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sábado, 19 de abril de 2025

Asas da Poesia * 8 *


Soneto de
PAULO CEZAR TÓRTORA 
Rio de Janeiro/ RJ

Aurora primaveril

Desabrocha sorrindo a beleza da vida.
Primavera! A estação da alegria e do amor...
Os casais se beijando em total despudor
Ornamentam de afeto a pracinha florida,

E na aurora eis o sol, em dourada investida.
Reverbera no voo do fugaz beija-flor,
A aquarela de tons que nos leva a supor
Ser a felicidade a razão desta vida.

Entre a copa cerrada o hospedeiro arvoredo
Dá aos ninhos, abrigo, em um lúdico enredo
De uma história irreal de mil sonhos dispersos.

E, num canto da praça o poeta, arredio,
Diz ao seu coração que preencha o vazio
E que iluda a tristeza, ao tecer os seus versos.
= = = = = = = = =  

Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba / PR

Sem pressa...
Na tua calmaria
Desacelero meu pensamento 
E como é bom respirar direito
Seguindo o ritmo do teu peito
Trocar a ansiedade
Pela pausa da saciedade 
Sem pressa
Pois tu és 
A fonte dos meus desejos.
= = = = = = = = =  

Trova Premiada de
A. A. DE ASSIS 
Maringá/PR

Promessa do esperto moço
ao bom sogro, ao se casar:
-- Voltaremos para o almoço,
todo dia... e pro jantar!
= = = = = = 

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

O silêncio tem a voz duma saudade
(Cacilda Celso in "Mar Mítico / Mer Mythique", p. 27)

O silêncio tem a voz d’uma saudade
Não bate à porta e entra sem licença
Impondo a sua incômoda presença
E em casa os cantos todos ele invade.

Senta-se à mesa sem urbanidade
Mal entra pousa em tudo, sem detença
Alastra e tudo infecta, qual doença
Que venha só mostrar sua maldade.

Que se vá embora, eu tanto lhe imploro
E que me deixe em paz, eu quase choro
Temendo o que ele quer e, ao menos, fale!

Mas arrogante, mau e prepotente
Aos meus queixumes sempre indiferente
É ele que me exige que eu me cale!
= = = = = = = = = 

Soneto de
DANIEL FERNANDES DA SILVA 
Belo Horizonte/ MG

Alvorecer

Já o Sol, desdobrando o claro manto,
Entorna seus primeiros resplendores,
E as nuvens, matizadas de mil cores,
Vão dando ao firmamento um novo encanto;

Já se escuta entoar um doce canto
O coro dos alígeros cantores,
E do prado regando as lindas flores
Derrama a Aurora seu saudoso pranto;

Já enfim, pela luz do dia acesa,
Vê-se romper a sombra horrenda, escura
Que de luto tingia a natureza.

Só nest'alma, onde a noite sempre dura,
Não se aclaram as sombras da tristeza
Em que me tem envolto a Desventura.
= = = = = = 

Trova Premiada de 
CEZAR DEFILIPPO 
Astolfo Dutra/MG

Não beber mais – garantiu,
promessa perante o santo!
E o bebum diz que cumpriu:
- tô bebendo o mesmo tanto!!!
= = = = = = 

Soneto de
JOSAFÁ SOBREIRA DA SILVA
Jacarepaguá/ RJ

O show da aurora

Eu reparei que as fúlgidas auroras
realçam magistrais policromias
e, em seu prenúncio, no avançar dos dias,
mudam-se as cores, no mover das horas.

Descortinei que, sem longas demoras,
exibe a aurora loucas fantasias,
em que dormitam danças e magias,
depois que os ventos fincam-lhe as esporas.

Eu me encantei a cada dia lindo
e em cada aurora que fosse surgindo,
nesse mover de um frêmito sem fim!

E, acalentado por meus pensamentos,
nas manhãs frias suportava os ventos
vendo esse show que Deus montou pra mim!
= = = = = = = = =  

Poetrix de
RONALDO RIBEIRO JACOBINA
Salvador/BA

Pena capital

Confesso e pena peço.
Senhor Juiz, eu roubo os sonhos
E registro-os em versos.
= = = = = = 

Soneto de
MAURÍCIO CAVALHEIRO 
Pindamonhangaba/ SP

Auroras

Abria a porta quando vinha a aurora
com seus pincéis de singulares cores
pintar a serra, o ribeirão, as flores,
os bois no pasto, o céu e o pé de amora.

Sentia paz ante a visão, e embora
o reumatismo provocasse dores,
se ajoelhava a oferecer louvores
a Deus por mais uma divina hora.

Após a prece ela se punha em pé
e entrava na casinha de sapé
onde morava há muito tempo, só.

Essa senhora de tão longa idade,
que quis morar distante da cidade,
se chama Aurora... Ela é a minha avó.
= = = = = = 

Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

Nos trilhos da ferrovia,
ela, brincando, caminha.
- Até que afinal Maria
resolveu andar na linha...
= = = = = = 

Hino de 
PELOTAS/RS

Salve, salve, ó Pelotas querida
Formosíssima terra do Sul
Tens coberta de glória a vida
Como é lindo o teu céu tão azul.

Não há terra no mundo grandiosa
Que te iguale no esplêndido brilho
De Pelotas a terra formosa
Tenho orgulho também de ser filho.

No teu seio aparece, fulgura
Alegria, instrução e valor
São Gonçalo baixinho murmura
A canção da saudade e do amor.

Salve, salve, ó Pelotas querida
Formosíssima terra do Sul
Tens coberta de glória a vida
Como é lindo o teu céu tão azul.

Hei de sempre Pelotas te amar
E trazer-te na minha memória
Aprendi no teu seio a chorar
E a sorrir nos momentos de glória.

Meus avós te souberam amar
Com orgulho, carinho e respeito
E ao morrer me fizeram herdar
Esse amor que conservo no peito

Salve, salve, ó Pelotas querida
Formosíssima terra do Sul
Tens coberta de glória a vida
Como é lindo o teu céu tão azul
= = = = = = = = =  

Soneto de
PAULO MAURICIO G. SILVA 
Teresópolis/ RJ

Teu violão

Magia dos acordes delicada...
Doce magia... Tons da inspiração...
Lembra o som de uma aurora imaculada.
Louros trigais dourando a imensidão.

Que vibração celeste, sossegada...
Raios de sol abrindo uma estação...
A minha alma flutua, acariciada
pelas notas sublimes de um refrão...

Que melodia suave, bem ritmada...
Afagos de uma brisa perfumada.
Remanso de uma tarde de verão.

Envolve-me a bucólica energia...
Meus nervos embriagados na harmonia
são cordas musicais do teu violão.
= = = = = = = = =  = = = = 

Uma Lengalenga de Portugal
ERA UMA VEZ… 2
 
Era uma vez
Um gato maltês
Tocava piano
Falava francês
Saltou-te às barbas
Não sei que te fez
A dona da casa
Chamava-se Inês
O número da porta era o 33!
Queres que te conte outra vez?
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Minha mãe, case-me cedo,
enquanto sou rapariga,
que o milho sachado tarde
não dá palha, nem espiga.
= = = = = = = = =  

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

A janela entreaberta

O Vento deixou
A janela  entreaberta,
E o Tempo tentou fechá-la,
Mas, não conseguiu
O Vento sorriu, enquanto
A noite trouxe a chuva,
Deslizaram gotas d’água
Em meu rosto,
E em cada gota, senti  uma carícia
Repleta  de Saudade,
Beijos em movimento…
= = = = = =

Spina de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

Saudade...

Penetra na pele
feito um aroma
leve de jasmim,

soprado na brisa do outono, 
um sentimento da doce paz
que renasce dentro de mim.
É um poema, uma profunda
saudade que nunca terá fim.
= = = = = = = = =  

Soneto de
AUTA DE SOUZA
Macaíba/RN, 1876 – 1901, Natal/RN

Página triste

Há muita dor por este mundo afora,
Muita lágrima à toa derramada;
Muito pranto de mãe angustiada
Que vem saudar o despontar da aurora!

Alma inocente só de amor cercada
A criancinha a soluçar descora,
Talvez no berço onde o menino chora
Também, ó Dor, tu queiras, desolada,

Erguer um trono, procurar guarida...
Foge do berço! não magoes a vida
Desta ave implume, lirial botão...

Queres um ninho, um carinhoso abrigo?
Pois bem! procura-o neste seio amigo,
Dentro em minh'alma, aqui no coração!
= = = = = = = = =  

Poema de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Se ela chegar...

Se ela chegar... eu rogarei baixinho;
- Não te aproximes! Vai! Esquece-o... Parte!
Que ele nem te pressinta!... O seu carinho
é meu... só meu... quem ama não reporte!

Nosso amor é sereno. Tão sereno,
que nem teme rivais! Se sou amada,
amo, também! Afeto puro e pleno,
que o entardecer transforma em alvorada!

Implorarei em prantos; - Não o leves!
Deixa-o comigo... Vês? Inda é tão cedo!
Nossas horas de amor foram tão breves,
tão breves quanto foi nosso segredo!

Mostrarei o teu rosto, belo e calmo,
tal como o vejo agora, meu querido...
Provarei que és feliz e, palmo a palmo,
defenderei teu corpo adormecido.

Tuas mãos - lhe direi - guardam carícias
somente minhas, apesar de o mundo
bafejá-las de intrigas e malícias!
Vai! - pedirei! E com fervor profundo,

esmolarei, ainda, uma migalha,
uma fração de tempo! E, suplicante,
meu coração, beijando-lhe a mortalha,
há de rogar-lhe nesse cruel instante:

- Bem sabes... tanta gente, em vão te espera
e tresloucada, às vezes, te procura!
Vai buscar essa gente sem quimera!
Deixa em paz nosso ninho de ternura!

Esquece que existimos. E, algum dia,
já velhinhos, já trôpegos, cansados,
de tua porta, iremos à porfia,
para beijar-te os mãos, sempre abraçados!

Se ela chegar... e se me ouvir paciente,
ela, que alma não tem, terá piedade,
levará minha angústia, tão somente,
sem acender o círio da saudade!

Contudo, ela chegou! Levou-te, amigo,
alheia ao meu clamor desesperado!
Nem quis a vida que deixou comigo,
cuja metade eu lhe teria dado!

Restou somente a solidão enorme...
O frio intenso... esse terrível frio
que enregela de dor um inconforme,
um pobre e triste coração vazio!…
= = = = = = = = = 

sexta-feira, 18 de abril de 2025

Asas da Poesia * 7 *


Spina de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/ SP

Clausura 

Reclusa no próprio 
tempo, seu sorriso
é seu sentimento.

Ora transborda paz, um alento, 
às vezes um leve contratempo. 
Atada em utopias, é momento, 
ou somente uma página virada
levada por folhagens no vento.
= = = = = = = = =  

Poema de
CLARISSE CRISTAL
Balneário Camboriú/SC

Algaravia

Encontrei as chaves perdidas de papai
Estavam lá, estáticas e bem seguras
 Na algibeira interna
 Do meu sobretudo negro  

Agora sou eu que não me encontro mais 
Acordo pelo amanhã
E contíguo a mim
Uma angústia
Infinda
De ser uma outra pessoa
Alheia do que fui até a pouco

Desaprendi
 A compor em versos com poesia 
Desaprendi a contemplar o vago

E o vazio inquebrantável
Do noturno silêncio oblíquo
Em noite perdida no campo santo

Encontrei as outrora chaves perdidas de papai
Agora a luz do dia faina
O meu corpo oco e insípido
Inerte em duas rodas velozes

Encontrei as chaves perdidas de papai
E minha nova paixão
Surge sempre benfazeja
Ao final do expediente
= = = = = = 

Poema de
FABIANE BRAGA LIMA
Rio Claro/ SP

Alma de poeta

Meus versos se rasgaram com o tempo,
As minhas mãos calejadas sangraram,
Ao escrever infindos poemas.
Hoje sou o grito intenso das madrugadas,
Sou o silêncio árduo em forma de rimas,
Sou a alma do poeta que derrama lágrimas...
A cada lágrima, nasce uma nova poesia...!
= = = = = = 

Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ ES

Amada

Que bom que acreditastes
Na minha volta, paixão
Se magoei teu coração
Perdoa, eis-me aqui
Acabou tua infelicidade
Sou tua Felicidade: 
voltei pra ficar.
= = = = = = = = = 

Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

Já pronta e de vela içada
tremulando de ansiedade,
vai para o mar a jangada
carregada de saudade!
= = = = = = 

Poema de
SOUSÂNDRADE
Guimarães/ MA 1833 – 1902, São Luís/ MA

Inverno 

Salve! felicidade melancólica,
Doce estação da sombra e dos amores-
Eu amo o inverno do equador brilhante!
A terra me parece mais sensível.
Aqui as virgens não se despem negras
À voz do outono desdenhoso e déspota,
Ai delas fossem irmãs, filhas dos homens!
Aqui dos montes não nos foge o trono
Dessas aves perdidas, nem do prado
Desaparece a flor. A cobra mansa,
Cor d’azougue, tardia, umbrosa e dútil,
No marfim do caminho endurecido
Serpenteia, como onda de cabelos

Da formosura no ombro. À noite a lua,
Qual minha amante d’inocente riso,
Co’a face branca assenta-se nas palmas
Da montanha estendendo os seus candores,
Mãe da poesia, solitária, errante:
O sol nem queima o céu como os desertos,
Simpáticas manhãs é sempre o dia.

Geme às canções d’aldeia apaixonadas
Mui saudoso violão: as vozes cantam
Com náutico e celeste modulado.
Chama às tácitas asas o silêncio
Ao repouso, aos amores: as torrentes
Prolongam uma saudade que medita:
Vaga contemplação descora um pouco
O adolescente e o velho: doce e triste
Eu vejo o meu sentir a natureza
Respirar do equador, selvagem bela
De olhos alados de viver, à sombra
Adormecendo d’árvore espaçosa.
= = = = = = 

Poema de 
EDITH CHACON THEODORO
São Paulo/SP

Ler

Ler.
Ler sempre.
Ler muito.
Ler “quase tudo”.
Ler com os olhos, os ouvidos, com o tato, 
pelos poros e demais sentidos.
Ler com razão e sensibilidade.
Ler desejos, o tempo, 
o som do silêncio e do vento.
Ler imagens, paisagens, viagens.
Ler verdades e mentiras.
Ler o fracasso, o sucesso, o ilegível, 
o impensável, as entrelinhas.
Ler na escola, em casa, no campo, 
na estrada, em qualquer lugar.
Ler a vida e a morte.
Saber ser leitor, 
tendo o direito de saber ler.
Ler simplesmente ler.
= = = = = = 

Hino de
INDIAROBA/ SE

Era começo do século XVIII
Catecúmenos vieram aqui se instalar
Em incursão entre os bravos silvícolas
Para a antiga "Feira da Ilha" habitar

Sobre as águas do rio que nos banha
Os imigrantes conseguiram aqui chegar
E entre os quais vieram ilustres jesuítas
Com a missão de evangelizar.

Abençoada seja Indiaroba
Recanto amado, hospitaleiro e sacrossanto
Iluminada seja Indiaroba
com a luz do Divino Espírito Santo

Disputaram os dois fortes caciques
capitães-mor: José de Oliveira Campos
e Manoel Francisco da Cruz e Lima
pela posse da Vila do Espírito Santo.

Se seria de Sergipe ou da Bahia,
foi decidido através Decreto-Lei
sendo, pois, a divisa o Rio Real da Praia
Ganhou a posse Sergipe Del-Rei!
= = = = = = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Não lamento o meu passado,
nem mesmo o tempo me ofende.
Viver é um aprendizado
quem mais vive mais aprende.
= = = = = = 

Poema de
RAINER MARIA RILKE
Praga/ Tchecoslováquia (1875 – 1926)

O homem que lê

Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde… em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.

E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa.
= = = = = = = = =

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Poético abandono

As folhas de hera cobrem tuas paredes.
Portas, janelas e varandas,
Lembrando verdes demãos
de tintas,
Afagos a protegê-la das
intempéries...
A escada com nove degraus, ainda,
Preserva parte do mármore,
A porta principal, já sem a dourada
Maçaneta é aberta com facilidade,

E a cada passo, sinto a solidão -
Um silêncio especial espreita-me
Nos gastos tapetes, no piano
Deixado à própria sorte,
Sonhando com Debussy...
A alma da casa abandonada
Refugia-se em imagens e sons

Do passado -
Continuo minha aventura -
Caminhada, sem pressa, com o olhar
E, curiosa, abro mais uma porta,
Encontrando, janelas sem vidros
Que deixam o canto dos pássaros
Mais próximos, fazendo parte
Da linda, mas esquecida, adega
As garrafas de vinho,
Sem rótulos e rolhas
(Nuas - vazias)
Ocupam prateleiras
Como se livros fossem -
Lunetas encantadas
Intocáveis,
Umas sobre as outras
Cobertas por camadas de poeira
Lembram uma segunda pele
Imagino diálogos entre
As garrafas e as partículas de pó,
E a sonolenta cadeira, sem palhas,
A observá-las...
Ah, esse aconchego da passagem
Do tempo, tatuando objetos e sonhos -
Tempo, que tudo desgasta, esmaece,
(Enferruja)
leva os sorrisos e, aos poucos
Ávida desaparece...
Choro com ela, sinto
Na casa adormecida
Um poético abandono,
Quem sabe,
Ela despertará
Em uma futura aquarela,
Quem sabe?
= = = = = = = = =  

Quadrão à antiga de
LOURIVAL BATISTA
Itapetim/PE

O Cantador repentista, 
Em todo ponto de vista, 
Precisa ser um artista 
De fina imaginação, 
Para dar capricho à arte, 
E ter nome em toda parte, 
Honrando o grande estandarte 
Dos oito pés de Quadrão!
= = = = = = = = =  

Glosa de
FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 – 2020

Mote:
O meu verso tem o cheiro 
Da poeira do sertão.
(Manoel Dantas)

Glosa:
Nasce o sol, outra manhã 
Se espreguiça, é novo dia 
E a morte, má, se anuncia 
No canto da acauã 
Ave de agouro, malsã, 
Que canta nossa desgraça 
Sobrevoando a carcaça 
Do boi que ontem era são 
Hoje inerte jaz no chão 
No pé do seco imbuzeiro 
O meu verso tem o cheiro 
Da poeira do sertão.
= = = = = = = = =  

Quadra de
AGOSTINHO DA SILVA
Porto/Portugal, 1906 – 1994, Lisboa/Portugal

Não corro como corria,
nem salto como saltava,
mas vejo mais do que via
e  sonho mais que sonhava.
= = = = = = = = =  

Poema de
CELSO BRASIL
Curitiba/PR

Tu, eu e a poesia

Te amo com toda energia,
Te quero bem perto de mim,
Mas também tem a Poesia!
Eu Quero as duas, enfim!!!

Te peço... não tenhas ciúme!
Sem ela não posso te amar!
Da minha montanha, ela é o cume,
Do cume, amor te quero gritar!

Abro os braços à magia,
Entre eles, sempre estarás.
Mas se não abraço a Poesia,
A ti... como me declarar?

Poesia, minha eterna amante.
Tu, minha eterna paixão.
A Poesia me leva adiante!
E tu! levo em meu coração.

Se me deixares amá-la,
Para ti também existirei.
Mas se me apartares dela,
Sem versos, então, morrerei.

Ficarás chorando no báratro,
Quando eu tiver que me ir.
Consolar-te até o reencontro,
Sei que a Poesia há de ir.

Tu e a poesia, então, juntas
Viverão a me relembrar.
De vez em quando unidas,
Ambas se porão a chorar.

Nesse momento, querida,
Certamente, ali estarei.
Tu e a Poesia formam minha vida!
E, assim, nunca mais morrerei.
= = = = = = = = =  

Trova de
NEI GARCEZ
Curitiba/PR

Entre o sonho e a verdade
vai vivendo, em seu juízo,
toda a nossa humanidade
seu inferno ou paraíso.
= = = = = = = = =  

Soneto de
CARLOS NEJAR
Porto Alegre/RS

Poemas e Sapatos

Nada tenho de meu, nem os sapatos
que vão acompanhar este defunto.
Nem tampouco montanhas e regatos
que habitaram o verso, nem o indulto

pode valer-me, o soldo, mero extrato
de contas. Nada tenho, nem o intuito
consome esta vontade ou desacato.
Desapareça o nome, seu reduto

de carne e bronze, a fome incorporada
e mais desapareça onde fecundos
são dias e são deuses nesta amada.

Não foram nunca meus — sonhos e fatos.
Nada tenho. Poemas e sapatos
irão reconhecer-me noutro mundo.
= = = = = = = = =