Se os meus suspiros pudessem
aos teus ouvidos chegar,
verias o quanto custa
esta ausência suportar.
2
Ausente de ti, distante,
não posso a vida sofrer,
sentindo tantas saudades,
como é possível viver?
3
Os meus amores perdidos,
que em minh'alma se criaram,
fazem hoje meu martírio
nas lembranças que deixaram.
4
Já não há papel, nem tinta,
nem pena em toda a cidade,
com que te escreva, meu bem,
tão rigorosa saudade.
5
Por ti vivo, por ti morro.
Por ti levo a suspirar:
O meu coração não pode
tua ausência suportar.
6
O ferro, mais a ferrugem,
e o tempo, tudo consome.
Só não posso consumir
a lembrança do teu nome.
7
Saudades que por ti passo,
não posso mandar dizer;
algum dia hei de contar-te,
se um dia puder te ver.
8
Antes eu nunca te visse
nem te tomasse amizade,
para agora me deixares
no rigor desta saudade.
9
Suspirar é meu sustento,
quando estou de ti ausente.
Nada me alegra o sentido,
só contigo estou contente.
10
Lá se vai meu coração,
amarrado com uma fita;
já que lá não posso ir,
aceita a minha visita.
11
Vai-te carta venturosa,
vai ver a quem quero bem;
Dize-lhe que eu fico a chorar
por não poder ir também.
12
Vai-se a tarde, vem o dia,
eu só de ti me lembrando,
faço a cama de suspiros,
quando me deito é chorando.
13
Passo as noites sem dormir,
passo os dias a gemer,
curtindo tantas saudades
como é possível viver?
14
Põe-se o sol e põe-se a lua,
põem-se as estrelas também,
só eu não posso me por
aos pés de quem quero bem.
15
Saudades que te persigam,
como me têm perseguido!
Por ti só falta morrer
ou perder os meus sentidos.
16
A saudade é matadora,
minha vida quer tentar;
Choro, suspiro e padeço,
já não posso mais penar.
17
As folhas do mato virgem
dá-lhes o vento, todas bolem.
Meu benzinho não te aflijas,
de saudades ninguém morre.
18
Se as saudades matassem
eu havia de morrer,
só não morro porque tenho
esperanças de te ver.
19
Se os meus suspiros pudessem
a teus ouvidos chegar,
verias que uma saudade
é bem capaz de matar.
20
Tristes ais, negras saudades
não me mates de repente,
que para matar não basta
querer bem, viver ausente...
21
A saudade me constrange
e me mata sem querer;
Esse teu peito, menina,
meu túmulo há de ser.
22
A gente só quando morre
é na terra consumida:
A saudade é sofrimento
que consome mesmo em vida.
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Júlio Afrânio Peixoto (Lençóis/BA, 1876 – 1947, Rio de Janeiro/RJ) foi um médico, político, professor, crítico literário, ensaísta, romancista e historiador brasileiro. Ocupou a cadeira 7 da Academia Brasileira de Letras, e a cadeira 2 da Academia Brasileira de Filologia, da qual foi fundador. Passou sua infância no interior da Bahia, na cidade de Canavieiras (onde há uma biblioteca e rua com seu nome), vivenciando situações e paisagens que influenciariam muitos dos seus romances. Formou-se em Medicina, em Salvador, no ano de 1897. Sua tese inaugural, "Epilepsia e crime", despertou grande interesse nos meios científicos do país e do exterior. Em 1902, mudou-se para a capital do país, na época, Rio de Janeiro, onde foi inspetor de Saúde Pública e diretor do Hospital Nacional de Alienados, em 1904. Ministrou aulas de Medicina legal na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (1907) e assumiu os cargos de professor extraordinário da Faculdade de Medicina (1911); diretor da Escola Normal do Rio de Janeiro, em 1915 e diretor da Instrução Pública do Distrito Federal no ano seguinte. Em 1916, após 3 anos ministrando a disciplina de Medicina Legal, torna-se professor titular da cadeira na Faculdade Nacional de Direito da UFRJ. Foi eleito deputado federal pela Bahia, ficando no cargo no período de 1924 a 1930. Após isto, voltou à atividade do magistério sendo professor de História da Educação no Instituto de Educação do Rio de Janeiro, em 1932. Em 1934 foi agraciado com a Grã-Cruz da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico de Portugal. Foi reitor da Universidade do Distrito Federal em 1935 e, após 40 anos de relevantes serviços, aposentou-se. Iniciou na literatura no ano de 1900 com a publicação do drama Rosa mística. Drama em cinco atos, luxuosamente impresso em Leipzig, com uma cor para cada ato. Entre 1904 e 1906 esteve em vários países da Europa, a fim de adquirir novos conhecimentos. Ao retornar ao Brasil esqueceu-se da literatura e pensou apenas na medicina. Nesse período foi grande sua produção de obras de cunho médico-legal-científica. O romance foi uma implicação a que o autor foi levado em decorrência de sua eleição para a Academia Brasileira de Letras, em 7 de maio de 1910, para a qual fora eleito à revelia, quando se achava no Egito, em sua segunda viagem ao exterior. Quase como que por obrigação, começou a escrever o romance A esfinge, o que fez em três meses antes da posse da Cadeira nº 7. O Egito inspirou-lhe o título e a trama novelesca. O romance, publicado no mesmo ano, obteve um sucesso incomum e colocou seu autor em posto de destaque na galeria dos ficcionistas brasileiros. Afrânio Peixoto obteve, na época, grande aprovação de crítica e prestígio popular. Existe no Palácio Imperial, em Petrópolis, uma placa comemorativa onde se lê: "Nesta sala, durante cinco verões, Afrânio Peixoto disse cousas. Que cousas! e como as disse!". Como ensaísta escreveu importantes estudos sobre Camões, Castro Alves e Euclides da Cunha. Como médico, conheceu e estudou as ideias e teorias de Freud, levando-as para muitos de seus romances. Teve colaboração na publicação periódica Atlântida (1915–1920) e na revista luso-brasileira Atlântico.
Algumas obras: Rosa mística — drama (1900); Lufada sinistra — novela (1900); A esfinge — romance (1911); Trovas brasileiras (1919); Fruta do mato — romance (1920); As razões do coração — romance (1925); História da literatura brasileira (1931); Livro de horas (1947), etc.
Fontes:
Afrânio Peixoto (seleção). Trovas populares brasileiras. RJ: Francisco Alves, 1919. Disponível em Domínio Público.
Biografia = https://pt.wikipedia.org/wiki/Afrânio_Peixoto
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