sábado, 10 de agosto de 2024

Arthur Thomaz (Velho Maracanã: reminiscências)

Em uma manhã de domingo, ecoa uma voz longínqua. Começa, então, a dura missão de afastar a ressaca resultante da balada da noite anterior. 

Ninguém levanta até que se ouve a frase mágica: “vai dar praia”.

Traje regulamentar: sunga, bermuda, chinelo, uma camiseta surrada e 10 cruzeiros no bolso interno da sunga.

Para completar: pingado e pão com manteiga na padaria mais próxima. Caminhando, até que surge o local mágico, a tão almejada e ensolarada praia.

Um mergulho e a ressaca vai embora. Em instantes está formado um time de futebol de areia. Gordos, magros, jovens, idosos, mulheres e crianças, em um elenco heterogêneo e democrático.

O jogo transcorre maravilhosamente, até que do nada aparece um vendedor de cerveja. Pausa para reidratação preconizada pela FIFA.

Mais alguns minutos de jogo, até que alguém grita que é hora do Maraca. Fila para a ducha gelada, trajes recolocados e seguir para o almoço no primeiro “buteco” encontrado.

Uma cachaça antes de um PF (Prato Feito), digno dos grandes chefs. Feijão preto ao fundo, coberto com arroz, um bife que é impossível de ter sua origem determinada, e por cima, uma salada que consistia em uma equilibrada rodela de cebola sobre uma de tomate.

Tudo isso pelo módico preço de 1 cruzeiro.

Um ônibus lotado com bandeiras e cantos dos hinos de ambos os times. Fila na bilheteria, e enfim, hora de garantir um assento naquilo que poderia ser comparado ao trono da rainha da Inglaterra, o quentíssimo cimento da arquibancada.

Então, começa o espetáculo mágico de 100 mil pessoas, cantando e tremulando suas coloridas bandeiras, enquanto os jogadores desfilam majestosamente no gramado. São 90 minutos de êxtase total.

Ao final da peleja, na descida da rampa, iniciam-se debates democráticos e sadios que se estenderão pela semana inteira.

Correr para o ônibus que levará à rodoviária, e de lá, embarcar no último “Viação Valenciana”. Passar a semana estudando e sonhar com o próximo fim de semana mágico.

Fonte: Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: imponderáveis. Volume 3. Santos/SP: Bueno Editora, 2022. Enviado pelo autor

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