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quinta-feira, 5 de junho de 2025

Figueiredo Pimentel (A moça do lixo)


Passavam um dia duas fadas por um jardim formosíssimo e bem tratado, quando viram um monte de estrume que o chacareiro havia deixado para estercar a terra.

– Que coisa nojenta! – Disse uma delas. – Como é que se consente num jardim tão belo tamanha porcaria, ainda que seja por um momento!...

– Tive uma ideia, disse a outra. – Eu faço para que essa esterqueira se transforme numa mulher tão linda como Leona, a princesa adivinha, que é a mais formosa criatura do mundo.

– E eu faço, retorquiu a outra, para que ela tenha um anel no dedo. Enquanto estiver com esse anel, só poderá pronunciar a palavra “porcaria”, sem que nada mais possa dizer. Tirando-lhe o anel, será uma moça instruída e espirituosa, ao passo que, quem o usar, ficará com o mesmo defeito.

As duas fadas desapareceram, e, do estrume, surgiu uma moça maravilhosamente formosa.

Era nos jardins reais. O príncipe, passando por acaso, viu-a e ficou apaixonado. Perguntando-lhe quem era, de onde vinha, como se chamava, só obteve em resposta:

– Porcaria! Porcaria!...

Admirado por ouvir aquela grosseria, tão suja, em boca tão formosa, sua alteza insistiu. Em vão! A deslumbrante moça respondia sempre:

– Porcaria!... Porcaria!...

O príncipe quis fazê-la sua esposa, mas o rei, os ministros, os conselheiros da coroa e os grandes dignatários não o consentiram.

Não podendo, entretanto, deixar de vê-la a todos os instantes, o futuro soberano fê-la alojar no palácio.

Tempos depois teve de se casar, como era obrigado por lei. Deram-lhe como noiva uma princesa, filha de um imperador vizinho e aliado.

Preparando-se a toalete da noiva, uma criada lembrou-se que Porcaria tinha um anel sem igual.

Tirou-o, e apresentou-o à sua nova ama, que o enfiou no dedo.

Quando o cortejo chegou à igreja, na hora da celebração do casamento, perguntando o padre à noiva, se livremente recebia o príncipe, ouviu-a dizer:

– Porcaria!... Porcaria!...

Não houve meios de se lhe arrancar outra coisa: – Porcaria!... Porcaria!... falava sempre. O príncipe, em vista daquilo, exclamou:

– Não! Não me serve! Porcaria por porcaria, tenho lá na palácio uma melhor.

Foram buscar a outra, que encontraram falando e conversando com todo o espírito, e o casamento foi celebrado.
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ALBERTO FIGUEIREDO PIMENTEL nasceu e morreu em Macaé/RJ, 1869 — 1914 foi além de poeta, contista, cronista, autor de literatura infantil e tradutor. Manteve por muitos anos, desde 1907, uma seção chamada Binóculo na Gazeta de Notícias. Publicou novelas, poesia, histórias infantis e contos. Um de seus grandes êxitos foi o romance O Aborto, estudo naturalista, publicado em 1893, e por mais de um século completamente esgotado. Como poeta, participou da primeira geração simbolista chegando a se corresponder com os franceses. Era amigo de Aluísio Azevedo, com quem trocou cartas, enquanto o autor de O Cortiço estava fora do país como diplomata. Poeta, romancista, escritor de literatura infantil, ganhou destaque e se perpetuou nos compêndios da literatura brasileira. A coluna Binóculo, assinada pelo autor na Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, de 1907 até 1914, obteve grande sucesso entre leitores e leitoras, ditando moda, o que faz de Figueiredo Pimentel o primeiro cronista social da capital. Era ele quem tratava das novidades da moda, do bom gosto, do chique em voga em Paris e que deveria ser aqui aclimatado. Obras: Fototipias, poesia, 1893; Histórias da avozinha, conto - somente em 1952; Histórias da Carochinha; Livro mau, poesia, 1895; O aborto, 1893; O terror dos maridos, romance e novela, 1897; Suicida, romance e novela, 1895; Um canalha, romance e novela, 1895.

Fontes:
Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado originalmente em 1896. 
Disponível em Domínio Público. 
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quarta-feira, 4 de junho de 2025

Monteiro Lobato (A história dos macacos)


Antigamente, lá no começo do mundo, os macacos moravam com os homens nas cidades. Falavam como eles, mas não trabalhavam. 

Certa vez houve uma grande festa. Durante um dia e uma noite o tantã não parou de soar. Todos dançavam e bebiam um vinho feito de caldo de palmeira, porque ainda não era conhecida a uva. O velho chefe da tribo saiu dali cambaleando e foi parar no bairro dos macacos. 

Antes não fosse! Os macacos judiaram dele. Uns puxavam-lhe a tanga, outros punham-lhe a língua, outros beliscavam-lhe a pele. Tamanha foi a falta de respeito que o velho chefe enfureceu-se a ponto de queixar-se a Nzame, a divindade da tribo. 

Nzame mandou chamar o chefe dos macacos. Passou-lhe uma grande descompostura e disse: 

— De hoje em diante, como castigo, os macacos têm que trabalhar para os homens. 

Mas os macacos revoltaram-se contra a ordem do deus. Juraram não trabalhar. Quando iam para a roça, penduravam-se nas árvores do caminho, davam pulos pra aqui, pra ali, fugiam. Não houve meio de conseguir deles nenhum trabalho. O chefe da tribo se enfureceu. 

— Preciso dar uma lição nesta macacada. 

Depois de refletir algum tempo deu ordens, para uma grande festança, onde houvesse muito vinho. Mas dividiu as cabaças de vinho em dois lotes — um de vinho puro e outro de vinho misturado com uma erva dormideira. 

"Este é para os macacos" disse ele. 

Quando os macacos souberam da grande festa e da grande vinhaça, aproximaram-se todos muito xeretas. Dançaram, pularam e beberam até não poder mais. Meia hora depois dormiam sono profundo. 

O chefe, então, mandou que os seus homens metessem o chicote nos macacos até deixá-los peladinhos — e no dia seguinte botou-os no serviço. 

Mas quem pode com macaco? 

O berreiro que fizeram foi tamanho que o chefe, completamente zonzo, deu ordem para que lhes cortassem a língua. 

"É o único meio de acabar com esta gritaria." 

Ficaram os macacos sem línguas — mas dois dias depois sumiram-se da aldeia, afundando no mato. Nunca mais quiseram saber dos homens — e também nunca mais falaram. Quem tem língua cortada não fala.
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Monteiro Lobato (José Bento Renato Monteiro Lobato) nasceu em 1882, em Taubaté/SP, e faleceu em 1948, em São Paulo. Foi promotor, fazendeiro, editor e empresário. Apesar de também escrever para adultos, ficou mais conhecido por causa dos seus livros infantis. Faz parte do pré-modernismo e escreveu obras marcadas pelo realismo social, nacionalismo e crítica sociopolítica. Já seus livros infantis da série Sítio do Picapau Amarelo possuem traços da literatura fantástica, além de apresentarem elementos folclóricos, históricos e científicos.Em 1900, ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo. Em 1903, se tornou um dos redatores do jornal acadêmico O Onze de Agosto. Escreveu também para periódicos como Minarete, O Povo e O Combatente. Se formou em Direito no final do ano de 1904. Em 1908, se casou com Maria da Pureza. Com a morte do avô, em 1911, o escritor recebeu como herança algumas terras. Assim, decidiu morar na fazenda do Buquira. Ele passou a ser conhecido quando, em 1914, sua carta “Uma velha praga” foi publicada n’O Estado de S. Paulo. Em seguida, o autor criou o personagem Jeca Tatu. Três anos depois, desistiu da vida de fazendeiro e se mudou para São Paulo. Nesse ano, publicou o polêmico artigo Paranoia ou mistificação?, que critica as tendências modernistas. No ano seguinte, comprou a Revista do Brasil. Em 1920, fundou a editora Monteiro Lobato & Cia. Cinco anos depois, vendeu a Revista do Brasil para Assis Chateaubriand (1892–1968) e decretou a falência da editora Lobato & Companhia, que, a essa altura, já se chamava Companhia Gráfico-Editora Monteiro Lobato. Ele se tornou sócio da Companhia Editora Nacional. Se mudou para o Rio de Janeiro, em 1925. Dois anos depois, foi para Nova York, onde assumiu o cargo de adido comercial. Em 1929, devido à crise econômica, vendeu suas ações da Companhia Editora Nacional. No final de 1930, quando Getúlio Vargas (1882–1954) subiu ao poder, o escritor perdeu seu cargo de adido comercial. Retornou ao Brasil no ano seguinte. Em 1932, foi um dos fundadores da Companhia Petróleo Nacional. Anos depois, em 1941, o autor ficou preso, durante três meses, por fazer críticas ao regime ditatorial de Getúlio Vargas. Se tornou sócio da Editora Brasiliense, em 1946, ano em que decidiu morar na Argentina, onde foi um dos fundadores da Editorial Acteón. Voltou ao Brasil em 1947 e fez críticas ao governo de Eurico Gaspar Dutra (1883–1974). Em 1922, decidiu concorrer à cadeira número 11 da Academia Brasileira de Letras. Porém, desistiu da candidatura por não querer “implorar votos”. Já em 1926, voltou atrás e, novamente, concorreu a uma vaga na ABL, mas não foi eleito. Por fim, em 1944, recusou indicação para a Academia, em protesto por Getúlio Vargas ter sido eleito à Academia Brasileira de Letras em 1941

Fontes:
Monteiro Lobato. Fábulas. Publicado originalmente em 1937.
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quarta-feira, 14 de maio de 2025

David de Carvalho (Bentinho da Samambaia)


Cada um cai do cavalo como quer. Através de uma série de contos da roça, o autor, David de Carvalho, pretende mostrar algumas realidades estratificadas no quadro sócio-cultural de Minas Gerais, procurando captar, também, na temática, traços típicos do comportamento do montanhês, tais como o humor e a tristeza. 
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Indo para o Largo da Capela do Rosário, o Doutor Alonsinho caminha firme e prumado. Indo ao lado dele, meio encumbucado, o Bentinho da Samambaia ora coçava as costas, ora ajeitava a correia. De repente, ele tirou um envelope amarrotado do bolso traseiro da calça:

– Recebi hoje notícias do primo Florindo, que está bem de vida em São Paulo, só trabalhando como servente de pedreiro, mas não entendi o raio dos rabiscos dele, porque os garranchos parecem letras de médico. Está parecendo que ele escreveu assim: “Bentinho, partiu-se o pote no cimento do meio-fio, ô fim de mundo!”

O Doutor Alonsinho pegou o cartão:

– Por favor, deixe-me ver!

O Doutor Alonsinho correu os olhos nos dizeres do cartão:

– Bentinho, você está confundindo topografia com caligrafia e posto artesiano com parto cesariano. Você fugiu da escola? O que está escrito aqui é o seguinte: “Bentinho, participo-te o nascimento do meu filho, o Sigismundo.” Tinha razão o seu pai, o velho Agripino, quando recomendava a você que alisasse mais o banco na escola do Mestre Candinho.

O Bentinho da Samambaia coçou o rosto:

– É!… Deveras, o velho Agripino me recomendava isso. E também: – “Bento, se de tudo você vier um dia a pensar em deixar a lida da roça, então aprenda primeiro o ofício de pedreiro, ainda que não seja um pedreiro inteirado e sim um meia-colher, porque na reconstrução da Europa, depois de acabar a guerra, você vai ficar podre de rico.”

O Doutor Alonsinho franziu a testa:

– Bentinho, qual é o animal que faz cocô em forma de grão de café?

– Cabrito, uai!

– Em forma de bolinho do tamanho de um ovo?

– Cavalo, ora pois!

– E em forma de uma broa?

– Cuá! Só pode ser boi.

– E em que dia, mês e ano Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil?

– Ah! Isso lá eu vou saber, doutor?!

– Você só entende é de cocô mesmo! E fique sabendo que a pessoa que não aprende a escrita e a leitura torna-se desconfiada, a ponto de deixar passar a oportunidade de ganhar dinheiro.

O Bentinho da Samambaia mudou de assunto:

– Doutor, aquele de peito estufado que vai indo ali na frente, de chapéu de aba larga, lenço vermelho no pescoço e botas de cano como sanfona, é o Já Caiu. Hi-hi-hi!… Explico melhor, é o Lindolfinho das Cachebras, mas só é conhecido pelo apelido, desde certa vez num rodeio na cidade de Cláudio, com a tropa do Zé Capitão, fazendeirão lá das bandas de Divinópolis. Antes de montar na égua Pinga Fogo, o Lindolfinho das Cachebras virou para a assistência e acenou o chapelão de aba larga: – “Vou fazer esta égua pingar fogo de suor e dançar no compasso do estalo da minha tala.”

O Bentinho da Samambaia voltou a ajeitar a correia:

– Êta diaba de calça que não pára no lugar! A gente sunga, sunga, e não adianta. Ãh? E daí? Daí que o Lindolfinho das Cachebras caminhou pomposo para o meio do campinho onde a Pinga Fogo estava arreada, laçada, sugigada pelo Quinquim Barba e dois capatazes do Coronel Quinto Tolentino. Parecendo ter o rei na barriga, o Lindolfinho das Cachebras montou nela e ficou acenando o chapelão de aba larga para Deus e todo o mundo e contando farofa: – “Ah, eguinha mixuruca e pangaré, agora é que você vai conhecer um peão bamba!” Atrás de um funilão, o Múcio da Dona Quita animava o peão: – “O Zé Capitão oferece cinquenta contos de réis para o Lindolfinho das Cachebras, se ele conseguir segurar os pulos da Pinga Fogo. Fulano oferece tanto. Beltrano oferece tanto. Sicrano oferece tanto.” E o Múcio da Dona Quita anunciou com todo o rompante: – “Agora, vai montar na Égua Pinga Fogo o …” O Quinquim Barba e os dois capatazes soltaram a bicha e o Múcio da Dona Quita completou: – “Já caiu!”

O Bentinho da Samambaia enfiou a barra da camisa por dentro da calça:

– Enquanto o Lindolfinho estava batendo a poeira da roupa, cheguei perto dele: – “Você machucou?” Com cara de tatu que caiu da garupa, ele ficou me olhando com os olhos parados: – “Eu não e você?” Ora! Que pergunta mais estonteada. Então eu estava bancando o peão? Olhei sério para ele: – “Você deu uma pirueta muito esquisita. Achei até que você tivesse quebrado o pescoço.” Ele me encarou de cara fechada: – “Deixe de ser bobo, sô, porque cada um cai do cavalo como quer! E fique sabendo que, até para cair, o peão precisa de ter a sua destreza!” Deixei para lá. Daí que ele passou a ser conhecido só por Já Caiu.

Já passando em frente da Capela do Rosário o Bentinho da Samambaia tirou o chapéu de palha, fez o em-nome-do-padre e reajeitou a calça:

– Doutor Alonsinho, este “causo” puxou outro na minha ideia. Naquele tempo, eu costumava vir cá para o Arraial do Empanturrado no fim de semana. E ficava sapeando na alfaiataria do Dico. Como o Dico tinha sempre que dar umas saidinhas, eu ficava tomando conta da alfaiataria para ele. Até passar ferro de brasa nuns panos eu passava. Certo dia, lá estava eu, quando apareceu lá um viajante de tipo prosa, pândego e gorducho e me perguntou onde era o negócio do Vivico da Venda. Expliquei para ele e, de troça, recomendei que falasse gritado com o Vivico, porque ele era surdo que nem uma porteira. Na hora, até inventei um “causo” e contei para ele, que certa vez o Vivico, quando estava com a mulher perrengue e desenganada, estava xingando no mandiocal no fundo da horta da casa dele, porque uma porca tinha fuçado por lá. Disse até que encomendei ao Vivico para colocar uma peia ou forquilha como canga na fujona. E que, no outro dia, passando pelo mesmo lugar, lá estava de novo o Vivico. Que então perguntei como ia passando a comadre, a mulher dele. E ele, que por ser surdo que nem tiú, achou que eu estava perguntando pela porca, me respondeu: – “Não usei nem peia e nem forquilha. Preferi colocar a bicha no chiqueiro de engorda.”

O Bentinho da Samambaia tirou do bolso traseiro um lenço e passou na testa:

– Assim que o viajante saiu, passei em frente da venda do Vivico. Então, expliquei para ele que acabava de sair da alfaiataria um viajante procurando a venda dele. E recomendei ao Vivico que o mesmo era muito surdo e que conversasse gritado com ele. Fiquei imaginando a gritaria que os dois iam arrumar. Mais tarde, eu estava soprando atrás do ferro de brasa na alfaiataria do Dico, quando voltou o viajante gorducho, alegre e pândego e me apertou a mão: – “O senhor está de parabéns, porque, andando pelo arraial, só li letreiros escritos com erro: Bazar Ção Pedro, Pharmácia Bom Jezus…” O gorducho passou as palmas das mãos na barrigaça: – “Daí que voltei para a ospedaria, sem h mesmo e resolvi dar um prêmio de quinhentos mangos para o dono do letreiro que estivesse escrito corretamente. E o único que encontrei certo foi o do senhor. Portanto, a Alfaiataria Águia de Ouro está de parabéns. Então, aqui está o prêmio, a pelega.” Pensei comigo: – “O que ele está querendo é tirar desforra do trote, pois deve ter gritado tanto no ouvido do Vivico e o Vivico no dele, até que descobrissem a minha malasartice.” Virei para o viajante: – “Aqui mais aqui para o senhor! O senhor está querendo troçar comigo, porque o nome certo é Alfaiataria Agúia de Ouro.” Ele arregalou os olhos: – “Agulha?!” Fechei a cara para ele? – “Não. Agúia mesmo, porque cada um cai do cavalo como quer.”
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(David de Carvalho, ensaísta, contista, pesquisador. Itaúna/ MG)

Fontes:
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quarta-feira, 7 de maio de 2025

Luís da Câmara Cascudo (O Papagaio Real)


Duas moças moravam juntas e eram irmãs, uma muito boa e outra maldizente e preguiçosa. Cada uma tinha seu quarto. 

A mais velha começou a notar um barulho de asa e depois fala de homem no quarto da irmã. Ficou desconfiada e foi olhar pelo buraco da fechadura. Viu uma bacia cheia d’água no meio do quarto. Quando deu meia-noite chegou na janela um papagaio enorme, muito bonito e voou para dentro, metendo-se na bacia, sacudindo-se todo, espalhando água para todos os lados. Cada gota d’água virava ouro, e o papagaio, quando saiu do banho, foi um príncipe mais formoso do mundo. Sentou-se ao lado da irmã e ficaram a conversar animados como noivos.

A irmã ficou roxa de inveja. No outro dia, de tarde, encheu o peitoril da janela de cacos de vidro, assim como a bacia. Nas horas da noite o papagaio chegou e, batendo no peitoril, cortou-se todo. Voou para a bacia e cortou-se ainda mais. Arrastando-se, o papagaio não virou príncipe, mas chegou até a janela e disse para a moça, que estava assombrada com o que sucedera:

– Ai, ingrata! Dobraste-me os encantos! Se me quiseres ver, só no reino de Acelóis.

E, batendo asas, desapareceu. A moça quase se acaba de chorar e de se lastimar. Brigou muito com a irmã e deixou a casa, procurando o noivo pelo mundo. Ia andando, empregando-se como criada nas casas só para perguntar onde ficava o reino de Acelóis. Ninguém sabia ensinar e a moça ia ficando desanimada.

Uma noite, depois de muito viajar, já cansada, ficou com medo dos animais ferozes e subiu em uma árvore, escondendo-se bem nas folhas. Estava amoquecada quando diversos bichos esquisitos chegaram para baixo do pé de pau e pegaram a conversar.

– De onde chegou você?

– Do reino da Lua!

– E você?

– Do reino do Sol!

– E você?

– Do reino dos Ventos!

A moça prestou atenção. No primeiro cantar dos galos sumiram-se todos, e ela desceu e continuou a marcha. Andou, andou, até que chegou em outra mata e, para não ser devorada, trepou numa árvore. Lá em cima, quando a noite ficou bem fechada, chegaram umas vozes no pé do pau.

– De onde veio?

– Do reino da Estrela!

– De onde veio?

– Do reino de Acelóis!

– Que novidades me traz?

– O príncipe está doente e ninguém sabe como tratar dele...

A moça botou reparo e na madrugada seguiu no mesmo rumo pois as vozes já tratavam do reino de Acelóis. Andou, andou, andou. Finalmente, quando anoiteceu, estava dentro de uma floresta. Subiu em um pau e ficou quieta, lá em cima. Mais tarde as vozes começaram na falaria:

– De onde vem você?

– Do reino de Acelóis!

– Como vai o príncipe?

– Vai mal, coitado, não tem remédio!

– Ora não tem! Tem! O remédio é ele beber três gotas de sangue do dedo mindinho de uma moça donzela que queria morrer por ele!

Quando amanheceu o dia, a moça colocou-se na estrada. Ia o sol se sumindo quando ela avistou o reinado de Acelóis. Entrou no reinado e pediu agasalho numa casa. Na hora da ceia perguntou o que havia e disseram que o assunto da terra era a doença do príncipe. 

A moça, no outro dia, mudou os trajes, foi ao palácio e pediu para falar com o rei.

– Rei Senhor! Atrevo-me a dizer que ponho o príncipe bonzinho se Rei Senhor me der, de tinta e papel, a metade do reinado e de tudo quanto lhe pertencer.

O rei deu, de tinta e papel, a metade de tudo quanto possuía. A moça foi para o quarto, meou um copo d’água, furou o dedo mindinho, botou três gotas de sangue dentro, misturou e mandou ele beber. Assim que o príncipe engoliu, foi abrindo os olhos, levantando-se da cama e abraçando a moça, numa alegria por demais.

O rei ficou muito satisfeito e quando o príncipe disse que aquela era a sua verdadeira noiva desde o tempo em que ele estava encantado em um papagaio real, o rei não quis dar consentimento porque a moça não era princesa. A moça então falou:

– Rei Senhor! Tenho por tinta e papel a metade de tudo quanto é do rei senhor neste reinado. O príncipe é do rei senhor e eu tenho por minha a metade dele. Se rei senhor não quiser que eu case com ele, inteiro, levarei para casa uma banda.

Ao ouvir falar em cortar o príncipe pelo meio, como a um porco, o rei chegou-se às boas e deu o consentimento. 

Foram três dias de festas e danças e até eu me meti no meio, trazendo uma latinha de doce, mas na ladeira do Encontrão, dei uma queda e ela, paf! – no chão!...
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Luís da Câmara Cascudo nasceu em Natal/RN, em 1898 falecendo na mesma cidade em 1986. Foi um historiador, sociólogo, musicólogo, antropólogo, etnógrafo, folclorista, poeta, cronista, professor, advogado, jornalista e escritor brasileiro. Passou toda a sua vida em Natal e dedicou-se ao estudo do folclore e da cultura brasileira. Foi professor da Faculdade de Direito de Natal, hoje Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), cujo Instituto de Antropologia leva seu nome. Deixou obra volumosa e de grande relevância, em particular sobre história, folclore e cultura popular. Recebeu o Prêmio Machado de Assis pela Academia Brasileira de Letras, em 1956, pelo conjunto de sua obra.

Fontes:
Luís da Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. Publicado originalmente em 1946. Disponível em Domínio Público.
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quinta-feira, 1 de maio de 2025

Figueiredo Pimentel (A rainha das águas)


O reino da Pérsia foi há séculos passados governado pelo rei Nebul.

Esse rei, que vivia muito feliz governando o povo com sabedoria, um dia ficou cego.

Mandou chamar todos os médicos do seu reino, todos os curandeiros, todas as feiticeiras, para lhe darem algum remédio que o curasse.

Nada puderam conseguir.

Já estava Nebul desanimado, e conformado com a sua triste vida, quando um dia, apareceu uma velhinha, pedindo esmola.

Sabendo que o rei havia cegado, pediu para lhe ensinar o remédio que o havia de curar.

O rei mandou entrar a velhinha, que lhe disse:

– Saiba vossa real majestade que no mundo só existe um remédio capaz de o fazer recobrar a vossa preciosa vista. Existe num reino muitíssimo distante daqui, uma fonte chamada de rainha das Águas. Se alguém conseguir um pouco dessa água, e colocá-la sobre os olhos, imediatamente verá tão bem como um pássaro. Mas é muito difícil ir a esse reino. Quem for buscar a água deve se entender com uma velhinha que mora perto da fonte. Essa velhinha é quem há de informar se o dragão que vigia a entrada da fonte está dormindo ou acordado, porque a fonte está situada atrás de umas montanhas muito altas, e, se alguém for visto pelo terrível bicho, morrerá no mesmo instante.

O rei Nebul deu à velhinha grande quantia e retirou-se para os seus aposentos.

Mandou preparar uma grande esquadra composta de duzentos navios, e enviou seu filho mais velho, o príncipe Agar, para buscar a água, dizendo que lhe dava o prazo de um ano para estar de volta, aconselhando-o que não saltasse em país algum, para não se distrair; e que, se naquele prazo não voltasse, considerá-lo-ia morto pelo dragão.

O moço partiu: e depois de viajar muito, foi aportar a um país estranho e mito rico.

Saltou em terra, e começou a se divertir a ponto de gastar todo o dinheiro que levava, e a contrair dívidas, pelo que ficou preso.

Passado o ano, Nebul, não o vendo voltar, ficou triste, julgando-o morto.

Mandou preparar nova esquadra de quinhentos navios, porque supunha que seu filho morrera na guerra que travara no reino das Águas, em busca do remédio para a sua cegueira.

Enviou seu segundo filho, o príncipe André.

Fez-lhe a mesma recomendação:

– Se no prazo de um ano, meu filho, não estiveres de volta, terei que chorar a tua morte.

Partiu André e, depois de muito viajar, aportou ao mesmo país que seu irmão Agar.

Aí, fascinado pelas festas, gastou tudo quanto levara, contraiu grandes dívidas, e, como seu irmão, ficou preso.

Passado um ano, vendo o rei que o seu outro filho não voltava, ficou desanimado, e sem esperanças de recuperar a vista, pois supunha que André houvesse tido o mesmo fim que o primeiro.

Então, o mais moço, o jovem Oscar, que ainda era menino, foi se oferecer para ir buscar o remédio.

– Agora, quero ir eu, meu pai; e se for, garanto que lhe trarei a água.

O rei começou a brincar.

– Como queres tu ir, meu filho? Não vês a sorte de teus irmãos mais velhos? Que é feito deles? Morreram. Como posso eu deixar que faças semelhante viagem? Seria até um contrassenso.

O menino tanto insistiu, tanto pediu, tanto rogou, que, afinal, o rei, para o contentar, lhe concedeu a licença pedida.

Mandou preparar uma esquadra de cem navios, menor que a dos outros dois príncipes, e disse a Oscar que partisse quando quisesse.

O menino, antes de partir, foi assistir à missa no palácio, e pediu com todo o fervor a Nossa Senhora que o protegesse na empresa a que ia se arriscar.

Partiu no dia seguinte, e, depois de muito navegar, foi aportar no mesmo país onde estavam seus irmãos presos por causa das dívidas.

Pagou-as e soltou-os.

Os dois irmãos aconselharam-lhe que não continuasse a viagem o que era tempo perdido, pois aquele país era muito divertido, e que se deixasse ficar por ali.

O menino nada quis ouvir, e, embarcando de novo, partiu em direção ao reino das Águas.

Chegando aí, desembarcou sozinho, e foi procurar a velhinha, que morava perto da fonte, a qual, quando o viu, ficou admirada e disse:

– Ó meu netinho, que veio cá fazer? Olhe que você corre grande perigo. O dragão, guarda da fonte, que fica por trás daquelas montanhas, é uma princesa encantada, que tudo devora. Procure uma ocasião em que esteja dormindo, para entrar, e repare bem que, quando estiver com os olhos abertos, é que está dormindo; mas, se estiver com os olhos fechados, acautele-se, senão morre.

O menino tomou as suas precauções, de modo que, ao chegar à fonte encontrou a fera com os olhos abertos.

Aproximou-se da fonte, e encheu a garrafa que levava.

Já ia se retirando, quando o dragão acordou, e avançou sobre ele.

– Que atrevimento é esse, menino mortal, que faz com que tenhas a audácia de vir aos meus reinos?

O moço só teve tempo de desembainhar a espada.

Em um dos botes a fera foi ferida, e, com o sangue que gotejava, se desencantou numa formosa princesa.

– Devo casar-me com o homem que me desencantou. Dou-te um ano, jovem príncipe, para me vires buscar. Leva a água a teu pai, e volta. Se dentro deste prazo não estiveres aqui, irei buscar-te, onde estiveres.

Como sinal de ser reconhecido, deu-lhe a princesa um anel com um brilhante enorme.

O príncipe Oscar voltou ao país, passando pelo reino onde estavam seus irmãos, levou-os para bordo, com o fim de os conduzir ao palácio do rei Nebul, seu pai.

Quando os dois irmãos mais velhos souberam que o principezinho tinha se saído bem da empresa, ficaram invejosos e planejaram roubar a garrafa que continha a preciosa água.

Essa garrafa estava na mala do príncipe Oscar, que não a deixava um minuto sequer, guardando consigo a chave, quando se ia deitar.

Propuseram ao irmãozinho dar um grande banquete a bordo do navio, convidando para isso toda a oficialidade, banquete esse em regozijo por se ter encontrado a água que havia de dar a vista ao velho rei Nebul.

O príncipe Oscar consentiu, e os irmãos, cujo fim era embebedá-lo, durante as saúdes que se fizessem, ficaram contentes com a aquiescência do principezinho.

Fizeram a coisa tão bem-feita que o jovem Oscar se excedeu nas saúdes, a ponto de ficar embriagado.

Os dois irmãos, assim que o viram naquele estado, correram à mala, e trocaram a garrafa da fonte por uma de água do mar.

Oscar, assim que ficou bom, tratou de ver a sua mala, e, como a achou intacta, não desconfiou da troca.

Quando a esquadra se apresentou no porto da cidade onde vivia o rei Nebul, houve satisfação geral, sendo o principezinho recebido entre gerais aplausos.

Assim que deitou a água nos olhos de seu pai, este ficou desesperado de dor. Então, os dois irmãos, chamando o mais moço de impostor, trouxeram a garrafa que haviam roubado, e puseram a água nos olhos do ei, que recuperou imediatamente a vista.

Começaram as festas em regozijo ao grande acontecimento de haver Nebul recobrado a vista.

Agar e André recebiam aplausos de todo o mundo, que admirava a sua intrepidez, arriscando a vida em uma viagem tão perigosa.

O rei Nebul não quis que o príncipe Oscar assistisse às festas. Mandou matá-lo, dizendo que um impostor como ele, merecia ser queimado vivo.

No dia em que devia começar a festa em homenagem a tão valentes príncipes, seguiu de manhã cedo, para uma floresta muito longe do castelo, o príncipe Oscar, acompanhado de um batalhão enorme que devia matá-lo.

Os soldados, assim que chegaram no meio da floresta, tiveram pena do principezinho, e, em vez de matá-lo, cortaram-lhe um dedo, que foram levar ao rei Nebul, como prova de sua morte.

Oscar, assim que se viu livre da morte, começou a procurar a vida, porque naquele lugar, tão deserto, morreria de fome ou nas garras de algum animal feroz, dos que ali havia em quantidade.

Depois de andar muito, foi ter à casa de um lavrador, a quem ofereceu os seus serviços.

O lavrador, vendo aquele menino, só, naquele lugar deserto, tomou-o para escravo, e o maltratava todos os dias.

Já havia passado um ano, e era esse o tempo marcado pela rainha das Águas para o príncipe Oscar ir buscá-la, e efetuarem o casamento.

Não aparecendo, resolveu ir buscá-lo.

Mandou preparar uma esquadra de cem navios, e partiu em direção ao reino do rei Nebul.

Aí chegando, mandou um de seus generais avisar ao rei que lhe mandasse o príncipe que, um ano antes, havia ido aos eu reino buscar água de uma fonte que lhe havia de restituir a vista, e que tendo o príncipe lhe prometido casamento, e não voltando, ia à sua procura.

Mandava dizer ainda que se o príncipe não viesse, arrasaria a cidade em meia hora, com os poderosos canhões de sua esquadra.

Nebul, à vista da intimação, ficou aflito, e mandou que o príncipe Agar fosse a bordo se apresentar à princesa.

Chegando a bordo, lhe disse ela:

– Homem atrevido, como tens coragem de aparecer aqui? Onde está o sinal que te dei para o nosso reconhecimento?

O príncipe, que não tinha ciência de sinal algum, voltou para terra, envergonhado de ter feito figura tão triste diante de uma formosa dama.

A princesa enviou nova intimação ao rei Nebul, e este, cada vez mais aflito, fez ir seu filho André à presença da princesa.

O segundo filho foi tão infeliz como seu irmão. Não tendo o reconhecimento da princesa, voltou envergonhado pelo fiasco que havia feito.

A princesa mandou nova intimação à terra, dizendo que, se em vinte e quatro horas o príncipe que lhe prometera casamento não lhe aparecesse, mandaria arrasar a cidade, e depois incendiá-la.

O rei ficou aflitíssimo, pois não tendo mais nenhum outro filho, esperava com ânsia o prazo marcado para o extermínio de seu povo.

Já estava arrependido de ter mandado matar Oscar, quando um dos soldados do batalhão que acompanhou o menino à floresta disse que eles não tinham tido coragem de matar o jovem moço, e só lhe haviam cortado o dedo.

Quando o rei soube disso, teve um raio de esperança. Mandou emissários por todo o seu grande reino, à procura do jovem príncipe Oscar, dando a todo mundo os sinais do moço, e prometendo uma grande fortuna a quem o trouxesse ao seu palácio.

Pediu à princesa que lhe desse cinco dias de espera, dizendo que seu filho Oscar, que lhe tinha prometido casamento, estava em viagem, mas que já o havia mandado chamar com urgência.

A princesa concedeu o prazo pedido, dizendo que mais um segundo não concedia, e que se, contados os cinco dias, o príncipe não chegasse, não responderia pela vida de ninguém daquela cidade.

Havendo tanta gente a procurar o príncipe Oscar, muito fácil foi encontrá-lo como escravo do lavrador, onde trabalhava todo o dia, fazendo serões até alta noite.

Quando o lavrador soube que o seu escravo era um príncipe, ficou mais morto do que vivo.

Carregou o mocinho nas costas, e foi chorando levá-lo ao palácio do rei Nebul.

Estava terminado o prazo, e a princesa já tinha mandado preparar os canhões para bombardear a cidade, quando o príncipe lhe fez sinal que esperasse, porque ia ter com ela.

Assim que o jovem chegou a bordo do navio onde estava a Rainha das Águas, colocou no dedo o anel de ouro.

Esta, reconhecendo o príncipe, mandou o general avisar ao rei Nebul que era aquele o seu noivo, e que podia ficar descansado porque não mais bombardearia a cidade, e que partiria no dia seguinte, com o noivo para seu reino.

O rei convidou, então, a rainha das Águas para vir visitá-lo, porque queria conhecer sua nora.

Estavam todos no palácio, quando apareceu uma velhinha pedindo uma esmola.

Oscar, vendo que era a mesma que lhe tinha ensinado o remédio para seu pai recuperar a vista, voltou-se para a noiva, e disse:

– É esta a velhinha, formosa princesa, a quem devo a felicidade de me casar e de ver meu pai com a vista que tinha perdido.

A rainha das Águas voltou para o seu reino e casou-se com Oscar, que ficou sendo o rei que governava o país mais rico e mais formoso do mundo.

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ALBERTO FIGUEIREDO PIMENTEL nasceu e morreu em Macaé/RJ, 1869 — 1914 foi além de poeta, contista, cronista, autor de literatura infantil e tradutor. Manteve por muitos anos, desde 1907, uma seção chamada Binóculo na Gazeta de Notícias. Publicou novelas, poesia, histórias infantis e contos. Um de seus grandes êxitos foi o romance O Aborto, estudo naturalista, publicado em 1893, e por mais de um século completamente esgotado. Como poeta, participou da primeira geração simbolista chegando a se corresponder com os franceses. Era amigo de Aluísio Azevedo, com quem trocou cartas, enquanto o autor de O Cortiço estava fora do país como diplomata. Poeta, romancista, escritor de literatura infantil, ganhou destaque e se perpetuou nos compêndios da literatura brasileira. A coluna Binóculo, assinada pelo autor na Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, de 1907 até 1914, obteve grande sucesso entre leitores e leitoras, ditando moda, o que faz de Figueiredo Pimentel o primeiro cronista social da capital. Era ele quem tratava das novidades da moda, do bom gosto, do chique em voga em Paris e que deveria ser aqui aclimatado. Obras: Fototipias, poesia, 1893; Histórias da avozinha, conto - somente em 1952; Histórias da Carochinha; Livro mau, poesia, 1895; O aborto, 1893; O terror dos maridos, romance e novela, 1897; Suicida, romance e novela, 1895; Um canalha, romance e novela, 1895.

Fontes:
Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado originalmente em 1896. 
Disponível em Domínio Público. 
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segunda-feira, 14 de abril de 2025

Monteiro Lobato (A raposinha)

Era uma vez um príncipe que saiu a correr mundo, em procura dum remédio para o rei, seu pai, que estava cego. Depois de muito andar, passou por uma aldeia, onde viu vários homens dando uma surra num defunto.

— Que é isso? — perguntou o príncipe.

— É que este homem nos devia dinheiro e morreu sem pagar. O costume da aldeia manda meter a lenha no cadáver.

O príncipe revoltou-se contra a brutalidade, e pagando a dívida do morto deu ordem para que o enterrassem.

Seguiu caminho. Adiante encontrou uma raposa que lhe perguntou para onde ia. O príncipe contou que andava atrás dum remédio para a cegueira do rei, seu pai.

— Pois sei de um remédio — disse a raposinha. — Basta esfregar nos olhos do rei um pouco de "unguento de papagaio", mas de um certo papagaio lá do reino dos Papagaios. Vá lá, meu príncipe, entre à meia-noite no lugar onde estão esses pássaros e não olhe para os bonitos, os que moram em gaiolas douradas. Pegue o mais velho de todos, o mais depenado e sujo, que está a um canto, num poleiro imundo. Esse é o bom.

O príncipe foi. Quando entrou no reino dos Papagaios, ficou de boca aberta com tantas aves lindas que viu, em gaiolas de prata e ouro, e até cravejadas de diamantes. Esquecido da recomendação da raposinha, pegou a gaiola do mais bonito e foi saindo. Mas o papagaio deu um berro. Os guardas acordaram e prenderam o príncipe.

— Que queres com este papagaio? — disseram. — Vais morrer, gatuno!

O príncipe, com muito medo, explicou do que se tratava. Os guardas então lhe disseram:

— Pois muito bem: damos-te o papagaio se fores ao reino das Espadas e nos trouxeres uma delas — e soltaram-no.

O príncipe saiu muito triste porque não sabia onde era o tal reino. A raposinha apareceu-lhe de novo.

— Então, meu príncipe, que tristeza é essa? — e depois de saber do acontecido falou assim: — Eu bem recomendei que pegasse o papagaio mais velho e feio. Agora o que tem a fazer é o seguinte: vá ao reino das Espadas (e contou onde era) e entre lá à meia-noite. Encontrará espadas de todos os jeitos, de ouro e prata, muitas cravejadas de pedras preciosas — mas não pegue nenhuma dessas. Pegue uma velhinha e enferrujada, que está num canto. Essa é a boa.

O príncipe foi, e lá no reino das Espadas ficou de boca aberta diante de tantas maravilhas que viu. Mas não teve coragem de pegar na espada mais velha e enferrujada; escolheu, ao contrário, a mais rica de todas. Quando ia saindo, fez barulho sem querer, os guardas acordaram e o prenderam. Iam levá-lo ao rei de Espadas.

O príncipe, porém, contou sua triste história de modo a comover os guardas, os quais disseram: "Bem. Perdoaremos o seu crime, se for ao reino dos Cavalos e nos trouxer um."

O príncipe saiu em procura do reino dos Cavalos. Logo adiante encontrou a raposinha. "Para onde vai tão triste o senhor príncipe?" — perguntou ela.

O príncipe contou tudo.

— Bem feito — disse a raposinha. — Por que não fez como eu disse? O remédio agora é um só — ir ao reino dos Cavalos (e contou onde era) e lá entrar à meia-noite. Encontrará muitíssimos cavalos de todas as cores e raças, cada qual mais lindo. Mas não pegue nenhum desses. Escolha o mais velho e feio. Esse é o bom.

O príncipe foi, mas tão lindos animais viu no reino dos Cavalos que não teve ânimo de pegar no mais velho e feio. Escolheu, ao contrário, o mais lindo de todos. Ao sair, o cavalo relinchou, acordando os guardas, que o prenderam.

Houve explicação e por fim os guardas disseram:

— Pois bem, nós o perdoaremos se você furtar a filha do rei.

O príncipe prometeu e saiu. Logo adiante encontrou a raposinha que lhe disse:

— Príncipe, saiba que sou a alma daquele defunto que levou a surra por causa das dívidas. Ando a protegê-lo por todos os modos, mas nada tem adiantado. Você nunca faz o que eu digo. Vamos ver se agora me atende. Arranje um cavalo e vá à meia-noite ao palácio do rei; entre, agarre a moça, ponha-a na garupa e dispare no galope. Passe pelo reino dos Cavalos e pegue o que eu disse. Depois passe pelo reino das Espadas e pegue a que eu disse. Depois passe pelo reino dos Papagaios e pegue o que eu disse. E dispare a toda velocidade para a casa de seu pai, porque o velho está morre, não morre. Mas nunca entre por veredas, nem dê atenção a coisa nenhuma antes de chegar em casa. E adeus!

O príncipe lá se foi. Chegando ao palácio do rei, furtou a moça; chegando ao reino dos Cavalos, pegou o mais velho e feio; chegando ao reino das Espadas, levou a mais velha; chegando ao reino dos Papagaios, pegou o mais feio — e seguiu a galope na direção de sua casa.

Pelo caminho, porém, encontrou seus irmãos que tinham saído à procura dele, mas que ao verem aqueles objetos ficaram com inveja e resolveram matá-lo para roubar. Para isso convenceram-no de que devia deixar a estrada e seguir por um atalho, porque indo pelo atalho estaria livre de ser assaltado por ladrões.

O moço caiu na esparrela; seguiu pelo atalho. Logo adiante os maus irmãos assaltaram-no, roubaram-no e jogaram-no num buraco, certos de que estava morto. E voltaram para casa com os despojos. 

Aconteceu, porém, uma porção de coisas. A moça não queria comer nem falar; o papagaio enfiou a cabeça sob a asa e não disse uma só palavra; a espada ficou mais enferrujada ainda e o cavalo pendeu a cabeça como se fosse morrer.

Quando o moço, lá no buraco, acordou do longo desmaio, viu diante de si a raposa, a qual o tirou dali e o botou no caminho. Ele seguiu para casa manquitolando. Assim que chegou, a espada perdeu a ferrugem, ficando novinha em folha; o papagaio criou penas novas e foi sentar-se em seu ombro; a moça deu uma gargalhada gostosa e falou pelos cotovelos; o cavalo ergueu a cabeça e engordou num instante.

O príncipe, então, dirigiu-se ao quarto do pai cego e esfregou-lhe nos olhos um pouco de "unguento de papagaio" — e o rei imediatamente recobrou a visão e a saúde.

Foi uma grande alegria na corte. O bom príncipe casou-se com a moça e os maus irmãos foram expulsos do reino. E acabou-se a história.

Fontes:
Monteiro Lobato. Histórias de Tia Nastácia. Publicado originalmente em 1937. Disponível em Domínio Público.  
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domingo, 23 de março de 2025

Luís da Câmara Cascudo (O Marido da Mãe-D’Água)

Era uma vez um moço pescador muito destemido e bom que lutava com as maiores dificuldades para viver. Ultimamente o vento mudara e quase não havia peixe. Passava horas e horas na praia, com a pindaíba na mão e os peixes fugiam dele como o Diabo da cruz. O rapaz estava mesmo desanimado e dormia com fome muitas vezes.

Numa noite de luar estava ele querendo pescar e o peixe escapulindo depois de comer a isca. A noite foi avançando, avançando, o luar ficando alvo como a prata e caindo mesmo a friagem. O rapaz não queria voltar para sua casinha sem levar nem que fosse um peixinho para matar a fome.

Já ia ficando desanimado quando começou a ouvir umas vozes cantando tão bonito que era de encantar. As vozes foram chegando para mais perto, mais perto, e o rapaz principiou a olhar em redor para ver quem estava cantando daquele jeito. Numa ponta de pedra apareceu uma moça bonita como um anjo do céu, cabelo louro, olhos azuis e branca como uma estrangeira. Ficou com o corpo meio fora d’água cantando, cantando, os cabelos espalhados, brilhando como ouro.

O pescador ficou todo arrepiado mas criou coragem e disse:

– Que desejais de um cristão, alma penada?

A moça respondeu:

– Não sou alma penada, cristão! Sou a Mãe-d’Água! Nunca uma pessoa me perguntou alguma coisa e sempre eu dei, e jamais me ofereceram auxílio. Tens coragem?

– Tenho, declarou o rapaz.

– Queres pegar peixe?

– Quero!

– Pois sacode o anzol onde eu estou. Deves vir todas as noites até o quarto minguante e só pescar de meia-noite até o quebrar da barra.

Abanou a mão e mergulhou, sumindo-se.

O rapaz fez o que ela tinha aconselhado e pegou tanto peixe que amanheceu o dia e não pudera carregar tudo para casa.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água mas, no tempo da lua, vinha pescar e foi ficando mais aliviado da pobreza. Os meses iam passando e ele ficando com saudade daquela formosura. 

Uma noite de luar, estando na pesca, ouviu o canto da Mãe-d’Água e, largando tudo, correu na confrontação da cantiga. Quando a Mãe-d’Água botou as mãos em cima da pedra o rapaz chegou para junto e, assim que ela se calou, o pescador agradeceu o benefício recebido e perguntou como pagaria tanta bondade.

– Quer casar comigo? – disse a Mãe-d’Água.

O rapaz nem titubeou:

– Quero muito!

A Mãe-d’Água deu uma risada e continuou:

– Então vamos casar. Na noite da quinta para sexta-feira, na outra lua, venha me buscar. Traga roupa para mim. Só traga roupa de cor branca, azul, ou verde. Veja que não venha alfinete, agulha ou coisa alguma que seja de ferro. Só tenho uma condição para fazer. Nunca arrenegue de mim nem dos entes que vivem no mar. Promete?

O rapaz, que estava enamorado por demais, prometeu tudo e deixou a Mãe-d’Água, que desapareceu nas ondas e cantou até sumir-se.

Na noite citada o pescador compareceu ao lugar, trazendo roupa branca, sem alfinete, agulha ou coisa que fosse ferro. Antes de o galo cantar, a Mãe-d’Água saiu do mar. O rapaz estava com um lençol bem grande, todo aberto. A Mãe-d’Água era uma moça tão bonita que os olhos do rapaz ficaram incendiados. Enrolou-a no lençol e foi para casa com ela.

Viveram como Deus com os Santos. A casa ficou uma beleza de arrumada, com roupa, mobília, dinheiro. Comida, água, nada faltava. O rapaz ficou rico da noite para o dia. O povo vivia assombrado com aquela felicidade que parecia milagre.

Passou-se um ano, dois anos, três anos. O rapaz gostava muito da Mãe-d’Água, mas de umas coisas ia se aborrecendo. A moça não tinha falta, mas, na noite da quinta para a sexta-feira, sendo luar, ficava até o quebrar da barra na janela, olhando o mar. Às vezes cantava baixinho que fazia saudade até às pedras e aos bichos do mato. Às vezes chorava devagarinho. O rapaz tratava de consolar a mulher, mas, com o correr dos tempos, acabou ficando enjoado daquela penitência e principiou a discutir com ela.

– Deixe essa janela, mulher! Venha dormir! Deixe de fazer assombração!

A Mãe-d’Água nem respondia, chorando, cantando ou suspirando na sina que Deus lhe dera.

Todo mês sucedia o mesmo. O rapaz ia ficando de mal a pior.

– Venha logo dormir, mulher presepeira! Que quisila idiota é essa? Largue essa mania de cantiga e choro virada para o mar! Você é gente ou é peixe?

E como o melhor já possuía em casa, deu para procurar vadiação do lado de fora, chegando tarde. A Mãe-d’Água recebia-o bem, não se queixando de nada e tudo ia correndo com satisfação e agrado da parte dela.

Numa noite o rapaz foi a um baile e ficou a noite inteira dançando, animado como se fosse solteiro. Nem se lembrava da beleza que esperava por ele em casa.

Só voltou de manhã e foi logo gritando pelo café, leite, bolos e mais coisas para comer. A Mãe-d’Água, com paciência, começou fazendo mais que depressa o que ele dissera, mas não vinha na rapidez do corisco.

O mal-agradecido, sentando-se numa cadeira, de cara franzida, não tendo o que dizer, começou a resmungar.

– Bem feito! Quem me mandou casar com mulher do mar em vez de gente da terra? Bem feito. É tudo misterioso, cheio de histórias. Coisas do mar... hi... eu te arrenego!

Logo que disse essas palavras, a Mãe-d’Água deu um gemido comprido e ficou da cor da cal da parede. Levantou as duas mãos e as águas do mar avançaram como um castigo, numa onda grande, coberta de espuma, roncando como um bicho feroz. 

O rapaz, morrendo de medo, deu uma carreira, subindo um monte perto da casa. Lá de cima se virou para ver. Casa, varanda, cercado, animais, tudo desaparecera. No lugar estava uma lagoa muito calma, pegada a um braço de mar. Ao longe ouviu uma cantiga triste, triste como quem está se despedindo do mundo.

Nunca mais viu a Mãe-d’Água.
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Fontes:
Luís da Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. Publicado originalmente em 1946. Disponível em Domínio Público.
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terça-feira, 11 de março de 2025

Sílvio Romero (Amiga raposa e amigo corvo)

Amiga raposa convidou amigo corvo para fazerem uma viagem. A raposa convidou o gambá para seu companheiro, e o corvo convidou o caracará*. Partiram. Chegando no meio dos montes, veio a noite e foram pedir rancho na casa da amiga onça. A onça andava por fora atrás de um rebanho de carneiros, e chegou na casa muito tarde, trazendo um grande carneiro morto. Os hóspedes, que se achavam em casa, ficaram com medo.

Disse a raposa:

— Compadre corvo, as coisas não estão boas.

Disse o caracará:

—Ora, esta é boa, não temos de que temer; mas você, comadre raposa, é que deve estar em maus lençóis, sem ter onde se meter!

A raposa deu uma gargalhada e disse:

—Serei eu pior do que compadre cachorro?

O caracará:

— Comigo ninguém pode, não corro por terra, porque não corto bem o chão, mas corto o vento. Você, amiga raposa, e compadre gambá, é que têm de se ver hoje, quando ela pegou o compadre carneiro, que é maior de que vocês, quanto mais!

Chegou a hora da ceia. A onça convidou os seus hóspedes para cearem. Só a raposa é que pôde comer, por causa do feitio do prato. A onça fez mais mingau e espalhou numa pedra, e a raposa tornou a lamber. Depois o corvo disse:

— Comadre onça, eu não acho boa esta moda: quem lambe, come,  quem pinica com fome fica! Foram todos dormir.

O corvo disse para o caracará:

— Nós não havemos de ficar com fome.

Quando a onça pegou no sono, o corvo agarrou nos filhotes da onça, e os devorou com o bico; o caracará fez o mesmo. Safaram-se, deixando a raposa e o gambá dormindo. 

Quando a onça acordou, procurou os filhotes e só viu os ossos, e investiu para a raposa, que escapou-se e foi ao encontro de seus companheiros de viagem e os encontrou na casa do macaco. 

A raposa disse:

—Agora é ocasião de vingar-me do que vocês me fizeram.

Mas como era hora de jantar, ela esperou. No fim do jantar viu um cachorro, teve medo e despediu-se. Foram o corvo e o caracará para a casa do galo e a raposa já lá estava, esperando pela ceia. 

Chegada a hora, foram todos cear. O galo espalhou milho por toda a casa e disse: 

Venham de bico
Que me despico:
Quem tem focinho.
Nem um tico. 

A raposa meio desconfiada: 

Façam o que quiser,
Durmam vocês, é que se quer. 

Foram todos dormir, e a raposa foi convidar mais amigas para virem dar cabo de seus inimigos de penas. Deram cabo de todos, só deixando o gambá, por ser muito fedorento.
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* Caracará = ave de rapina semelhante ao falcão.
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SÍLVIO VASCONCELOS DA SILVEIRA RAMOS ROMERO (1851-1914) foi crítico e historiador da literatura brasileira. Fundador da Academia Brasileira de Letras. Pensador social, folclorista, poeta, jornalista, professor e político. Era sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa. Nasceu na vila de Lagarto, Sergipe, 1851. Em 1868 mudou-se para o Recife e ingressou na Faculdade de Direito. Polêmico, combativo e contraditório, foi influenciado por seu conterrâneo Tobias Barreto. Juntos, lideravam uma escola que reunia jovens inteligentes e destemidos, que se encarregavam de irradiar as recentes ideias vindas da França. Quando estava no 2. Ano da faculdade, Sílvio Romero colaborou com vários jornais, entre eles, o Diário de Pernambuco, a República, o Liberal, o Correio de Pernambuco e o Americano. Em 1873 concluiu o curso de Direito. Em 1876 mudou-se para o Rio de Janeiro onde obteve a cátedra de filosofia. Ao defender sua tese, travou uma discussão com um de seus examinadores, o professor Coelho Rodrigues. A agressão resultou em um processo, que não teve consequências. Romero foi também professor da Faculdade Livre de Direito e da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro. Como poeta, teve uma breve carreira. O primeiro livro de poemas foi Cantos do Fim do Século, lançado em 1878, em uma tentativa de aderir poesia filosófica científica que pregava desde 1870 em artigos, mas que não obteve êxito. Em 1883 publicou Últimos Arpejos, seu segundo e último volume de poesia. Desenvolveu intensa atividade como escritor. Escreveu vários livros que abordavam praticamente tudo que se referia à realidade cultural brasileira como: filosofia, literatura, folclore, educação, política e religião. Publicou assuntos ligados à cultura popular revelando-se um grande folclorista. Escreveu sobre filosofia no Brasil e sobre escolas filosóficas diversas. Em 1878 escreveu Filosofia no Brasil, publicado em Porto Alegre. Sua obra História da Literatura Brasileira (1888), em dois volumes, menos uma história literária do que uma enciclopédia de conhecimentos sobre o Brasil, a origem e evolução de sua cultura, suas raízes sociais e técnicas, foi considerada sua obra mais revolucionária. Deixou uma vasta obra culturalmente valiosa e pioneira em muitos aspectos. Respeitado pela imprensa nacional, conquistou seu lugar como um dos mais importantes críticos e historiadores da literatura brasileira do século XIX. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1914.

Fontes:
Sílvio Romero. Contos populares do Brasil. Publicado originalmente em 1883.
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