sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

José Feldman (O Café da Tarde)

Era uma tarde ensolarada em Londrina/PR, e Luana decidiu visitar seu avô, Seu Afonso, que morava em um pequeno apartamento no centro da cidade. Ele sempre tinha histórias fascinantes sobre o passado, e Luana adorava ouvi-las. Ao chegar, encontrou-o sentado à mesa, tomando café e lendo um jornal antigo.

— Oi, vovô! — Luana disse, sorrindo ao entrar. — O que você está lendo?

— Ah, minha neta! — Ele respondeu, levantando os olhos. — Estou vendo as notícias de antigamente. Olha isso aqui, um anúncio de um carro que custava menos que um salário mínimo!

Luana se aproximou, interessada. — Uau, como as coisas mudaram, né? Hoje em dia, um carro é quase um sonho para muitos.

— É verdade. Na minha juventude, as pessoas sonhavam em ter um carro, mas o foco era diferente. A gente sonhava com pequenas coisas, como ter uma casa própria, uma família... — Seu Afonso disse, lembrando-se de tempos passados.

— E como eram esses sonhos, vovô? — Luana perguntou, sentando-se à mesa.

— Ah, os sonhos eram simples, mas cheios de significado. — Ele sorriu. — Eu queria estabilidade. O que importava era trabalhar duro e cuidar da família. Acredito que as pessoas valorizavam mais as relações pessoais.

— Hoje, parece que tudo é tão diferente. As pessoas estão mais focadas em ter sucesso rápido. — ela disse, balançando a cabeça. — Eu vejo meus amigos sempre correndo atrás de likes nas redes sociais.

— Likes? O que é isso? — Seu Afonso perguntou, franzindo a testa.

— É como uma forma de aprovação online. A gente posta fotos e o pessoal curte. — Luana explicou, meio envergonhada. — Mas às vezes fica parecendo que isso é mais importante do que viver as experiências de verdade.

— Sabe, Luana, na minha época, a gente valorizava mais o momento. Não ficávamos pensando em como os outros nos viam. — Seu Afonso disse, pensativo. — Acreditávamos que a felicidade estava nas coisas simples, como um passeio no parque ou um jantar em família.

— Isso é verdade, vovô. Mas hoje em dia, a pressão para ser “perfeito” é muito maior. — ela suspirou. — Todo mundo quer ser influencer, ter uma vida perfeita nas redes sociais.

— E o que é uma vida perfeita? — ele questionou, com um olhar curioso. — Na minha visão, a perfeição está nas imperfeições. Nas risadas, nas lágrimas, nas histórias que construímos juntos.

Ela sorriu, admirando a sabedoria do avô. 

— Você sempre tem uma forma especial de ver as coisas, vovô. Mas às vezes sinto que a geração mais nova não se conecta como antes. Nossos relacionamentos são mais superficiais.

— É verdade, Luana. A tecnologia trouxe muitas facilidades, mas também uma certa solidão. — Seu Afonso concordou. — Lembro-me de quando nos reuníamos com amigos para jogar baralho ou contar histórias. Não havia distrações. As pessoas se ouviam.

— Isso faz falta. — ela admitiu. — Às vezes, quando estou com meus amigos, todos estão no celular, e parece que estamos todos juntos, mas, na verdade, cada um está em um mundo diferente.

— E o que você faz para mudar isso? — ele perguntou, interessado.

— Eu tento propor atividades que nos tirem do celular, como ir a um parque ou fazer um piquenique. — ela respondeu. — Mas é um desafio!

— Você está no caminho certo! — Ele elogiou. — É importante cultivar relações verdadeiras. E não esqueça de passar tempo com a família. As memórias que criamos juntos são inestimáveis.

Luana olhou nos olhos do avô e percebeu como ele valorizava esses momentos. — Eu quero aprender mais com você, vovô. Suas histórias são inspiradoras.

— E você ainda tem muito a ensinar também! — ele disse, com um sorriso. — A juventude de hoje é mais engajada em questões como meio ambiente e justiça social. Isso é admirável.

— É verdade! Nós nos preocupamos mais com o futuro do planeta. — ela afirmou. — Tentamos fazer a diferença, mesmo que seja pequena.

— Isso é excelente! — Ele exclamou. — Na minha juventude, lutávamos por direitos básicos, mas agora vocês têm uma luta mais ampla. É bom ver que a chama está acesa.

— Mas às vezes me sinto perdida. — Luana confessou. — Há tantas causas e tanta pressão para fazer a coisa certa.

— A vida é cheia de incertezas, minha neta. — Seu Afonso disse. — O importante é agir conforme suas convicções. E não se esqueça de cuidar de si mesma no processo. A jornada é tão importante quanto o destino.

— Você tem razão, vovô. Às vezes, me preocupo tanto com o futuro que esqueço de viver o presente. — ela refletiu.

— A vida é um equilíbrio. — Ele sorriu. — E lembre-se: você não precisa ter todas as respostas agora. O que importa é continuar aprendendo e crescendo.

Luana se levantou e foi até a janela, olhando para a cidade. 

— Eu quero fazer a diferença, mas também quero aproveitar a vida, como você fez.

— E você pode! — Seu Afonso disse, levantando-se para ficar ao lado dela. — Encontre seu próprio caminho. E, acima de tudo, nunca perca a capacidade de se maravilhar com o mundo ao seu redor.

A tarde passou, e os dois continuaram conversando sobre vida, sonhos e diferenças entre as gerações. O café esvaziou, mas as ideias e as risadas encheram o ambiente. Luana sabia que, apesar das diferenças, havia um fio invisível que os unia: o amor e a vontade de aprender uns com os outros.

E assim, naquela tarde ensolarada, Luana e Seu Afonso descobriram que, embora as épocas fossem diferentes, as experiências e os sentimentos humanos permaneciam eternos e conectados, sempre prontos para serem compartilhados e celebrados.
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José Feldman nasceu na capital de São Paulo. Formado técnico de patologia clínica, não conseguiu concluir o curso superior de psicologia. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais; trovador da UBT São Paulo e membro da Casa do Poeta “Lampião de Gás”. Foi amigo pessoal de literatos de renome (falecidos), como Artur da Távola, André Carneiro, Eunice Arruda, Izo Goldman, Ademar Macedo, Hermoclydes S. Franco, e outros. Casado com a escritora, poetisa e tradutora professora Alba Krishna mudou-se em 1999 para o Paraná, morou em Curitiba e Ubiratã, radicou-se definitivamente em Maringá/PR. Consultor educacional junto a alunos e professores de universidades do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras e de trovas, fundador da Confraria Brasileira de Letras e Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, possui o blog Singrando Horizontes desde 2007, com cerca de 20 mil publicações. Atualmente assina seus escritos por Campo Mourão/PR. Publicou mais de 500 e-books. Em literatura, organizador de concursos de trovas, gestor cultural, poeta, escritor e trovador. Dezenas de premiações em trovas e poesias.

Fontes 
José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

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