António Fernandes Aleixo nasceu em Vila Real de Santo António, uma pequena cidade do
Algarve, sul de Portugal, na fronteira com a Espanha, 18 de fevereiro de 1899 e
faleceu em Loulé/Portugal, a 16 de novembro de 1949.
Filho de um operário
tecelão, teve uma infância de dificuldades e foi obrigado a abandonar os
estudos antes de completar o segundo ano de escolaridade. Sua experiência com
poesia surgiu ainda aos dez anos de idade: há, no sul de Portugal, um antigo
costume de grupos de crianças que vão de porta em porta, à época das festas
natalinas, cantar as “janeiras”, quadras que se vão repetindo, alterando-se
apenas o nome do dono da casa, que é então homenageado em troca de algum
dinheiro ou prenda natalina. Como o repertório de seu grupo se esgotara, Aleixo
começou a inventar, por si próprio, as quadras para o pequeno grupo de cantores
populares. A vida de António Aleixo, contudo, foi de
sobrevivência difícil em meio à pobreza daqueles primeiros anos do século XX:
foi tecelão, como o pai; serviu o exército, onde aprenderia de fato a ler e
escrever, ainda que de forma rudimentar; depois, policial; imigrou para a
França, onde exerceu o ofício de pedreiro; foi depois vendedor de cautelas de
loteria – ocupações que mantinha em paralelo aos improvisos em praça pública,
que, em pouco tempo, se tornaram uma nova fonte de renda, pois passou a se
apresentar em festas populares e romarias, ocasiões em que começou também a
vender seus versos impressos. Sobre suas várias profissões, escreveu Aleixo:
Fui
polícia, fui soldado,
Estive
fora da Nação,
Vendo
jogo, guardei gado,
Só
me falta ser ladrão.
(ALEIXO,
1978, p. 16)
Em
1942, por iniciativa de um amigo de António Aleixo, um relojoeiro da cidade de
residência do poeta, Loulé, fez-se imprimir em uma gráfica local uma folha
datilografada com cerca de duas dúzias de quadras do poeta que ele, o
comerciante, colecionara. Joaquim de
Magalhães, à época professor do Liceu de Loulé, recebeu um exemplar da
pequena coletânea e, entusiasmado pela qualidade poética que observou na
despretensiosa obra, propôs-se a fazer uma compilação das quadras de António
Aleixo, servindo-lhe de “secretário” para coletar material suficiente para a
publicação de um volume de poesias. Sobre esse fato, escreveu Aleixo:
Não
há nenhum milionário
que
seja feliz como eu
tenho
como secretário
um
professor do liceu.
(ALEIXO,
1983, p.102)
António
Aleixo, contudo, no mesmo ano de lançamento de seu primeiro livro, descobre-se
também tuberculoso como a filha e, por conta da intervenção de diversos
artistas de renome a seu favor, consegue internação em um sanatório na cidade
de Coimbra. Naquela cidade, conheceu outros escritores, como Miguel Torga, e
produziu um segundo volume de quadras, chamado Intencionais, e duas peças
teatrais de inspiração vicentina, o Auto do CURAndeiro (sic) e o Auto
da Vida e da Morte. A doença, contudo, não cedeu com sua estada no
sanatório de Coimbra e, em 1949, António Aleixo viria a falecer na cidade de
Loulé, de tuberculose. Por conta do temor do contágio e por desconhecimento, os
vizinhos que atenderam ao poeta em seus últimos dias de vida atearam fogo a
alguns dos muitos cadernos nos quais Aleixo registrou, incentivado por Joaquim
de Magalhães, suas quadras e poemas.
Uma
das razões formais para o sucesso das quadras de António Aleixo é o uso quase
que exclusivo de versos em redondilha maior. Norma Goldstein, em seu compêndio
intitulado Versos, sons, ritmos, recorda que o “verso de sete sílabas
[...] é o mais simples, do ponto de vista das leis métricas” e também o “verso
tradicional em língua portuguesa”, que já era “freqüente em cantigas medievais”
(GOLDSTEIN, 2001, p. 27) e perenizou-se nas cantigas de roda, quadras e canções
populares. Outro recurso usado intuitivamente por Aleixo é a composição de
rimas alternadas – ABAB – externas e consoantes, a qual auxilia no ritmo
natural da fala em língua portuguesa e oferece fácil identificação por parte do
leitor. Tais elementos formais são, ainda, característicos da literatura oral e
das formas cantadas de poesia popular, gêneros dentro dos quais Aleixo
desenvolveu seu talento poético.
Embora
praticasse formas tradicionais de poesia, em si mesmas limitadoras – o quarteto
de sentido completo e a sextilha –, Aleixo impunha a esse gênero um traço
bastante peculiar de narrativa e de crônica do cotidiano. Seus temas principais
oscilavam entre a crítica social, os infortúnios de uma vida miserável e os
acontecimentos pontuais do cotidiano português. Curiosamente, quase nada de sua
produção ecoa os temas amorosos ou o saudosismo tão presentes na poesia
lusitana que o antecedeu:
Nas
tuas horas mais tristes
de
mágoas e desenganos,
pensa
que já não existes,
que
morreste há muitos anos.
(ALEIXO,
1983, p. 85)
Considerado
um dos poetas populares portugueses de maior relevo, afirmando-se pela sua
ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo
também é recordado como homem simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim
ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário
português da primeira metade do século XX.
No
emaranhado de uma vida cheia de pobreza, mudanças de emprego, emigração,
tragédias familiares e doenças, na sua figura de homem humilde e simples houve
o perfil de uma personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas
realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem
parte profissões como tecelão, polícia e servente de pedreiro, trabalho este
que, como emigrante, exerceu em França.
De
regresso ao seu Algarve natal, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde passou a
vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas,
atividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a
alcunha de «poeta-cauteleiro».
Faleceu
vítima de uma tuberculose, a 16 de novembro de 1949, doença que tempos antes
havia também vitimado uma de suas filhas.
Poeta
possuidor de uma rara espontaneidade, de um apurado sentido filosófico e
notável pela «capacidade de expressão sintética de conceitos com conteúdo de
pensamento moral», Aleixo tinha por motivos de inspiração desde as brincadeiras
dirigidas aos amigos até à crítica sofrida das injustiças da vida. É notável em
sua poesia a expressão concisa e original de uma "amarga filosofia,
aprendida na escola impiedosa da vida".
A
sua conhecida obra poética é uma parte mínima de um vasto repertório literário.
O poeta, que escrevia sempre usando a métrica mais comum na língua portuguesa
(heptassílabos, em pequenas composições de quatro versos, conhecidas como
"quadras" ou "trovas"), nunca teve a preocupação de registrar
suas composições. Foi o trabalho de Joaquim de Magalhães, que se dedicou a
compilar os versos que eram ditados pelo poeta no intuito de compor o primeiro
volume de suas poesias (Quando Começo a Cantar), com o posterior registro do
próprio poeta tendo o incentivo daquele mesmo professor, a obra de António
Aleixo adquiriu algum trabalho documentado. Antes de Magalhães, contudo, alguns
amigos do poeta lançaram folhetos avulsos com quadras por ele compostas, mais
no intuito, à época, de angariar algum dinheiro que ajudasse o poeta na sua
situação de miséria que com a intenção maior de permanência da obra na forma
escrita.
Estudiosos
de António Aleixo ainda conjugam esforços no sentido de reunir o seu espólio,
que ainda se encontra fragmentado por vários pontos do Algarve, algum dele já
localizado. Sabe-se também que vários cadernos seus de poesia, foram cremados
como meio de defesa contra o vírus infeccioso da doença que o vitimou, sem
dúvida, um «sacrifício» impensado, levado a cabo pelo desconhecimento de seus
vizinhos. Foi esta uma perda irreparável de um patrimônio insubstituível no
vasto mundo da literatura portuguesa.
A
opinião pública aceitou a primeira obra de António Aleixo com bom agrado, tendo
sido bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1.100 exemplares, o
livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao Poeta Aleixo uma pequena
melhoria de vida, contudo ensombrada pela morte de uma filha sua, com
tuberculose. Desta mesma doença viria o poeta a sofrer pelos tratamentos que a
vida lhe foi impondo, tendo de ser internado no Hospital – Sanatório dos
Covões, em Coimbra, a 28 de junho de 1943.
Em
Coimbra começa uma nova era para o poeta que descobre novas amizades e
deleita-se com novos admiradores, que reconhecem o seu talento, de destacar o
Dr. Armando Gonçalves, o escritor Miguel Torga, e António Santos (Tóssan),
artista plástico e autor da mais conhecida imagem do poeta algarvio, amigo do
poeta que nunca o desamparou nas horas difíceis. Os seus últimos anos de vida
foram passados, ora no sanatório em Coimbra, ora no Algarve, em Loulé.
A
27 de maio de 1944 recebeu o grau de Oficial da Ordem de Benemerência.
Fontes:
– Robertson Frizero Barros . “Perdão,
porque mal sei ler” – apresentando António Aleixo, poeta popular português. In
Revista Nau Literária. PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 03 N. 02 – jul/dez
2007
– https://pt.wikipedia.org/wiki/António_Aleixo
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