CAROLINA RAMOS
Santos/SP
Profecia
(Elo partido...)
Muitas vezes te disse - tens lembrança?:
– Muda! por nossos filhos! - E, também,
que a renúncia constante anula, cansa,
quando improfícua... e só de um lado vem.
Lembrei-te (quantas vezes!] é a confiança
base que o templo conjugal sustém.
E estremecia a última esperança
de envelhecermos juntos... mal ou bem!
Cumpriu-se a profecia! O eco ressoa!
Cai o arruinado templo! Embora doa,
nossos elos partiram-se! Defuntos,
os sonhos se perderam no caminho!
Tanta mentira e ausência de carinho,
que ao fim da estrada, não chegamos juntos!
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Poema de
MACHADO DE ASSIS
Rio de Janeiro/RJ, 1839 – 1908
Mundo interior
Ouço que a natureza é uma lauda eterna
De pompa, de fulgor, de movimento e lida,
Uma escala de luz, uma escala de vida
De sol à ínfima luzerna.
Ouço que a natureza, — a natureza externa, —
Tem o olhar que namora, e o gesto que intimida
Feiticeira que ceva uma hidra de Lerna
Entre as flores da bela Armida.
E contudo, se fecho os olhos, e mergulho
Dentro em mim, vejo à luz de outro sol, outro abismo
Em que um mundo mais vasto, armado de outro orgulho,
Rola a vida imortal e o eterno cataclismo,
E, como o outro, guarda em seu âmbito enorme,
Um segredo que atrai, que desafia — e dorme.
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Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR
Casulo de vidro
Ofusca-me a visão
Esses encontros com o espelho
A dualidade entre o passado
E o presente, repleto de ausências,
Dos traços envoltos em brumas
O doloroso mergulho:
Quebrar o espelho
Sem fragmentar a essência
Sentir na pele, a lâmina que corta
E recorta - cura -
Desfalecer de dor
No silenciar da alma,
Na solidão do "casulo de vidro"
Buscando respostas
Na sequência de pétalas eternas-
“Flor da Vida”-
Aroma de bálsamo –
Aquietando meu coração.
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Poetrix de
PEDRO CARDOSO
Brasília/DF
Outono
as folhas amareladas
dizem que o meu coração
mudou de estação
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Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal
Sou um cansaço que findou no sono
(Narciso Alves Pires, in “Para além do adeus”)
Sou um cansaço que findou no sono
Da tarde triste em que morreu o dia
E quando a noite o meu corpo acolhia
O sol desceu do seu dourado trono.
A doce paz nasceu desse abandono
Mistura de mistério e nostalgia
E, aos poucos, o meu ser desfalecia
Como folha que tomba pelo Outono.
A mansidão abraça-se ao sossego
E eu fico numa luz, num aconchego
Como nunca, em meus dias, eu vivi.
O tempo foi passando devagar
E não sendo eu capaz de me acordar
Só então é que eu soube que morri.
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Soneto de
OLAVO BILAC
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918
Ida
Para a porta do céu, pálida e bela,
Ida as asas levanta e as nuvens corta.
Correm os anjos: e a criança morta
Foge dos anjos namorados dela.
Longe do amor materno o céu que importa?
O pranto os olhos límpidos lhe estrela...
Sob as rosas de neve da capela,
Ida soluça, vendo abrir-se a porta.
Quem lhe dera outra vez o escuro canto
Da escura terra, onde, a sangrar, sozinho,
Um coração de mão desfaz-se em pranto!
Cerra-se a porta: os anjos todos voam...
Como fica distante aquele ninho,
Que as mães adoram... mas amaldiçoam!
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Soneto de
ANTERO DE QUENTAL
Ponta Delgada/Portugal, 1842 – 1891
Intimidade
Quando, sorrindo, vais passando, e toda
Essa gente te mira cobiçosa,
És bela - e se te não comparo à rosa,
É que a rosa, bem vês, passou de moda...
Anda-me às vezes a cabeça à roda,
Atrás de ti também, flor caprichosa!
Nem pode haver, na multidão ruidosa,
Coisa mais linda, mais absurda e doida.
Mas é na intimidade e no segredo,
Quando tu coras e sorris a medo,
Que me apraz ver-te e que te adoro, flor!
E não te quero nunca tanto (ouve isto)
Como quando por ti, por mim, por Cristo,
Juras - mentindo - que me tens amor...
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Trova de
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/ RN, 1951 – 2013, Natal/ RN
A distância nos redime
se a saudade nos escolta;
ir pra longe é tão sublime
como sublime é a volta!
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Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal
Teu nome
Fecho os olhos pela luz dos teus
A escuridão tem o teu nome
Quando chegas sem pedir licença.
Trazes nos gestos a graciosidade da açucena
Um brilho distinto de beleza sem mácula
Vontade projetada pelo fulgor dos sentidos.
Tudo o que vejo, tudo o que sinto
É um sorriso, um ansiado aroma teu
Um olhar suspenso no tempo
Naquele dia onde esmoreceu.
Abro os olhos de ofuscada saudade.
O que me falta em palavras
Sobra-me de teus gestos ausentes!
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Haicai de
GUILHERME DE ALMEIDA
Campinas/SP 1890 – 1969 São Paulo/SP
O Pensamento
O ar. A folha. A fuga.
No lago, um círculo vago.
No rosto, uma ruga.
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Poema de
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994) Porto Alegre/RS
Saudade
Que me dizias, Augusto Meyer,
naquele tempo que não passa,
na mesa, junto à vidraça,
naquele bar que era um barco?
Por ela passavam mares,
passavam portos e portos,
ali que os ventos ventavam,
dos quatro cantos do mundo!
O que dizíamos? Sei lá!
não falemos em nossas vidas...
nem, por nós, se salvou o mundo...
Mas, Amigo, eu sei que tenho
— naquelas horas perdidas —
o meu ganho mais profundo!
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Hino de
ANAHY/ PR
Neste solo gentil dadivoso
Onde outrora o café imperou
O pioneiro com seu braço valoroso
O agreste sertão desbravou
Na clareira do mais puro encanto
A capela de Sant'Ana se ergueu
e anunciando o progresso ao recanto
Anahy majestosa nasceu
Na lavoura a magia singela
O algodão canta um hino de amor
Com o milho e a soja tão bela
Revezando com o trigo em flor
Qual presentes da mãe natureza
A irrigar as riquezas daqui
Correm rios da mais alva beleza
Irmanados ao rio Piquiri
Tuas portas estão sempre abertas
Acolhendo com carinho e afeição
Todo aquele que procura rotas certas
Aqui encontra abrigo e união
Anahy és um exemplo seguro
A inspirar este povo gentil
No labor construindo o futuro
E a grandeza do nosso Brasil
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Soneto de
BENEDITA AZEVEDO
Magé/ RJ
Meu primeiro amor
Lembras nosso primeiro carnaval?
Eu dançava no corso na avenida...
Ao me vês acenaste da calçada
A música era bela e original.
Ao ver-te disparou meu coração,
O amor que despertava no momento
Sob o som da marchinha, e o sentimento,
Trouxe à minha alma muita inquietação.
Cheguei naquele dia no trabalho,
Mas teu olhar em fuga deixou o meu
Percebi que sentias tal qual eu.
Meu amor que nasceu sob o orvalho,
Deu frutos, em dois filhos que gerou,
E em cinco netos o amor eternizou
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Trova de
CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/ SP, 1945 – 2021, Santos/ SP
Imensidões veneráveis,
que me fazem navegar,
céu e mar, inseparáveis,
na linha do meu olhar.
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Soneto de
CRUZ E SOUZA
Florianópolis/SC, 1861-1898, Antonio Carlos/MG
Sonho branco
De linho e rosas brancas vais vestido,
Sonho virgem que cantas no meu peito!...
És do Luar o claro deus eleito,
Das estrelas puríssimas nascido.
Por caminho aromal, enflorescido,
Alvo, sereno, límpido, direito,
Segues radiante, no esplendor perfeito,
No perfeito esplendor indefinido...
As aves sonorizam-te o caminho...
E as vestes frescas, do mais puro linho
E as rosas brancas dão-te um ar nevado...
No entanto, Ó Sonho branco de quermesse!
Nessa alegria em que tu vais, parece
Que vais infantilmente amortalhado!
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Uma Lengalenga de Portugal
O QUE ESTÁ NA GAVETA?
O que está na gaveta?
Uma fita preta.
O que está na varanda?
Uma fita de ganga
O que está na panela?
Uma fita amarela
O que está no poço?
Uma casca de tremoço
O que está no telhado?
Um gato malhado
O que está na chaminé?
Uma caixa de rapé
O que está na rua?
Uma espada nua
O que está atrás da porta?
Uma vara torta
O que está no ninho?
Um passarinho
Deixa-o no morno
Dá-lhe pãozinho.
Vamos ver se ele pia?
Piuuuuuuuuuuuuuu!
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Quadra Popular de
FERNANDO MÁXIMO
Avis/ Portugal
Cria um filho para ser
paladino das verdades,
não o cries para ter
vícios… defeitos… maldades…
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Soneto de
MÁRIO ZAMATARO
Curitiba/PR
Ingenuidade
Quero ter a minha voz
pra dizer abertamente
que uma farsa aperta os nós
e disfarça impunemente!
E direi como é feroz,
como faz tranquilamente
o papel doce de algoz
e se crê ser inocente.
Usa a lei como sofisma,
tem acordo com a ilusão
pra fazer cavilação.
Quer impor sempre o seu prisma
e não vê nisso maldade,
deve ser ingenuidade!
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Poemeto de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP
Ouvia-se os respingos
caindo inertes, sem emoção.
Não era chuva, orvalho,
tampouco pranto.
Somente borrifadas...
Talvez poesia,
talvez um nada no chão.
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