terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

Caldeirão Poético LXXIX


Murilo Fontes
Juiz de Fora/MG, 1901 – 1975, Lisboa/Portugal

SINOS DA TARDE

São seis horas da tarde... são seis horas!
Vibram nos ares carrilhões divinos!
Por que sofres minh'alma, por que choras
pela tardinha, ao repicar dos sinos?

São seis horas... e eu sei... Tu não demoras...
Dentro em breve chegavas... mil violinos
cantavam no meu peito como auroras
a bendizer os nossos dois destinos!

São seis horas... meu Deus! Quanta harmonia,
duas vidas vivendo uma só vida
na glorificação de um grande amor!

São seis horas... eu rezo... morre o dia!...
Que saudades de ti, minha querida!
— Sinos da tarde, cessem por favor!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Paschoal Carlos Magno
Rio de Janeiro/RJ, 1906 – 1980

À MINHA MÃE

A tua sombra é doce e comovida,
o teu destino de árvore tonteia...
A tua vida, que mais linda vida?
Toda de pássaros e ninhos cheia...

A sombra deu a tantos acolhida,
a árvore tudo dando pouco anseia:
cada vez mais cansada e envelhecida,
a ramaria para o chão arqueia...

Mas quando o vento vem rodopiando,
a árvore, cuja sombra é boa e doce,
abre os braços em súplica, chorando.

Choro de folhas! Alma dos caminhos...
Enche todos os Céus como se fosse
choro de mãe para embalar os ninhos...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Paulo Fender
Belém/PA, 1912 – 1981, Rio de Janeiro/RJ

NÃO ERA AMOR...

Não era amor aquele amor veemente,
que me trazia em êxtase profundo
e que causava inveja a toda gente,
como se fosse o amor maior do mundo.

Era, apenas, talvez, abismo fundo,
em que se rola involuntariamente,
coisa estranha, que um deus fero e iracundo
fez brotar no meu peito, de repente.

Não era amor, torno a afirmá-lo, e creio
que todo aquele insopitado anseio
por vê-la sempre a mesma, eterna e linda,

era simples loucura de criança,
porque hoje, velho, o coração não cansa
de me dizer que não amei ainda!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Rosemar Pimentel
Niterói/RJ, 1905 – 1975

PEQUENINO MORTO

Morreu. Vestiram-no de branco e veio
entre outras crianças rútilas, mimosas,
dar o corpinho emagrecido e feio
à tristeza das tumbas dolorosas.

As mãozinhas em cruz, postas no seio,
como duas saudades silenciosas,
tornavam-se mais lívidas, no meio
das grinaldas, dos lírios e das rosas.

Eu, que encontrei o féretro na estrada,
penso na dor de quem ficou sozinho
e vejo, pela aldeia desolada,

que quando passa o corpo desse anjinho,
enquanto os outros pais não dizem nada,
o coração das mães chora baixinho!...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Santiago Vasques Filho
Teresina/PI, 1921 – 1992, Fortaleza/CE

NATAL DO ÓRFÃO

— "Mamãe, Papai Noel não veio ainda?
No ano passado, ele chegou tão cedo!... “
E a mulher, voz tremente, a tarde finda,
tenta encobrir o trágico segredo:

"Vai dormir, que ele vem... Não tenhas medo.
Olha as estrelas... como a noite é linda!...
Põe teu sapato ali, que o teu brinquedo
há de deixar, por certo... É cedo ainda...”

Dorme o garoto, e acorda com surpresa,
vendo vazio o gasto sapatinho!
"Ele não veio!..." — e logo o pranto vaza...

—"Sim, filhinho, não veio... Com certeza
não encontrou teu pai pelo caminho,
ou se esqueceu do número da casa!...”
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Vulmar Coelho
Santana dos Ferros/MG, ??? – ????, Juiz de Fora/MG

MELANCOLIA

A gente morre um pouco todo o dia.
O tempo vai matando, devagar,
os sonhos, um por um, a fantasia,
essa ilusão ingênua de sonhar.

A vida é como o sol — nasce, irradia...
Depois vem vindo a luz crepuscular.
Despedem-se os prazeres, a alegria,
e só resta um consolo recordar.

O corpo cansa de viver. A estrada
fica deserta e triste. A caminhada
é mais penosa pelo anoitecer.

Fica-se abandonado ao léu da sorte,
e quando, finalmente, chega a morte,
a gente já tem pouco que morrer.

Fonte> Vasco de Castro Lima. O mundo maravilhoso do soneto. 1987.

Nenhum comentário: