casar seu filho com Gykia, assim quando Lamacho morresse o filho dele governaria e depois seu neto.

Tudo aconteceu de acordo com o plano, Gykia casou com o filho de Asandros. Mas havia uma cláusula que dizia que se o marido saísse da cidade para encontrar o pai, seria executado. Gykia amava o marido sinceramente. Ele parecia ser uma boa pessoa, um fiel cidadão e era cheio de boas ações. Só que Lamachos morreu dois anos mais tarde e o Conselho da cidade decidiu entregar o governo não para o seu marido, mas para Zethos, um cidadão de destaque da cidade. O marido não desistiu, e ficou esperando uma oportunidade para tomar o poder.

No aniversário da morte de seu pai, Gykia organizou uma comemoração, regada a muita comida e bebida. O marido dela resolveu usar um dos aniversários de morte do sogro para tomar a cidade. Ele enviou um escravo dedicado a Panticapaion (a capital do reino do Bósforo) com uma mensagem que ele tinha encontrado uma maneira de tomar o controle sobre Chersonesos.

O pai enviou navios a seu filho com guerreiros dentro, como se eles estivessem trazendo presentes para a festa. Os barcos bósforos chegaram na Baía de Símbolos, e o filho de Asandros enviou cavalos para eles. Eles foram à cidade, entregaram os presentes, e alguns ficaram escondidos na casa de Gykia, enquanto os remadores partiam dando a impressão de que eles tinham partido.

Os escravos que o filho de Asandros trouxe de Bósporos o ajudaram, dizendo para todos que ele tinha deixado a cidade e dando comida e água para eles. Tudo foi feito secretamente. Gykia não suspeitava o que estava acontecendo em sua própria casa.

O prazo para o cumprimento do plano era o terceiro aniversário da morte de Lamachos. Por dois anos ele reuniu em segredo cerca de duzentos guerreiros de Bósporos. O filho de Asandros supôs que no dia da comemoração todos iriam divertir-se até tarde da noite e ficar totalmente bêbados, e quando dormissem, ele levaria seus guerreiros para realizar seu ato traiçoeiro. Nessa altura, a frota de seu pai estaria pronta para o ataque contra Chersonesos.

A trama foi descoberta por acidente, isso porque uma das servas de Gykia estava de castigo em um aposento, e sem querer deixou cair um grampo, quando foi pegá-lo no chão, ela viu os soldados escondidos no andar de baixo. Imediatamente ele pediu para alguém trazer sua patroa e falou a ela o que estava acontecendo. Gykia não teve dúvidas, o amor pela cidade era maior que qualquer coisa, e decidiu matar a todos, inclusive seu próprio marido, que acabou por ser um traidor.

Ela pediu a seus parentes para reunir os mais valentes cidadãos. Ela fez eles jurarem que se tudo fosse verdade, depois da morte dela, ela deveria ser enterrada dentro do perímetro da cidade. Eles juraram cumprir seu desejo, Gykia satisfeita revelou a traição do marido. Quando eles ouviram a estória, congelaram de medo.

Ela combinou que as comemorações deveriam ocorrer de maneira normal. Todos beberiam, dançariam, cantariam, mas de maneira comedida e sem esquecer o perigo. Deveriam também juntar mato em suas casas. Assim, quando a festa terminasse, os portões seriam fechados e todos iram para suas casas, pegariam os galhos e folhas e iriam a casa dela, colocariam tudo lá e ateariam fogo, assim que ela saísse, é claro. Cuidando para que ninguém mais saísse vivo de lá.

Como havia sido combinado, no dia do memorial de Lamachos, os habitantes da cidade se divertiram durante todo o dia nas ruas. Gykia generosamente distribuiu vinho na festa em sua casa, entreteve seu marido, mas ela mesma não bebeu e ordenou o mesmo a sua servas. Gykia bebia água de uma tigela púrpura que parecia vinho.

Quando a noite chegou, e os cidadãos retornaram à suas casas, Gykia convidou seu marido para dormir. Ele concordou prontamente. Ela ordenou que os portões e entradas fossem fechadas, como de costume, e imediatamente enviou servas de confiança para levar roupas, ouro e decorações diversas para fora da casa.

Tudo ficou silencioso na casa e o marido bêbado adormeceu, então Gykia saiu do quarto, fechou a porta atrás de si, e chamando de servas, deixou a casa. Na rua, ela disse que ateassem fogo em cada lado da sua casa. Logo a casa estava envolta em chamas. Os guerreiros bósforos tentaram fugir, mas foram imediatamente mortos. Em um instante todos os conspiradores foram executados.

Desta forma Gykia manteve Chersonesos fora do perigo, os cidadãos ergueram duas estátuas em sua homenagem.

Quando, mais tarde, Gykia lembrou o conselho da cidade sobre a sua promessa de enterrá-la dentro do perímetro da cidade, alguns ficaram contra dizendo que a necrópole de Chersonesos estava longe das muralhas da cidade, e eles nunca enterravam os mortos em bairros residenciais. Em vez disso, eles propuseram reconstruir a casa dela, em troca.

Ela não desistiu. Alguns anos mais tarde a sábio Gykia decidiu testar se seus concidadãos iriam manter sua palavra na prática. Ela disse a seus escravos para espalhar a notícia de que ela tinha morrido. Todos ficaram tristes. As pessoas lotaram a praça da casa de Gykia. Seus escravos e parentes prepararam o corpo para o rito fúnebre.

Após uma longa reunião da anciãos eles decidiram não infringir o rito antigo dos gregos, e sim quebrar o juramento, e ordenaram levar o corpo dela para fora da cidade e para enterrá-la na necrópole.

Quando o cortejo parou diante do túmulo aberto, Gykia levantou-se do sarcófago, e começou a acusar os cidadãos amargamente. Os anciãos ficaram envergonhados e juraram pela terceira vez realizar o seu desejo. Ela foi autorizada a encontrar um local de sepultamento dentro da cidade, que foi marcado com um busto em cobre dourado da heroína.

E aqueles que quisessem admirar a beleza dela, poderiam escovar o pó do busto de cobre e ler na placa a estória de seu feito corajoso.

Fontes:
http://www.chersonesos.org/?p=history_tls1&l=eng . Tradução do grego por N. Khrapunov
Imagem criada com Microsoft Bing 

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Folclore Sueco (Ingeborg e Hialmar)

HIALMAR, o herói descendente dos Vetars, tinha feito um pacto de fraternidade com Orrar Oddur, o Viking.

Juntos se haviam apresentado ao rei de Sigtune, Ané, prometendo-lhe fidelidade absoluta.

O rei Ané tinha uma filha chamada Ingeborg, que amava secretamente Hialmar, e sentia-se desgraçada porque acreditava que o herói não reparara em sua beleza. Estava, porém, enganada, pois que também Hialmar a queria, embora jamais tivesse confessado seu amor.

Em Bolmsé, país próximo de Sigtune, remava Ansgrim, o gigante, pai de doze filhos, todos audazes guerreiros. O mais velho, Hiovard, tinha contemplado uma única vez a formosura de Ingeborg e por ela se apaixonara de tal maneira que, quando chegou a festa de Yul — a festa do verão — e Ansgrim e seus filhos brindaram com a taça de hidromel para que cada um deles propusesse uma nova gesta com que se expandisse sua fama de heróis, Hiovard declarou que aquele ano conseguiria a mão da princesa de Sigtune, mesmo que a isso se opusessem o Rei e todo o país.

Ansgrim, prudente, lembrou ao filho a presença em Sigtune de dois irmãos de armas: Orrar Oddur, o Viking, e Hialmar, o herói. Hiovard assegurou que estava disposto a bater-se fosse com quem fosse, e dez de seus doze irmãos beberam a taça de hidromel, declarando que se colocariam ao lado de seu irmão em qualquer circunstância, e que lutariam em defesa dele contra todos os guerreiros de Sigtune reunidos.

Angandyr, o mais moço, tinha ainda intacta sua taça de hidromel. O pai, surpreendido, perguntou-lhe se ele seria suficientemente covarde para não se unir à luta de seus irmãos pela conquista de Ingeborg. Levantou-se, então, o mais moço dos irmãos e declarou que acompanhar os demais na luta contra Sigtune parecia-lhe pouca coisa. Queria encontrar, e apoderar-se da espada Tirfing, cujo fio era envenenado e saía vitoriosa de todas as lutas. Os anões, inimigos dos deuses do Valhala, tinham forjado aquela espada, havia muito tempo. Vários heróis tinham-na possuído, e com ela conquistado memoráveis vitórias. Agora estava escondida nas profundezas da terra, e ninguém sabia de seu paradeiro.

Tanto o pai como os onze irmãos do jovem admiraram-lhe a coragem de formular tal promessa, que consideravam impossível de realizar.

Pouco tempo depois, os doze irmãos dirigiram-se para Sigtune, onde foram recebidos em audiência pelo rei, rodeado de todos os seus guerreiros. Angandyr olhou atentamente para a espada de todos os presentes, sem poder descobrir a Tirfing entre elas.

Ao oferecer-lhe Ané a taça de hidromel, Hiovard recusou-a, dizendo que não tinha vindo em ânimo pacífico nem para beber com ele. Vinha buscar a princesa Ingeborg, que solicitava como esposa.

Antes que o Rei tivesse tempo de responder, levantou-se Hialmar com tal violência que sua armadura ressoou estrepitosamente. Colocou-se na frente do Rei e disse-lhe que ele havia defendido todo o tempo as costas de seu Estado, que as rochas do mar podiam dar testemunho dos numerosos combates que às suas margens tinha ganho. Nunca pedira uma recompensa, porque sentia satisfação em cumprir a promessa, que fizera quando ainda era quase uma criança, de dedicar sua vida à salvaguarda de seu país. Agora se tornara um homem e não se sentia disposto a esperar, só e sem lar, a chegada da morte. Também ele amava a princesa Ingeborg, e solicitava-lhe a mão dela.

O velho Rei vacilou. Não podia prescindir de Hialmar, mas também temia a cólera dos filhos de Ansgrim. Não sabendo como resolver a questão, decidiu chamar sua filha, para que fosse ela quem escolhesse entre os dois apaixonados.

Apareceu Ingeborg ante eles, mais bela do que nunca. Ao saber o que dela se esperava, sorriu, feliz, e, sem temor algum, sem vacilar um único instante, estendeu a mão para Hialmar, declarando que de há muito desejava ser sua esposa.

Hiovard e seus onze irmãos, indignados pela afronta que, segundo eles, lhes infligia Hialmar, desafiaram-no a que fosse a Samsé, combater com eles. Hialmar aceitou o repto.

Os doze gigantes saíram do palácio de Ané com o coração repleto de ódio e desejos de vingança. Mas chegaram apenas onze à casa de seu pai. Angandyr ficou pelo caminho, meditando sobre a maneira de apoderar-se de Tirfing e vingar-se de Hialmar.

Vagou pelos montes durante muito tempo, e, cansado enfim, com aquela caminhada, aproximou-se de umas pedras cobertas de musgo e deixou-se tombar sobre elas. Estava anoitecendo, e o jovem adormeceu.

Acreditou ver, em sonhos, como que uma luz azul que iluminava o espaço. No meio daquela claridade, Angandyr percebeu os anões que dançavam em torno de um átrio enegrecido. Entre saltos e risos entoavam uma canção, em que diziam que apenas um guerreiro forte e valente, que fosse digno de tal coisa, conseguiria encontrar Tirfing, a espada envenenada.

Quando a estranha visão se desvaneceu, Angandyr despertou e viu a seu lado uma espada. Apanhou-a, surpreendido. Era a Tirfing.

Aproximava-se a data do combate em Samsé. Ingeborg tecia uma forte couraça de seda para Hialmar, mas um terrível pressentimento impedia-a de adiantar o trabalho. As agulhas caíam-lhe das mãos e a jovem chorava amargamente, porque, embora confiando no valor e na audácia de seu amado, tinha a certeza de que ele morreria em combate.

Também Hialmar tinha esse pressentimento. Só a Orrar Oddur, que devia acompanhá-lo ao combate, confiara seus temores.

Chegou o momento da partida, e os dois apaixonados, com o coração cheio de dor, despediram-se à beira do mar. Ingeborg entregou ao seu noivo um anel de ouro, como prenda de seu amor e de sua fé. Hialmar colocou o anel no dedo e ao ver o amor que lhe dedicava a princesa a quem adorava, sentiu renascer a confiança e a coragem para afrontar o perigo da espada envenenada de Angandyr. O pensamento de que era ela o prêmio para a sua façanha dissipou seus lúgubres pressentimentos.

Orrar Oddur e Hialmar chegaram a Samsé e encontraram os doze irmãos. Onze deles precipitaram-se sobre Oddur. Hialmar lançou-se contra Angandyr.

Enquanto Orrar se defendia do violento ataque dos onze irmãos, gritava a Hiovard que aquele não era procedimento digno de nobres. Que cada um deles viesse à luta por sua vez, e ele daria boa conta de todos. Assim o fizeram, e, um por um, caíram os onze aos golpes fortes da espada do Viking.

Terminada a luta, Orrar voltou-se a procura de Hialmar. Angandyr jazia morto e Tirfing estava a seu lado, manchada com o sangue de Hialmar. Este continuava de pé, mas tinha no rosto a lividez da morte.

Ao ver aproximar-se seu irmão de armas, Hialmar pareceu reunir as poucas forças que lhe restavam. Dezesseis feridas dilaceravam-lhe as carnes. O veneno de Tirfing ia penetrando em seu coração.

Arrancou de seu dedo o anel que Ingeborg lhe dera ao despedir-se, e, entregando-o ao seu amigo, rogou-lhe que o devolvesse à sua amada dizendo-lhe que seu último pensamento tinha sido para ela.

Orrar deu sepultura aos doze irmãos. Apanhou depois o amigo e depositou-o no fundo da embarcação.

Dirigiu-se, muito triste, para Sigtune. Ao chegar, foi ver Ingeborg, que o recebeu ansiosamente. Entregou à princesa o anel de Hialmar, transmitindo-lhe, ao mesmo tempo, as derradeiras palavras do guerreiro, que tinham sido uma doce lembrança de amor para ela.

A dor de Ingeborg foi imensa. Contemplou, absorta, o anel, e, de súbito, vendo as manchas de sangue que nele havia, teve a ideia de reunir-se a Hialmar. Aplicou, pois, os lábios ao sangue envenenado, e absorveu-o desesperadamente. O veneno deslizou pelas suas veias, chegando até o coração.

Tirfing, ao matar Hialmar, tinha matado também Ingeborg.

Orrar Oddur transladou os corpos dos dois enamorados e enterrou-os em Samsé. 

Conta o mito que pouco tempo depois nasciam junto à sepultura duas bétulas frondosas e esbeltas, tão aproximadas uma da outra, que seus ramos entrelaçavam-se, como os braços de dois apaixonados. E ainda se assegura que nas noites de ventania, as copas das árvores, ao balançarem, pronunciam docemente, os nomes de Hialmar e Ingeborg.

Fontes:
Maravilhas do conto mitológico. Adaptação de Nair Lacerda. Cultrix, 1960.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

quinta-feira, 24 de julho de 2025

Leonardo da Vinci (A Cotovia)

Era uma vez um velho eremita que morava numa floresta com apenas um companheiro, um pássaro, uma cotovia.

Um dia dois mensageiros foram procurar o velho eremita para pedir-lhe que os acompanhasse ao palácio de seu amo, que estava gravemente enfermo.

O velho, seguido pela cotovia, partiu com os mensageiros e fizeram-no entrar imediatamente no quarto do homem doente. Quatro médicos balançavam a cabeça, fazendo comentários em voz baixa entre si.

— Não há mais nada a fazer. - murmurou o que parecia ser o mais importante. – Infelizmente ele está morrendo.

O velho eremita em pé junto à porta, observava a cotovia, que pousara no peitoril da janela e olhava fixamente para o doente.

— Ele vai viver. - disse o eremita.

— Mas como pode este camponês fazer uma afirmação dessas? - exclamaram os médicos em coro.

O doente abriu os olhos, viu a cotovia olhando-o fixamente e esboçou um sorriso. Pouco a pouco a cor foi voltando ao seu rosto, suas forças retornaram e, para assombro de todos os presentes disse: — Estou me sentindo um pouco melhor.

Tempos depois, o nobre do palácio, totalmente recuperado, foi à floresta para agradecer ao eremita.

— Não agradeça a mim, disse o eremita. – Foi o pássaro quem o curou. A cotovia, acrescentou ele, é um pássaro muito sensível. Ao ser colocada junto a uma pessoa doente, se ela virar a cabeça e não olhar para o doente, isso significa que não há esperança. Mas se olhar para o doente, como olhou para o senhor, quer dizer que o paciente não vai morrer. Na realidade a cotovia, através do olhar ajuda a recuperação.

Assim como a sensível cotovia, o amor da virtude não olha para coisas vís, sombrias, mas procura tudo o que é nobre e honrado. O pássaro habita o bosque florido, e a virtude habita o coração nobre.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
Leonardo de Ser Piero da Vinci nasceu em 1452 na Itália e morreu em 1519, na França, era para seus contemporâneos um personagem discutido e controvertido. Como pintor era mal visto, porque jamais terminava as obras iniciadas; como escultor despertou suspeitas por não ter forjado em bronze o monumento equestre a Francisco Sforza; como arquiteto era perigosamente ousado; como cientista era de fato um louco. Sobre um ponto, no entanto, seus contemporâneos viam-se obrigados a concordar: Leonardo era um argumentador fascinante, um polido conversador, um contador de histórias “mágico” e fantástico, um gênio da palavra acompanhada da mímica.Falando da ciência, fazia calar os cientistas; argumentando sobre filosofia, convencia os filósofos; inventando fábulas e lendas, conquistava os favores e a admiração das cortes. Sempre, e em qualquer lugar, Leonardo era o centro das atenções. E jamais decepcionava seu auditório porque tinha sempre, alguma história nova para contar. As fábulas e lendas de Leonardo têm um objetivo e finalidade moral, algumas foram traduzidas por Bruno Nardini e publicadas no Brasil em 1972. O único personagem constante dessas fábulas e lendas é a natureza: a água, o ar, o fogo, a pedra, as plantas e os animais têm vida, pensamento e palavras. O homem, pelo contrário, aparece como instrumento inconsciente do destino, e sua ação, cega e implacável, destrói vencidos e vencedores.
“O homem é o destruidor de todas as coisas criadas”, escreveu Leonardo no “Livro das Profecias”; e nunca, como hoje em dia, na longa história de nosso planeta, uma asserção foi mais verdadeira e tão tragicamente atual..

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

quarta-feira, 16 de julho de 2025

Contos e Lendas do Mundo (Romênia) Harap Alb


"Harap Alb" é o protagonista, bem como o título de um conto de fadas em língua romena de Ion Creangă, conhecido na íntegra como Povestea lui Harap Alb ("A História de Harap Alb"). Ele é o mais novo de três príncipes.

"Harap Alb" recebeu muita atenção póstuma dos críticos literários e inspirou obras de outros gêneros. Isso inclui o filme de Ion Popescu-Gopo, De-aș fi Harap Alb (Se eu fosse Harap Alb), um romance pós-modernista de Stelian Țurlea e uma história em quadrinhos de Sandu Florea, ao lado de uma das teses de Gabriel Liiceanu no campo da filosofia política.

Harap Alb em romeno significa "árabe branco". A palavra harap é uma forma antiquada de arap derivada de "árabe" significa "pessoa negra" ou "mouro". Também pode se referir a um homem bonito, geralmente com feições escuras.

O arap ou harap é uma raça estereotipada no folclore dos Bálcãs, da Turquia no sul à Romênia moderna no norte, muitas vezes, mas nem sempre, retratada de forma negativa.

O nome também pode ser uma alusão à condição de escravidão do protagonista de "degradação e submissão", já que alp pode ser prontamente associado ao comércio de escravos africanos ou à escravidão de minorias na escravidão na Romênia. O conto torna-se, assim, a busca do herói pela recuperação do "status humano".

RESUMO DO CONTO

A narrativa começa com uma fórmula padrão: os três filhos de um rei são enviados em uma missão, e o herói, o filho mais novo, está pronto para suceder.

Um rei sem nome tem um irmão, o Imperador Verde (Împăratul Verde) que está se aproximando da morte, e como não tem herdeiros do sexo masculino, ele escreveu ao rei para enviar qualquer um de seus três príncipes, e qualquer um que completar a jornada herdará todo o império. O reino e o Império estão nas "margens" da terra, separados por terras desoladas.

O filho mais velho concorda em aceitar o desafio de seu tio, e o rei decide testar sua coragem vestindo-se com uma pele de urso e bloqueando a ponte ao longo do caminho. O príncipe mais velho volta apavorado para casa. O monarca prega o mesmo truque em seu segundo filho, com o mesmo resultado. Sem revelar seu estratagema, o rei expressa sua decepção, o que leva o mais novo a chorar e correr para o jardim do palácio. Lá, uma velha mendiga lê sua sorte: o príncipe mais jovem se tornará um glorioso imperador. Ela pede que ele tente a busca de seu tio, mas avisa que ele deve usar apenas os ítens que seu pai tinha quando era noivo: roupas esfarrapadas, armas enferrujadas e um velho garanhão. Ela então desaparece nos céus.

O príncipe mais jovem sofre o ridículo de seu pai, mas acaba obtendo permissão para ir, e com os itens antigos do rei. 

O cavalo pode ser identificado pela sabedoria que lhe foi dada pela velha: o cavalo certo será o único no estábulo que se aproximará de uma bandeja cheia de brasas na alimentação. O cavalo dá três sacudidas e se transforma em um belo corcel. O cavalo pode conversar com seu novo mestre e carregá-lo saltando para as nuvens e a Lua. 

O príncipe vai até a ponte e suporta o ardil do urso, e o rei lhe dá a pele de urso como troféu. Como palavras de despedida, o pai diz a ele para tomar cuidado "com o Homem Vermelho, e especialmente com o Careca".

A próxima etapa da jornada leva o príncipe a uma floresta profunda habitada pelo malvado Homem Careca (Spânul), que o escravizará por meio de truques. O príncipe rejeita duas vezes a oferta de serviços do Homem Careca, mas na terceira vez, perdeu o rumo e decide aceitar. Por engano, a criatura engana o príncipe e coloca-o no fundo de um poço e só o deixa sair submetendo-se à sua condição de que os dois agora devem trocar de papéis. 

Assim, no palácio, o Careca é apresentado como filho do rei, enquanto o jovem príncipe segue como seu servo chamado "Harap Alb". O Imperador Verde os recebe sem suspeitar, mas a filha do Imperador pega o mestre batendo em seu servo e o repreende; ela começa a se perguntar qual é verdadeiramente nobre e qual é a base entre os dois.

Harap-Alb logo é enviado em sua primeira missão perigosa. Ele é ordenado pelo Homem Careca a recuperar a "salada do Jardim do Urso", que o Imperador Verde gostava. Seu cavalo falante o tranquiliza e, voando no ar, o leva para uma ilha, onde ele se reúne com a mendiga adivinha, que agora se identifica como "Domingo Santo" (Sfânta Duminică). Ela dopa o bebedouro do urso com uma infusão indutora de sono, ervas, mel e leite, e Harap Alb envolto em pele de urso pega a salada antes que a fera acorde.

A segunda missão perigosa de Harap-Alb é caçar o cervo encantado cuja pele é cravejada de pedras preciosas e trazer de volta seu crânio e couro. O olhar do cervo é mortal e ninguém jamais sobreviveu. O Santo Domingo fornece a ele a viseira e a espada de Statu-Palmă-Barbă-Cot (um personagem anão). Seguindo suas instruções, Harap Alb se esconde em um poço profundo e embosca o veado, cortando sua cabeça de uma só vez, depois retorna ao buraco esperando até que a cabeça morra completamente. Durante sua espera, a cabeça do veado decepado grita com uma voz humana pedindo para vê-lo, mas se ele tivesse obedecido, o "olho envenenado" do veado o teria matado.

O retorno triunfante com as joias aumenta muito o prestígio de Harap Alb, bem como a estima do Imperador Verde por ele. O Homem Careca tenta ciumentamente creditar os feitos a si mesmo por treinar seu servo com seus modos severos. 

Enquanto o monarca é crédulo, sua filha e suas irmãs ficam ainda mais céticas e decidem investigar mais. Eles pedem a Harap Alb para pôr a mesa para o banquete, mas o Careca faz o servo jurar não conversar com as damas. 

Nas festividades, uma criatura encantada parecida com um pássaro, Pasărea măiastră faz uma visita surpresa e anuncia: "Vocês estão comendo, bebendo e se divertindo, mas não conseguem pensar na filha do Imperador Vermelho!" 

Segue-se um debate animado sobre o tirânico Imperador Vermelho (Împăratul Roșu) e sua filha. Alguns convidados afirmam que esta última é uma bruxa malévola, e alguns ainda que ela é o próprio pássaro, em uma missão para propagar o medo. 

O Careca posteriormente oferece Harap Alb para investigar o mistério e o envia em uma missão para capturar a filha do Imperador Vermelho.

A jornada do príncipe começa com um ato de piedade. Ele se depara com uma procissão de casamento de formigas na ponte e, em vez de pisoteá-las, decide ir para o rio de águas profundas. Uma formiga alada agradecida lhe dá suas asas, dizendo-lhe para queimá-las em sua necessidade, e toda a colônia virá em seu auxílio. 

O príncipe tem um encontro semelhante, desta vez com um enxames de abelhas. Ele deposita seu chapéu para o enxame descansar, depois os carrega para uma nova colmeia que ele fez escavando um tronco. Em gratidão, a abelha rainha o presenteia com uma asa para convocá-la em seu momento de busca de ajuda.

Harap Alb continua a jornada e ganha cinco companheiros. O primeiro é Gerilă (de "geada", e o sufixo diminutivo -ilă), um homem que treme mesmo no verão, cujo hálito frio se transforma em um vendaval que congela tudo em gelo. Depois de ser brincalhão, Gerilă responde "Ria se quiser, Harap Alb, mas você não será capaz de realizar nada sem mim para onde está indo", e o príncipe muda de ideia, concordando em deixar o homem acompanhá-lo. 

Eles se juntam a Flămânzilă (de flămând, "faminto"), que pode consumir grandes quantidades sem satisfazer seu apetite e Setilă (de sete, "sede"; também "Beber tudo") com a capacidade de beber sem fim, Ochilă (de ochi, "olho"), um homem de olhos aguçados cuja visão alcança longas distâncias, e Păsări-Lăți-Lungilă (de pasăre, "pássaro", a se lăți, "alargar-se" e a se lungi, "alongar-se"), que pode crescer em qualquer direção à vontade e atingir alturas acessíveis apenas aos pássaros. 

Inicialmente, a reunião produz um desastre após o outro: florestas queimadas, solo esgotado, drenagem de água, exposição de segredos e matança de pássaros. 

Harap Alb sozinho "não causou nenhum desastre".

O grupo finalmente chega à corte do Imperador Vermelho, onde Harap Alb anuncia sua intenção de sair com a garota. O Imperador Vermelho tenta eliminá-los alojando-os em uma casa de cobre e ordenando que ela aqueça a uma temperatura semelhante à de um forno. 

Gerilă com seu hálito frio esfriou. Como tática seguinte, o Imperador Vermelho convida o grupo para um banquete, apenas para testemunhar com alarme a rapidez com que sua comida e bebida são consumidas por Flămânzilă e Setilă. 

O imperador então exige um teste: eles devem separar um mierță (cerca de 200 litros) de semente de papoula de uma quantidade equivalente de areia fina no espaço de uma noite, mas isso é feito com a ajuda das formigas. 

O monarca então diz aos heróis que, se eles querem sua filha, eles devem guardar e seguir por mais uma noite, deixando-os saber que ele não conhece seus caminhos. 

À meia-noite, a princesa se transforma em um pássaro e escapa do palácio, mas, embora ela se refugie nos lugares mais inacessíveis, desde "a sombra do coelho" até o outro lado da Lua, ela é rastreada por Ochilă e eventualmente agarrada por Păsări-Lăţi-Lungilă.

O Imperador Vermelho dá seu teste final: Harap Alb deve distinguir a filha real de sua filha adotiva, que é sua cópia exata. Isso o protagonista realiza com a ajuda da abelha rainha, que identifica a verdadeira princesa e pousa em sua bochecha. 

Um desafio final é apresentado pela própria menina, como uma corrida entre sua pomba e seu cavalo, para ir ao local "de onde as montanhas batem cabeça a cabeça umas nas outras", e obter três galhos de sua macieira, três medidas da água da vida e três medidas da água morta. Embora mais lento, o cavalo força o pássaro que retorna a lhe entregar os itens e é o primeiro a retornar. A princesa aceita o resultado como seu destino, e agora acompanha de bom grado Harap Alb.

Os companheiros de Harap se dispersam e voltam para seus locais originais onde se juntaram ao grupo. Harap Alb se apaixona por sua refém e fica abatido com a perspectiva de ter que entregá-la ao Homem Careca.

Na corte do Imperador Verde, o Homem Careca tenta pegar a filha do Imperador Vermelho pelos braços, mas ela o rejeita completamente, expondo o Homem Careca por assumir uma identidade falsa e declarando que seu pretendido (ou seja, futuro marido) era o sobrinho do verdadeiro imperador, Harap Alb. 

O careca enfurecido corta a cabeça do herói com a espada larga que o príncipe fez seu juramento. O garanhão arrebata o Homem Careca com os dentes, voa alto para os céus e o joga no chão. A princesa conserta a cabeça e o corpo do príncipe, gira o galho de maçã três vezes sobre sua cabeça, reparando as feridas com a água morta e revivendo-o com a água da vida. 

A história termina com um casamento magnífico entre Harap Alb, reconhecido como sucessor do Imperador Verde, e a filha do Imperador Vermelho - uma festa que, de acordo com o relato do narrador, dura "até hoje".

Fonte:

quinta-feira, 3 de julho de 2025

Contos e Lendas do Japão (O gato assombrado de Nabeshima)


As folhas de momiji (acer), que da cor verde passaram para o amarelo e depois para o laranja, agora ganhavam uma cor vermelho vivo. Não só as árvores como o chão, forrado de folhas caídas, davam a impressão de que todo o jardim do castelo de Nabeshima havia pegado fogo. Era final de outono no Japão.

O príncipe de Hizen, um membro da família honrada de Nabeshima, tinha como sua concubina favorita uma mulher charmosa, cujo nome era Otoyo. Certa ocasião, os amantes passeavam no jardim do castelo e permaneceram apreciando as flores até o pôr-do-sol. No retorno, sem que eles percebessem, foram seguidos por um enorme gato negro.

Otoyo dirigiu-se para o seu quarto e sentiu uma inesperada indisposição. Tentou manter-se acordada, mas logo dormiu. À meia-noite, foi despertada por uma estranha sensação e viu dois olhos enormes que a fixavam brilhando na escuridão. Prestando bastante atenção, percebeu que se tratava de um enorme gato negro. Porém, antes que ela pudesse gritar pedindo ajuda, o animal saltou em sua garganta e mordeu-a profundamente, estraçalhando seu pescoço até a morte. O gato, então, foi lambendo o sangue da moça e adquirindo forma humana, ficando igual a sua vítima. Então, arrastou Otoyo para baixo do assoalho e enterrou o corpo sob a varanda.

O príncipe, que de nada sabia, não desconfiou nem um pouco da bela mulher que naquela noite o procurou para fazer amor. Assim, nos dias seguintes, como um ritual, ela o procurava no meio da noite e ia sugando seu sangue sem que a vítima percebesse. Em poucos dias, o príncipe de Hizen perdeu toda a força e seu rosto estava mais pálido que uma vela. Permanecia o dia todo deitado, pois já não tinha força para se levantar.

Os médicos do palácio prescreveram vários medicamentos, mas nenhum fez o efeito desejado. Suspeitaram então que alguém estava envenenando o príncipe.

Vários samurais montaram guarda ao redor de seu quarto. Porém, quando chegou o meio da noite, todos pegaram no sono e só acordaram na manhã seguinte. Nas noites que se seguiram, as mesmas coisas aconteceram. Nenhum soldado conseguia ficar acordado.

Os conselheiros concluíram que alguma força estranha, de poder sobrenatural, estava agindo naquela alcova. Chamaram monges budistas e sacerdotes xintoístas para fazer exorcismo no quarto, já que a saúde do príncipe ia piorando dia a dia. Foram semanas de orações e rituais diversos, mas de nada adiantou, a saúde do príncipe de Hizen ia de mal a pior.

Naquela ocasião, um samurai de nome Ito Soda, que serviu na infantaria de Nabeshima, atravessou o jardim de inverno e invadiu as proximidades do quarto do príncipe. Ele solicitou aos conselheiros que permitissem a ele permanecer escondido no quarto do enfermo, para desvendar como agia o espírito maligno que estava prejudicando seu senhor.

Seu pedido foi prontamente aceito, já que todas as tentativas tinham se mostrado infrutíferas. Ito ficou firme em seu posto, no entanto, como aconteceu com os guardas que o antecederam, a partir das dez horas, começou a sentir um sono irresistível. Para espantar seu sono, espetou sua faca profundamente em sua coxa, de modo que a dor aguda o mantivesse acordado.

De repente, as portas deslizantes do quarto do príncipe abriram-se, e uma linda mulher entrou e dirigiu-se ao leito. Ela agachou na cabeceira do príncipe e esticou o pescoço como quem vai beijar o adormecido. Porém, a mulher, pressentindo a presença de mais alguém no quarto, virou a cabeça e, com olhos brilhantes, disse:

– Tem alguém aí?

Ito permaneceu escondido e em silêncio, espiando pela fresta da porta do quarto ao lado. Percebendo que alguém a observava, ela levantou e saiu do quarto às pressas.

Na noite seguinte, a cena se repetiu. Assim, por não ter sido subjugado por duas noites seguidas enquanto dormia, a saúde do príncipe melhorou consideravelmente. Para Ito Soda, ficou claro que Otoyo era alguma entidade maligna tentando acabar com a vida do príncipe de Hizen. Diante disso, traçou um plano para acabar com ela.

Fingindo ser um mensageiro do príncipe, foi até o quarto dela, para entregar um bilhete que sua alteza lhe enviara. Ao aproximar-se da falsa Otoyo para entregar o suposto bilhete, Ito sacou da espada e desferiu um golpe na direção dela. Porém, com percepção felina, ela esquivou-se da lâmina pulando para trás. Na sequência, assumiu a forma de um gato preto e saltou pela janela. Ganhou o telhado do castelo e, segundos depois, fugia em direção à montanha.

Esse gato que gostava de lamber sangue humano passou a incomodar os habitantes da montanha. Tempos depois, o príncipe de Hizen, completamente recuperado, organizou uma caçada ao gato maldito de Nabeshima. Um exército com milhares de samurais vasculhou a montanha. Somente no oitavo dia, finalmente, o gato maldito foi liquidado e a paz voltou à região.
============================================================

Comentário:
Os primeiros gatos foram introduzidos no Japão por Fujiwara-no-Sanesuke, um nobre da corte do imperador Ichijo (987–1011). Trazidos da China, esses animais de estimação eram vistos com reserva pelos japoneses. Além de não serem obedientes como os cachorros, eram considerados destrutivos por natureza, por rasgarem tatami de palhas (tablado que servia de assoalho) e fazerem furos no shoji (parede de papel) para apanhar insetos que vinham as casas atraídos pelas lamparinas. Na época, a iluminação das casas era à base de lamparina a óleo, e os gatos gostavam de lamber esse óleo combustível, muitas vezes causando incêndio. Assim como a raposa, o texugo e a serpente, o gato era considerado um animal assombrado no antigo Japão.

Fonte: 
http://www.nippobrasil.com.br/

segunda-feira, 30 de junho de 2025

Contos e Lendas do Japão (O cavalo das cores e as sete berinjelas)


No Japão, existe um dito que diz: “Se ama seu filho, permita que ele viaje”. O imigrante japonês no Brasil conhece bem o sentido dessa frase.

Há muitos e muitos anos, numa aldeia rural do Japão, viviam dois inseparáveis amigos. Eisuke era filho do chefe da aldeia, uma família abastada, dona das terras daquela região. Goro era filho de pobres lavradores, que trabalhavam nas terras do pai de Eisuke. Apesar da diferença social econômica das famílias de ambos, eles viviam sempre juntos, desde quando pequeninos.

Certa ocasião, os dois, cansados de viverem dentro dos limites da aldeia, resolveram conhecer outras paragens e ganharam a estrada.

Caminhavam alegremente, ora cantando, ora tirando músicas assoprando folhas de bambu esticadas nos lábios. Prosseguiam a viagem despreocupados.

Dias depois, na travessia de uma montanha, perderam-se no meio da mata. A noite caiu, e a floresta transformou-se em completa escuridão. Apesar do medo, continuaram caminhando, pois permanecer ali parecia por demais perigoso. De repente, avistaram uma luz no meio da mata. Os dois rumaram apressados em direção à luz, pois devia, com certeza, ser uma casa. Por sorte, era uma hospedaria. Os meninos ficaram animados e pediram uma pousada para uma velha dona da pensão. Cansados que estavam, logo Eisuke adormeceu. Goro, que nunca tinha dormido numa hospedaria, apesar de exausto, não conseguia pegar no sono.

De repente, percebeu que uma pessoa estava atrás de um shoji (parede móvel de papel), então fechou os olhos e fingiu que estava dormindo. De olhos semi-cerrados, viu que a dona da pensão olhou para dentro do quarto e, vendo que os dois estavam dormindo, deu uma risada horripilante e se afastou do corredor. Goro ficou arrepiado de medo, aquela não era uma situação normal.

Da porta corrediça que a velha deixou semi-aberta, Goro podia vê-la na sala no fim do corredor. A velha sentou-se perto do irori (fogareiro), mexeu as cinzas com dois palitos de ferro e acendeu o fogo assoprando as brasas no centro do irori. Em seguida, depositou algumas sementes nas cinzas. Goro não estava entendendo nada do que estava acompanhando.

Para a surpresa do menino, como sementes plantadas começaram a brotar e a crescer em segundos. Como folhas finas e compridas denunciavam que eram pés de arroz, que incrivelmente vieram a soltar cachos, que  carregados, fizeram como hastes curvarem. Segundos depois, os cachos pendentes ficaram amarelos e prontos para ser colhidos.

A velha colheu o arroz, tirou a casca esfregando-o em uma peneira de bambu e cozinhou-o no fogareiro. Depois, amassou-o num pequeno pilão e fez quatro motis (bolinhos de arroz glutinoso). Goro, que assistiu a tudo, pensou em contar para o amigo, mas vendo Eisuke roncando, resolveu deixar para o dia seguinte. Cansado, Goro também acabou pegando no sono.

No dia seguinte, quando Goro despertou, o sol já estava alto. Olhou para o leito ao lado e viu que Eisuke já havia se levantado. Então, levantou-se depressa e correu para a sala. A dona da hospedaria estava oferecendo os bolinhos para Eisuke. Goro gritou para que ele não comesse aquele moti, porém, era tarde. Eisike havia posto o bolinho na boca e degustou-o com satisfação.

– Nossa, que bolinho gostoso. Quero mais.

– Sim, coma! – disse a dona da pensão.

– Não coma! – gritou Goro.

Mas era tarde. Eisuke botou as mãos sobre a barriga, começou a se contorcer e, por mais incrível que possa parecer, transformou-se num cavalo. Um cavalo bonito, mas diferente de todos os cavalos que o homem tinha visto até então. Um cavalo todo colorido, como se fosse um cavalo de circo. Goro ficou paralisado de susto. Compreendeu que era a velha dona da pensão, na verdade, uma Yamanbá (bruxa da montanha), que transforma todos os viajantes que se hospedam. Já havia ouvido qualquer coisa a respeito, mas não acreditou que pudesse ser verdade. No entanto, seu amigo Eisuke era agora um cavalo de sons, com colorido impressionantemente belo e maluco.

– É sua vez. Coma os motis, garoto – disse a velha, esticando o prato com dois bolinhos ao garoto.

Goro estava paralisado de medo, mas numa reação desesperada, derrubou o prato dos bolinhos com um mão e saiu correndo da casa. Correu desesperado, sem rumo, até que avistou uma casa de lavrador no vale.

Quando Goro abriu os olhos, estava estirado sobre um tatame (esteira de palha) na casa do vale. Um velho com barba e cabelos compridos, que observava seu desespero, sorriu e disse:

– Vejo que está melhor. Você bateu na minha porta e desmaiou de canseira.

– Estou com sede. Muita sede – disse Goro, percebendo que estava diante de um Sennin (sábio imortal), e que só ele poderia ajudá-lo a salvar seu amigo.

Depois que tomou várias tigelas de água, Goro contou o ocorrido ao bom velhinho e pediu ajuda para salvar seu amigo. O ancião ensinou, então, que o único modo de salvar seria fazer Eisuke comer sete berinjelas de um mesmo pé.

– Só assim seu amigo voltará a ser humano. 

Em seguida, o velho fez um mapa ensinando o homem onde poderia encontrar uma grande plantação de berinjelas e como chegar de volta à casa da Yamanbá. 

Assim, Goro, agradecendo ao velhinho, seguiu o que indicava o mapa. Uma plantação de berinjela era enorme. Goro saiu contando pé por pé quantas berinjelas tinha cada um. Depois de muitas horas, finalmente achou um pé com as sete berinjelas. Então, arrancou o arbusto e foi em direção à casa da Yamanbá.

O cavalo estava amarrado em uma árvore ao lado da “hospedaria”. Goro aproximou-se sorrateiramente, desamarrou a corda e disse:

– Eisuke, escute, sou eu, Goro.

O cavalo olhou-o como se reconhecesse o amigo e balançou a cabeça no sentido vertical.

– Olha, você tem que comer estas sete berinjelas. Assim que comer, o encanto se quebrará, e você voltará a ser gente – o cavalo fez movimento horizontal com a cabeça, como quem desaprova uma ideia.

– Puxa, agora lembrei que você não gosta de berinjelas. Sua mãe vive dizendo para você comer berinjelas, mas você detesta. Só que, desta vez, você vai ter de comer estas sete, se não quiser ser cavalo para o resto da vida. Essas berinjelas foram sugeridas por um Sennin, não tem erro.

Assim, fazendo cara de poucos amigos, o cavalo começou a comer as berinjelas. Depois, ao digerir a última, como num passe de mágica, voltou a ser Eisuke. Os dois se abraçaram de alegria e trataram de fugir do local o mais rápido possível. 

De volta à aldeia, cada um foi para sua casa e, durante bom tempo, tiveram histórias para contar. Anos depois, tornaram-se sócios em uma plantação de berinjelas e continuaram bons amigos para sempre.

Fontes: 
http://www.nippobrasil.com.br
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Contos e Lendas do Japão (As origens de Maneki-Neko)


Conhecido em todo o mundo como talismã da sorte e, particularmente, como talismã que atrai freguesias para casas comerciais, o Maneki-neko, o gatinho enviado que tem uma patinha levantada, tem diferentes versões a respeito de sua origem, conforme a região do Japão. 

Esta é uma das versões do lado leste do Lago Biwa, na região central do Japão.

Conta a lenda que quando o senhor guerreiro Ii Naotaka (1590~1659) voltava do cerco e tomada do Castelo de Osaka, após ter comandante 3,2 mil homens e se destacado na Batalha de Tennoji, em março de 1615, surpreendido por uma chuva repentina, abrigou-se embaixo de uma árvore próxima do Templo Gotokuji, em Setagaya.

Gotokuji, na época, era um templo decadente, com pouca frequência de fiéis e, portanto, muito pobre. No templo, vivia um monge budista e uma gata de nome Tama. Solitário, o monge conversava com a gatinha lamentando quase uma situação de penúria do templo.

– A situação está cada vez pior. Hoje, nem temos arroz para comer. Bem que você pode dar uma ajuda para melhor nossa situação, em vez de ficar dormindo o dia inteiro.

Esperando a chuva passar sob a árvore, Ii Naotaka olhou para o velho templo e viu o gato sentado sobre suas patas traseiras e acenando com uma pata dianteira levantada. O samurai ficou encantado pela habilidade do bichinho e foi em direção do templo para ver de perto.

Quando Naotaka chegou junto ao templo, um raio fulminante atingiu a árvore exatamente no local em que ele estava encostado. O guerreiro então percebeu que aquele gesto do gato salvou sua vida. Então, entrou no templo para rezar em agradecimento à graça recebida.

No salão principal, havia várias goteiras, e todo o templo estava em condição lamentável. Naotaka fez oferenda de todo o dinheiro que carregava ao altar, comendo com o monge que com a sabedoria de Buda ia usar aquele dinheiro para reformar o templo. Após esse episódio, Naotaka passou a frequentar o Gotokuji, e o local tornou-se, então, o templo oficial da família de Ii Naotaka. Consequentemente, tornou-se um próspero local e visitado por todas pessoas do feudo.

Para homenagear o gesto de Tama, que tanta sorte trouxe ao templo e salvou a vida de Naotaka, foi esculpido e colocado no local uma estátua da gata com uma pata levantada. Como réplicas em miniaturas da estátua, foram distribuídas no Templo Gotokuji como lembrança, tornaram-se, mais tarde, amuleto da sorte, com o nome de Maneki-Neko.

Outra versão

História também bastante conhecida, surgida nos meados da Era Edo (1615~1868), conta que existiu, no bairro de Imado, em Edo (hoje Tóquio), uma velha senhora que tinha um gato de estimação. A velhinha estava em péssimas condições financeiras, porque, devido à idade avançada, não conseguia arranjar um trabalho para garantir seu sustento.

Numa determinada ocasião, a situação ficou tão crítica, que ela não tinha mais como alimentar seu gatinho. Então, conversando com o bichinho, disse:

– É com o coração partido que terei de abandonar você. Devido à minha condição de extrema pobreza, não tenho como continuar a te alimentar.

Depois, com lágrimas nos olhos e barriga roncando, a velhinha foi dormir. Em seu filho, o gato apareceu e disse:

– Molde minha imagem em barro, que trará muita sorte.

No dia seguinte, ela resolveu fazer uma estatueta do gato, conforme o filho havia sugerido. Enquanto ela moldava o barro, o gato estava “lavando a cara” com gestos exagerados e, a velhinha resolveu moldar o bichinho com uma pata levantada. Nisso, passou uma pessoa em frente de sua casa e, achando interessante, quis comprar a estatueta. 

Como estava dias sem comer, a velhinha vendeu a estatueta e comprou comida para ela e o gato. Assim, de barriga cheia, resolveu fazer outra estatueta para deixar como talismã da sorte. Porém, apareceu outra pessoa e comprou a segunda estatueta

Quanto mais a velhinha fazia estatuetas, mais aparecia gente para comprá-las. Com isso, ela mudou de vida e nunca mais passou necessidades. E a estatueta da sorte passou a ser conhecida como Maneki-Neko.

Fonte: 
http://www.nippobrasil.com.br/