(foi mantida a grafia original)
Embora não constituindo categorias distintas, há trovas que apresentam
particularidades curiosas quanto à sua mensagem e, mais raramente, quanto à
origem. Estão neste caso as trovas mistas e as trovas bipartidas. Trovas mistas
são aquelas que, pela sua mensagem, são, ao mesmo tempo, líricas e filosóficas,
filosóficas e humorísticas, humorísticas e líricas e até mesmo
lírico-filosófico-humorísticas. Não há mistério algum, pois a idéia contida
numa trova pode exprimir simultâneamente essas três nuances do sentimento.
Vejamos um exemplo de trova mista lírico-filosófica. É de autoria do consagrado
trovador Orlando Brito:
Até num êrro
há nobreza,
se com teu
pranto o reparas,
— Mesmo a lama
tem beleza
no fundo das
águas claras...
Com efeito, se os dois primeiros versos pregam um conceito filosófico, os dois
versos finais nos oferecem uma comparação de grande delicadeza poética,
revestida de encantador lirismo.
Belmiro Braga nos proporciona um exemplo perfeito de trova mista
filosófico-humorística:
Quanta vez,
junto ao jazigo,
alguém murmura
de leve:
– "Adeus
para sempre, amigo"
E o morto diz:
– "Até breve!..."
Antônio Sales, um dos grandes trovadores brasileiros do começo do século, é o
autor desta trova mista lírico-humorística:
Se as santas
no paraíso
possuem os
teus encantos,
eu fico muito
indeciso
sôbre a
virtude dos santos...
As trovas mistas de mensagem tríplice, lírico – filosófico – humorísticas são,
naturalmente, mais raras. Como exemplo, citaremos duas trovas. A primeira é de
autoria de Lindouro Gomes; a segunda, de
Petrarca Maranhão:
A tua jura não
passa
de falsidade
patente:
– engana como
a cachaça,
que alegra
tombando a gente.
______
Eu pergunto
muito a mêdo,
quase a sentir-me
covarde:
– nasceste por
demais cedo,
ou fui eu que
nasci tarde?
As trovas bipartidas (pela mensagem) são aquelas que nos dois primeiros versos
exprimem uma idéia, e nos dois versos finais outra coisa muito diferente. Entre
os dois pensamentos não há qualquer relação. São desconexos e, muitas vêzes,
disparatados. Essas trovas, que comumente são populares anônimas, têm a sua
graça, sua brejeirice. Eis um exemplo:
Debaixo
daquela ponte
passa boi, passa
boiada.
Quero que você
me diga
se vai ser a
minha amada.
continua… Trovas Mistas
Fonte:
Aparício Fernandes. A Trova no Brasil: história & antologia. Rio de
Janeiro/GB: Artenova, 1972
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