Marcadores

Marcadores

Mostrando postagens com marcador Universos Di Versos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Universos Di Versos. Mostrar todas as postagens

sábado, 27 de abril de 2024

Olavo Bilac (Poesias para crianças) - 3


AS FORMIGAS

Cautelosas e prudentes,
O caminho atravessando,
As formigas diligentes
Vão andando, vão andando...

Marcham em filas cerradas;
Não se separam; espiam
De um lado e de outro, assustadas,
E das pedras se desviam.

Entre os calhaus vão abrindo
Caminho estreito e seguro,
Aqui, ladeiras subindo,
Acolá, galgando um muro.

Esta carrega a migalha;
Outra, com passo discreto,
Leva um pedaço de palha;
Outra, uma pata de inseto.

Carrega cada formiga
Aquilo que achou na estrada;
E nenhuma se fatiga,
Nenhuma para cansada.

Vede! enquanto negligentes
Estão as cigarras cantando,
Vão as formigas prudentes
Trabalhando e armazenando.

Também quando chega o frio,
E todo o fruto consome,
A formiga, que no estio
Trabalha, não sofre fome...

Recorde-vos todo o dia
Das lições da Natureza:
O trabalho e a economia
São as bases da riqueza.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

JUSTIÇA

Chega a casa, chorando, o Oscar. Abraça
Em prantos a Mamãe.
“Que foi, meu filho?”
—“Sucedeu-me, Mamãe, uma desgraça!
Outros, no meu colégio, com mais brilho,
Tiveram prêmios, livros e medalhas...
Só eu não tive nada!”

—“Mas porque não trabalhas?
Por que é que, a uma existência dedicada
Ao trabalho e ao estudo,
Preferes os passeios ociosos?
Os outros, filho, mais estudiosos,
Pelas suas lições desprezam tudo...
Pois querias então que, vadiando,
Os outros humilhasses,
E que, os melhores prêmios conquistando,
Mais que os outros brilhasses?
Para outra vez, ao teu prazer prefere
O estudo! e o prêmio alcançarás sem custo:
E aprende: mesmo quando isso te fere,
É preciso ser justo!”
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

MEIA-NOITE

O filho:
Ó Mamãe! quando adormecem
Todos, num sono profundo,
Há mesmo almas do outro mundo,
Que aos meninos aparecem?

A mãe:
Não creias nisso! É tolice!
Fantasmas são invenções
Para dar medo aos poltrões:
Não houve ninguém que os visse.

Não há gigantes nem fadas,
Nem gênios perseguidores,
Nem monstros aterradores,
Nem princesas encantadas!

As almas dos que morreram
Não voltam à terra mais!
Pois vão descansar em paz
Do que na terra sofreram.

Dorme com tranquilidade!
— Nada receia, meu filho,
Quem não se afasta do trilho
Da Justiça e da Bondade.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

MEIO-DIA

Meio-dia. Sol a pino.
Corre de manso o regato.
Na igreja repica o sino;
Cheiram as ervas do mato.

Na árvore canta a cigarra;
Há recreio nas escolas:
Tira-se, numa algazarra,
A merenda das sacolas.

O lavrador pousa a enxada
No chão, descansa um momento,
E enxuga a fronte suada,
Contemplando o firmamento.

Nas casas ferve a panela
Sobre o fogão, nas cozinhas;
A mulher chega à janela,
Atira milho às galinhas.

Meio-dia! O sol escalda,
E brilha, em toda a pureza,
Nos campos cor de esmeralda,
E no céu cor de turquesa...

E a voz do sino, ecoando
Longe, de atalho em atalho,
Vai pelos campos, cantando
A Vida, a Luz, o Trabalho.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

O OUTONO

Coro das quatro estações:
Há tantos frutos nos ramos,
De tantas formas e cores!
Irmãs! enquanto dançamos,
Saíram frutos das flores!

O Outono:
Sou a estação mais rica:
A árvore frutifica
Durante esta estação;
No tempo da colheita,
A gente satisfeita
Saúda a Criação,

Concede a Natureza
O premio da riqueza
Ao bom trabalhador,
E enche, contente e ufana,
De júbilo a choupana
De cada lavrador.

Vede como o galho,
Molhado inda de orvalho,
Maduro o fruto cai...
Interrompendo as danças,
Aproveitai, crianças!
Os frutos apanhai!

Coro das quatro estações:
Há tantos frutos nos ramos,
De tantas formas e cores!
Irmãs! enquanto dançamos,
Saíram frutos das flores!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

O REMÉDIO

A Amelinha está doente,
Chora, tem febre, delira;
Em casa, está toda gente
Aflita, e geme, e suspira.

Chega o médico e a examina.
Tocando a fronte abrasada,
E o pulso da pequenina,
Diz alegre: “Não é nada!

Vou lhe dar uma receita.
Amanhã, o mais tardar,
Já de saúde perfeita
Há de sorrir e brincar.”

Vem o remédio. Amelinha
grita, faz manha, esperneia:
O pai se avizinha,
Mostrando-lhe a colher cheia:

“Toma o remédio, querida!
Dar-te-ei como recompensa,
uma boneca vestida
De seda e rendas, imensa...”

“— Não quero!”
Chega a titia:
“Amélia é boa, não é?
Se fosse boa, teria
Toda uma arca de Noé...”

“— Não quero!”
Prometem tudo:
Livros de figuras cheios,
Um vestido de veludo,
Brinquedos, joias, passeios...

Teima Amelinha, faz manha.
E diz o pai, já com tédio:
“— Menina! você apanha,
Se não toma este remédio!”

E nada! a menina grita,
Sem querer obedecer.
Mas nisto, a mamãe aflita,
Põe-se a gemer e a chorar.

Logo Amelinha, calada,
Mansa, a colher segurando,
Sem já se queixar de nada,
Vai o remédio tomando.

“—Então? mau gosto sentiste?”
Diz o pai... E ela, apressada:
“— Para não ver mamãe triste,
Não sinto mau gosto em nada!”
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Fonte> Olavo Bilac. Poesias Infantis. RJ: Francisco Alves. 1929. Disponível em Domínio Público 

sexta-feira, 26 de abril de 2024

Vasco Mousinho de Quebedo (Poesia sem fronteiras) = 2


SONETO X

Quais no soberbo mar à nau, que cansa
Lidando c'os assaltos da onda e vento,
Os Bálios* irmãos do Etéreo assento
Lhe confirmam do porto a esperança,

Tal vossa vista ao tempo, que se alcança
Desta, que não tem mor contentamento,
No mar de meu cuidado e meu tormento
Mil esperanças cria de bonança.

Comparação, conforme a causa, ufana,
Pois quando um me aparece, outro se esconde,
Como no Céu faz u'a, e outra estrela.

Iguais também no Amor, que em vós responde
Também no desamor da Irmã Troiana,
Que ambos vos conjurais em ódio dela.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Bálios = Na mitologia grega, Xantos e Bálios eram dois cavalos sendo imortais, filhos do deus-vento Zéfiro e da harpia Podarge. Xantos e Bálios foram presenteados a Peleu, pai de Aquiles, por Poseidon, em seu casamento. 
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SONETO XI

Lá nua estranha e solitária terra,
De gente e nação bárbara habitada,
O metal nobre não se estima em nada
Que embalde seu valor e preço encerra.

Ouro, com que se arreia e move guerra
A corações, a Dama delicada,
Serve lá de grilhão, que em apertada
Corrente a malfeitores fecha e cerra.

Nasce esta confusão e diferença
Do muito que uns o seu valor alcançam,
E do pouco que de outros se conhece.

Julguem do Sol, e sua glória imensa
Os olhos d'Águia, já que todos cansam,
Que só para tais olhos resplandece.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SONETO XV

Triste do que em tristeza passa o dia,
Feliz porém, se a passa, e enfim lhe passa,
Mas quem ventura teve tão escassa
Que em nada ache prazer nem alegria.

Nos ais, alívio tem quem n'alma os cria,
A quem em trevas vive, a luz dá graça,
Há quem do fogo e Sol se satisfaça,
E quem se satisfaça d'água fria.

Restaura o ar, na calma, o fraco alento,
Conforta o cheiro de u'a flor suave,
Convida a sombra, a erva a grato assento,

Suspende da Ave o canto a pena grave;
Ai que não aliviam meu tormento
Ais, luz, Sol, fogo, água, ar, flor, sombra, erva, Ave.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SONETO XVI

Já tramontado o Sol do assento puro,
Debuxadas se veem no claro rio
As seis filhas de Atlante pelo estio,
Cobre-se Electra, só, de um manto escuro.

Já que com tanto risco me aventuro,
E sou tachado por escuro e frio,
Mostrem-se todos, que eu num só desvio
De vergonha escondido estar procuro.

Mas bem sabeis, engenho ilustre e nobre,
Que inda que o lavrador bárbaro veja
Que não são mais que seis estas estrelas,

O Astrólogo sábio, que descobre
Mais avante e co'a vista além peleja,
Diz que são sete, esconde-se u'a delas.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SONETO XVIII

Quem quiser que seus ais o vento leve,
Quem quiser levantar nas águas torre,
Quem semear nas praias onde morre
E onde jamais ser o trigo teve.

Morra por vós, que na constância breve
Sois como folha, que c'o vento corre
Só constante em meu mal, porque me forre
De cuidar que sereis 'té nisto leve.

Suspiros de minha alma a quem vos dei,
Dei-vos suspiros meus ao leve vento?
Que foi de vós ó lágrimas cansadas?

Assaz pago fiquei com meu tormento,
Já que outro bem por vós não alcancei,
O bem me fica de vos ter choradas.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SONETO XIX

Qual mísera Calisto, quando atenta
Que abrindo o dia vão ao largo estanho
As mais estrelas a seu doce banho,
Só com seu Plaustro só ficar lamenta,

Tal, quando me a memória representa
Banharem-se outros nesse mar estranho,
De graças mil gozando bem tamanho,
A falta dessa glória me atormenta.

E como inda que irada Juno a tolha
Descer ao mar, não deixa em noite clara
Ferir nele seus raios do alto assento,

Assim, por mais que a sorte em tudo avara
Para si deste corpo a parte escolha,
Livre, porém, me fica o pensamento.

Fonte> http://www.sonetos.com/biografia.php-a=39.htm (site desativado). Acesso em 15.01.2016

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Dom Pedro II (Cachoeira de Versos)


A IDEIA CONSOLADORA

Vendo as ondas correr para o ocidente,
Corre mais do que elas a saudade,
Mas espero que a minha enfermidade
O mesmo me consinta brevemente.

Com saúde mais lustre dar à mente
É cousa que enobrece a humanidade;
Contudo agora o paga a amizade
Da pátria, e da família, cruelmente;

Mas consola-me a ideia, — que mais forte
Lhes voltarei para melhor amá-los,
Pois mais anos assim até a morte

Eu mostrarei que sempre quis ligá-los
Na feliz, e também na infeliz sorte
Para, amando-os, ainda consolá-los.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

A MEUS NETINHOS IMPRESSORES DE MEUS VERSOS

Versos feitos por mim na mocidade
O mérito só tem sentimento.
Eram, pra assim dizer, um instrumento
Mais que o prazer ecoando-me a saudade.

Pospondo a fantasia sempre à verdade
Melhor encontrei nesta o ornamento
E, no estudo apurando o sentimento,
Quanto tenho a saber disse-me a idade.

É isso o que vos quero eu ensinar,
Amando-vos qual pode um terno avô,
A quem para as suas cãs engrinaldar

Melhor só poderia o que eu vou
Em carícias tão vossas procurar,
Sentindo que de vós inda mais sou.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

À MORTE DO PRÍNCIPE D. PEDRO

Pode o artista pintar a imagem morta
Da mulher, por quem dera a própria vida.
À esposa que a ventura vê perdida
Casto e saudoso beijo inda conforta.

A imitar-lhe os exemplos nos exorta
O amigo na extrema despedida...
Mas dizer o que sente a alma partida
Do pai, a quem, oh Deus, tua espada corta.

A flor de seu futuro, o filho amado;
Quem o pode, Senhor, se mesmo o Teu
Só morrendo livrou-nos do pecado,

Se a terra à voz do Gólgota tremeu
E o sangue do Cordeiro Imaculado
Até o próprio céu enegreceu!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

A VIDA E O BARCO

Andar e mais andar é a vida a bordo;
Mal estudo, e apenas eu vou lendo;
A noite com a música entretendo;
Deito-me cedo, e mais cedo acordo.

Saudosíssimo a pátria eu recordo,
E, pra consolo versos lhe fazendo,
Desenho terras só aquela vendo,
E para não chorar os lábios mordo.

Enfim há de chegar, eu bem o sei,
Que o Brasil eu reveja jubiloso;
E, se outrora eu servi-lo só pensei,

Muito mais forte e muito mais zeloso,
Para ainda mais servi-lo, voltarei
'Té que nele encontre o último repouso.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

INGRATOS

Não maldigo o rigor da iníqua sorte,
Por mais atroz que fosse e sem piedade,
Arrancando-me o trono e a majestade,
Quando a dois passos só estou da morte.

Do jogo das paixões minha alma forte
Conhece bem a estulta variedade,
Que hoje nos dá contínua f'licidade
E amanhã nem — um bem que nos conforte.

Mas a dor que excrucia e que maltrata,
A dor cruel que o ânimo deplora,
Que fere o coração e pronto mata,

É ver na mão cuspir a extrema hora
A mesma boca aduladora e ingrata,
Que tantos beijos nela pôs — outrora.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SEMPRE O BRASIL

Nunca noite dormi tão sossegado,
Quem nem mesmo sonhei com o meu Brasil,
Porém, vendo infinito mar d'anil,
Lembra-me a aurora dele nacarada.

Cada dia que passa não é nada,
E os que faltam parecem mais de mil.
Se o tempo que lá vivo é um ceitil*,
Aqui é para mim grande maçada*.

E a doença porém me consentir,
Sempre pensando nele, cuidarei
De tornar-me mais digno de o servir,

E, quando possa, logo voltarei;
Pois na terra só quero eu existir
Quando é para bem dele que eu o sei.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Ceitil = quantia insignificante
Maçada = aborrecimento, enfado
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

TERRA DO BRASIL

Espavorida agita-se a criança,
De noturnos fantasmas com receio,
Mas se abrigo lhe dá materno seio,
Fecha os doridos olhos e descansa.

Perdida é para mim toda a esperança
De volver ao Brasil; de lá me veio
Um pugilo de terra; e neste creio
Brando será meu sono e sem tardança...

Qual o infante a dormir em peito amigo,
Tristes sombras varrendo da memória,
ó doce Pátria, sonharei contigo!

E entre visões de paz, de luz, de glória,
Sereno aguardarei no meu jazigo
A justiça de Deus na voz da história!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Fonte> http://www. sonetos.com/biografia.php-a=71.htm. (site desativado), acesso em 15.01.2016

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Lino Vitti (Asas da poesia) = 1


A BANDEIRA DO SONHO E DA ESPERANÇA

Vede a nave que vai. É a vida que navega,
às vezes calmaria, às vezes sol bonito.
Pelos mares boreais agora nos carrega,
por oceano feliz, estival e bendito.

Esta nau é latina, esta outra é vela grega,
qual vem de Gibraltar, qual vem do velho Egito.
Hoje o Mediterrâneo em torno a si as congrega,
amanhã já não sei em que quadrante as fito...

E quem sabe, Senhor o rumo dessas naves,
ora ao Norte, ora ao Sul, tempestades, bonanças,
furor de vendavais, quiçá rotas suaves!

O que vejo, porém, em toda a nau que avança,
vencendo furacões, à voz de roucas aves,
é a bandeira do Sonho e o mastro da Esperança.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

ANTES QUE AS ESTRELAS BRILHEM

Antes que brilhem as estrelas no alto,
num estranho chegar do lusco-fusco;
antes que a noite com seu negro assalto
me tire a santa luz que tanto busco;

antes que as trevas - esse horrendo asfalto
do céu - onde de dor a alma chamusco,
os meus ideais a poetar ressalto,
vejo perto um crepúsculo velhusco.

O sol já não quer ver-me com carinho,
sem águas vou, aos passos, no caminho,
vão as flores e as aves debandadas.

Restam somente as rimas por conforto,
eu já alcancei o derradeiro porto,
brilhem pois as estrelas namoradas.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

LUZES DO OCASO

Quando o céu se colore e como um pálio
se desdobram luzores no horizonte,
dou por findo o meu rústico trabalho,
do versejar selou-se a minha fonte.

É preciso parar ânsias do atalho,
é preciso deter o afã do monte.
É preciso secar o doce orvalho
antes que o sol, no céu, fulvo tramonte.

Toda a vida me foi um belo acaso,
quanto pude galguei o meu Parnaso
dispersando poesia estremecida.

Tudo finda na vida, tudo finda,
mesmo assim vejo sempre muito linda
a aventura enigmática da vida,
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

POESIA MODERNA

Minha cara Poesia alegre e modernista,
inestética, irreal, síntese, paradoxo.
Desrimada, a mancar qual manca altivo coxo
mas sincera, jovial, enigmática, artista.

Protestante, genial, lírica arte golpista,
bela como o Brasil, ou feia como um mocho,
ora clara manhã, ora poente roxo,
revolução feliz, a se perder de vista.

Sem métrica, sem rima, e sem qualquer estrofe
és. Poesia moderna, um grande regabofe,
artística, revolta, amada e sem vergonha.

Assim mesmo sem rima ou métrica que a cantem,
não importa porém que os outros mais se espantem,
enquanto teu cantor divinamente sonha.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

"PORTAL DOS SONHOS"

(Ao seu autor Esio Pezato)

Poeta peregrino, após tantas andanças
à procura do Belo, em busca de um tesouro
erguendo o olhar ao céu das doces esperanças.
feitas de imenso azul, feitas de estrelas de ouro;

poeta caminheiro, afinal, quando alcanças
do teu longo viajar feliz ancoradouro?
Quando te acolherâo aquelas terras mansas
do encantado país, dos sonhos sorvedouro?

Responda-me, poeta, até quando essa busca,
E esse louco viver que a incompreensão ofusca,
muitas vezes sem sol, muitos dias tristonhos!?

Eis a tua resposta, aloucado poeta:
ter a glória imortal do um telúrico esteta
e a pérola nos dar desse “PORTAL DE SONHOS".
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

TERRA NATAL
(Santanense com orgulho)

Nesse chão, onde guarda a santa natureza
as minhas ancestrais, genéticas raízes,
vi florir-me da vida os sonhos de beleza,
desfrutei do viver, os dias mais felizes.

Deram-me as fontes a água pura posta à mesa,
da sede refrescando as fundas cicatrizes.
O céu - cúpula azul - de enorme azul-turquesa,
se enfeitava de sol e de nuvens atrizes.

Pássaros musicais, saudando a manhã nobre,
a escola, as plantações, as estrelas em penca,
as estradas que vão, de um sino o triste dobre...

Uma terra não há como a minha Santana:
Tem o terno verdor de um vasinho de avenca,
e o gosto sazonal de um cacho de banana.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Fonte> Lino Vitti. Antes que as estrelas brilhem. Piracicaba, 2001.

sábado, 20 de abril de 2024

Francisca Clotilde (Livro de Sonetos) = 3 =


HORA FESTIVA

Brilha o sol no infinito! A natureza em festa
Mostra um raro primor, por toda parte exulta
A flor, a estremecer no galho em que se oculta,
E o pássaro, a cantar, doce prazer atesta.

Nem um traço sombrio no horizonte resta,
Tudo azul a sorrir... pela leveza inculta,
Brinca a luz, que entre as ramas trêmulas se esfresta,
Enquanto cresce o dia, enquanto o dia avulta.

Perfumes no ambiente... aves pipilam... cantam
A linfa de cristal cujo murmúrio encanta
O espírito do poeta aureolado em dor.

Bendita seja tu, oh! Grande natureza,
Fonte eterna de paz, de graça, de beleza,
Que infiltras dentro em nós o bem, a luz, o amor!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

NO SOSSEGO DO CAMPO

Eis-me longe da praça! Em plena alacridade
Do campo aberto em flor, a sentir a poesia,
Como é lindo este azul e que beleza irradia
A luz que vem do céu, que vem da imensidade

Aqui ouço da linfa, a grata suavidade,
Num murmúrio de leve, ouço ali a melodia
Da mimosa avezinha a cantar que anuncia
O doce rosicler... A vida... A claridade...

Não me vem à lembrança a ventura falaz,
À atração da cidade eu prefiro esta paz
Que me inspira, conforta e reanima na luta;

No sossego do campo é mais doce a ventura,
Mais nitente o luar, sopra a brisa mais pura,
Deus parece mais perto e melhor nos escuta!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

O ALVORECER

Vai pouco a pouco o sol iluminando
A terra que se cobre de verdores,
Cantam as aves pelo azul voando
Seus inocentes, cândidos amores.

Por toda a parte luzes e primores
Sente-se o aroma delicado e brando
Da fresca rosa, as pétalas soltando
A natureza ostenta-se em fulgores.

Oh! Como é belo o despontar do dia!
Que coração não pulsa de alegria,
Ao ver a luz avassalar a terra?

Ergue-se a Deus o olhar agradecido
E o homem forte sente-se vencido
Pelas belezas que a manhã encerra!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

O CAMINHO DA GLÓRIA

Sempre a olhar a bandeira erguida e tremulante,
Visão sublime e pura, imagem consagrada,
E sentindo o amor, a chama acrisolada,
Esquece a noiva o lar e a família distante.

Que lhe importa morrer? Num ardor incessante
Quer ver enaltecida a flâmula sagrada
E o sangue a referver, vigoroso, estuante,
Que corra vivo e rubro, em prol da terra amada,

Ouve o som do canhão e inda mais se avigora;
Parece circundando em fulgores de aurora,
Na luz de um novo sol que anuncia vitória;

E, ao cair sobre a arena ainda fita a bandeira
Essa estrela que brilha, a mostrar altaneira,
Sobre as ruínas da Pátria, o caminho da glória!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

REMINISCÊNCIA

Era sempre ao sol pôr... Milhares de boninas
E rosas em botão, cravina multicores,
Junquilhos delicados e outras muitas flores
Eu reunia feliz para as aras divididas.

E que aroma sutil; nas horas vespertinas.
A linda primavera – a quadra dos amores –
Espalhava a sorrir, enquanto as pequeninas
Nuvens d’ouro, no azul, refletiam fulgores.

Como eu relembro agora aqueles belos dias!
O sino a bimbalhar... As doces litanias,
O trono envolto em luz, o incenso, a Mãe bendita...

Hoje o que se seduz? O mesmo céu é triste
E dentro de minha alma apenas subiste
Da aventura fugaz a saudade infinita.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

sexta-feira, 19 de abril de 2024

Emílio de Meneses (Poemas Escolhidos) = 2 =

 A CHEGADA

Noite de chuva tétrica e pressaga.
Da natureza ao íntimo recesso
Gritos de augúrio vão, praga por praga,
Cortando a treva e o matagal espesso.

Montes e vales, que a torrente alaga,
Venço e à alimáría* o incerto passo apresso.
Da última estrela à réstia ínfima e vaga
Ínvios caminhos, trêmulo, atravesso.

Tudo me envolve em tenebroso cerco
D'alma a vida me foge, sonho a sonho,
E a esperança de vê-la quase perco.

Mas uma volta, súbito, da estrada
Surge, em auréola. o seu perfil risonho,
Ao clarão da varanda iluminada!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Alimária = animal de carga
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

DA MINHA JANELA

Desta janela aberta aos eflúvios de Abril,
Vendo os que vão e vêm, a alma sonha e medita:
- "Pela vida- a lutar nesta faina febril,
Este e aquele, onde vão? de onde vêm nesta grita?”

O que se ama ou se odeia ou se busca ou se evita,
Tudo se cruza aqui numa trama sutil.
- Quantos a morte leva ou seja nobre ou vil,
Enquanto em pleno sol o vivente se agita? -

E penso então que desde o tempo mais distante
A rua vê correr a humana vaga, e nela,
Nada mudar da vida o drama palpitante.

E que outras ondas sempre aqui virão rolar...
Sempre as mesmas! porém, desta minha janela,
Outros - não eu! - virão vê-las ir e voltar…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

GOTA D’ÁGUA

Olha a paisagem que enlevado estudo!...
Olha este céu no centro! olha esta mata
E este horizonte ao lado! olha este rudo
Aspecto da montanha e da cascata!...

E o teu perfil aqui sereno e mudo!
Todo este quadro que a alma me arrebata,
Todo o infinito que nos cerca, tudo!
D'água esta gota ao mínimo retrata!...

Chega-te mais! Deixa lá fora o mundo!
Vê o firmamento sobre nós baixando;
Vê de que luz suavíssima me inundo!...

Vai teus braços, aos meus, entrelaçando,
Beija-me assim! vê deste azul no fundo,
Os nossos olhos mudos nos olhando!…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

O RIO GUERREIRO

Rota a vertente, a rocha rebentando,
Impetuoso em esguicho o campo irrora;
Regato agora, agora largo e brando,
De branca espuma a superfície enflora.

Logo torrente o crespo dorso impando,
- Quer seja noite, quer o veja a aurora –
Légua a légua o terreno conquistando,
Vai caudaloso pelo vale em fora.

Ei-lo afinal - o forte curso findo,
Num esforço estupendo, soberano.
Fero, revolto, arroja-se rugindo

Aos loucos roncos vagalhões do Oceano.
A Pororoca o estrondo repetindo
Eternamente do combate insano!…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

SALTO DO GUAÍRA

Largo oceano azul, ora margeando
Campina extensa, ora frondosa mata,
Léguas e léguas marulhoso e brando,
O rio enorme todo o céu retrata.

Súbito, as águas, brusco, represando,
Em torvelins de espuma se desata:
Vertiginoso, indômito, raivando,
Ruge, fracassa e tomba em catarata.

Tomba, e de novo em arco se levanta:
Nada a brancura esplêndida lhe turva
E na apoteose em que a caudal se expande,

Do sol aos raios, multicor se encurva
Em tanto resplendor e glória tanta,
Rútilo arco-íris, luminoso e grande. 
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

VIDA NOVA

De uma vida sem fé de nebuloso inverno,
Furtei-me sacudindo o gelo da descrença.
Aquece-me outra vez este calor interno,
Esta imensa alegria, esta ventura imensa.

Sinto voltar de novo a minha antiga crença,
Creio outra vez no céu, creio outra vez no inferno,
Na vida que triunfe ou na morte que a vença
Creio no eterno bem, creio no mal eterno!

E quando enfim do corpo a alma for desgarrada
E procure entrever a região constelada
Que aos bons é concedida, esplêndida a irradiar,

Ao coro festival de um hino triunfante
Abra-se a recebê-la, olímpico e radiante
Todo o infinito céu do teu sereno olhar!…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Fonte: Menezes, Emílio de. “Versos Antigos (1885-1889)”. In Obra reunida. RJ: José Olympio, 1980.

Recordando Velhas Canções (Imagine)


Composição: John Lennon 

Imagine que não exista paraíso
Imagine there's no heaven
É fácil se você tentar
It's easy if you try
Nenhum inferno sob nós
No hell below us
Acima de nós apenas o céu
Above us only sky
Imagine todas as pessoas
Imagine all the people
Vivendo o presente
Living for today

Imagine que não há países
Imagine there's no countries
Não é difícil
It isn't hard to do
Nenhum motivo para matar ou morrer
Nothing to kill or die for
E nenhuma religião também
And no religion too
Imagine todas as pessoas
Imagine all the people
Vivendo a vida em paz
Living life in peace

Você pode dizer que sou um sonhador
You may say I'm a dreamer
Mas eu não sou o único
But I'm not the only one
Eu espero que algum dia você se junte a nós
I hope someday you'll join us
E o mundo será um só
And the world will be as one

Imagine que não existam posses
Imagine no possessions
Eu me pergunto se você consegue
I wonder if you can
Sem necessidade de ganância ou fome
No need for greed or hunger
Uma irmandade de homens
A brotherhood of man
Imagine todas as pessoas
Imagine all the people
Compartilhando o mundo inteiro
Sharing all the world

Você pode dizer que sou um sonhador
You may say I'm a dreamer
Mas eu não sou o único
But I'm not the only one
Eu espero que algum dia você se junte a nós
I hope someday you'll join us
E o mundo viverá como um só
And the world will live as one 
= = = = = = = = = 

Imagine: Um Hino de Esperança e União de John Lennon
A canção 'Imagine', composta e interpretada por John Lennon, é um dos hinos mais emblemáticos da música contemporânea, transcendendo gerações com sua mensagem de paz e união. Lançada em 1971, a música propõe uma reflexão profunda sobre um mundo sem divisões e conflitos, onde a humanidade poderia viver em harmonia. A letra convida o ouvinte a imaginar um lugar sem as barreiras que frequentemente nos separam, como fronteiras nacionais, religiões e posses materiais.

Através de uma linguagem poética e de fácil compreensão, Lennon descreve um cenário utópico onde 'não há céu' e 'nenhum inferno abaixo de nós', sugerindo a eliminação da ideia de recompensa ou punição após a morte, o que poderia levar as pessoas a viverem mais pelo presente ('Living for today'). Ao imaginar 'nenhum país' e 'nenhuma religião também', a música aborda a possibilidade de um mundo sem guerras ou conflitos ideológicos, onde 'todas as pessoas' poderiam 'viver a vida em paz'.

A repetição do verso 'You may say I'm a dreamer' (Você pode dizer que sou um sonhador) é um reconhecimento de que essas ideias podem parecer idealistas ou inatingíveis, mas Lennon reforça que ele 'não é o único' a ter tais sonhos. Ele expressa esperança de que um dia mais pessoas se unirão a essa visão, resultando em um mundo unificado. 'Imagine' não é apenas uma canção, mas um chamado à ação para a humanidade repensar seus valores e aspirar a um futuro onde prevaleça a 'fraternidade do homem' e o compartilhamento coletivo dos recursos do mundo ('Sharing all the world').