segunda-feira, 5 de maio de 2025

Asas da Poesia * 17 *


Trova de
ARTHUR THOMAZ
Campinas/SP

Toda vez que me chamares, 
eu, desgarrado veleiro, 
singrarei todos os mares 
buscando teu paradeiro…
= = = = = =

Soneto de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

Uma vez um anjo apaixonou-se
(Manuel Antonio Pina in "Todas as Palavras - Poesia Reunida (1974-2011)", p. 52)

Uma vez um lindo anjo apaixonou-se
Ao fim de tantas viagens siderais
Por essa estrela que brilhava mais
E tinha a luz mais forte, quente e doce.

A vida rotineira alvoroçou-se
Começou a sofrer como os mortais
E nas vivas palpitações carnais
A sua alma errou e enredou-se.

Mas no reino sem fim desses espaços
Não se permitem beijos nem abraços
Entre vidas, assim, tão diferentes.

Recusando esse amor sem união
À beira do vazio dão a mão
E no céu fazem dois traços cadentes...
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Ó lua que vais tão alta 
Redonda como um tamanco! 
Ó Maria traz a escada 
Que não chego lá co’o banco! 
= = = = = = = = = = 

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Monjolo

A madeira antiga
Dilui-se com a passagem
Do tempo, tempo
Que afaga teus contornos...
A madeira antiga
Resiste e ainda
Insiste, em sobreviver,
Mesmo com a ausência das águas,
Mantém vivo
O som distante
E repetitivo.
Do teu cadenciado toque...
= = = = = = 

Trova de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

– Depressa!… A bolsa ou a vida.
– Mas, que sufoco, senhor!…
Diz a livreira polida.
– Não sabe o nome do autor?
= = = = = = = = =  

Poema de
ELISA ALDERANI
Ribeirão Preto/SP

Rei

Onde está meu rei?
Saiu do palácio…
Ele se foi.
Tudo ficou sem graça…
Mas não levou
Nem se quer uma taça.

Só os sonhos dele.
 
O trono ficou vazio
O resto ficou no mesmo lugar.
O tempo passou, esperei…
O rei não voltou,
Ninguém pegou seu lugar.

No trono agora,
Acredite se quiser,
Senta-se a poesia.

Ela sabe reinar.

Conduzir minha vida,
E, continuar a sonhar!
= = = = = = = = = 

Aldravia do
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

No
inefável
riso
chapliniano
lírica
tristeza
= = = = = = = = =  

Poema de
OLAVO BILAC
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918

Sonho

Quantas vezes, em sonho, as asas da saudade
Solto para onde estás, e fico de ti perto!
Como, depois do sonho, é triste a realidade!
Como tudo, sem ti, fica depois deserto!

Sonho... Minha alma voa. O ar gorjeia e soluça.
Noite... A amplidão se estende, iluminada e calma:
De cada estrela de ouro um anjo se debruça,
E abre o olhar espantado, ao ver passar minha alma.

Há por tudo a alegria e o rumor de um noivado.
Em torno a cada ninho anda bailando uma asa.
E, como sobre um leito um alvo cortinado,
Alva, a luz do luar cai sobre a tua casa.

Porém, subitamente, um relâmpago corta
Todo o espaço... O rumor de um salmo se levanta
E, sorrindo, serena, aparecer à porta,
Como numa moldura a imagem de uma Santa...
= = = = = = 

Trova de 
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/ RN, 1951 – 2013, Natal/ RN

Nos poemas que componho, 
de beleza quase extrema, 
eu ponho em verdade um sonho 
dentro de cada poema!
= = = = = = 

Poema de 
JOSÉ FARIA NUNES
Caçu/GO

Oração do educador

Inspirai-me
oh! Mestre dos Mestres
para que o mister a que me proponho
ilumine as mentes a mim confiadas
nessa jornada. Dai-me sabedoria
Oh mestre, para que mais que professor
seja eu educador, condutor de esperanças
para um novo amanhã. Tenha eu
complacência para com aqueles
que de mim mais necessitam. Como orientador
de vidas jamais a intolerância consiga
meu domínio e me force a trilhar
o cômodo caminho do descompromisso.
Esteja eu mais para Apóstolos que para Pilatos
com um assumir constante da Divina
Missão de educar, criar vidas, reinventar mundos.
Possa eu educar para a vida
longe da discriminação sem marginalizar ninguém,
pois todos da luz são herdeiros e merecedores.
Tenha eu sempre na alma a imagem,
a lembrança do Mestre-Amor, Mestre-Perdão
e jamais expulse meu aluno
que merece ser mais gente,
jamais um desviado na marginalidade da vida.
Jamais me deixe esquecer
de que a palavra orienta, mas o amor
e o exemplo constroem, edificam para a vida
para o mundo
e para Deus.
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Na velhice, as incertezas, 
para ocupar os espaços, 
vão empilhando tristezas 
e acumulando cansaços..
= = = = = = 

Soneto de
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994) Porto Alegre/RS

Lunar

As casas cerraram seus milhares de pálpebras.
As ruas pouco a pouco deixaram de andar.
Só a lua multiplicou-se em todos os poços e poças.
Tudo está sob a encantação lunar...

E que importa se uns nossos artefatos
lá conseguiram afinal chegar?
Fiquem armando os sábios seus bodoques:
a própria lua tem sua usina de luar...

E mesmo o cão que está ladrando agora
é mais humano do que todas as máquinas.
Sinto-me artificial com esta esferográfica.

Não tanto... Alguém me há de ler com um meio sorriso
cúmplice... Deixo pena e papel... E, num feitiço antigo,
à luz da lua inteiramente me luarizo...
= = = = = = 

Trova do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/ RN

Desperto e fico tristonho,
é triste o meu despertar,
ver acabado o meu sonho
antes do sonho acabar!
= = = = = = 

Hino de
SÃO TOMÉ/ RN

I
Entre terras serranas azuis
Um ar Olímpico o sopro vital
De mares Glaucos que embalsamam e conduzem
Em sesmaria a data do Pica-pau.

II
És banhada pelo Potengi amado
Que suas vertentes, fazem brotar
As produções que afluíram
A agricultura familiar.

III
Nesta terra bendita e fecunda
Suas riquezas podemos ressaltar
Entre todas, o algodão, ouro branco
E os minerais não deixemos de lembrar.

IV
Tu és boa terra hospitaleira
Em acolhimento não te podem igualar
Por isso hoje teus filhos jubilosos
Com alegria te querem saudar.

Refrão
São Tomé, terra de gente de fé
Não vejo, contudo creio
Nós teus filhos entre brados e aclamações
Aqui vimos abrigar-nos no teu seio.
= = = = = = = = =  

Trova de
ADALBERTO DUTRA REZENDE
Cataguazes/MG, 1913 – 1999, Bandeirantes/PR

A missão será cumprida,
quer tu acertes ou falhes;
Deus traça as linhas da vida,
e o destino, seus detalhes…
= = = = = = = = =  

Soneto de 
ANIBAL BEÇA
Manaus/ AM (1946 – 2009)

Profissão de fé

Meu verso quero enxuto mas sonoro
levando na cantiga essa alegria
colhida no compasso que decoro
com pés de vento soltos na harmonia.

Na dança das palavras me enamoro
prossigo passional na melodia
amante da metáfora em meus poros
já vou vagando em vasta arritmia .

No voo aliterado sigo o rumo
dos mares mais remotos navegados
e em faias de catraias me consumo.

É meu rito subscrito e bem firmado
sem o temor do velho e seu resumo
num eterno retorno renovado.
= = = = = = = = =  = = = = 

Trova de
RITA MOURÃO
Ribeirão Preto/ SP

Não lamento o meu outrora, 
nem choro uma dor vivida, 
lamento sim, a demora 
em por Deus em minha vida.
= = = = = = = = =

Poema de
AIRES DE ALMEIDA SANTOS
Bié/ Angola, 1922 – 1991, Benguela/ Angola

Meu amor da Rua Onze

Tantas juras nos trocamos,
Tantas promessas fizemos,
Tantos beijos roubamos,
Tantos abraços nos demos.

Meu amor da Rua Onze,
Meu amor da Rua Onze,
Já não quero
Mais mentir.

Meu amor da Rua Onze,
Meu amor da Rua Onze,
Já não quero
Mais fingir.

Era tão grande e tão belo
Nosso romance de amor
Que ainda sinto o calor
Das juras que nos trocamos.

Era tão bela, tão doce
Nossa maneira de amar
Que ainda pairam no ar
As promessas que fizemos.

Nossa maneira de amar
era tão doida, tão louca
Qu'inda me queimam a boca
Os beijos que nos roubamos.

Tanta loucura e doidice
Tinha o nosso amor desfeito
Que ainda sinto no peito
Os abraços que nos demos.

E agora
Tudo acabou.
Terminou
Nosso romance.

Quando te vejo passar
Com o teu andar
Senhoril,
Sinto nascer

E crescer
Uma saudade infinita
Do teu corpo gentil
De escultura
Cor de bronze,
Meu amor da Rua Onze.
= = = = = = = = =  

Poetrix de
ANGELA TOGEIRO
Belo Horizonte/MG

Falsa borboleta

Ousei ser lagarta e pupa.
Rompi o casulo
numa sociedade de asas tolhidas.
= = = = = = = = =  

Soneto de
GREGÓRIO DE MATOS
Salvador/BA, 1623 – 1696, Recife/PE

Soneto a uma saudade

Em o horror desta muda soledade,
Onde voando os ares a porfia,
Apenas solta a luz a aurora fria,
Quando a prende da noite a escuridade.

As cruel apreensão de uma saudade!
De uma falsa esperança fantasia,
Que faz que de um momento passe a um dia,
E que de um dia passe à eternidade!

São da dor os espaços sem medida,
E a medida das horas tão pequena,
Que não sei como a dor é tão crescida.

Mas é troca cruel, que o fado ordena;
Porque a pena me cresça para a vida,
Quando a vida me falta para a pena.
= = = = = = = = =  

Haicai de
ANGÉLICA VILLELA SANTOS
Guaratinguetá/SP, 1935 – 2017, Taubaté/SP

Cachecóis e mantas 
Amontoados sobre a cama: 
Frente fria que chega.
= = = = = = = = =  

Poema de
EUGÉNIO DE ANDRADE
Fundão/Portugal, 1923 – 2005, Porto/Portugal

As palavras que te envio são interditas

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma  regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos noturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.
= = = = = = = = =  

Limerique de
MARIANA U. BARDELLA
Americana/SP

Minha "peixinha"
é metidinha
um dia ela
foi parar na panela
virou comidinha.
= = = = = = = = =

Soneto de
LUCÍLIA A. T. DECARLI
Bandeirantes/PR

Amor oculto 

O amor na adolescência vem risonho,
sem oponência às flechas do cupido.
Sobre o ente amado, o olhar embevecido
se estende ao pensamento entregue ao sonho.

Exime-se, entretanto, de alarido
um sentimento oculto e assaz bisonho.
O dia,”lento,” torna-se enfadonho;
cálida, a noite tem bem mais sentido.

Introvertido, o impasse da existência…
No âmago eclodem chamas da eloquência,
somente extravasadas na poesia.

E tal poeta, frente a uma acuidade,
quando o sentir habita na saudade:
– do seu imenso amor, um só sabia!…
= = = = = = = = = 

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