segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 76 =


Trova de Cantagalo/RJ

RUTH FARAH NACIF LUTTERBACK
Cantagalo/RJ, 1932 – 2017

Um céu de rara beleza, 
a invejar o mundo inteiro, 
nos dá a plena certeza 
de que Deus é brasileiro. 
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Poema de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

É Natal... (será?)

Saudades daqueles Natais folguedos 
quando eu, igual a toda meninada,
pedia pro Papai Noel, brinquedos:
uma bola, um carrinho ou uma espada!
Na cartinha, escrevia: Meu querido
Papai Noel, eu quero de presente...
e nela eu descrevia o meu pedido
da maneira mais simples e inocente!
Hoje vejo um Natal bem diferente,
quando as lojas, com seus "papais noéis",
procuram, de maneira indiferente,
tão somente exaurir os saquitéis,
impondo a todos tudo é "presente",
e pondo Jesus Cristo pra viés!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

OCTÁVIO BABO FILHO
(1915 – 2003)

Rezando pelos demais,
eu de mim sempre me esqueço.
Eles que rezem por mim,
quando acharem que eu mereço…
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

BENI CARVALHO
Aracati/CE, 1886 – 1959, Rio de Janeiro/RJ

O cais

Quando te vejo, velho cais, em ruínas,
perscruto a tua vida secular:
— Manhãs radiosas em que te iluminas!
— Serenas noites de encantado luar!

Viste, partindo, ao canto das matinas,
velhas naus, brancas velas, pelo mar:
— Dourados sonhos, ilusões divinas,
ânsia de descobrir e conquistar!

Hoje, todo em tristeza, te esbarrondas;
mas uma voz oculta, dentre as ondas,
te diz: "A sorte não te foi tão má:

Terás, em ti, esta legenda impressa:
— Recolheste o sorrir do que regressa
e a saudade de quem não voltará".
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Trova Premiada na Academia Brasileira de Trova/1991

VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba/PR

Eu sempre lutei sentindo,
nesta arena em que se vive,
a mão de Deus dirigindo
cada conquista que eu tive. 
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

Perguntas vãs

Que me vale a vida sem amor;
amor sem carinho;
carinho sem ternura;
ternura sem meiguice;
meiguice sem querer;
você em saudade;
saudade sem você?!
– Nada!...
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Trova Popular

Eu amante e tu amante,
qual de nós será mais firme?
Eu como o sol a buscar-te,
tu como a sombra a fugir-me?
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Soneto de Ilhavo/Portugal

DOMINGOS FREIRE CARDOSO

Tenho a alma vestida de saudade
(Maria Paulina de Sousa in "Coração à Solta'', p. 45)

“Tenho a alma vestida de saudade”
Como a noite se cobre de negrume
A dor se desabafa num queixume
E a candura se enfeita de verdade.

Partindo, tu levaste a claridade
Desse dia sem paz e sem perfume
Na lareira apagou-se o brando lume
E de mim fizeste uma só metade.

Tenho o corpo dorido pela espera
Que tu voltes e faças Primavera
No chão que tanta chuva já bebeu.

Vem antes que eu me torne um malfeitor
A saudade me faça um pecador
E eu vá deixando, aos poucos, de ser eu.
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros

Cinema mudo: o pianista,
na solidão da coxia,
valorizando o artista,
tocava.., ninguém o via.
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Poema do Rio de Janeiro/RJ

CATULO DA PAIXÃO CEARENSE
São Luís/MA, 1863 — 1946, Rio de Janeiro/RJ

Tu passaste por este jardim

Tu passaste por este jardim!
Sinto aqui certo odor merencório
Desse branco e donoso jasmim
Num dilúvio de amoras pendeu
Os arcanjos choraram por mim
Sobre as folhas pendidas do galho
Que a luz de seus olhos brilhantes verteu.

Tu passaste, que de quando em quando
Vejo nas rosas no hastil lacrimado
Das corolas de todas as flores
As minhas angústias, abertas em flores
Neste ramo que ainda se agita
Uma roxa saudade palpita
E esse cravo, no ardor dos ciúmes
Derrama os perfumes num poema de amor.

De um suspiro deixaste o calor
Neste cálix de neve, estrelado
Neste branco e gentil monsenhor
Vê-se os íris de um beijo esmaltado
Tu deixaste num halo de dor
Nas violetas magoadas, sombrias
A tristeza das ave-marias
Que rezam teus lábios à luz do Senhor.

Vejo a imagem da minha ilusão
Nessa rosa prostrada no chão
Meus afetos descansas nos leitos
Deste lindo amores-perfeitos
Como chora o vernal jasmineiro
Que me lembra o candor de teu cheiro!
Este cravo sanguíneo é uma chaga
Que se alaga no rubor da cor.

As gentis magnólias em vão
Muito invejam teu rosto odoroso
Rosto que tem a conformação
De um suspiro adejando saudoso
E esses lírios têm a presunção
De imitar em seus níveos brancores
Esses dois ramalhetes de amores
Andores de flores num seio em botão.
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Flagrando a esposa e o banqueiro,
pensa bem e esquece o orgulho:
-Vou precisar de dinheiro...
e sai... sem fazer barulho!
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Soneto de Fortaleza/CE

CARLYLE MARTINS
(1899 – 1986)

O enterro do sol

O sol empalidece entre a seda macia
de um leito de rubis e opalas recamado.
As montanhas, entoando o funeral do dia,
de aromas sem iguais vão perfumando o prado.

Há um pesar pela terra inteira, que dir-se-ia
tudo na escuridão já ficou mergulhado.
Ao longe na ampla várzea enlutada e sombria,
vagaroso  se arrasta, em fileiras, o gado.

Torpor e indecisão. Vai chegando a penumbra.
Nuvens fogem do céu. Nada mais se vislumbra
nas matas onde a treva está quase a envolvê-las.

A noite, como um duende, a estender-se por tudo,
atira sobre a terra um manto de veludo
e desfia, no espaço, um rosário de estrelas.
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Trova de Bandeirantes/PR

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DE CARLI

Só poderás vivenciar
no amor toda a imensidão,
se souberes retirar
as pedras do coração!
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Spina de Bragança/PA

ROSE ROSÁRIO

Broto de sensível inteligência 

Escritor lavra letras!
Traz real significado. 
Dignifica a existência.

Perpetua com louvor, sua vivência 
tanto mais alegre caminhante liberto, 
seguindo toada, pegadas da essência.
Tenros raios, poeticidade, o aurorescer 
cúmplice, vê brotar sensível inteligência.
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

É um mero gesto, impensado,
mas causa tamanha dor,
tentar voltar ao passado
e reviver um amor!
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Soneto de Cantagalo/RJ

AMÉLIA TOMÁS
(1897 – 1992)

Canta!

Encarcera em teu verso, a cantar, tudo quanto
te cerca: — a luz, o som, a flor que o aroma encerra.
E celebra, em glorioso e sempiterno canto,
o céu, a noite, o sol, o luar, o campo e a serra.

Que o riso estue e vibre, e guaie e gema o pranto
dentro do verso teu como dentro da Terra!
Haja nele, da tarde ao pôr-do-sol, o encanto,
e haja o heroico clangor das trombetas da guerra!

Guarda do vento a raiva e as queixas merencórias.
Prende a sua expressão dentro da rima escassa,
desde o sopro da brisa à vergasta de Bóreas!

E canta o teu Amor num surto honesto e terso:
Celebra-o! Exalta-o! pois que Deus te fez a graça
de saberes cantar a tua mágoa em verso!
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Trova Premiada em Cruz Alta/RS, 1992

JOSÉ FELDMAN
Campo Mourão/PR

Foram felizes instantes...
Juventude na querência…
Hoje em terras tão distantes…
Pilcha... mate... sinto ausência.
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Poema de Catanduva/SP

ÓGUI LOURENÇO MAURI

Pintura Íntima

Teus predicados ocultos são tantos,
Tens, com eles, as bênçãos de Jesus.
Atenta que os picos de teus encantos,
Vistos por Deus, não são vistos à luz.

Destarte, faz teu coração magnânimo
Comandar, desde dentro de teu peito,
A prática do bem com todo o ânimo;
Sem alarde, sem vangloriar o feito.

Faz sempre prevalecer a moral
Frente ao foco material desprezível.
É o bem tomando o lugar do mal,
É o imortal se impondo ao perecível.

Fortalece-te mais interiormente,
Pondo à frente de tudo o coração.
Para os necessitados, sê presente;
Estende a mão amiga a teu irmão.

A beleza física não perdura.
Ela escapa do progresso moral.
Daí, a busca por outra pintura;
Pintura íntima, espiritual.
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Trova de Campos dos Goytacazes/RJ

DIAMANTINO FERREIRA

A trova, de qualquer jeito,
chega forte e vai bem fundo:
em seu contexto perfeito
já percorre todo o mundo!
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Escada de Trovas de São Paulo /SP

FILEMON MARTINS
(Filemon Francisco Martins)

Sonho

NO TOPO:
"Naquele dia, tristonho,
Pousaste os olhos nos meus:
- Vivi na tarde do sonho,
Morri na noite do adeus!"
Maria Thereza Cavalheiro
São Paulo/SP , 1929 – 2018

SUBINDO:
"Morri na noite do adeus"
quando de casa, saíste,
meu sofrimento só Deus
sabe que ainda persiste.

"Vivi na tarde do sonho"
quando entraste em minha vida,
tornei-me um homem risonho,
mas, chorei na despedida.

"Pousaste os olhos nos meus"
dando-me luz e esperança,
quase fui um semideus
e sorri como criança.

"Naquele dia, tristonho"
como doeu, ao saber,
que foste embora, suponho,
por deixar de me querer.
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Trova da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP

A liberdade germina
quando um povo pulsa e anseia,
qual semente pequenina
que rasga o solo e se alteia!
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Hino de Paranaguá/PR

Aos nossos mares vieram dantes,
Altivas naus, velas possantes,
Inflando à brisa de monção...
E, a voz dos lusos pioneiros,
O Itiberê viu os primeiros
Sinais de civilização.

Estribilho
Salve! Salve! Berço amado
Do Paraná sempre êxul!
Pórtico todo encantado
Aos sertanejos do Sul!

Hulhas éris de cataratas,
Onde rebrilham tantas pratas!
Terras verdes dos pinheirais!
Talvez não fosseis Paraná
Sem lusas quilhas vindo cá,
Em busca de ouro e de cristais...

Estribilho
Salve! Salve! Berço amado
Do Paraná sempre êxul!
Pórtico todo encantado
Aos sertanejos do Sul!

Sejamos pela liberdade
Ao lado da fraternidade,
Em fortes elos da união,
Que o nosso orgulho e a nossa glória
Têm uma página da história
Do Paraná e da Nação!

Estribilho
Salve! Salve! Berço amado
Do Paraná sempre êxul!
Pórtico todo encantado
Aos sertanejos do Sul!

Seja a grandeza nosso Norte
A paz e o amor - numa coorte
De bênçãos sempre a nos sorrir
E à luz da estrela do civismo
Entre canções de patriotismo
Eia! Marchemos ao porvir!

Estribilho
Salve! Salve! Berço amado
Do Paraná sempre êxul!
Pórtico todo encantado
Aos sertanejos do Sul!
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Trova Humorística de Pouso Alegre/MG

JOSÉ MESSIAS BRAZ

...Dá tudo quanto eu preciso...
roupas... nem cabem no armário...
prometeu-me o paraíso!...
- Ele é rico? – Não... otário!
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Poema de Atenas/Grécia

ZACHAROULA GAITANAKI

Primavera

A natureza se levantou
e se vestiu em cores familiares,
o ar transporta milhares de cheiros,
fragrâncias de flores
e o sol brinca na terra.
Em toda parte está 
a sabedoria de Deus
e a gente faz silêncio.
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

DURVAL MENDONÇA 
(1906 – 2001)

Ao beijar a tua mão,
 que o destino não me deu,
 tenho a estranha sensação
 de estar roubando o que é meu...
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O leão vencido pelo homem

Pôs-se em venda uma pintura
Onde estava figurado
Leão de enorme estatura
Por mãos humanas prostrado.

Mirava a gente com glória
O painel. Eis senão quando,
Um leão que ia passando,
Lhe diz: «É falsa a vitória.

Deveis o triunfo vosso
A ficção, blasonadores!
Com mais razão fora nosso,
Se os leões fossem pintores.»
(tradução: Bocage)

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