quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 78 =


Trova de Pouso Alegre/MG

CIOMARA FERNANDES CASCELLI

Um cumprimento, um sorriso,
“obrigado” logo após...
À paz só isso é preciso:
- um pouco de todos nós!
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Poema de São José dos Campos/SP

MYRTHES MAZZA MASIERO

Em fogo brando

Enquanto escolhos os feijões,
sem querer faço alusões;
um grão..., dois...
e enfim,
não sobra tempo pra mim!
Corro para lavar o arroz,
deixo a mágoa pra depois.
Enquanto lavo as verduras,
me frito em conjeturas...
Enquanto escorro os legumes,
vou ruminando os queixumes.
Enquanto tempero a carne,
sinto ligar meu alarme...
Enquanto destrincho o frango,
fervo a raiva em fogo brando.
Enquanto aqueço a gordura,
unto as minhas queimaduras.
Enquanto o fogo se mantém,
Santo Deus! Sou uma refém...
Enquanto misturo os molhos,
cascas de sonhos, recolho.
Enquanto a salada esfria,
asso a vida em banho-maria.
Na hora de pôr a mesa
é que refogo a tristeza.
Mas quando sirvo o cozido...
Ah! Nem tudo está perdido!...
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Trova Paulista

CAMPOS SALES
Lucélia/SP, 1940 – 2017, São Paulo/SP

A mágoa que a um pai consome,
e do olhar rouba-lhe o brilho,
é ver a cara da fome
na cara do próprio filho!
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Soneto de São José dos Campos/SP

AMILTON MACIEL MONTEIRO

Artesão

Quisera ser poeta... Sou apenas
um humilde artesão da poesia,
que lida com palavra, a duras penas,
para louvar o amor com alegria.

Trabalho quando as noites são amenas
e tenho a alma cheia de estesia;
tal qual oleiro que produz dezenas
de vasos até ver o que queria...

O artífice de si só dá o melhor,
na busca de alegrar seu bem maior,
que é uma das razões de seu viver.

Se não tem perfeição de um bom poeta,
coloca o coração no que arquiteta...
Por seu amor..., não importa se morrer!
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Trova Premiada  no Rio de Janeiro/RJ, 2006

LUIZ POETA
Luiz Gilberto De Barros 
(Rio de Janeiro/RJ)

De tanto voar sozinho
No rumo de alguma flor,
Meu coração passarinho
Fez ninho no teu amor.
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

Regresso

Que fazes aqui?!
Mandaram-te embora
                         E somente agora
                    vens procurar
                          o teu ninho antigo
                            para te abrigar?!...

Pobre coitada!...
Por que fostes assim desprezada?...
...tamanha maldade fizeram contigo...

Mas, se vens para ficar
Com este primeiro
E verdadeiro
amigo,

Podes entrar... venha, SAUDADE,
Fique comigo!...
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Trova Popular

Das lágrimas faço contas
com que rezo às escuras;     
oh! morte que tanto tardas!        
oh! vida que tanto duras!    
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Soneto da Alemanha 

WALTER BENJAMIM 
(Walter Benedix Schönflies Benjamin)
Berlim/Alemanha (1892 - 1940) Portbou/Espanha

A Mão que a Seu Amigo Hesita em Dar-se 

Perguntaste se eu amo o meu amigo?
como rompendo um demorado açude
na tua voz quis hausto que transmude
todo o cristal dos ímpetos consigo

Neste meu choro enevoado abrigo
pôs-me a palavra o peito em alaúde
que uma doce pergunta tua ajude
no sim furtivo que eu levei comigo

Mas a meu lábio lento em confessar-se
um mestre inda melhor o cunharia
A mão que a seu amigo hesita em dar-se

ele a tomou o que mais firme a guia
para que ao coração secreto amando
ao mundo todo em rimas o vá dando.

(Tradução de Vasco Graça Moura)
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Trova Humorística de Portugal

ANTONIO ALEIXO
(António Fernandes Aleixo)
Vila Real de Santo António (1899 — 1949) Loulé

Uma mosca sem valor
pousa com a mesma alegria,
na cabeça de um doutor
como em qualquer porcaria.
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Poema de Ribeirão Preto/SP

RITA MARCIANO MOURÃO

Fonte de inspiração

O dia amanhecia flamejante.
Dentro de mim também flamejava, amanhecia.
No carro de boi, Sô Quincas Carreiro carreava
nossas tralhas e alegrias.
íamos para vila assistir aos rituais da Semana Santa.
Meu pai, minha mãe e eu,
todos no carro que seguia rangente estrada afora.
Cantávamos hinos de louvor.
O carro também cantava um monólogo triste
que invadia os grotões do sertão das Minas Gerais.
Dentro dele eu, meio santa, meio profana,
sonhava encontrar meu seguidor entre os seguidores de Cristo.
Quanto sonho, quanta esperança no coração daquela
criança verde!
O tempo passou e cumpriu sua meta, à revelia.
O asfalto engoliu a terra, a estrada ficou cinzenta
e meus sonhos mudaram de cor.
Só o carro de boi varou meus sentimentos,
atravessou fronteiras
e até hoje me fala de POESIA!
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Não houve pancadaria
nem sufoco na paquera...
“Sou homem”, disse a Maria.
Ainda bem que o Zé... não era!
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Soneto de Sorocaba/SP

DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

Folhas Esparsas

Quando a tarde, ao cair, toda dourada,
lenta transmuda em gradações cambiantes,
sinto minh’ alma sensibilizada,
afinar-se ao sabor dos tons mutantes.

E os versos que componho em tais instantes
assumem cor ardente ou desmaiada:
vivos do leve Alegro aos sons vibrantes,
tristes, do grave Adágio à dor velada.

São notas desprendidas da Sonata,
dispondo um clima de jovial Cantata,
ou da Pavana o sufocado grito.

São folhas soltas, pelo vento esparsas…
Verdes ou murchas, voam como garças,
deixam meus sonhos no azul do infinito.
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Trova de Bandeirantes/PR

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DE CARLI

Deves repartir teu pão
com quem pede, no momento,
pois, às vezes, a inversão
ocorre ao sabor do vento...
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Spina de São Paulo/SP

SOLANGE COLOMBARA

Reencontro

Exalas cada manhã 
tuas cores, pairando 
nas esquinas frias 

ilusões, ou serão velhas poesias?
Um badalar do sino, timidamente, 
anuncia em vozerios, tuas magias
ou será um poeta (re)descobrindo 
este renascimento todos os dias?
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

Tua voz a sussurrar,
quando estamos nos amando,
parece a brisa do mar,
mansas ondas encrespando...
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Soneto de Portugal

LUIS VAZ DE CAMÕES
Coimbra (1524 – 1580) Lisboa

XIX

Alma minha gentil, que te partiste
Tão cedo desta vida descontente,
Repousa lá no Céu eternamente,
E viva eu cá na terra sempre triste.
            
Se lá no assento Etéreo, onde subiste,
Memória desta vida se consente,
Não te esqueças daquele amor ardente,
Que já nos olhos meus tão puro viste.

E se vires que pode merecer-te
Alguma coisa a dor que me ficou
Da mágoa, sem remédio, de perder-te,

Roga a Deus, que teus anos encurtou,
Que tão cedo de cá me leve a ver-te,
Quão cedo de meus olhos te levou.
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Trova Premiada em Juiz de Fora/MG, 1988

ANA MARIA MOTTA 
(Nova Friburgo - RJ)

Quando a vida nos golpeia
e o trauma nos acompanha,
qualquer montinho de areia
ganha forma de montanha!
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Poema dos Estados Unidos

ROBERT FROST
(Robert Lee Frost)
São Francisco (1874 – 1963) Boston

A Família da Rosa

 A rosa é uma rosa
E sempre foi rosa.
Mas hoje se usa
Crer que a pera é rosa
E a maçã vistosa
E a ameixa, uma rosa.
Pergunta a amorosa
Que mais será rosa.
Você, claro, é rosa –
Mas sempre foi rosa.

(Tradução: Renato Suttana)
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Cuidado, amigo, atenção... 
não beba o primeiro trago. 
– Quando se escuta o trovão, 
o raio já fez o estrago!
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Indriso de Villanueva e La Geltrú/Espanha

ISIDRO ITURAT

O Ladrão de Lençóis

Um raio de lua que é pássaro e homem
através do xadrez do vitrô entra,
e de halo, então, passa a corpo denso.

É chamado pelo dormir das que não sabem
de seus sonhos e, assim, os lençóis
rouba. E quiçá deixe como se um orvalho

que fica no corpo ou como um sabor

de lua nos lábios ou um sonhar que esteve.
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Trova Humorística da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Deu a tantos seu carinho
que no enlace, em confusão,
deu o sim para o padrinho
e o beijo no sacristão!
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Hino de São Mateus do Sul/PR

Fulgurante no vigor da mocidade
São Mateus, bela cidade, meu torrão,
Eu te adoro como adoro a liberdade
E a ti levanto um altar no coração
Terra sublime, por Deus amada,
Tu és a fada do meu sonhar.
Neste regime de ardor e zelo
Ao bom e belo te quero amar.

ESTRIBILHO
Rainha bela do Iguaçu tão majestosa
Neste alvor esperanço e juvenil
Na tua vida já lutaste vitoriosa
Com amor pela grandeza do Brasil.
Terra sagrada, São-Mateuense
Que luta e vence com rigidez
Nesta alvorada de grandes feitos
Batem os peitos com altivez.

Da colina que entronizas dignamente
Ao longe vedes tuas matas de valor,
E ao beijar num longo beijo reverente
Teus alvos pés, o Iguaçu com tanto amor,
Bela cidade dos bons ervais
Que tem jamais tristeza e dor.
Na mocidade robusta e forte
Confieis a sorte do teu valor.
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Trova de Porto Alegre/RS

FLÁVIO ROBERTO STEFANI

Na pescaria, de fato,
notei teu jeito “chinfrim”,
mas o olhar era de gato:
um no peixe e outro em mim...
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Soneto de de Porto Alegre/RS

IALMAR PIO SCHNEIDER

Mágoas e queixas

Fazer versos é fácil - dir-me-eis -
se lerdes minhas páginas singelas
e simplesmente reparardes nelas
mágoas que nem de longe conheceis....

Se assim pensardes, nunca entendereis
da própria alma as fatídicas procelas
surgindo à noite, não em tardes belas,
e sois felizes porque não sofreis...

Se, no entanto, sentirdes a tristeza
transparecendo aqui nas entrelinhas
destes versos, que os leva a correnteza

a transbordar em zonas ribeirinhas,
é possível que tendes, com certeza,
queixas amargas iguais às minhas !
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Trova de Irati/PR

MAFALDA DE SOTTI LOPES

Toda semente que eu planto
nos sulcos da minha dor,
germina regada em pranto,
mas, desabrocha em amor!
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

Os lobos e as ovelhas

Os lobos e as ovelhas, que tiveram
Uma guerra entre si, tréguas fizeram:
Os lobos em reféns lhes entregavam
Os filhos; as ovelhas os cães davam.
Os lobinhos, de noite, pela falta
Dos pais, uivavam todos em voz alta:
Acudiram-lhes eles acusando
As ovelhas de um ânimo execrando;
Pois contra o que é razão e o que é direito,
Algum mal a seus filhos tinham feito:
Faltavam lá os cães que as defendessem,
Deu isto ocasião a que morressem.

Haja paz, cessem guerras tão choradas;
Mas fiquem sempre as armas e os soldados,
Que inimigos que são atraiçoados,
Tomaram ver potências desarmadas.
Não durmam, nem descansem confiadas
Em ajustes talvez mal ajustados:
Nem creiam na firmeza dos tratados,
Que os tratados às vezes são tratadas.
Só as armas os fazem valiosos;
E ter muitos, soldados ali juntos
Respeitáveis a reis insidiosos;
Senão, para os quebrar há mil assuntos;
E mais tratados velhos, carunchosos,
Firmados na palavra dos defuntos.
(tradução: Couto Guerreiro)

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