"Trovas populares anônimas não são apenas trovas "eruditas" dos
grandes poetas, as trovas literárias, que um dia se perdem no rio da grande
popularidade, afogando seus autores, são também as trovas rústicas e
imperfeitas que nascem da alma do povo, na boca dos cantadores, dos violeiros,
dos sanfoneiros, dos poetas populares anônimos que enxameiam no interior do
Brasil e de Portugal. Verdadeiros filões de ouro de nossa sensibilidade e de
nosso espírito".
Na síntese clara e expressiva de algumas poucas palavras, J. G. nos oferece uma
esplêndida definição sobre a trova popular anônima. Quem não sente a alma do
nosso povo, tão sentimentalmente romântico, nesta trova popular anônima,
autêntica e deliciosa cantiga, uma das mais lindas que conhecemos?:
Vou-me embora,
vou-me embora
segunda-feira
que vem.
Quem não me
conhece, chora,
que dirá quem
me quer bem!
Ao que tudo indica, esta trova deve ter surgido no Nordeste, uma vez que a
expressão “que dirá”, significando quanto mais, é tipicamente nordestina.
Quando éramos garoto e nadávamos no rio de nossa cidadezinha, ouvíamos
diariamente as bravatas dos pequenos nadadores, em desafios mútuos: "Você,
que é medroso, atravessou o rio, que dirá eu!"
Outra deliciosa quadrinha popular é esta:
Todo homem é
um diabo,
não há mulher
que o negue.
Mas todas elas
procuram
um diabo que as
carregue!...
Talvez em represália, apareceu esta quadrinha popular, muito ao sabor das
mocinhas, que, mal começam a namorar, já sentem prazer em alfinetar os seus
futuros maridos:
Deus, quando
fêz o homem,
não precisou
cerimônia:
– deu-lhe o corpo
de um boneco
e a cara de um
sem-vergonha.
Muito embora "cerimônia" não rime com "sem-vergonha", a
quadrinha é deliciosa; todavia, por êsse defeito de rima, não a consideramos
Trova, na moderna acepção do termo. Sem dúvida poderia caber-lhe o título de
trova, mas apenas no sentido mais amplo e vago da palavra, ou seja, de
composição poética ligeira, despretensiosa, cantiga popular, etc.
Concluindo, aqui ficam mais alguns exemplos de trovas populares anônimas:
O meu pai é
Juca Caco;
minha mãe,
Caca Maria;
ajuntando os
cacos todos,
sou filho da
cacaria.
___________
Ó beija-flor
de asa branca,
que mora na
pedra ôca,
toda menina
bonita
merece um
beijo na bôca!
___________
Não seja tão
imprudente,
olhe bem por
onde vai.
Sua mãe morreu
sem dente,
de tanto
morder seu pai.
___________
Dizem que o
pito alivia
as mágoas do
coração;
eu pito, pito
e repito,
e as mágoas
nunca se vão.
Algumas vezes acontece que a trova, além de ser popular anônima, vem em
linguagem chula ou caipira:
Bezerro de
vaca preta
onça pintada
não come.
Quem casa com
muié feia
não tem mêdo
de outro home.
___________
continua… Trovas mistas e trovas
bipartidas
Nenhum comentário:
Postar um comentário