SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/ SP
Clausura
Reclusa no próprio
tempo, seu sorriso
é seu sentimento.
Ora transborda paz, um alento,
às vezes um leve contratempo.
Atada em utopias, é momento,
ou somente uma página virada
levada por folhagens no vento.
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Poema de
CLARISSE CRISTAL
Balneário Camboriú/SC
Algaravia
Encontrei as chaves perdidas de papai
Estavam lá, estáticas e bem seguras
Na algibeira interna
Do meu sobretudo negro
Agora sou eu que não me encontro mais
Acordo pelo amanhã
E contíguo a mim
Uma angústia
Infinda
De ser uma outra pessoa
Alheia do que fui até a pouco
Desaprendi
A compor em versos com poesia
Desaprendi a contemplar o vago
E o vazio inquebrantável
Do noturno silêncio oblíquo
Em noite perdida no campo santo
Encontrei as outrora chaves perdidas de papai
Agora a luz do dia faina
O meu corpo oco e insípido
Inerte em duas rodas velozes
Encontrei as chaves perdidas de papai
E minha nova paixão
Surge sempre benfazeja
Ao final do expediente
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Poema de
FABIANE BRAGA LIMA
Rio Claro/ SP
Alma de poeta
Meus versos se rasgaram com o tempo,
As minhas mãos calejadas sangraram,
Ao escrever infindos poemas.
Hoje sou o grito intenso das madrugadas,
Sou o silêncio árduo em forma de rimas,
Sou a alma do poeta que derrama lágrimas...
A cada lágrima, nasce uma nova poesia...!
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Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ ES
Amada
Que bom que acreditastes
Na minha volta, paixão
Se magoei teu coração
Perdoa, eis-me aqui
Acabou tua infelicidade
Sou tua Felicidade:
voltei pra ficar.
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Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN
Já pronta e de vela içada
tremulando de ansiedade,
vai para o mar a jangada
carregada de saudade!
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Poema de
SOUSÂNDRADE
Guimarães/ MA 1833 – 1902, São Luís/ MA
Inverno
Salve! felicidade melancólica,
Doce estação da sombra e dos amores-
Eu amo o inverno do equador brilhante!
A terra me parece mais sensível.
Aqui as virgens não se despem negras
À voz do outono desdenhoso e déspota,
Ai delas fossem irmãs, filhas dos homens!
Aqui dos montes não nos foge o trono
Dessas aves perdidas, nem do prado
Desaparece a flor. A cobra mansa,
Cor d’azougue, tardia, umbrosa e dútil,
No marfim do caminho endurecido
Serpenteia, como onda de cabelos
Da formosura no ombro. À noite a lua,
Qual minha amante d’inocente riso,
Co’a face branca assenta-se nas palmas
Da montanha estendendo os seus candores,
Mãe da poesia, solitária, errante:
O sol nem queima o céu como os desertos,
Simpáticas manhãs é sempre o dia.
Geme às canções d’aldeia apaixonadas
Mui saudoso violão: as vozes cantam
Com náutico e celeste modulado.
Chama às tácitas asas o silêncio
Ao repouso, aos amores: as torrentes
Prolongam uma saudade que medita:
Vaga contemplação descora um pouco
O adolescente e o velho: doce e triste
Eu vejo o meu sentir a natureza
Respirar do equador, selvagem bela
De olhos alados de viver, à sombra
Adormecendo d’árvore espaçosa.
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Poema de
EDITH CHACON THEODORO
São Paulo/SP
Ler
Ler.
Ler sempre.
Ler muito.
Ler “quase tudo”.
Ler com os olhos, os ouvidos, com o tato,
pelos poros e demais sentidos.
Ler com razão e sensibilidade.
Ler desejos, o tempo,
o som do silêncio e do vento.
Ler imagens, paisagens, viagens.
Ler verdades e mentiras.
Ler o fracasso, o sucesso, o ilegível,
o impensável, as entrelinhas.
Ler na escola, em casa, no campo,
na estrada, em qualquer lugar.
Ler a vida e a morte.
Saber ser leitor,
tendo o direito de saber ler.
Ler simplesmente ler.
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Hino de
INDIAROBA/ SE
Era começo do século XVIII
Catecúmenos vieram aqui se instalar
Em incursão entre os bravos silvícolas
Para a antiga "Feira da Ilha" habitar
Sobre as águas do rio que nos banha
Os imigrantes conseguiram aqui chegar
E entre os quais vieram ilustres jesuítas
Com a missão de evangelizar.
Abençoada seja Indiaroba
Recanto amado, hospitaleiro e sacrossanto
Iluminada seja Indiaroba
com a luz do Divino Espírito Santo
Disputaram os dois fortes caciques
capitães-mor: José de Oliveira Campos
e Manoel Francisco da Cruz e Lima
pela posse da Vila do Espírito Santo.
Se seria de Sergipe ou da Bahia,
foi decidido através Decreto-Lei
sendo, pois, a divisa o Rio Real da Praia
Ganhou a posse Sergipe Del-Rei!
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Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO
Ribeirão Preto/SP
Não lamento o meu passado,
nem mesmo o tempo me ofende.
Viver é um aprendizado
quem mais vive mais aprende.
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Poema de
RAINER MARIA RILKE
Praga/ Tchecoslováquia (1875 – 1926)
O homem que lê
Eu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde… em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.
E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa.
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Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR
Poético abandono
As folhas de hera cobrem tuas paredes.
Portas, janelas e varandas,
Lembrando verdes demãos
de tintas,
Afagos a protegê-la das
intempéries...
A escada com nove degraus, ainda,
Preserva parte do mármore,
A porta principal, já sem a dourada
Maçaneta é aberta com facilidade,
E a cada passo, sinto a solidão -
Um silêncio especial espreita-me
Nos gastos tapetes, no piano
Deixado à própria sorte,
Sonhando com Debussy...
A alma da casa abandonada
Refugia-se em imagens e sons
Do passado -
Continuo minha aventura -
Caminhada, sem pressa, com o olhar
E, curiosa, abro mais uma porta,
Encontrando, janelas sem vidros
Que deixam o canto dos pássaros
Mais próximos, fazendo parte
Da linda, mas esquecida, adega
As garrafas de vinho,
Sem rótulos e rolhas
(Nuas - vazias)
Ocupam prateleiras
Como se livros fossem -
Lunetas encantadas
Intocáveis,
Umas sobre as outras
Cobertas por camadas de poeira
Lembram uma segunda pele
Imagino diálogos entre
As garrafas e as partículas de pó,
E a sonolenta cadeira, sem palhas,
A observá-las...
Ah, esse aconchego da passagem
Do tempo, tatuando objetos e sonhos -
Tempo, que tudo desgasta, esmaece,
(Enferruja)
leva os sorrisos e, aos poucos
Ávida desaparece...
Choro com ela, sinto
Na casa adormecida
Um poético abandono,
Quem sabe,
Ela despertará
Em uma futura aquarela,
Quem sabe?
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Quadrão à antiga de
LOURIVAL BATISTA
Itapetim/PE
O Cantador repentista,
Em todo ponto de vista,
Precisa ser um artista
De fina imaginação,
Para dar capricho à arte,
E ter nome em toda parte,
Honrando o grande estandarte
Dos oito pés de Quadrão!
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Glosa de
FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 – 2020
Mote:
O meu verso tem o cheiro
Da poeira do sertão.
(Manoel Dantas)
Glosa:
Nasce o sol, outra manhã
Se espreguiça, é novo dia
E a morte, má, se anuncia
No canto da acauã
Ave de agouro, malsã,
Que canta nossa desgraça
Sobrevoando a carcaça
Do boi que ontem era são
Hoje inerte jaz no chão
No pé do seco imbuzeiro
O meu verso tem o cheiro
Da poeira do sertão.
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Quadra de
AGOSTINHO DA SILVA
Porto/Portugal, 1906 – 1994, Lisboa/Portugal
Não corro como corria,
nem salto como saltava,
mas vejo mais do que via
e sonho mais que sonhava.
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Poema de
CELSO BRASIL
Curitiba/PR
Tu, eu e a poesia
Te amo com toda energia,
Te quero bem perto de mim,
Mas também tem a Poesia!
Eu Quero as duas, enfim!!!
Te peço... não tenhas ciúme!
Sem ela não posso te amar!
Da minha montanha, ela é o cume,
Do cume, amor te quero gritar!
Abro os braços à magia,
Entre eles, sempre estarás.
Mas se não abraço a Poesia,
A ti... como me declarar?
Poesia, minha eterna amante.
Tu, minha eterna paixão.
A Poesia me leva adiante!
E tu! levo em meu coração.
Se me deixares amá-la,
Para ti também existirei.
Mas se me apartares dela,
Sem versos, então, morrerei.
Ficarás chorando no báratro,
Quando eu tiver que me ir.
Consolar-te até o reencontro,
Sei que a Poesia há de ir.
Tu e a poesia, então, juntas
Viverão a me relembrar.
De vez em quando unidas,
Ambas se porão a chorar.
Nesse momento, querida,
Certamente, ali estarei.
Tu e a Poesia formam minha vida!
E, assim, nunca mais morrerei.
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Trova de
NEI GARCEZ
Curitiba/PR
Entre o sonho e a verdade
vai vivendo, em seu juízo,
toda a nossa humanidade
seu inferno ou paraíso.
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Soneto de
CARLOS NEJAR
Porto Alegre/RS
Poemas e Sapatos
Nada tenho de meu, nem os sapatos
que vão acompanhar este defunto.
Nem tampouco montanhas e regatos
que habitaram o verso, nem o indulto
pode valer-me, o soldo, mero extrato
de contas. Nada tenho, nem o intuito
consome esta vontade ou desacato.
Desapareça o nome, seu reduto
de carne e bronze, a fome incorporada
e mais desapareça onde fecundos
são dias e são deuses nesta amada.
Não foram nunca meus — sonhos e fatos.
Nada tenho. Poemas e sapatos
irão reconhecer-me noutro mundo.
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