sábado, 18 de junho de 2022

1a. Edição da Coletânea CULTURA (Prazo: 30 de agosto)


Edital de participação


A Academia Luso-Brasileira de Letras do Rio Grande do Sul – ALBL/RS, em parceria com a Editora Alternativa e com apoio do Instituto Cultural Português, lança a primeira edição da Coletânea CULTURA.

A ALBL/RS tem a satisfação de convidar os escritores Acadêmicos e seus convidados de todo o Brasil a participarem deste momento ímpar da literatura nacional. Esta histórica edição confirmará o destaque dos escritores independentes no panteão da literatura luso-brasileira de todas as regiões dos países.

A Coletânea CULTURA publicará poemas, contos, crônicas, artigos e trabalhos visuais, como pinturas ou imagens, revelando e ampliando a pujança e diversidade de nosso universo literário.

Escreva ∞ Participe ∞ Publique

Para participar, envie seu texto (poesia, crônica, conto, artigo ou ilustração) para o e-mail contato@editoralternativa.com, juntamente com uma biografia resumida e uma fotografia em boa resolução.

Cada página publicada possibilitará o recebimento de dois exemplares da obra, por um investimento de R$ 100,00 cada página, sem limite de páginas por escritor.

A temática da coletânea é livre, podendo conter textos originais ou já publicados anteriormente. Também será possível encomendar exemplares extras antes da impressão, por R$ 35,00 a unidade.

O prazo para o envio dos textos é até 30/08/2022.

As opções de pagamento serão pela emissão de boleto (+ R$ 3,00 por unidade), PIX ou depósito bancário.

A sua participação é essencial para a qualidade e diversidade da obra, expressando a força da literatura nacional.

Coordenador
João Riel de Oliveira Brito
Presidente da ALBL/RS
 
Organizador
Milton José Pantaleão Junior
Editora Alternativa


Fonte:
email da Editora Alternativa

quinta-feira, 16 de junho de 2022

Silmar Böhrer (Gamela de Versos) 22

 

Manuel Du Bocage (Sonetos) IX

Lá onde o Fado impenetrável mora,
Voa o menino Amor entre os Amores:
Loureja a trança, que matizam flores,
Cintila o facho, que a Razão devora :

Entra, saúda o nume, ao nume implora
Que de Marília os olhos tentadores
Vejam sempre ante as Graças, e os Louvores
De seus anos gentis surgir a aurora:

Fronte rugosa vezes três sacode
O deus, cujo poder tudo atropela,
E às súplicas de Amor destarte acode:

"Escape às minhas leis Marília bela,
seja, seja imortal ; durar não pode,
o mundo sem amor, amor sem ela".
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Quantas vezes , Amor, me tens ferido?
Quantas vezes, Razão, me tens curado?
Quão fácil de um estado a outro estado
O mortal sem querer é conduzido!

Tal, que em grau venerando, alto e luzido,
Como que até reagia a mão do fado,
Onde o sol, bem de todos, lhe é vedado
Depois com ferros vis se vê cingido:

Para que o nosso orgulho as asas corte,
Que variedade inclui esta medida,
Este intervalo de existência à morte!

Travam-se gosto, e dor ; sossego, e lida;
É da lei da Natureza ,é lei da sorte
Que seja o mal e o bem matriz da vida.
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Eu me ausento de ti, meu pátrio Sado,
Mansa corrente deleitosa, amena,
Em cuja praia o nome de Filena
Mil vezes tenho escrito, e mil beijado:

Nunca mais me verás entre o meu gado
Soprando a namorada e branda avena,
A cujo som descias mais serena,
Mais vagarosa para o mar salgado:

Devo enfim manejar por lei da sorte
Cajados não, mortíferos alfanges
Nos campos do colérico Mavorte;

E talvez entre impávidas falanges
Testemunhas farei da minha morte
Remotas margens, que umedece o Ganges.
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Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez perdendo o Tejo
Arrostar c’o sacrílego gigante:

Como tu, junto ao Ganges sussurrante
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante:

Ludibrio, como tu, da sorte dura
Meu fim demando ao Céu, pela certeza
De que só terei paz na sepultura:

Modelo meu tu és... Mas, oh tristeza!...
Se te imito nos transes da ventura,
Não te imito nos dons da Natureza.
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Adeja, coração, vai ter aos lares,
Ditosos lares, que Gertrúria pisa;
Olha, se inda te guarda a fé mais lisa,
Vê, se inda tem pesar dos teus pesares:

No fulgor dos seus olhos singulares
Crestando as asas, tua dor suaviza,
Amor de lá te chama, te divisa,
Interpostos em vão tão longos mares:

Dize-lhe, que do tempo o leve giro
Não faz abalo em ti, não faz mudança,
Que ainda lhe és fiel neste retiro:

Sim, pinta-lhe imortal minha lembrança;
Dá-lhe teus ais, e pede-lhe um suspiro,
Que alente, coração, tua esperança.

Fonte:
Manuel Maria Barbosa Du Bocage. Soneto e outros poemas. SP: FTD, 1994.

Rachel de Queiroz (Isabel)

SEMPRE DIZIA QUE NÃO se casara por amizade: casara por “iludição”. Para vestir vestido branco, ir ao Quixadá na garupa do cavalo, ser mulher casada, ter seus filhos, a sua cozinha, o seu terreiro.

Agora era aquela a sua vida. A casa isolada guardava a extrema da terra, numa capoeira deserta, na seca ribeira do Sitiá. No verão, ali, quase não há água, e a pouca que há tem piranha. A terra é pedregosa; aqui e além uns campestres bonitos de capim-panasco — mas que adianta ao pobre a pastagem bonita? Pasto é para o gado, e o gado é do dono da terra. O marido ganhava uns vinténs no corte de lenha — e ela ia se arrastando entre a fadiga, a preguiça e os desgostos. Um roçado pequeno, quase no quintal da casa: era como roça de bugre; fazia-se com o caco da enxada um buraco do tamanho do covo da mão, atirava-se nele a semente, e o milho e o feijão iam crescendo como podiam, furando a terra dura, recobrindo os tocos mal queimados da coivara. Um pé de jerimum, um pé de melancia e, rodeando tudo, a ramada de garranchos, tão precária que as cabras das redondezas comiam mais do legume do que o dono do roçado.

Nos fundos da casa, o galinheiro velho — e já há dias a raposa carregara o galo, último sobrevivente de um terno de galinhas que Isabel deveria criar de meia com uma comadre. Do lado esquerdo o chiqueiro, onde ainda restava uma pouca de criação: duas cabras velhas e um cabritinho novo, que sempre berrava, aflito, no meio da noite. E aquele balido do animal arrepiava ainda mais os nervos cansados de Isabel, que, de cócoras no canto da cozinha, com as lambadas do chiqueirador ainda lhe doendo nas costas, ia curtindo o seu pavor e o seu ódio, enquanto lá na camarinha escura o marido curtia a bebedeira, atirado no jirau de varas. Aquela “cama” — quatro forquilhas de palmo e meio de altura, dois caibros fazendo as barras e a estiva de varas servindo de enxerga — ela mesma a preparara com suas mãos, quando o filho estava para nascer. Era serviço de homem, sim, mas contava ela com homem?

Naquelas varas duras, mal-cobertas por uns trapos, penou durante todo o resguardo — o frustrado resguardo do menino morto, que nasceu já roxo, com o corpinho mole e nem sequer chorou. A vizinha, que a acudira, batizara a criança, assim mesmo morta — mas todos lhe diziam que um batizado desses não tinha virtude e era até pecado o que haviam feito.

Agora, em vez de um anjo no céu que rezasse por ela, Isabel sabia que pusera apenas mais um pagão no limbo, sofrendo inocente pelo pecado original de que não pudera ser remido.

Lá na cozinha, onde estava, ouvia o roncar do marido; um ronco estertorado, aflitivo, que mais parecia o cirro de um moribundo. Ronco de bêbedo. O braço pendia da cama e a mão quase tocava, no chão, o chiqueirador de cabo de jucá, tendo na extremidade a longa fita de relho cru ensebado e cortante.

Isabel continuava de cócoras, sem ânimo de se erguer e armar a rede, sem ânimo de tirar a roupa e passar arnica pelas costas magoadas, como às vezes fazia. Mantinha-se quase imóvel, a cabeça encostada nos joelhos magros, a barra da saia tocando uma poça de água que pingara no alguidar rachado; e murmurava baixinho, num soluço trêmulo: “Desgraçado, desgraçado!”

Ali mesmo dormiu. E no sono parecia uma criança açoitada, que dorme ainda chorando. De vez em quando suspirava, estremecia, dava um soluço curto, e se encolhia mais ao canto da parede.

Igual àquela noite muitas noites houvera antes, muitas noites houve depois, Isabel ia ficando mais velha, mais magra, com um olhar estranho e escorraçado. Raramente punha uma toalha à cabeça e ia à casa da sua comadre, que ficava a meia légua de distância. E lá pouco falava, deixava se ficar no canto da cozinha, assistindo à lida da outra, escutando a algazarra da criançada. Comia um bocado escasso, bebia um gole de café, tornava a pôr o pano à cabeça e voltava para o seu desterro. Mas não se queixava nunca, só aquele olhar fundo, vidrado, gritava mágoas; a boca de lábios finos quase não falava — mal dava um boa-tarde ou um bom-dia.

Certo sábado, era boquinha da noite quando o marido chegou em casa, tombando pela vereda. Trazia pendurada no dedo, por um cordão, a garrafa de querosene. Só por milagre não a quebrara.

— Tá aí o gás... Depois ainda se queixe...

Isabel foi encher a lamparina e consertar o pavio velho, aproveitando o resto de claridade do dia; e enquanto, junto à porta, acocorada segundo o seu costume, ela torcia entre os dedos a mecha de algodão, lá na cozinha o marido enfiava o quengo do côco no pote, em busca de água, e reclamava:

— Água salobra; essa peste nem coragem tem pra ir buscar água na cacimba do riacho... E o fogo apagado... isso não é mulher, é um castigo de Deus... Não tem um caroço de feijão pra se comer... não tem uma galinha no terreiro... não tem um canteiro com um pé de coentro pra remédio... não me remenda uma roupa... não costura, não faz renda, não planta nada, não cria nada...

Isabel entrara segurando a lamparina, e procurava uma caixa de fósforo no caritó da parede da sala, debaixo da estampa de são Sebastião. O marido foi de mansinho, apanhou atrás da porta o chiqueirador, instrumento da sua justiça; esperou que Isabel riscasse o fósforo, pendurasse a lamparina no prego, de onde um cone preto de fuligem subia até a palha do teto. E habilmente, com um virtuosismo de domador, enrolou a mulher com o relho, que sibilou no ar, com um silvo de cobra. Isabel deu um grito, correu em direção à porta — mas três vezes o relho ainda a apanhou durante a fuga.

O marido não a perseguiu, viu-a atravessar o terreiro, esconder-se na moita de mofumbo (planta da caatinga brasileira), que ainda estava florida e cheirosa em pleno mês de julho. Ficou encostado ao portal com o açoite na mão, resmungando coisas, com um riso mau; depois recuou uns passos, fechou a porta, desceu a taramela e falou satisfeito:

— Vai dormir no mato, cachorra... vai dormir com as jararacas, tuas parceiras...

E atirou-se à rede que lá estava, a um canto — pois Isabel já não se dava o trabalho de a desarmar pela manhã. E o homem dormiu, sem sequer retirar as alpercatas, sem desapertar o cinturão.

Alta noite, saiu Isabel da moita onde se abrigara. Seriam mais de dez horas talvez; uma lua tardia já se erguera no céu limpo.

Caminhou até a porta da frente, empurrou-a: trancada. Rodeou a casa, entrou pela cozinha, que ele não se lembrara de fechar. Foi direto à sala: lá estava ele dormindo, bem estirado de seu, dono da rede, a boca aberta, o fartum de cachaça ao redor. Esteve algum tempo a olhar a criatura. Depois se dirigiu ao quarto, apanhou o balaio onde guardava a roupa velha e os remendos. Tirou uma agulha grossa, um fio forte — bem comprido, de mais de braça.

Devagarinho — tão devagar, tão silenciosa, que parecia até mais lenta e mais calada do que a sua grande sombra projetada pela luz da lamparina na parede de barro — chegou junto à rede. O adormecido deitara-se de través, com os pés meio de fora. Isabel, com a mão tão leve quanto a da mãe que muda a posição do filhinho adormecido, soergueu os pés do marido e os colocou dentro da rede. Depois, ele próprio a ajudou — talvez inconscientemente estimulado pelo gesto dela; virou-se, emborcou a cara contra o pano e ficou deitado a fio comprido, a cabeça mais embaixo, os pés pertinho do punho. Era uma rede grande, listada de vermelho e verde, que comportava bem todo o corpo do homem; e, como o espaço entre os dois armadores era pequeno, ela ficava baixinha, arrastando pelo chão a varanda rala de crochê.

Isabel tirou a agulha que enfiara no peito do casaco. E rapidamente costurou uma contra a outra, as duas beiradas da rede, do punho direito ao esquerdo, envolvendo, prendendo o homem no cartucho de pano, como um bicho-da-seda no seu casulo. Depois foi ao terreiro dos fundos e veio rolando o pilão, cozinha adentro, atravessou com ele a sala, rolou-o mais um pouco até debaixo da rede, e o pôs, como um cepo, sob a cabeça do marido — que não deixara de roncar.

Deu nova viagem à cozinha, trouxe a mão de pilão, pesada, feita de aroeira rija. E lentamente, com a mesma força cadenciada com que pilava o milho, malhou a cabeça que a rede envolvia e o pilão amparava por baixo.

A primeira pancada talvez não acertasse em cheio — e o homem estrebuchou, sacudindo-se com força na prisão de pano. Mas aos poucos foi ficando imóvel, e a mão de pilão descia sempre, provocando, ao cair, um ruído surdo de coisa quebrada, como uma cuia que se esmaga.
 
Isabel continuou batendo, batendo ritmicamente, até perder a força no braço. Aí descansou a mão de pilão, foi à camarinha, juntou alguns panos numa trouxa, cobriu a cabeça; atravessou a cozinha e, já do lado de fora, cerrou a porta, que quase nunca se fechava, abriu o chiqueiro da criação, para que as cabras não morressem de fome e sede, e sumiu-se no caminho que se perdia caatinga adentro.

Quando levantou urubu na casa, foi que os vizinhos descobriram o morto. Já fazia tantos dias, o estrago fora tão grande que, se o identificaram, foi porque o sabiam morador daquela casa; e, ademais, num dos pés, ainda calçados na alpercata, uma velha vizinha reconheceu o coto amputado de um dedo comido de piranha — acidente sofrido por ele em criança e que ela própria benzera para não arruinar.

Enterraram-no ali mesmo no terreiro, com rede e tudo; em cima puseram uma cruz — e o lugar ficou mal-assombrado.

Quanto a Isabel, não se soube dela. Alguns pretendem que caminhou até o açude de Cedro, distante de lá três léguas, e se atirou do paredão abaixo. A comadre por sua vez recordava que a ouvira falar certo dia na vontade que tinha de fugir, arranjar uma passagem de trem com uma alma caridosa e ir pedir esmolas bem longe, na estação de Baturité, por exemplo.

De qualquer forma, afogada ou mendiga, nunca mais ninguém a viu.

Fonte:
Rachel de Queiroz. A casa do Morro Branco: crônicas. RJ: J. Olympio. Publicado em 1999.

quarta-feira, 15 de junho de 2022

Dorothy Jansson Moretti (Album de Trovas) - 8

 

Olivaldo Júnior (Poemas Escolhidos) VI

A FLOR DO PEQUENO PRÍNCIPE


Sou pequeno, mas não príncipe.
Antes, reino em minha vida
como se fosse senhor de mim,
como se fosse a luz e a lida
de alguém que espera enfim
quem lhe seja o jardineiro.

Sou pequeno, mas não príncipe,
cara flor que esfalfa os dias
em que me pego sendo assim,
sabiá sem laranjeira, poesias
que ninguém lê, nem no fim
de um periódico brasileiro...

A flor do Pequeno Príncipe
se precipita em meu colo,
afoita pelo melhor de mim,
como se eu fosse o solo
em que suas raízes, sem fim,
me diriam: és o primeiro.
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AMOR, DEIXA QUE EU CHORE...

Amor, deixa que eu chore
minhas penas ante o rio
que os afluentes da ilusão
fazem nascer, crescer
e tomar corpo
em prol do mar,
que nem conhecem...

Amor, deixa que eu siga
a estrela-guia de Belém,
ainda que faltem meses
para o Cristo vir à Terra...

Amor, deixa que eu seja o Cristo,
o próprio Cristo à beira,
à margem do mundo inteiro
renascido e, novamente,
tenha a chance de não ser
crucificado...

Amor, deixa que eu seja a cruz,
a velha cruz a sugerir
que a vida é feita de empecilhos,
de tormentas, para
que, um dia, o Céu seja nosso,
todo nosso,
Adão e Eva
que terão mais uma chance...

Amor, deixa que eu tenha
a chance de estar no mar
de tua estrela, teu Jesus
que não nasceu,
tua cruz que, leve, leve,
paire sobre ti
sem te tocar,
até que o rio das penas
que ora choro
te faça sentir pena
de um poeta
ribeirinho de si mesmo.
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A PELE DO ADEUS

O adeus é uma forma de trocar de pele
e criar uma nova.
Uma nova?! Uma ova!
O adeus é uma forma de lavar a alma
e forjar sua calma.

Calma, que o adeus
é luva de pelica
que nos fere o rosto,
nos acerta um soco,
mas nos retifica.

Aplica-se ao nosso eu,
que nos leva ao nós,
que norteia o 'Romeu'
sem a Julieta, a sós,
só adeus, o puro breu.

O breu é uma forma de trocar os óculos
e criar uma aurora.
Uma aurora?! Uma abóbora!
O adeus é uma forma de ser Cinderela
e dançar no castelo.

Cego, que o adeus
é pele de cordeiro
que nos cobre o corpo,
nos encobre um lobo,
mas nos purifica.
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A VELHA DO RIO

Porque a vida é uma forma inconstante

Naquela curva do rio,
entre as dúvidas e as dádivas,
uma velha, estranha,
estranha e sábia,
se assenta.

Não sabe quando vai chover,
nem quando o sol
nem nunca vai brilhar,
mas, velha,
é honrada por todos.

Muitos vêm de longe,
muito longe, só para vê-la:
novelo nas mãos,
amor em seus olhos
e um xale de lã,
tão descuidado, nas costas...

Tem hora que, só de vê-la,
só de olhá-la assim,
tão absorta em si mesma,
se lembram
nem sabem ao certo
de quê,
mas, talvez por isso,
talvez por isso mesmo,
sarem, se recuperem
de ser
e apenas, apenas por isso,
aprendam
a estar.
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DAS FLORES

"Vou plantar um milhão de flores!",
disse a mãe, toda ofegante,
como se a vida dependesse disso,
de algum quintal com flores.

Assim, separou as sementes,
escolheu o lugar e, de posse de si,
cavou, escavou e escalavrou
a cara da terra com as suas mãos
de mãe, de avó e de mulher.

Não sabia se dentro de sua alma
crescia uma rosa, uma dália,
ou uma porção de "primas veras",
mas, mesmo assim, plantava.

Ao fim, após um bom tempo,
uma boa chuva, eis o amor:
nasceu derredor da jardineira
um milhão de seres flóreos,
com suas pétalas enoveladas
em bastões de verde sólido,
a dizer que, das flores, nasce,
cresce, surge, aparece Deus.
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SÃO TRÊS GATOS

São três gatos lá em casa,
cada um com seu jeitinho,
que, com jeito, nos abrasa,
dando à gente seu carinho.

Tem a Alzira, a “delicada”;
o Peludo, o “rei de tudo”,
e o bichano que da escada
do jardim faz seu escudo.

Nessa data tão singela,
cada gato merecia
sua própria poesia!

Um versinho da janela
de que os gatos dia a dia
sonham pulos de alegria!

Fonte:
Poemas enviados pelo autor.

Aparecido Raimundo de Souza (A tristeza secreta do Lápis Preto)

Palavras com * e negritadas, veja vocabulário no final do texto.
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INTERVALO DAS AULAS, todos os estudantes saem para o refeitório. É hora do recreio. O Lápis Preto está num canto da carteira, amuado. A Borracha se achega à ele, a passos curtos e um carinho indescritível no rosto de maçãs salientes, a pele de porcelana. Fala. A sua voz é pausada, meiga e adocicada:

— Quer me contar o que está acontecendo?

Lápis Preto oferece à recém chegada uma cadeira e ela se acomoda, não sem antes repetir a indagação que acabara de fazer: “Quer me contar o que está acontecendo?”.  

— Não está acontecendo nada, Borracha.

— De uns dias para cá vejo você como agora, pelos cantos, cabisbaixo, não fala com ninguém. Perguntei ao Lápis Vermelho se sabia de alguma coisa, mas nada me esclareceu. Nem seu amigo, o Lápis Roxo quis me dar trela. Por fim, achei melhor vir falar diretamente com você. Vamos, abra seu coração.

— Ele está aberto. Nunca se fechou.

— E o dono dele?

— Só um pouquinho triste...

— E o motivo da tristeza?

— Nada sério que me afaste de meu estado normal.

— Não é o que seus olhos demonstram. Lápis Preto, sou sua amiga. Nos conhecemos de longa data. Nossa amizade vem desde quando morávamos nas prateleiras do shopping. Olhe para mim. Desabafe. Pela sua carinha, percebo que falta por aqui somente os instrumentos para que alguém o torture e o faça desabafar:  

— Por que acha que preciso desabafar?

— Porque a sua ausência dos demais da roda de amigos é muito acentuada. Seu enclausuramento no estojo, se faz distinto e marcante. Você passa horas sem falar uma palavra sequer. Olhe à sua volta. Seus outros companheiros de caixa estão todos unidos, tagarelando. E você aqui, jogado às traças, em cima desta carteira. O Apontador também pensa o mesmo que eu.

— E o que ele pensa?

— Muitas coisas. Que você pode estar doente, uma vez que anda meio macambúzio, literalmente desleixado... faz dias que não escreve nada, nem desenha. Segundo soube pela Régua, o menino Moisés, seu dono, está mais aberto ao Lápis Roxo. Até bem pouco tempo, você não largava do Lápis Marrom Terra. Vivia enrabichado com o Rosa Claro e com o cotoco do Amarelo Canário. Assim, do nada, debandou? Preste atenção. A Cola que gosta tanto de você, até ela, foi deixada de lado.

— Engano de vocês. Estou bem. Só um pouco cansado.

— Todos nós estamos. As aulas diárias nos deixam em petição de miséria, os nervo em frangalhos... porém...

—... Porém?

— Eu me preocupo com você, Lápis Preto. De verdade. Vivo por aí apagando as coisas tortas, invalidando os erros grosseiros, esvaecendo os garranchos, mandando para o lixo os desenhos sem pé nem cabeça que o menino Sucupira, meu dono faz. Contudo, apesar de todas estas loucuras do nosso catemerino*, aqui na escola, e, mesmo fora dela, não deixo de reparar em sua pessoa. A sua melancolia, por exemplo... a megera está estampada, gritante e esbugalhada em seu semblante de uma forma forte e deveras transparente, tão desanuviada e distinta, que não estou vendo como fazer para arranjar uma forma de sumir de vez com ela.

— Melancolia?

— Sim. Uma melancolia intrigante e declarada...

— Intrigante e declarada?

— Por certo, muito intrigante. “Intrigadérrima” para ser mais precisa. Chega a ser pesada e desgastante. Lápis Preto, sou sua amiga. Desabafa comigo.

O Lápis Preto, de repente, começa a chorar. A Borracha se levanta e o abraça com meiguice, como se ele fosse um filho seu:

— Põe para fora tudo o que está lhe fazendo mal...

Lápis Preto cede às súplicas da Borracha. Se recosta no ombro dela como se o céu tivesse caído por sobre a sua cabeça. Toma fôlego numa breve pausa e então  explana seu relato:

— De uns dias para cá, ando percebendo que os lápis de outras carteiras próximas vêm me repudiando vituperadamente*. Até o menino Moisés, que não ficava um dia sem me ver e me usar, me jogou para escanteio. Me trocou pela Caneta Azul. Estou me sentindo um lixo. Escutei o Clips tagarelando com o Papel Almaço, ainda a pouco. Insinuavam que uns caras iriam me tirar da coleção da caixinha onde moro com meus demais consanguíneos*.

— Meu Deus! E qual o motivo?

— O ponto “xis” da questão é o que está me matando aos poucos, numa lentidão enervante. Tudo por causa da minha cor. Sou preto, minha amiga. O preto não é bem visto em lugar nenhum. A coisa está tão profundamente enraizada, que disseram, não sei se procede a informação, parece que os fabricantes de lápis estão pensando seriamente em tirar de linha a produção dos lápis pretos, e, por consequência, os já existentes no mercado.

Lápis Preto retira do bolso um lenço e limpa os olhos, como se tentasse arrancar  deles algum cisco inexistente:

— Nós, os negros, somos vistos com ódio e repugnância. Existe uma coisa degradante lá fora, que acabou chegando e atingindo o centro nevrálgico de nossos ossos. A discriminação racial. Por conta, se alguma coisa acontece dentro de outros estojos próximos, de alguma carteira, bolsa, mochila, ou até mesmo na caixinha onde moro, vem logo a tragédia anunciada. Virou um despautério*: “Isso é coisa do Lápis preto... mancharam o caderno de “A”, ou de “B”, um infame logo apregoa*: “aposto que foi coisa de um Lápis Preto”. Enfim, essa carga malévola contra a nossa cor, surge do nada. Resumindo a história de todos os meus aparentados, amiga Borracha, ou os não nascidos brancos, saiba que eles carregam nos costados as manchas do preconceito. Grudado nele, o artifício da insensatez, grosso modo, dos que vieram ao mundo com as peles alvas. Por conta, padecemos e sentimos na carne os horrores impostos por esses dissidentes. O Preto, em dias de agora, é o vilão grosseiro, o maldoso inurbano*, o rurícula* asqueroso. Acredito que, em breve, nós os lápis pretos seremos as bolas da vez — as cartas fora dos baralhos...

A Borracha ouve em silêncio, atenta, compenetrada, sem interromper. Ao derradeiro, se agiganta numa exultação contagiante. Toma entre as suas as mãos de Lápis Preto e sem mais delongas coloca para fora o que lhe vai no mais profundo do intimo:

— Lápis Preto, você pode até pensar o contrário. É um direito seu achar que as demais cores não gostam de você. Eu, como sua amiga incondicional, entendo que tudo isso que está acontecendo com você é uma tolice, uma espécie de incidente repulsivo e avarento que deve ser deixado definitivamente de lado. Olhe em volta. Você é essencial, insubstituível, necessário, especial. Um elo basilar* e dominante como todos os demais pretos existentes fora do nosso mundinho de materiais escolares. O preto é o oposto do branco, a noite silenciosa, a escuridão necessária que nos acalanta a alma, o respeito ao isolamento quando queremos estar a sós. Sem a cor preta seria uma chatice ser e ver tudo hialino* ou diáfano*. O preto está no luto que vela os mortos, se faz sutil na noite angelical nos deixando ver as estrelas, a lua, e o mais importante: a grandiosidade dos olhos do Criador depois que o dia se recolhe à descansar.

A Borracha se cala, respira pausadamente, acaricia o rosto de Lápis Preto e segue com o que precisa acabar de ser dito:

— O preto, meu querido, se faz bonito e elegante. Perceba: se notabilizou nos quadros de pintores renomados, como Estevão Silva, Jacob Lawrance. Não parou ai. Se imortalizou nos escritores Carolina Maria de Jesus e Machado de Assis, sem contar que se fez inimitável nos artistas Grande Otelo e Gilberto Gil. Enfim, meu amado, você é parte integrante da sociedade em que vivemos.

— Borracha, minha princesa, desse jeito você me deixa sem palavras. Vou acabar me desmoronando numa tempestade de lágrimas...

— Essa é a ideia. Chore. Ponha para fora o que lhe maltrata o mais profundo do seu chão impenetrável. Quero lembrar que a sua cor é tão magnânima e indispensável, que para encerrar nosso bate papo, eu diria que a sua pessoa ou melhor dito, a sua cor, virou celebridade...

— Como assim, Borracha?

— O que estou querendo sinalizar, meu lindo, é que o mundo inteiro e os seres viventes que nele habitam (fora das caixinhas de lápis de cores, mochilas, salas de aulas e alunos chatos) o amam. Você agora é a paixão do momento. É febre quarenta graus.  Se transformou no senhor Black Friday. Por conta, todos, sem exceção, esperam a sua chegada triunfante mergulhados numa ansiedade efusiva e impossível de ser medida e descrita.

— Borracha, quer, por favor, me explicar o que é esse tal de Black... Black o que, mesmo?

— Só cantarei a pedra, se você me pagar um café... antes que os alunos voltem para o segundo tempo da aula...

— Não só a bebida, minha linda. Tudo mais que você desejar. É só pedir...

Lápis Preto e Borracha deixam o estojo e caminham, igual passo, as mãos entrelaçadas em direção à cantina.
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VOCABULÁRIO

Apregoa: aquele que fala em voz alta, vocifera proclamando algo a outros.

Basilar: coisa básica, essencial, o primordial o necessário.

Catemerino: o mesmo que cotidiano, o dia a dia, o diário.

Consanguíneos: parentes ligados pelo vínculo do sangue parentesco natural, pai, filho, filho, neto.

Despautérios: grande disparidades, imensa tolice, insensato despropósito.

Diáfano: que permite a passagem da luz, que é transparente e límpido, puro, sem manchas.

Hialino: Tudo o que é transparente, translúcido e claro.

Inurbano: sujeito que não é urbano. Aquele que vive longe da cidade, afastado, pessoa descortês.

Rurícula: aquela pessoa que vive no campo, que cultiva o meio do mato.

Vituperadamente: repudiando afrontosamente, desaprovando de maneira a desabonar ou enegrecer.


Fonte:
Texto e vocabulário enviados pelo autor.

Estante de Livros (Viagem ao Oriente, de Hermann Hesse)


O livro é uma história mística contada por Herman Hesse, membro de uma confraria secreta que empreende uma viagem rumo ao Oriente com seus outros membros, que incluem filósofos, músicos, artistas. Mas para fazer parte da confraria é preciso ter um objetivo pessoal.

Viagem ao Oriente é na verdade uma viagem para dentro de si mesmo. Daquelas que todos nós ansiamos: o voltar para a 'casa', uma viagem puramente simbólica.

No caminho para o Oriente um membro do grupo, Leo, desaparece junto com algo muito importante, causando mal estar, dúvidas e discussões. O resultado é a fragmentação do grupo. E assim, Hesse se vê fora da Confraria, o qual julgara ter chegado ao fim. Mas algo permanece inquieto dentro do personagem e ele inicia uma empreitada de encontrar Leo e saber o que aconteceu de fato. É como se isso fizesse parte da sua história e o ajudasse a encontrar algo que ele mesmo também julgou perdido na vida dele.

Hesse encontra Leo e descobre que na verdade ele nunca deixou a Confraria, e sim o inverso. Assim ele será julgado por toda a comissão pelo seu abandono. Uma história emocionante, que reflete muita das nossas tentativas de reconstrução individual e na busca que empreendemos para conhecermos a nós mesmos. E geralmente aquilo que julgamos perdidos na verdade foi por nós negado, deixado de lado. E assim passamos um tempo procurando o que nós mesmos escondemos.

terça-feira, 14 de junho de 2022

Edy Soares (Manuscritos (Di)versos) 11: Depois da Lua

 

Leon Eliachar (Decisão)

Dona Gertrudes quase caiu pra trás quando a filha lhe disse:

— Estou apaixonada pelo Zacarias, mamãe.

— Mas ele é casado, minha filha.

— E daí? Quem não é casado hoje em dia, mamãe?

Dona Gertrudes engasgou com a sopa, deixou cair o talher no chão:

— Que ideias são essas, minha filha? Onde é que você está aprendendo essas coisas?

— A senhora bem sabe o que penso do casamento.

Dona Gertrudes não tinha muita saída, diante do argumento decisivo da filha:

— Veja o seu caso, mamãe. A senhora não é casada com o papai e vive muito feliz com ele, não vive?

Dona Gertrudes tentou explicar:

— Mas o seu caso é diferente.

— Não há diferença alguma, quando duas pessoas se gostam.

Não houve jeito de demover a ideia da filha. Ela estava presa demais às suas convicções pra estar voltando atrás assim sem mais nem menos. Armando, o pai, ouvia o diálogo sem dizer uma palavra. Soprava a sopa, tranquilo, enquanto mãe e filha iam perdendo a calma.

— Não permitirei que você tenha ligação alguma com esse homem.

— Isso é o que a senhora pensa — respondeu, retirando-se da mesa.

Dona Gertrudes perdeu o apetite, trocou ideias com o companheiro. Nunca pensaram que isso fosse acontecer, logo à sua filha. Armando foi positivo:

— Quem sabe eles serão felizes, meu bem?

Dona Gertrudes ficou indignada:

— Até você, Armando? Onde é que você está com a cabeça? Já imaginou a sua filha “juntada” com um homem?

Armando calou a boca, preferiu não discutir. Chegou a pensar que sua companheira se sentisse infeliz por não ser casada com ele, com certidão e tudo. Para ele, bastava serem felizes, se compreenderem, se respeitarem, coisas que muito papel de cartório não dá a ninguém. Dona Gertrudes insistia:

— O que dirão os outros?

A filha voltou com duas maletas nas mãos, a tempo de rebater a última frase da mãe.

— Os “outros”, sempre os “outros”. Que é que os “outros” têm a ver com a minha vida?

Dona Gertrudes tentou convencê-la:

— Você não sabe o que está dizendo, minha filha. Nossas vidas sempre dependem mais dos outros do que de nós mesmos. Por mais que a gente se considere independente, temos sempre satisfações a dar aos “outros”. Não se esqueça de que vivemos numa sociedade e é ela quem dita as normas da vida.

A filha não quis ouvir tudo, deu um beijo na mãe, outro no pai, e foi saindo:

— Vou para um hotel. Sinto que não há mais clima pra mim dentro desta casa.

Dona Gertrudes enxugou uma lágrima. Seu Armando baixou a cabeça. Ninguém disse uma palavra. Quando ia saindo, a empregada entrou, como numa peça de teatro:

— Telefone pra senhora. É o Dr. Zacarias.

Correu pro telefone, falou quase quinze minutos, quando desligou estava com a fisionomia completamente mudada. Trouxe as maletas de volta:

— Zacarias vai viajar hoje para a Europa. Disse que vai passar lá dois anos, estão satisfeitos?

Dona Gertrudes e seu Armando correram para abraçá-la. A filha estava trêmula, não deu o braço a torcer:

— Vocês me aceitam de volta? Meu ponto de vista continua sendo o mesmo: marido pra mim, só homem casado.

— Está bem, minha filha, está bem. Mas por que você não foi com ele?

Caindo em prantos, ela respondeu:

— Ele foi com a mulher, mamãe. Fez as pazes com ela ontem à noite.

Um silêncio pesado caiu no ambiente e ficaram os três, calados, tomando a sopa fria.

Fonte:
Leon Eliachar. A mulher em flagrante. Publicado em 1965.

Ronnaldo de Andrade (Caderno de Trovas) – 5 -

Agora que tu és minha
e eu já sou todinho teu,
podemos, minha rainha,
enterrar o que morreu.
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Café na cama, beijinhos...
Sua mão e minha mão...
Somos no inverno peixinhos
nadando no meu colchão.
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Cansei de ser passatempo,
seu brinquedo descartável.
Você foi um contratempo
para mim, incontestável.
= = = = = = = = = = =

Com as mãos postas no peito
declarei à minha amada,
meu amor mais-que-perfeito,
e morri sem ouvir nada.
= = = = = = = = = = =

Deixo em seu criado-mudo,
nossa foto de noivado;
nesse tempo eu era tudo
que você queria ao lado!
= = = = = = = = = = =

De maneira fria e crua,
covardemente e sem lógica,
você me tirou da sua
árvore genealógica.
= = = = = = = = = = =

É dureza amar a alguém
e não ser correspondido.
Às vezes, isso não tem,
nem faz o menor sentido.
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És luz que brilha em meu céu,
linda, meiga e delicada;
pra santa te falta o véu,
linda luz de minha estrada.
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Eu passo a noite cantando,
pra sufocar minha dor,
que aos poucos vai maltratando
meu coração sonhador.
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Eu sinto que estou amando
e esse amor muito me anima,
feito pássaro cantando
e uma trova toda em rima.
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Lua que brilha no céu,
ilumina minha estrada,
para eu pegar o mel
nos lábios de minha amada.
(Trova em parceria com Brenda Lyn, minha filha)
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Meu corpo todo retalho,
e ela me diz: “– Não tem lógica,
só não lhe quero no galho
da árvore genealógica”.
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Minha tristeza é profunda,
quero tirar minha vida.
A minh'alma está imunda
e anda no mundo perdida.
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Não brinque assim! Não maltrate
o meu coração que é seu.
Nele vive, Amor, não mate
"o amor que, intenso cresceu...".
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Não sai de minha memória
a nossa história de amor;
você, sua trajetória,
seu desejo abrasador...
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Nosso amor é tocha acesa,
é mel que a gente consome;
geleia de framboesa:
tudo que nos mata a fome!
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Os olhos da noite estão
onde os seus não podem ver.
Pergunte ao seu coração
se ele sabe lhe dizer.
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Peço-lhe pra me perdoar,
mesmo se achar que é demência
o amor que eu quero lhe dar,
e que falo em reticência.
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Por causa do teu ciúme
me afastei, fiquei distante;
porém isso não resume
quanto me foste importante.
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Preciso daquele amor,
aquele amor prometido
com graça e muito fervor,
antes de eu ser seu marido.
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Preciso de amor, carinho...
Gesto mais apaixonado,
pra não me sentir sozinho
tendo você a meu lado.
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Procuro em minha memória,
um motivo e qual a lógica,
de não ter em nossa história
uma árvore genealógica.
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Solidão, não me judia
nem ria como os palhaços.
"Que dolorosa ironia"
ver quem amo em outros braços!
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Tarde fria! Chuva fina!
E essa saudade, a contento,
não deixa eu tirar, menina,
você do meu pensamento!
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Tenho ao meu lado a tristeza,
que você deixou um dia;
ela é melhor, com certeza,
do que a sua companhia.
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Tomou meu leme da vida
como fosse embarcação,
e partiu logo em seguida
do mar do meu coração!
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Você apareceu, querida,
toda altiva e majestosa,
e perfumou minha vida
com a fragrância de rosa.
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Volte aos meus braços, querida,
volte para o nosso lar;
e descubra enquanto há vida,
o valor do “perdoar”!

Fonte:
Trovas enviadas pelo trovador.

Sammis Reachers (As doces mangas – e o muro – do velho Lauro)

Como eu disse, uma das mais doces atividades da idade, figurada e literalmente, era apanhar frutas – dentro ou fora da legalidade, pois à época a fronteira entre tais picuinhas era muito sutil.

Em linhas paralelas, nosso pequeno sub-bairro era formado por apenas quatro longas ruas. A primeira, margeando o rio Alcântara, era a Manoel Bandeira, nosso terno e frágil poeta. Em seguida vinha a central e principal, honrando o grande Pastor Martin Luther King, e para cima as outras duas.

Me lembro de certa feita em que eu e Renato fomos em missão sigilosa até a última rua, que era pouco movimentada. Havia um terreno desocupado, protegido apenas por uma cerca de arame (ou seja: protegido pelo vento...) e, dentro dele, jazia solitária e imensa uma mangueira de manga espada. Ao lado do terreno ficava a casa do proprietário, essa medievalmente murada: era o irmão Lauro, por sinal pai de uma menininha que foi minha primeira paixão platônica.

Assim, vendo que o tempo era propício e as mangas convidativas, lá fomos nós naquela manhã surrupiar algumas delas. Eu e Renato já tínhamos certo know-how na área: na casa ao lado costumávamos roubar cajás... Rua deserta e silenciosa, penetramos no minifúndio e principiamos a tacar paus e pedras naquelas alturas, tentando derrubar algum favo daquele mel alaranjado, rainha das frutas vinda da Índia.

Em meio da faina naquela dura lavoura, nem percebemos quando o Lauro, um moreno com cabelos lisos como um índio, adentrando o clube dos obesos, “brotou” já dentro da cerca. O sexto sentido de Nato falhara, e nossa captura era iminente!

– Moleques safados, vou pegar vocês, vem cá! – e o brutamontes avançava, senhor de seu direito, afinal não pedíramos para colher os frutos.

Geralmente Renato percebia a presença hostil e imediatamente desabalava a correr em silêncio; jamais dizia sequer um “corre, Sammis”. Jamais! Eu que me virasse. Ou ficasse de boi pras piranhas. Mas neste dia ambos fomos pegos em perfeita surpresa, e corremos juntos para a única escapatória: o muro em tijolos nus que separava o terreno de Lauro da casa ao lado. Tal casa não possuía portão e o melhor, por seu quintal podiam ser acessadas duas ruas. Não era apenas a melhor rota de fuga, mas a perfeita, criada por Deus para isso.

Corremos em direção ao muro e pulamos – juntos, como símios habilitados em parkour, bem antes do parkour ser “fundado” em França. Eramos magricelas, mas o pedreiro que erguera aquele muro falhara em algo; assim que tocamos nossas mãos no alto do muro, de forma perfeitamente síncrona, algo divertidíssimo – ou triste no momento, mas hoje divertidíssimo – aconteceu. O muro começou a tombar com o nosso peso. Sim, nos agarramos no muro e ele “quebrou” quase ao meio. A sincronicidade dos moleques do balacobaco naquele dia foi elevada a nível olímpico, como de uma dupla de salto ornamental. Ainda no ar, caindo para trás com o muro, entendemos imediatamente que seríamos esmagados – nada que matasse, mas alguns ossos poderiam se quebrar e a fuga seria frustrada. Assim, em pleno ar, demos impulso com o pé de apoio no muro que caía, para que nos livrássemos de seu raio de impacto.

Amigos, caí em pé no chão, seguido pelo esboroar-se do muro, a coisa de apenas uns cinco centímetros de esmagar meus pés. E os de Renato, que caíra à mesma distância.

Pronto, subíramos de nível e já éramos Ninjas da Presepada.

Mas não era caso de comemorar o feito. Sem olhar para trás, pulamos por sobre os tijolos e o cotôco de muro que restara, enquanto o bom Lauro – poderia ter sido meu sogro! – multiplicava seu ódio ao perceber o prejuízo com o muro – muro que talvez ele mesmo tivesse erguido...

Aquela aventura não teve maiores consequências, pois o tal Lauro, ainda que conhecesse meus pais, aparentemente não me conhecia ou reconhecera, e nem a Renato, senão a notícia teria chegado lá em casa, como tantas chegaram, para alegria da vara de goiabeira e da sandália Havaianas de minha mãe, minhas inimigas figadais.

Fonte:
Sammis Reachers. Renato Cascão e Sammy Maluco: uma dupla do balacobaco. São Gonçalo/RJ: Ed. do Autor, 2021.
Livro enviado pelo autor.

segunda-feira, 13 de junho de 2022

A. A. de Assis (Jardim de Trovas) 7

 

Nadir D’Onofrio (Poemas Escolhidos) V

A DONZELA E A LUA


Tal qual noviça
Donzela e pura
Ofereço uma oração
Ao despontar a manhã...

Vendo a lua ainda a brilhar
Tomada por encanto e magia
Lépida me pus a dançar...

O sol invejou esse momento
Quebrou meu encantamento
Brilhando com todo esplendor
Ofuscando da lua o brilho inspirador...

A noite não demora chegar!
Vá lua, deusa, amiga
Volte depois pratear essa terra
Aqui me encontrará...nua a dançar.
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ATRACADOURO
 
Solitário ou da solidão
companhia dos meus dias?
Interprete como quiser!
Chegará o momento em que
o degelo cessará, as águas
diminuirão de volume.
O isolamento será maior,
no entanto considero, insignificante,
se comparado ao que me foi imposto...
Até os gritos de angustia
tem ecos, diferenciados.
Que planeta é esse, onde
não vejo a luz do sol?
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LUAR SOBRE O MAR

Quadro perfeito
Quietude no momento
Aguça inspiração...
 
 Em fase de glória
Ou  quando a tristeza aflora
E o vazio apavora
 
 Solitário vai o poeta
Ser de alma sonhadora!
Imaginar sua estória...
 
E o mar à espera!
Das letras na areia
Explícitas declarações à musa…
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SINAIS

Sem pestanejar os atendi
Manhãs e noites de orgia
Em teus braços me perdi
Sorvendo tua sabedoria
Com você só aprendi
Nada, constrangia!
Em teus beijos, transcendi
Hoje consulto astrologia...
O tempo passou
Finalizaram os sinais
Alguém regressou...
Você partiu para os finais
Tua chama por mim apagou
Restaram, somente... meus ais…
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TEMPO INFANTE
 
Eram festivos os momentos
luminosidade aristocrática,
inerente ao ser, que chegava!
Alma transbordante de afeto,
a espera fazia-se ansiada,
em seu ser, o contentamento!
Protagonista do tempo infante!
Tornando-a cativa de seu carinho...
Beleza, alegria, amor puro, devotado,
em dezenas de cestas de margaridas...
Sem entender-se apaixonada...
a menina o aguardava!
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VELAS

Tal pescador quero estar só
envolta, na redoma de lembranças!
Que não seja de todo fechada, nem densa,
para poder sentir do mar a brisa.
Ouvir a cantilena do vento
soprando, em meus ouvidos.
Enquanto olhos debilitados
vasculham a linha do horizonte
vislumbram, velas enfunadas!
Saberei que os ventos estão favoráveis...
Presságio... a espera não será prolongada

Contos e Lendas Indígenas (Nação Lakota: Mulher Búfalo Branco) Parte 2, final

A Mulher Búfalo Branco mostrou ao povo o caminho certo para orar, as palavras certas e os gestos certos. Ela ensinou-os a cantar a canção de preenchimento de tubulação e como levantar o tubo do cachimbo para o céu, para o avô, e para baixo em direção a Unci, Avó Terra, e depois para as quatro direções do universo.

Com este tubo de santo”, ela disse, “você vai andar como uma oração viva”. Com os pés descansando sobre a terra e a haste do tubo alcançando para o céu, seu corpo forma uma ponte viva entre o Sagrado Abaixo e Acima. Wakan Tanka sorri sobre nós, porque agora nós somos como um: terra, céu, todas as coisas vivas, os de duas pernas, os de quatro patas, os de as asas, as árvores, as gramíneas.

Juntamente com as pessoas, eles estão todos relacionados, uma família. O tubo mantém-los todos juntos.

Olhe para este fornilho”, disse a mulher Búfalo Branco. ”Sua pedra representa o búfalo, mas também a carne e o sangue do homem vermelho”.  O búfalo representa o universo e as quatro direções, porque ele fica em quatro pernas, para as quatro idades de criação. O búfalo foi colocado no oeste por Wakan Tanka na criação do mundo, para conter as águas.

Todos os anos ele perde um fio de cabelo, e em cada uma das quatro idades ele perde uma perna. O aro sagrado vai acabar quando todo o cabelo e as pernas do grande búfalo são terem ido, e a água volta para cobrir a Mãe Terra.

A haste de madeira desta chanunpa representa tudo que cresce sobre a Terra. Doze penas penduradas na haste - a espinha dorsal - se junta a taça - o crânio - são de Wanblee Galeshka, a águia manchada, um pássaro muito sagrado que é o mensageiro do Grande Espírito e o mais sábio de todos os voadores.

Você está unido a todas as coisas do universo, por tudo o que clamam a Tunkashila. Olhe para a tigela: gravado nela são sete círculos de vários tamanhos. Eles representam as sete cerimônias sagradas você vai praticar com esta chanunpa, e para a Oceti Shakowin, as sete fogueiras sagradas de nossa nação Lakota”.

A Mulher Búfalo Branco em seguida, dirigiu-se às mulheres dizendo-lhes que era a obra das suas mãos e os frutos de seus corpos que mantiveram as pessoas vivas. "Vocês são da Mãe Terra", ela disse a elas. "O que vocês estão fazendo é tão grande quanto o que os guerreiros fazem.

E, portanto, o cachimbo sagrado também é algo que liga homens e mulheres juntos em um círculo de amor. É o santo objeto na fabricação de que homens e mulheres têm uma mão.

Os homens esculpir a taça e fazer a haste; as mulheres decorá-lo com bandas de porco-espinho coloridas. Quando um homem tomar uma mulher, ambos segurem o tubo, ao mesmo tempo e um pano de tratado vermelho é enrolado em torno de suas mãos, amarrando-os junto para a vida.

A Mulher Búfalo Branco também conversou com as crianças, porque elas têm uma compreensão além de seus anos. Disse-lhes: "Vocês são a próxima geração, é por isso que vocês são os mais importantes e preciosos. Algum dia vocês vão realizar estes ensinamentos e algum dia vocês vão rezar com ele…”.

Ela falou mais uma vez para todas as pessoas: "O tubo está vivo, é um ser vermelho mostrando-lhe uma vida vermelha e uma estrada vermelha E esta é a primeira cerimônia… A alma de uma pessoa morta, porque através dele você pode falar com Wakan Tanka, o Grande Mistério. O dia em que um ser humano morre é sempre um dia sagrado. O dia em que a alma é liberada para o Grande Espírito é outro. ”

Ela falou uma última vez para Standing Horn, o chefe, dizendo: “Lembre-se:… Este tubo é muito sagrado Respeite-o e ele irá levá-lo até o fim da estrada nas quatro idades da criação que estão chegando e eu virei vê-lo em cada ciclo de geração, vou voltar para vocês”.

A mulher sagrada, em seguida, despediu-se o povo, dizendo: "Toksha ake wacinyanktin ktelo - Vou vê-los novamente.

O povo viu saindo na mesma direção de onde tinha vindo recortado contra a bola vermelha do sol poente. Enquanto caminhava ela parou e rolou quatro vezes. Pela primeira vez, ela se transformou em um búfalo preto; o segundo para em um castanho; o terceiro em um vermelho e, finalmente, a quarta vez que ela rolou, ela se transformou em um bezerro de búfalo branco. Um búfalo branco é a coisa viva mais sagrada que você poderia encontrar.

A Mulher Búfalo Branco desapareceu no horizonte. Assim que ela tinha desaparecido, búfalos em grandes manadas apareceram, permitindo-se ser mortos de forma que as pessoas pudessem sobreviver. E a partir desse dia o búfalo forneceu às pessoas tudo o que precisam - carne para a sua alimentação, peles de suas roupas e tipis, e os ossos de suas muitas ferramentas.

Fonte:Curate Ipsum
https://canal-curateipsum-blog.tumblr.com/

XIII Seletiva Nacional de Poesia para a edição do livro XIII Coletânea Século XXI (Prazo: 31 de Julho)

Homenagem à Magnífica Trovadora, Sonetista, Poeta e Contista Carolina Ramos, de 98 anos

(Prazo: 31 de julho 2022) (somente pela INTERNET)

A PoeArt Editora de Volta Redonda RJ, institui o livro XIII Coletânea Século XXI 2022 (depois das bem sucedidas Antologias Poéticas de Diversos Autores, Vozes de Aço da I a XXIV, depois do sucesso da I a XII Coletânea Século XXI, do livro Cardápio Poético, 1ª e 2ª edição, I a IX Coletânea Viagem pela Escrita. Dentre os já homenageados por suas contribuições literário-culturais em nossos livros (ou em entrevistas), estão: 
Adahir Gonçalve s Barbosa, Alan Carlos Rocha, Alexei Bueno, Álvaro Alves de Faria, Antonio Carlos Secchin, Antônio Torres, Astrid Cabral, Antonio Miranda, Anderson Braga Horta, Clevane Pessoa, Denise Emmer, Evandro Sarmento, Flávia Savary, Flora Figueiredo, Geraldo Carneiro, Gilberto Mendonça Teles, João Almino, José Eduardo Degrazia, Lourdes Sarmento, Maria Braga Horta (in memoriam), Maria José Bulhões Maldonado, Matilde Diniz Lacerda, Mauro Mota, Menulfo Nery Bezerra, Olga Savary, Oscar Niemeyer, Pedro Albeirice da Rocha, Pedro Lyra, Pedro Viana Filho, Roseana Murray, Reinaldo Valinho Alvarez, Ruy Espinheira Filho, Rubens Jardim, Tanussi Cardoso dentre outros.

PREMIAÇÃO

Os cinco melhores poemas serão publicados sem qualquer ônus. Cada um dos cinco autores premiados receberá três exemplares da obra pelos direitos autorais, diploma e a sua foto colorida no livro. Será cobrada apenas a taxa de envio dos livros pelos Correios.

A partir do sexto trabalho selecionado, os autores serão convidados a participar do livro pelo sistema de cooperativismo, pois serão escolhidos trabalhos de até 50 escritores ou mais, dependendo da qualidade literária.

Sem taxa de inscrição (até três poemas)

Ao efetuar a sua inscrição, o autor estará concordando com as regras do concurso, e, se selecionado, autorizando a publicação dos trabalhos no livro XIII Coletânea Século XXI 2022. Em caso de cópia indevida e demais crimes previstos na Lei do Direito Autoral, será responsabilizado judicialmente.

Tema e apresentação

O tema é livre.

Cada autor poderá inscrever de um a três poemas (versos livres ou poema com forma fixa), cada um em uma página, inéditos ou não, máximo de até 20 versos cada, fonte Times New Roman, corpo 12 e foto de rosto em jpg – imagem com alta qualidade. Não é necessário pseudônimo.

Muita atenção na hora de enviar seu texto: já envie revisado. Enviar em doc. anexo contendo os trabalhos e os seguintes dados: nome completo, nº do RG, nome do concurso, títulos dos trabalhos, endereço completo, dados biográficos (no máximo dez linhas) , telefone e e-mail.

As obras que chegarem sem esses dados não serão consideradas inscritas. Todos os trabalhos enviados (selecionados ou não) serão incinerados, após a divulgação do resultado.

Forma de inscrição

As obras deverão ser enviadas pela internet para: 
 
poearteditora@gmail.com

Jean Carlos Gomes / organizador e editor / organização e realização:
PoeArt Editora de Volta Redonda / telefone e WhatsApp (24) 99979-3205.


Apoiadores:
Câmara Municipal de VR, Academias Volta-redondense de Letras e Barramansense de História, Evangélica de Letras do Brasil, Costelas Felinas Livros Artesanais, IEV – Instituto de Estudos Valeparaibanos, Val Lourenço – Cabelo e Corpo, Vitor Contabilidade a imprensa falada e escrita e redes sociais.


Fonte:
Texto enviado por Jean Carlos Gomes

domingo, 12 de junho de 2022

Isabel Furini (Poema) 28: Incandescente

 

Professor Garcia (Reflexões em Trovas) 8

A ave presa quando canta,
sabe que não canta em vão;
se solta a voz da garganta,
liberta a voz da prisão!
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A ganância, me insinua,
a ver crianças sem nome,
entre mendigos de rua
mastigando o pão da fome!!!
= = = = = = = = = = =

Ante o amor, que se desfaz,
há gritos de pranto e dor,
e a terra perdendo a paz
mendiga um pouco de amor!
= = = = = = = = = = =

As folhas secas do outono,
que se arrastara pelo chão...
Levam meus sonhos sem dono
que aos poucos, também se vão!
= = = = = = = = = = =

Das palmas do vento, o açoite
dedilha canção tão bela,
que eu sinto os dedos da noite
batendo em minha janela!
= = = = = = = = = = =

Deus, por ser sábio e tão santo,
num santo gesto de amor,
afasta a fonte do pranto
da fonte que orvalha a flor!
= = = = = = = = = = =

Eis que a ilusão continua...
E, a liberdade, é ilusão;
que há jovens presos na rua
e homens livres na prisão!
= = = = = = = = = = =

É neste silêncio mudo
quando estamos sempre a sós,
que eu percebo em quase tudo,
o que ainda existe entre nós!
= = = = = = = = = = =

Enquanto a ganância avança
e, a exploração continua,
a fome perde a esperança
de um dia fugir da rua!
= = = = = = = = = = =

Enquanto a noite se aninha,
a saudade me seduz
e a tarde, bela e sozinha,
enche os meus versos de luz!
= = = = = = = = = = =

Há na cinza requentada
do fogão do meu passado,
velha saudade sentada
batendo palma ao meu lado!
= = = = = = = = = = =

Mesmo sem cor, desbotada,
guarda uma infância tão linda,
essa fraldinha rasgada
que em meu baú, guardo ainda!
= = = = = = = = = = =

Meu verso, por onde for,
mesmo se não for preciso,
é velha prece de amor
e paz em qualquer sorriso!
= = = = = = = = = = =

Não temo o tempo que avança!
Envelhecer, na verdade...
é voltar a ser criança
no fim da terceira idade!
= = = = = = = = = = =

O andarilho tem na mão,
o mais fiel breviário,
que fala da solidão
na vida de um solitário!
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Ó, solidão, tem piedade!
Ou tu não tens coração?...
Nunca sentiste saudade,
sequer, de outra solidão?
= = = = = = = = = = =

O Sol, quando acende a chama,
e entre a neblina reluz...
Parece que o céu derrama
cristais em gotas de luz!
= = = = = = = = = = =

O velho mosteiro, ao longe,
na solidão, sem alarde,
rende-se à prece de um monge,
nos idos, do fim da tarde!
= = = = = = = = = = =

Preserve, não mate as matas,
o verde está moribundo!
Ouça na voz das cascatas
as dores cruéis do mundo!
= = = = = = = = = = =

Quando a tarde, faz seus testes,
com nuvens, lençóis tecendo,
é Jesus trocando as vestes
da tarde que vai morrendo!
= = = = = = = = = = =

Quando disseste, "até breve",
esqueceste os sonhos seus!...
Sem sonhos, ninguém descreve,
o peso da cruz do adeus!
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Quem lê, não teme os fracassos,
e a nada o leitor se rende...
Pode alguém prender teus braços,
mas os teus sonhos, não prende!
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Se a angústia, filho, entedia,
saiba que ela é cega e vã;
e, por ser cega de guia,
não guia o nosso amanhã!
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Se a sorte nos desatina,
quem ama não se maldiz;
o amor traça a própria sina
de quem quer ser mais feliz!
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Se és escravo do teu ódio,
e te escraviza o teu tédio...
Esquece a glória do pódio,
que o teu mal não tem remédio!
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Semeio meu grão sem nome,
seja na roça que for;
que a massa do pão da fome
é a mesma do pão do amor!
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Só existe um lar sem suspeita,
que agrega o amor mais profundo:
É o ventre da mãe que aceita
todas as raças do mundo!
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Teu pranto trevoso, vence-o,
pela fé, que te conduz;
que a humilde prece, em silêncio,
abre um caminho de luz!

Fonte:
Professor Garcia. Versos para refletir. Natal/RN: Trairy, 2021.
Livro enviado pelo trovador.

Contos e Lendas Indígenas (Nação Lakota: Mulher Búfalo Branco) Parte 1

A Mulher Búfalo Branco, na mitologia Lakota, é uma mulher sagrada de origem sobrenatural que deu aos Lakotas  "Sete ritos sagrados". Esta história da Mulher Búfalo Branco tem imensa importância para os Lakotas e muitas outras tribos.

Mais tarde, a lenda tornou-se atribuído à deusa Wohpe, também conhecido como Whope ou Wope.

Quando os missionários católicos romanos vieram pela primeira vez entre os Lakota, suas histórias da Virgem Maria e Jesus tornaram-se associada com a lenda da Mulher Búfalo Branco. A prática sincrética de identificação de Maria com PtesanWi e Jesus com o Chununpa continua entre os Lakota cristãos.

O Primeiro búfalo branco registrado no EUA foi em 1833 quando um bisonte branco foi morto por um Lakota Cheyenne durante uma chuva de meteoros chamada Chuvas Leonid. A pele deste bisonte está pendurado na parede do Old Fort de Bent no Colorado.

O búfalo americano ou Bison é um símbolo da abundância e da manifestação do sagrado. A lição aprendida pelos Lakotas é que um não tem que lutar para sobreviver. Isto é especialmente verdadeiro se a ação correta é acompanhada pela oração direita. Ao aprender a se unir de forma adequada com o divino, tudo o que será necessário será fornecido.

Como John Lame Deer, um líder espiritual diz: “Um búfalo branco é a coisa viva mais sagrada que você poderia encontrar." A cor e a idade têm um significado muito importante e que deve ser interpretado por um homem santo.

Os nativos americanos ao ver o nascimento de um bezerro de búfalo branco como o mais significativo dos sinais proféticos, equivalentes às estátuas que jorram mel ou choram sangue e as cruzes de luz que estão se tornando predominantes dentro das igrejas cristãs de hoje. Onde os fiéis que visitam estes sinais como uma renovação da relação contínua de Deus com a humanidade, por isso os nativos americanos ao ver o bezerro de búfalo branco como o sinal do sagrado da vida.

"A chegada do búfalo branco é como a segunda vinda de Cristo”, diz Floyd, um curandeiro Lakota Oglalade de Pine Ridge, Dakota do Sul. "Ele vai trazer a pureza da mente, corpo e espírito e unificar todas as nações; preto, vermelho, amarelo e branco.“ Ele vê o nascimento de um bezerro branco como um presságio porque acontecem nos lugares mais inesperados e muitas vezes entre as pessoas mais pobres do país. O nascimento do búfalo branco sagrado fornece aqueles dentro da comunidade indígena com um sentido de esperança e uma indicação de que os bons tempos estão por vir.

A narração de uma história de uma cultura para outra é complexa; sem viver na cultura, perdemos muito do significado da história. No entanto, ela ainda pode ter significado para nós se tomarmos o tempo para aprender sobre a filosofia da cultura de onde ela veio talvez meditar ou refletir sobre seu lugar em nossas próprias vidas.
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Os dois rapazes olharam para ela de boca aberta. Um deles foi intimidado pela sua presença, mas o outro a desejava e estendeu a mão para tocá-la. Esta mulher era Lila Wakan, muito sagrada, e não poderia ser tratada com desrespeito. Um relâmpago instantaneamente atingiu o jovem impetuoso, de modo que apenas uma pequena pilha de ossos enegrecidos foi deixada.

Para o outro olheiro que havia se comportado com razão, a Mulher Búfalo Branco disse: “Trago boas coisas, algo sagrado para sua nação uma mensagem que eu vou levar da nação búfalo para o seu povo. Volte para o acampamento e diga para o seu povo… para se prepararem para minha chegada. Diga ao seu chefe para colocar um Tipi (tenda) de cura com vinte e quatro polos. Que seja santificado pela minha vinda.

Este jovem caçador voltou para o acampamento. Ele disse ao chefe e às pessoas o que a mulher sagrada havia ordenado. Assim, as pessoas colocaram um grande tipi de medicina e esperou. Depois de quatro dias eles viram a Mulher Novilho Búfalo Branco se aproximando, carregando seu pacote a sua frente. Seu vestido de camurça branca maravilhoso brilhou de longe. O chefe a convidou a entrar no tipi. Ela entrou e circulou o nascer do sol no interior. O chefe se dirigiu a ela com respeito, dizendo: “Irmã, nós estamos contentes, você veio para nos instruir”.

Ela disse a ele o que ela queria que fosse feito. No centro do tipi eles tiveram que colocar um altar sagrado, feito de terra vermelha, com um crânio de búfalo e uma mesa de três pernas para uma coisa sagrada ela estava trazendo. Eles fizeram o que ela pediu e ela traçou um projeto com o dedo na terra suavizada do altar. Parou diante do chefe e abriu o pacote. A coisa sagrada que continha era o chanunpa, o cachimbo sagrado. Ela estendeu para as pessoas para deixá-los olhar para ele. Ela estava segurando a haste com a mão direita e a fornalha com a mão esquerda.

Mais uma vez o chefe falou: “Irmã, nós estamos contentes. Nós não tivemos nenhuma carne por algum tempo, tudo o que podemos dar-lhe é água.“. Eles mergulharam alguns wacanga (uma espécie de grama doce)  dentro de um saco feito de pele cheio de água e deu a ela, e até hoje as pessoas mergulham grama doce ou uma asa de águia na água e respinga a água em uma pessoa para ser purificado, como os padres fazem com a água benta.

A Mulher Búfalo Branco mostrou ao povo como usar o cachimbo. Ela encheu-o com chan-shasha , tabaco vermelho feito da casca  do salgueiro. Ela caminhou ao redor da pousada quatro vezes após o por de Anpetu-Wi, o grande sol. Isso representou o círculo sem fim, o arco sagrado, na estrada da vida. A mulher colocou uma lasca de couro de búfalo seca no fogo e acendeu o cachimbo com ele. Este foi peta-owihankeshni, o fogo sem fim, a chama para ser passado de geração em geração.

Ela disse-lhes que a fumaça subindo da fornalha era a respiração de Tunkashila (Deus), a respiração viva do grande avô misterioso.
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Continua…

O Teatro de Rua

Modalidade de teatro produzida em espaços exteriores ao edifício teatral, preferencialmente públicos, tais como ruas ou praças. Designa espetáculos com textos elaborados especialmente para representação na rua e adaptação de textos originalmente criados para ser apresentados em outros locais, bem como manifestações cênicas improvisadas ou performáticas (incluindo-se aí performances que dialogam com o universo das artes plásticas e números ligados à tradição da comédia popular ou do circo).

O teatro de rua se baseia em certas técnicas – como a amplificação da atuação com uso de máscaras, bonecos e adereços gigantes e grande participação da música – que trabalham para atrair a atenção dos espectadores em espaços abertos (mais “dispersivos” e menos favoráveis à manutenção da concentração do que os espaços teatrais tradicionais).

As origens do teatro de rua remontam à Antiguidade clássica: na Grécia, aos cortejos e às celebrações dionisíacas; e, em Roma, às trupes de artistas populares (mímicos, músicos, cômicos etc.). Na Idade Média, com o advento do feudalismo e a retração da vida urbana, surge uma característica importante na atividade dos artistas populares: ser itinerante. Havendo poucos centros urbanos, as trupes vagam de local para local em busca de público, especialmente em ocasiões como as feiras. Há também a ligação entre o teatro de rua e a religiosidade católica nos espetáculos voltados para a doutrinação dos fiéis, como os autos e os mistérios, que na maior parte das vezes ocorrem em espaços públicos.

Com o Renascimento, começam a ganhar forma em algumas regiões da Europa os edifícios tradicionais, passando a predominar a partir do século XVI (a princípio apenas em certas áreas) o teatro com palco italiano. Aparece então uma separação mais nítida entre o teatro dito “erudito” e o de rua, de caráter mais popular. Do século XVI ao XVIII, porém, a commedia dell’arte italiana consolida alguns dos procedimentos cênicos e dramatúrgicos (principalmente cômicos) do teatro de rua, tomando-se a forma paradigmática desse tipo de teatro.

Do fim do século XVIII ao século XX, tem ensejo na Rússia uma forma de teatro popular fortemente baseada na commedia dell’arte conhecida como balagan. Já nos primeiros anos do século XX, inicia-se o movimento francês de popularização do teatro – liderado por nomes como Jacques Copeau (1879-1949) –, que leva o teatro tradicional ao espaço público e à população mais pobre; e, na Rússia, além das experiências de nomes como Meyerhold (1874-1940), que fica conhecido como o criador da técnica biomecânica, surge o teatro de conscientização política, desenvolvido simultaneamente na Alemanha.

Uma de suas formas é o agitprop: teatro realizado na rua por atores profissionais ou amadores, com cenas simples que buscam expor a luta de classes e conscientizar a população da necessidade de mudança. Após 1917, aparecem também os grandes espetáculos de massa dedicados à glorificação da revolução comunista, como A Tomada do Palácio de Inverno, realizado em 1920 em São Petersburgo, reproduzindo no próprio local esse acontecimento revolucionário marcante, contando com 15 mil profissionais (entre atores, diretores, técnicos e figurantes) e 100 mil espectadores.

No fim da década de 1920, com o advento do stalinismo, o agitprop russo perde espaço para um teatro mais tradicional. Aparece, porém, o agitprop na Alemanha, que vive o caos social após a Primeira Grande Guerra (1914-1918). Esse tipo de teatro influencia nomes como Bertolt Brecht (1898-1956) e Erwin Piscator (1893-1966), que por sua vez passam a influenciar todo o teatro político – de rua ou não – desde então.

Nos Estados Unidos, nas décadas de 1940 e 1950, surgem grupos que realizam, muitas vezes na rua, representações de cunho político. Tais grupos se fortalecem especialmente a partir da década de 1960, com a mobilização da juventude em torno de causas políticas, sociais e culturais. Entre eles estão o Living Theatre, o Bread and Puppet Theatre e o californiano San Francisco Mime Troupe. Ganham força também os happenings (acontecimentos cênicos improvisados) e as performances (experiências que misturam artes plásticas e teatro), muitas vezes em espaços públicos. Desde as décadas de 1960 e 1970, o teatro de rua também cresce na Europa, com muitos grupos, festivais e o trabalho de teóricos como o italiano Eugenio Barba (1936), formulador da antropologia teatral.

No Brasil, o teatro de rua tem como importantes referências, desde sempre, as grandes manifestações culturais populares, como Carnaval, bumba meu boi, maracatu, reisado e todos os folguedos que contam com algum tipo de teatralidade. E há importantes realizações de grupos desde a década de 1960. Exemplos disso são as atividades do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC/UNE), liderado por Augusto Boal e Oduvaldo Vianna Filho, que adapta à realidade brasileira recursos do agitprop; e o trabalho desenvolvido pelo Teatro do Oprimido, método sistematizado por Boal, que, muitas vezes apresentado na rua, visa à conscientização social.

Da década de 1970 em diante, aparecem diversos grupos que se dedicam inicialmente à pesquisa de espetáculos para a rua (e, eventualmente, também elaboram espetáculos para espaços fechados), como Ventoforte, Tá na Rua e Teatro de Anônimo (fundados no Rio de Janeiro); Ói Nóis Aqui Traveiz (em Porto Alegre); Imbuaça (em Aracaju); Galpão (em Belo Horizonte); Parlapatões, Patifes e Paspalhões (em São Paulo), entre muitos outros. Existem ainda os grupos menos conhecidos e os artistas anônimos – muitas vezes itinerantes – que até hoje, misturando as tradições teatrais e circenses, se apresentam pelas ruas do Brasil e do mundo.

Fontes:
TEATRO de Rua. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2022. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo882/teatro-de-rua. Acesso em: 11 de junho de 2022. Verbete da Enciclopédia.
– Imagem : Entreverbos