Era uma vez um homem e uma mulher, casados e muito amigos. Mas, em dada altura, ela começou a sentir uma aflição e pôs-se a dizer que lhe estava a apetecer matar-se. E o marido disse-lhe:
- Vamos passear, vamos espairecer!
E foram. Depois ele andou para o campo e ela para casa. Nessa ocasião passou o Diabo, que ia muito apressado, e uma mulher feiticeira, que o viu, perguntou-lhe:
- Tu vais tão aflito? E ele respondeu:
- Queria arranjar aqueles dois para mim e não posso. - Aludia aos dois casados.
E ela disse-lhe:
- Isso te arranjo eu, mas quanto me dás?
- Dou-te umas chinelas.
E a feiticeira foi ter com o homem ao campo e pediu-lhe uma esmolinha. E o homem:
- Vá a casa ter com a minha mulher. E ela perguntou-lhe:
- A sua mulher é sua amiga?
- Sim, senhora, é muito minha amiga.
- Pois olhe que ela quer matá-lo.
A tal foi então a casa do homem e pediu a esmola à mulher. Perguntou-lhe:
- Q seu homem é seu amigo?
- É muito meu amigo.
- Pois olhe, se quer que ele seja mais seu amigo, fique a cirandar e deixe-o adormecer, corte-lhe dois cabelos da cabeça e traga-os consigo. Isso então é que ele há-de ser seu amigo.
A mulher assim fez. Deixou-o adormecer, pegou numa tesoura e foi ver se ele dormia. Pôs-se a examinar e foi com a tesoura para ele. Ele então levantou-se e sempre acreditou o que a outra lhe tinha dito, pois que cuidava que a tesoura era para ela o matar. Mas quem a matou foi ele.
Depois a feiticeira foi ter com o Diabo e disse-lhe:
- Venham, venham para cá as minhas chinelas.
E ele exclamou, pondo-se à distância:
- De longe!... Toma lá! Fizeste num dia o que eu não fiz num ano!
Fonte:
Viale Moutinho (org.) . Contos Populares Portugueses. 2.ed. Portugal: Publicações Europa-América.
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