quinta-feira, 15 de novembro de 2012

José de Alencar (Ao Correr da Pena) 17 de dezembro: O Teatro Lírico


I

Por enquanto, em falta de melhor, falemos do Teatro Lírico, que está hoje na ordem do dia, justamente pela desordem em que tem andado todas estas noites, depois que o diabo lhe entrou no corpo.

Todos os jornais têm dito a sua opinião a respeito; todas as opiniões são muito acertadas; mas parece-me que ainda ninguém chegou à conseqüência necessária deste estado anormal em que se acha o nosso teatro italiano.

Nas circunstâncias atuais, só há um remédio, e é interromper os espetáculos, pelo menos durante um mês, para dar tempo a que a nossa companhia de cantores inválidos se restabeleça e possa novamente entrar em trabalhos.

Consta-nos que a maior parte dos embaraços e dificuldades que a diretoria tem ultimamente encontrado nasce dos seus próprios empregados. Ora, com o fechamento do teatro durante um mês, poderão os diretores restabelecer a ordem necessária e destruir essa soberania do capricho, que até agora era privilégio das primas-donas, mas que já se vai estendendo às comprimárias, e breve passará às coristas e às comparsas.

Temos um regulamento de teatro, que, se não é perfeito, contém ao menos um bom número de disposições acertadas, suficientes para impor o respeito a alguns cantores, que por terem meia dúzia de panegiristas, entendem poder abusar da indulgência do público.

Faça a diretoria cumprir rigorosamente este regulamento, requisite nos casos necessários a ação da polícia, que se tem mostrado zelosa, e pode ficar certa que ninguém deixará de aplaudir essa boa resolução, cujos efeitos salutares em pouco tempo se começarão a fazer sentir.

Que importa que um cantor, punido por uma falta de suas obrigações, seja recebido com palmas a primeira vez que apareceu na cena, depois do seu ato de insubordinação? Há sempre nos homens um bom instinto que ilude, e os faz tomar o partido daqueles que julguem oprimidos, que consideram como vítimas. Isto, porém, não é uma razão para que se deixe de manter o princípio da autoridade, sem o qual não há ordem nem tranqüilidade possível.

Se todas as infrações do regulamento tivessem sido punidas como essa de que falamos, ninguém se lembraria de enxergar uma vítima no ator que caíra em falta, nem de protestar contra o ato dos diretores por uma semelhante manifestação de simpatia.

Tomando a diretoria a posição que lhe convém, e fechando o teatro pelo tempo necessário para preparar as óperas que tem de levar à cena, poderá em pouco tempo continuar os espetáculos sem interrupção, e com aquela regularidade que até hoje tem sido impossível conseguir.

Todos os anos por este tempo a imprensa lembra a idéia de fechar-se o Teatro Lírico por um ou dois meses, e, apesar disto, ainda não nos compenetrarmos bem desta necessidade; não queremos reconhecer que, se na Europa a ópera italiana abre-se por uma estação, no nosso país, com o nosso clima, é quase impossível continuar os espetáculos sem dar aos artistas algum tempo de repouso e descanso.

Estou certo que este ano sucederá a mesma coisa; que a diretoria não julgará necessária uma medida sem a qual se passou muito bem os anos anteriores. Mas também este ano veremos acontecer o mesmo que o verão passado. O teatro continuará aberto por formalidade e por luxo unicamente, os cantores estarão constantemente doentes; passarão doze dias sem espetáculo; o calor e o receio das transferências afugentará os espectadores; e por fim, depois de dois ou três meses de vegetação, a companhia ficará extenuada e incompleta, e, como o ano passado, seremos obrigados a fechar o teatro justamente quando se acabar o verão, e quando os espetáculos começarem a ser agradáveis.

Talvez percamos o nosso tempo a falar destas coisas. O teatro lírico, que já tomou as proporções gigantescas de uma questão de gabinete, hoje apenas serve de tema sediço às palestras e correspondências de jornais. Entretanto isto não pode continuar assim; já não podemos passar sem ópera italiana, e por conseguinte mais cedo ou mais tarde se descobrirão os meios de possuirmos constantemente no nosso teatro uma companhia regular e composta de artistas de merecimento.

Para isso o governo pode achar um grande auxílio no nosso Conservatório de Música, dirigido pelo hábil professor o Sr, Francisco Manuel da Silva. O gosto e a aptidão que têm geralmente as brasileiras para o canto pode  concorrer para o futuro do nosso teatro, fornecendo as empresas de coristas e comprimárias, e facilitando-lhe assim os meios de contratar na Europa as primeiras partes, pelo preço que pagam os melhores teatros europeus.

Na visita que o Sr. Ministro do Império fez ultimamente a este estabelecimento, assistiu aos trabalhos da aula destinada ao sexo feminino. Estiveram presentes 34 jovens alunas, que executaram, entre outras três peças de música sacra, compostas pelo diretor, duas sobre poesias do Padre Caldas, e uma sobre a letra latina – Ó salutaris hóstia.

O Sr. Ministro do Império conta visitar igualmente a aula dos meninos, e, depois que tiver assistido a todos os trabalhos do Conservatório, é de crer trate de completá-lo, anexando às aulas rudimentais, únicas que existem, aulas de aplicação, que poderão daqui a algum tempo dar-nos ótimos instrumentistas para nossas orquestras.

A escassez dos recursos é a primeira causa do pouco desenvolvimento que tem tido o Conservatório. Os auxílios concedidos por meio de loterias estão hoje reconhecidos como pouco eficazes, principalmente correndo elas com longo espaço. Fora preferível que o corpo legislativo votasse uma dotação anual, com a qual o governo poderia contar para ir melhorando gradualmente esta instituição.

Hoje ninguém se lembra do Conservatório de Música. Entretanto quem sabe daqui a alguns anos quantas horas agradáveis não nos dará ele por ocasião dos seus concursos e dos seus exames anuais! Quem sabe se ainda não terei de contar aos meus leitores a história de alguma Rosina Stoltz brasileira, educada neste Conservatório, e para quem algum Donizetti também brasileiro escreverá uma nova Favorita.

Talvez julguem que isto são votos de imaginação: é possível. Como não dar largas à imaginação, quando a realidade vai tomando proporções quase fantásticas, quando a civilização faz prodígios, quando no nosso próprio país a inteligência, o talento, as artes, o comércio, as grandes idéias,tudo pulula, tudo cresce e se desenvolve?

Na ordem dos melhoramentos materiais, sobretudo, cada dia fazemos um passo, e em cada passo realizamos uma coisa útil para o engrandecimento do país.

Não há muito tempo que S.M. teve a bela idéia de fundar em terras de uma fazenda sua uma colônia, que recebeu o nome de Petrópolis. O ano passado, à imitação da primeira, se começou a criar uma nova cidade, à qual se deu o nome de Teresina. Hoje sabemos que uma terceira colônia se vai formar na Serra dos Órgãos, na fazenda do Marsch; já começou a divisão dos prazos, pelo mesmo sistema de Petrópolis.

A situação é a mais aprazível e a mais linda que se pode imaginar: é plana, cortada por um belo rio, e acha-se no alto da serra, num ponto de muita passagem, e por onde talvez tenha de seguir um dos ramais da estrada de ferro do Vale do Paraíba.

A viagem desta corte é a mais cômoda possível. Vai-se até Sampaio em barca de vapor; o resto é um agradável passeio de duas léguas e meia, que se pode fazer de carro, por uma excelente estrada. Reúne, portanto, todas as condições, a comodidade, a rapidez e a segurança.

Isto no estado atual; porque, logo que se começar a povoar o lugar, logo que os habitantes desta corte tiverem gozado aquele clima frio e seco, aquele céu sempre azul, aquelas águas frescas e puras, logo que se estabelecer a concorrência, não faltarão companhias regulares de ônibus e de carros, que ainda tornarão a ida mais breve e mais cômoda. Então não será uma viagem, mas um passeio; poder-se-á almoçar na corte e ir lá jantar-se, mas, jantar-se à hora curial, e não às cinco, como sucede com Petrópolis, por causa da maré.

De maneira que daqui a uns dez ou vinte anos, se as coisas continuarem, em vez de  se passar o domingo em Andaraí, Botafogo, ou no Jardim Botânico, iremos a Petrópolis, a Teresina, ou a cidade dos Órgãos; depois do almoço, se estivermos aborrecidos, tomaremos a estrada de ferro e iremos por distração ver correr o Paraíba; de noite voltaremos para o teatro, ou para o baile, e nos recolheremos tendo andado de léguas o que hoje andamos de braças.

Talvez ainda me tachem isto de sonho e de utopia. Será sonho, não o nego; mas que melhor se pode fazer neste tempo de repouso e descanso, do que sonhar? O trabalho vai cessar, as festas aí vêm, cheias de prazeres e de folhas para aqueles que estão alegres e dispostos a goza-las.

As férias começam. Os colégios se fecham desde que concluem os seus exames, os quais este ano já têm mostrado mais zelo da parte dos diretores e mais aplicação nos discípulos. O que se nota apenas é que em cada colégio o menino ressente-se um pouco da influência de uma ou outra especialidade, conforme a educação dos diretores.

Com as férias, com os dias de festa, nem a exposição da Rua do Ouvidor, verdadeira exposição, porque deixa a bolsa dos passeantes exposta a um perigo terrível. Este ano apresenta-se à concorrência uma nova casa brasileira do Sr. C. Lase, que entrou pelos domínios estrangeiros, mas com um luxo e um brilhantismo que nada tem que invejar às casas francesas.

Se não preferis, pois, o sossego e a tranqüilidade do campo, tereis durante esses dias algumas horas bem agradáveis, vendo passar diante  daqueles salões,brilhantemente iluminados, tudo quanto há de elegante e distinto na nossa sociedade.

Tereis ainda o prazer de poder escolher, entre tantas galanterias, uma bem delicada, bem mimosa, como as mãozinhas a que a destinardes; e em paga recebereis algum olhar, alguma palavra de agradecimento, que vos fará andar por ai a roer as unha e a sorrir às pedras das calçadas até o momento em que o cruel e positivo negociante vos traduzir aquele encantador olhar em linguagem de cifra, e lhe der um valor em moeda corrente.  

Tudo isto, e os mais divertimentos que gozardes durante a festa, me referireis a primeira vez que nos encontrarmos no ano seguinte. Em troca vos contarei a festa do campo, os dias passados à sombra a conversar com algum amigo, a contemplar a natureza, e a evocar as lembranças adormecidas de outros dias já passados.

II

Voltemos uma folha ao livro da semana. Um grande pensamento, uma idéia brilhante foi nela escrita pelo amor da pátria, e pelo amor da ciência.

O Instituto Histórico do Brasil celebrou a sua sessão aniversária sexta-feira no Paço Imperial. SS.MM., o seu Conselho de Estado, alguns ministros, o corpo diplomático, e quase todas as ilustrações do país, assistiram a este ato solene, celebrado com as formalidades do estilo.

Depois da breve alocução do Exmo. Visconde de Sapucaí, o Sr. Dr. Macedo, 1.º Secretário, leu o seu relatório dos trabalhos do Instituto durante o ano. É um resumo completo, um pouco longo, como exigia o seu assunto, mas ao qual o seu autor soube, com rara habilidade, dar uma forma amena, e muitas vezes eloqüente. Depois de mostrar a incansável solicitude com que S.M. continua a proteger o Instituto, o Sr. Dr. Macedo passou à enumeração dos trabalhos, e terminou por um belo trecho, notável não só pela boa dicção da frase, como por uma verdadeira apreciação da atualidade.

Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Raquel Ordones (Guardados de Mim)


Ruth Rocha (Bom dia todas as cores)


Meu amigo Camaleão acordou de bom humor.
- Bom dia, sol, bom dia, flores,

bom dia, todas as cores!

Lavou o rosto numa folha
Cheia de orvalho, mudou sua cor
Para a cor-de-rosa, que ele achava
A mais bonita de todas, e saiu para
O sol, contente da vida.

Meu amigo Camaleão estava feliz
Porque tinha chegado a primavera.
E o sol, finalmente, depois de
Um inverno longo e frio, brilhava,
Alegre, no céu.
- Eu hoje estou de bem com a vida
- Ele disse. - quero ser bonzinho
Pra todo mundo...

Logo que saiu de casa,
O Camaleão encontrou
O professor pernilongo.
O professor pernilongo toca
Violino na orquestra
Do Teatro Florestal.
- Bom dia, professor!
Como vai o senhor?
- Bom dia, Camaleão!
Mas o que é isso, meu irmão?
Por que é que mudou de cor?
Essa cor não lhe cai bem...
Olhe para o azul do céu.
Por que não fica azul também?

O Camaleão,
Amável como ele era,
Resolveu ficar azul
Como o céu da primavera...

Até que numa clareira
O Camaleão encontrou
O sabiá-laranjeira:
- Meu amigo Camaleão,
Muito bom dia e você!
Mas que cor é essa agora?
O amigo está azul por quê?

E o sabiá explicou
Que a cor mais linda do mundo
Era a cor alaranjada,
Cor de laranja, dourada.

Nosso amigo, bem depressa,
Resolveu mudar de cor.
Ficou logo alaranjado,
Louro, laranja, dourado.
E cantando, alegremente,
Lá se foi, ainda contente...


Na pracinha da floresta,
Saindo da capelinha,
Vinha o senhor louva-a-deus,
Mais a família inteirinha.
Ele é um senhor muito sério,
Que não gosta de gracinha.
- bom dia, Camaleão!
Que cor mais escandalosa!
Parece até fantasia
Pra baile de carnaval...

Você devia arranjar
Uma cor mais natural...
Veja o verde da folhagem...
Veja o verde da campina...
Você devia fazer
O que a natureza ensina.

É claro que o nosso amigo
Resolveu mudar de cor.
Ficou logo bem verdinho.
E foi pelo seu caminho...

Vocês agora já sabem como era o Camaleão.
Bastava que alguém falasse, mudava de opinião.
Ficava roxo, amarelo, ficava cor-de-pavão.
Ficava de toda cor. Não sabia dizer NÃO.

Por isso, naquele dia, cada vez que 
Se encontrava com algum de seus amigos,
E que o amigo estranhava a cor com que ele estava...
Adivinha o que fazia o nosso Camaleão.
Pois ele logo mudava, mudava para outro tom...

Mudou de rosa para azul.

De azul para alaranjado.

De laranja para verde.

De verde para encarnado.

Mudou de preto para branco.

De branco virou roxinho.

De roxo para amarelo.
E até para cor de vinho...

Quando o sol começou a se pôr no horizonte,
Camaleão resolveu voltar para casa.
Estava cansado do longo passeio
E mais cansado ainda de tanto
mudar de cor.
Entrou na sua casinha.
Deitou para descansar.
E lá ficou a pensar:
- Por mais que a gente se esforce,
Não pode agradar a todos.
Alguns gostam de farofa.
Outros preferem farelo...
Uns querem comer maçã.
Outros preferem marmelo...
Tem quem goste de sapato.
Tem quem goste de chinelo...
E se não fossem os gostos,
Que seria do amarelo?

Por isso, no outro dia, Camaleão levantou-se
Bem cedinho.
- Bom dia, sol, bom dia, flores,
Bom dia, todas as cores!

Lavou o rosto numa folha
Cheia de orvalho,
Mudou sua cor para
A cor-de-rosa, que ele
Achava a mais bonita
De todas, e saiu para
O sol, contente
Da vida.

Logo que saiu, Camaleão encontrou o sapo cururu,
Que é cantor de sucesso na Rádio Jovem Floresta.
- Bom dia, meu caro sapo! Que dia mais lindo, não?
- Muito bom dia, amigo Camaleão!
Mais que cor mais engraçada,
Antiga, tão desbotada...
Por que é que você não usa
Uma cor mais avançada?

O Camaleão sorriu e disse para o seu amigo:
- Eu uso as cores que eu gosto,
E com isso faço bem.
Eu gosto dos bons conselhos,
Mas faço o que me convém.
Quem não agrada a si mesmo,
Não pode agradar ninguém...
E assim aconteceu
O que acabei de contar.
Se gostaram, muito bem!
Se não gostaram, AZAR!


Fonte:

João Anzanello Carrascoza (Ponta da Língua)


Ilustração: Clouds

Cheia de graça é a nossa língua, portuguesa.
 Você nem precisa aprender o á-bê-cê para rir com ela.
 Desde pequeno já ouve dizer que mentira tem pernas curtas.
 E mentira tem pernas?
 E a verdade? A verdade tem pernas longas?
 E quando dói a barriga da perna?
 Ou quando ficamos de orelha em pé?
 O que a barriga tem a ver com a perna, e orelha com o pé?
 Pra ser divertido, não leve nada ao pé da letra!
 Até porque letra não tem pé. Ou tem?
 Pé-de-meia é o dinheiro que a gente economiza.
 Pé-de-moleque, doce de amendoim.
 Dedo de prosa é papo rápido.
 Dedo-duro é traidor.
 Pão-duro, pessoa egoísta.
 E boca da noite? E céu da boca?
 É uma brincadeira atrás da outra!
 Cabeça de cebola, dente de alho, braço de mar.
 Com a nossa língua, a gente pode pegar a vida pela mão.
 Pode abrir o coração. Pode fechar a tristeza.
 A gente pode morrer de medo e, ao mesmo tempo, estar vivinho da silva.
 Pode fazer coisas sem pé nem cabeça.
 Mas brincar com palavras também é coisa séria.
 Basta errar o tom e você vai parar no olho do furacão.
 Então, divirta-se. Cuidado só para não morder a língua portuguesa

Fonte:

Mário de Carvalho (Três personagens transviadas)


Escrevo num computador instalado num móvel polido que tem uma prateleira que se puxa. Muito vulgarizados, tais móveis podem encontrar-se em qualquer loja informática das grandes. Menciono este dado pessoal porque ele estabelece o cenário de desconfortáveis ocorrências, há pouco mais duma hora, aqui no meu escritório. Possuir um móvel destes não é coisa de que alguém se gabe, e eu preferiria ocultar o facto, se não fosse necessário confessá-lo.

Estava a premir a tecla F 11, quando um homenzinho magro, de fato escuro completo e chapéu fora de moda emergiu atrás do teclado e começou a fazer esforços para se içar para o tampo superior, onde se agigantam monitor e impressora. Levantava os braços, numa gesticulação que me pareceu desesperada e dava grandes saltos, em cima da consola. Calçava sapatos ferrados que tiravam do plástico x sons fortes lembrando bicadas repetidas de catatua.

Não foi esta a primeira vez que me vi assediado por personagens. Acontecia-me, não raro, quando ia passear para o Jardim Constantino, depois do jantar, em certos plenilúnios. Saíam-me ao caminho por detrás das árvores e quase sempre eram mais altas e encorpadas do que eu. Algumas mostravam-se pouco benignas e chegavam a maçar-me. Essa a razão por que evito o Jardim Constantino e, quando tenho de passar por ali, sigo numa corrida e oculto a cara como posso. Nunca estou bem certo do plenilúnio.

Agora, uma personagem de doze centímetros de altura, magrita, a saltar ao alcance dos meus dedos é que nunca me tinha acontecido. Alguma vez havia de ser a primeira. O que pensei logo foi «com este posso eu bem». Apesar de parecer bastante ginasticado, capaz daqueles pulos todos, não me deu para ter medo dum homenzinho que me cabia na palma da mão. E se ele estivesse armado? Pelo aspecto não parecia.

Mas havia já outra personagem. À claridade do monitor, uma jovem loura, de blusa rosa e saia preta, passeava ao comprido pelo tampo do móvel, esfregando uma na outra as mãos ansiosas. Parecia estar muito preocupada. Usava bandós e calçava saltos altos. Podia estragar-me o verniz. Aproximei a cara. Tranquilizei-me. O peso dela não era bastante para que os saltos de agulha perfurassem a mobília. A mulherzinha não deu por mim. Continuava a andar, de um lado para o outro, fazendo soar, ao de leve, no móvel o tique-tique dos saltos. Ao debruçar-me, pareceu-me ouvir, muito sumidamente, uma vozinha angustiada: «Oh, Augusto, Augusto!» Mas não garanto.

O homem, entretanto, conseguia pendurar-se no tampo, e depois de um esforço complicado de braços e cotovelo içava o corpo, com dificuldade. Demorou que tempos nisto. Sobreveio a tentação de lhe dar uma ajuda com os dedos. Mas resolvi não interferir. Se ele me desabasse sobre o teclado, então poria a mão debaixo, não fosse danificar-me algumas teclas ou ficar entalado entre elas. Seria um tanto ridículo, aparecer na loja de informática a explicar que tinha um fulano esprimido entre as teclas, e que fizessem o favor de mo tirar com aquelas pinças largas que os especialistas usam.

Mas, enfim, o homenzinho lá se levantou, sacudiu o pó do fato, num manifesto exagero, ou num reflexo habitual (injusto porque eu posso comprovar que não há pó neste móvel) teve uma hesitação, e fez qualquer coisa de absolutamente inesperado.

Em vez de se dirigir à mulher, como eu erradamente previa, encaminhou-se para o velho do tambor.

O velho, de barba branca e barrete frígio, estava sentado na borda do cinzeiro, e tocava permanentemente tambor. Não se ouvia um som. Mas eu notava que às vezes aplicava as baquetas com grande energia. E a mulher lá continuava, dum lado para o outro, tique-tique, a arrepelar as mãos. Notei que teve um sobressalto, talvez um susto, e recuou um passo. Mas quando o homem desapareceu por trás do cinzeiro, fora do seu alcance, voltou à perturbada deambulação anterior.

A mulher estava, de certeza, à espera de alguém, provavelmente do tal Augusto, que não era o do chapéu. Eu comecei a enternecer-me e quase a desejar que o Augusto se mostrasse. O velho do tambor suspendeu a batida e olhou para o homem de chapéu que o tirou, num repelão, e tornou a colocá-lo. Era educado. O velho do tambor rodou a cabeça, repetidamente, numa obstinação negativa e recomeçou a rufar.

Mas o receio de que pudessem surgir mais personagens inquietou-me. Qual Augusto! Não me apetecia nada que a casa se me enchesse de cavaleiros, de ciclistas, de pugilistas e meninas do can-can. Ou de tropa. Não, é que podia perfeitamente aparecer um pelotão, a formar, em ordem unida, no braço do meu sofá orelhudo...

Em circunstâncias difíceis como esta, não há nada como recorrer a um perito. Telefonei a um amigo, que é escritor. Atendeu mal-disposto, porque foi acordado. É um escritor dos diurnos, nove às cinco.

«Ouve, meu caro, desculpa lá, mas estão a aparecer-me personagens em volta do computador. O que é que eu faço?»

O meu amigo formulou muitas perguntas sábias. É um grande especialista de personagens. Se eram pesadas ou leves, grandes ou pequenas, silenciosas ou barulhentas, sentimentais ou secas. «Têm máscara?», inquiriu. «Não? Então são de grau inferior...» Quando eu o informei de que eram pequenas e silenciosas, ele sugeriu-me com um tonzinho superior de quem enuncia uma evidência: «Agarra nas três e atira-as pela janela.»

«E se atinjo alguém? Estás a ver-me em tribunal por defenestrar personagens, com dano para os utentes da via pública?» «Então, conduta do lixo com elas.» «Não posso fazer uma coisa dessas, sempre são gente.»

Do lado de lá do telefone o meu amigo fez um «ts» de rabugice. Desconfio de que trata as personagens dele com uma certa dureza. É o que dá a experiência.

«Escuta, não andas agora a escrever umas crónicas, uns comentários, ou lá o que é?» Como é que ele sabia? Isto é uma cidade muito bem informada. Admiti.

«Então, faz o seguinte: aprisiona-as no texto.»

Fonte:
Mário de Carvalho. Contos Vagabundos. Lisboa: Editorial Caminho,2000. 

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 727)



Uma Trova de Ademar  

Meu momento mais doído
foi perder quem tanto adoro,
por isso eu choro escondido
para ninguém ver que eu choro!
–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional  

Arruaça sempre grande:
jogo, bebidas, e orgia,
Quanto mais o vício expande,
mais sua alma se esvazia!
–Eliana Palma/PR–

Uma Trova Potiguar  

Não fumo nem por esporte,
porque cigarro fascina;
mas deixa um gosto de morte
no trago da nicotina.
–José Lucas de Barros/RN–

Uma Trova Premiada  

2005   -   Nova Friburgo/RJ
Tema   -   APELO   -   M/E

Preenchi a tua vida:
fui musa, amante, modelo.

Mas, hoje, a minha partida...
resiste a qualquer apelo!
–Dilva Maria de Moraes/RJ–


...E Suas Trovas Ficaram  

Quando o solo estranho pisa,
o imigrante, esta é a verdade,
imigra porque precisa,
mas não foge da saudade.
–José Maria Morgade/SP–

U m a P o e s i a  

Fugindo à desarmonia,
no Bem vivemos imersos,
numa redoma de paz,
onde os males mais diversos,
sublimamos com ternura...
e um punhadinho de versos!
–Vanda Fagundes Queiroz/PR–

Soneto do Dia  

CRIATIVIDADE NA TERCEIRA IDADE
–Roza de Oliveira/PR–


Ser criativo na terceira idade
é sublimar os próprios desenganos!
Sócrates – a lira, aos setenta anos ,
aprendeu e tocou....na intimidade!

O filósofo, em criatividade,
uniu-se aos demais gênios – mais que ufanos:
Michelângelo – Goethe – soberanos
astros e gênios na melhor idade!

Em nossos tempos Cora Coralina
nos seus setenta, jovem se insinua
nas poesias tão puras, que ao escrevê-las

revela, em sua arte cristalina,
que lançando sua rede ao mar da lua
busca as estrelas ... tão somente estrelas!!!

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Cláudia Dimer (Não Sei Falar do Amor)

Formatação: Margot Vidal

Olivaldo Junior (Fim de Feira)


Pintura: Adriane Freire
Recolho a lona, aluno aplicado
em não ser mal-educado,
escrevendo como se o Olivaldo
pudesse lhe dar respaldo
para o sol que você não queria
obrigado.

Tiro as ripas, roubo a estrutura.
Estruturo o silêncio, silencio.
Mas o cio das letras me tortura
e sou mais um no meu vazio.

Não há mais sol de querosene,
não há mais lua de metáforas,
não há mais eu que só lhe acene,
nem há mais rua de semáforos,
fechados sinais
a quem tem pressa:
- Te interessa?

Guardo as tralhas que ninguém
de mim mais quer, aguardo.

É, o fim de feira me aperta,
pois sou, amigo, o seu poeta,
a linha reta que te entorta,
o torto ao peito que se porta
como se fosse só de morte.

Fonte:
O Autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 726)



Uma Trova de Ademar  

Quando uma paixão soterra 
mágoa e dor nas cicatrizes, 
deixa uma marca que ferra 
o peito dos infelizes... 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Quando o percurso é distante
e os trilhos correm sem fim,
é bem neste exato instante, 
que Deus alia-se a mim! 
–Lisete Johnson/RS– 

Uma Trova Potiguar  

Mesmo sozinho e tristonho 
jamais vou te machucar,
porque o sonho que eu sonho, 
ninguém mais pode sonhar.
–Heliodoro Morais/RN– 

Uma Trova Premiada  

1997  -  Ribeirão Preto/SP 
Tema  -  GENTE  -  9º Lugar 

Que bom se a gente pudesse
fazer tudo que não fez...
e a vida, a chance nos desse,
de ser criança outra vez!...
–Ercy Maria M. de Farias/SP– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Nos bons tempos de criança 
sonhava ser rei na vida: 
hoje toda essa esperança 
é ser teu servo, querida! 
–Jayme Paulo Filgueira/RN– 

U m a P o e s i a  

Eu montei o meu esquema 
pra viver as emoções, 
não abro mão do prazer 
de viver minhas paixões. 
Falo do meu dia a dia, 
do trabalho, da alegria, 
do real, e de ilusões. 
–Dáguima Verônica/MG– 

Soneto do Dia  

CARRO DE BOIS. 
–Divenei Boseli/SP– 

Eu sinto a mansidão de um boi de carro 
e meu carro de bois roda mansinho 
por mais íngreme e hostil seja o caminho: 
às vezes só de pedra, outras de barro. 

Sabemos, eu e os bois, que há um passarinho 
cantando em cada arbusto em que me esbarro. 
Do cheiro do gambá não me desgarro... 
Mas ouço, de uma fonte, o burburinho! 

Eu sou carro de bois rodando agora 
caminhos que a saudade, mundo afora, 
abriu, redesenhando o meu sertão. 

A mata com veredas tem meu jeito: 
veredas são as veias no meu peito 
bordando esse meu triste coração!

Jornais e Revistas no Brasil (A Época)


Período disponível: 1912 a 1919 
Local: Rio de Janeiro, RJ 

Denunciando os hábitos "puramente provincianos" da imprensa brasileira, o matutino A Época apresentou-se, no editorial do primeiro número, como jornal crítico e de oposição ao governo do marechal Hermes da Fonseca e ao Partido Republicano Conservador (PRC), do qual o presidente da República era um dos principais nomes. Lançado no Rio de Janeiro em 31 de julho de 1912, o periódico pertencia à Sociedade Anônima A Época, e tinha como diretores, no período inicial, Vicente de Toledo de Ouro Preto, Vicente Ferreira da Costa Piragibe e J. B. Câmara Canto. Circulava diariamente, em formato standard e oito páginas, com redação e administração situadas no nº 151 da avenida Rio Branco. 

Ainda no editorial da edição de lançamento, A Época discorria sobre os vícios e desqualificações de jornalistas e da imprensa brasileira em geral, a qual tachava de "ridícula" por valorizar noticiários policiais, notas sobre órgãos públicos e a bajulação a figuras da alta sociedade. Cabe ressaltar, no entanto, que o matutino não rompeu necessariamente com alguns desses vícios. Outro editorial da mesma edição inicial, assinado pelos três diretores da folha, "sinceramente catholicos", qualificava o periódico como apartidário e defensor de "um Exercito e uma Marinha efficientes, isto é disciplinados".

Apesar de apresentar refinados artigos e ensaios de cultura e moda galante,assinados por gente como Sílvio Romero, Coelho Neto e Augusto dos Anjos, A Época também tinha também uma linha popular, voltada para questões sociais e trabalhistas. Abordando lutas e manifestações gerais do operariado, a "Columna Operaria" noticiava greves, reivindicações proletárias, novidades sobre clubes e associações sindicais, incluindo mesmo atividades dançantes, esportivas e carnavalescas. O diário ainda tratava de assuntos ligados ao cotidiano e às condições de vida da população suburbana carioca na seção "Nos Suburbios!". Em novembro de 1912, noticiou e discutiu amplamente o projeto de construção de vilas operárias pelo governo.

Curiosamente, muito pela preferência política de Vicente de Ouro Preto, o diário se mostrava por vezes simpático ao monarquismo. A possível contradição entre o monarquismo de Ouro Preto e a atenção às causas operárias fica exposta, por exemplo, no nº 706. Após destacar a figura de Ouro Preto, que acabara de falecer, o jornal publicava, em outra página, o texto "Algumas palavras sobre o movimento revolucionario contemporaneo" (p.3), do jovem anarquista Astrojildo Pereira, que mais tarde se tornaria líder comunista e prestigiado crítico literário de orientação marxista.

Em seus primeiros momentos, A Época publicava a coluna "Política Exterior", assinada por "G. Ruch"; a seção de humor político intitulada "Fora do Sério", assinada por "Ridente"; entrevistas e textos opinativos sobre política nacional; notícias sobre Portugal, na seção "Cousas Portuguezas", de Alberto Estanislau; folhetins de autores diversos; notas sobre movimentações militares, sobretudo na seção "Forças Armadas", assinada por Vedeta; notícias gerais de utilidade pública no Rio de Janeiro e em outras cidades, como transportes, obras públicas, legislação e assuntos jurídicos etc.; o cotidiano carioca; a coluna "Echos Sociaes"; artigos sobre saúde; notícias e variedades relativas ao Congresso Nacional; notas sobre política e administração pública na seção "Periódicas", assinada por "Xosciuszko"; notícias enviadas por telegramas do estrangeiro e de várias cidades brasileiras; cotidiano policial; a coluna "Commercio, Lavoura e Industria", com cotações de produtos e variedades sobre economia e mercado; a "Chronica Esotérica", assinada pelo barão Ergonte, depois substituída pela seção de ocultismo e estudos espíritas "Os mysterios do Além...", então dirigida pelo médium Fernando Lacerda; anúncios de peças de teatro e crônica teatral, em "Coisas do Theatro" ou em especiais dominicais; artigos e ensaios sobre mestres da literatura; uma seção esportiva; a "Secção Livre"; sonetos, contos e crônicas de autores variados, sendo alguns traduzidos; despachos de órgãos públicos; viagens e curiosidades sobre diversas cidades e paisagens; ciências; moda; resultados do Jogo do Bicho; anúncios publicitários, entre outras coisas, incluindo fotografias. 

De início, as assinaturas semestrais e anuais custavam, respectivamente, 18$000 e 30$000. As edições dominicais eram mais robustas, com cerca de 12 páginas e matérias especiais de capa, em geral ilustradas. Os temas de destaque dos três primeiros domingos do periódico foram, no dia 4 de agosto de 1912, "O repatriamente dos restos mortaes de Suas Magestades D. Pedro 2º e D. Thereza e a revogação do banimento da Familia Imperial".

As convicções políticas de A Época, como era de se esperar, renderam ao jornal inúmeras polêmicas e embates. Em novembro de 1913, por exemplo, o jornal desfechou uma onda feroz de ataques ao PRC e a seus políticos. Em meio a isso, noticiou, na edição do dia 25, o falecimento de seu diretor Vicente de Ouro Preto (dois dias depois, o jornal se mostraria solidário à revista Careta diante dos ataques do filho de Hermes da Fonseca, por exageros humorísticos contra seu pai). Em 1914, já sob o governo de Wenceslau Brás, A Época aplaudia a atuação de Rui Barbosa como senador.

Após desdicar atenção inicial ao conflito armado na Europa, o jornal voltaria a lançar ataques ao governo, evocando ainda a anistia aos envolvidos na Revolta da Chibata – ver, na edição nº 856, de 28 de dezembro de 1914, a matéria "A amnistia aos revoltosos de 1910". Ainda em 1914, conforme aparece a partir da edição de 3 de outubro, a redação, a administração e as oficinas do jornal se mudaram da avenida Rio Branco para o nº 139 da rua do Rosário.

Por volta de outubro de 1916, deu destaque à Guerra do Contestado e à questão fronteiriça envolvendo os estados do Paraná e de Santa Catarina. Rui Barbosa continuava uma figura benquista nas páginas do jornal, assim como o chanceler Lauro Muller, mas críticas gerais ao governo federal cessaram. A edição de nº 1.588, de 15 de novembro daquele ano, trazia uma mudança de opinião do diário em relação a Wenceslau Brás; avaliando positivamente os dois anos de seu governo. No entanto, mesmo parecendo favorável ao governo federal, A Época sofrerá com a censura. Na edição de nº 1.998, de 31 de dezembro de 1917, ao relatar a prisão de Dormund Martins, diretor de A Lanterna, a entrevista com o mesmo teve dois trechos cortados. 

Até o nº 2.114, ano 7, de 27 de abril de 1918, a publicação foi dirigida por Vicente Piragibe. Na edição do dia seguinte, o diário subtraiu seu nome do cabeçalho e passou a ser identificado como "Propriedade de P. D'Almeida Godinho". Na edição de nº 2.130, de 13 de maio de 1918, reforma editorial e gráfica modernizou-o consideravelmente. Logo na primeira página publicou editorial que destaca o novo padrão gráfico e os novos colaboradores. A partir deste momento, o alto da capa de cada edição passou a sair com a frase "Tudo pelo Brazil". Nessa nova fase, o jornal aparentava neutralidade política, pelo menos até o fim do governo de Wenceslau Braz. No governo de Delfim Moreira, que assumira a presidência com a convalescença de Rodrigues Alves, a publicação voltou a mostrar esporádicas reportagens e textos críticos ao governo. 

A partir da edição nº 2.591, de 21 de agosto de 1919, passou a estampar em cabeçalho o nome do novo dono e diretor: Jeronymo Teixeira de Alencar Lima, fundador do jornal baiano A Tarde. Iniciando sua terceira fase, passou a publicar a série de artigos "O governo e os problemas nacionaes", intitulada posteriormente apenas "Grandes problemas nacionaes". Internamente, as edições do jornal passavam a se organizar em páginas intituladas "Congresso e Governo", "Correio dos Estados" (onde saía a clássica coluna sobre o subúrbio carioca), "Vida Internacional", "Justiça – Religião – Sciencia", "Educação e Trabalho" (onde eram publicados a "Columna Operaria" e a "Resenha Commercial"), "Notas Desportivas e Sociaes" e "Letras, Artes e Diversões".

 A última edição do jornal foi, até onde se pôde apurar, de número nº 2.690, ano 8, de 28 de novembro de 1919. Além dos nomes já citados (sendo vários pseudônimos), ao longo de sua edição A Época teve o trabalho ou colaboração de nomes como Affonso Celso, Múcio Teixeira, Maurício de Medeiros, Hermes Fontes, Maria da Cunha, Angelina Vidal, Juvenal Sampaio, Teophilo Guimarães, Augusto dos Anjos, José Félix, Fialho D'Almeida, Campos de Medeiros, Alberto de Carvalho, Eduardo e Benjamin Magalhães (aparentemente os responsáveis pela coluna "Nos Subúrbios", por volta de 1917), Orestes Barbosa, Afonso Lopes D'Almeida, entre outros, assim como os caricaturistas e ilustradores Fritz, Kalixto e Edmir, de grande destaque na imprensa humorística da época.

Fonte:
http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/época

José de Alencar (Ao Correr da Pena) 10 de dezembro: Adeus à Corte!


Farewell! Farewell!... Adeus à corte, aos bailes, aos teatros! Adeus às belas noites do Rio de Janeiro; aos seus magníficos salões, aos seus brilhantes saraus!Até à volta!  Chegou a época das viagens; é preciso partir.

A cidade vai ficando tão monótona e tão insípida, que já não há prazer em andar por aí a arruar, vendo sempre as mesmas ruas e as mesmas casas, algumas tristes e abandonadas, entregues ao gênio protetor dos lares domésticos.

A caminho, pois, meu amável leitor. Tomai o vosso bordão de tourista, o vosso saco de viagem, o vosso álbum de recordações; esquecei por alguns dias os negócios, esquecei as obrigações, esquecei tudo e segui-me. Viajaremos de companhia, iremos juntos procurar além novas impressões, outros cuidados.

Onde iremos? A Cantagalo, à Santa Cruz, à Nova Friburgo, ao Morro Queimado, a esses lugares onde o clima é doce e saudável, onde as águas são puras e cristalinas? Nada; vamos a Petrópolis, a terra das flores, a terra dos amores-perfeitos; vamos percorrer a Alemanha como sobre uma carta geográfica; vamos ver os nevoeiros da serra, os despenhadeiros das montanhas, e finalmente aquelas graciosas casinhas tão alvas e com suas janelinhas verdes, que se destacam aqui e ali pela beira do caminho, ou pela margem dos canais.

A barquinha de vapor corta ao largo resvalando docemente pela flor d’água, mas sem aquela excessiva velocidade que dá aos objetos um aspecto fantástico. A cidade do Rio de Janeiro vai fugindo à vista, e com o vago da distância começa a retratar-se no horizonte como um painel magnífico iluminado pela esplêndida claridade dos raios do sol.

Aqui e ali aponta sobre todo aquele confuso e variado panorama da cidade a torre de alguma igreja ou a cruz singela de algum campanário, como para advertir ao viajante que do meio das saudades da pátria, da família, ou de algum ente que se idolatra, o pensamento deve erguer-se a Deus no momento da partida.

Ali, onde as vagas se desfazem em alvos flocos de espumas, estão as Feiticeiras, célebres na crônica do mundo elegante, pelo quase naufrágio do Guarani. Quantas feiticeiras não conheço eu mesmo em terra, que já produziram e são capazes de produzir ainda mais terríveis naufrágios! Há, porém, entre estas e aquelas, duas pequenas diferenças. A primeira é que em umas morre-se pela água, nas outras pelo fogo. A segunda diferença é muito  mais curiosa. Nas feiticeiras do mar o Guarani salvou-se por ser um barco novo; nas feiticeiras de terra são justamente os barcos novos os que correm maior perigo.

Perdoai-me esta observação humorística, meu amável leitor e companheiro de viagem; prometo-vos que será a última. Abandonemos de uma vez, com os olhos e com o pensamento, esta cidade que já não tem encantos para nós. Quereis o belo sob outras formas, quereis a natureza da nossa terra em outros quadros? Lançai os olhos por este vasto estendal das ondas alisadas ao sopro acariciador da brisa; vede aqueles grupos de pequenas ilhas verdes e graciosas, que com a carreira da barca parecem que vão fugindo umas atrás das outras; vede as alvas praias de areia onde a vaga se espreguiça e murmura, ao longe os claros e escuros das encostas, e o vulto das montanhas que se debuxam no azul do céu.

Mas eis a ponte do desembarque que se alonga pela proa da barca; chegamos a Mauá. Saltemos, e, como o lugar não tem nada que ver, como as construções da Companhia ainda estão em princípio e não oferecem nada de curioso, tratemos já de tomar os nossos lugares no vagão, e preparemo-nos para a nova viagem, tendo o nosso bilhete em mão segundo o regulamento.

Deu o sinal. Lá vamos levados pelo monstro de fogo que se lança, rugindo como uma fera, vomitando fumo, devorando o espaço. Alexandre Dumas já o disse; o prazer da velocidade tem um gozo, uma voluptuosidade inexprimível. A primeira vez, porém, a novidade, o vago do desconhecido, destroem em parte aquele prazer, e produzem uma espécie de embriaguez de espírito, que de alguma maneira paralisa o pensamento. Não há idéia fixa, não há preocupação, por mais forte que seja, que resista a esse choque súbito de tantas emoções, a esse tumulto confuso das impressões que se sucedem rapidamente, que se aglomeram, se repelem e se destroem.

Depois de dezenove minutos desse vôo fantástico, desse sonho acordado, despertais repentinamente aos gritos do cocheiro e aos trancos de um  dos incômodos carros da Companhia, que vos faz imediatamente lembrar dos passeios ao Catete. Resignai-vos como eu; e, se tendes alguma idéia favorita, alguma imagem suave, que vos ande a sorrir na mente, abri-lhe a vossa alma, e esquecei as misérias deste mundo. Quando mal pensardes, estareis no alto da serra.

Salve, louçã e faceira, Petrópolis! Salve, lindos chalés, casinhas campestres, montanhas, cascatas, canais! Como tudo isto é gracioso e simples; como a existência é doce e tranqüila nestes lugares aprazíveis e nesta convivência agradável da gente da terra! Que risonhas que são essas manhãs de cerração, que ao nascer do sol começam a desdobrar o seu véu branco, com toda a garridice e todo o disfarce de uma andaluza, quando entreabre a sua mantilha! 

E contudo nunca Petrópolis esteve como agora entregue ao abandono e ao desleixo. O estado das ruas é péssimo; não se cuida da limpeza dos canais, e de outros melhoramentos urgentes. Ao passo, porém, que isto sucede, consome-se dinheiro em edificar uma capelinha no antigo hospital, que há muito se trata de remover. Compra-se um terreno para servir de matadouro público, e consente-se que um particular continue a cortar num açougue, infectando assim a principal rua da colônia – a Rua do Imperador.

Pelo menos, é isto o que dizem todos os habitantes de Petrópolis, cujo clamor é geral. Foi preciso que chegasse o tempo da viagem costumada de SS. MM. Para  que se tratasse de melhorar os caminhos, e reparar algumas ruas que se acham em miserável estado e que oferecem pior trânsito do que a estrada da serra.

Enquanto o diretor da colônia não for obrigado a residir em Petrópolis, embora tenha boas intenções e grande atividade, não poderá prestar a devida atenção às necessidades do lugar, nem entregar-se completamente ao estudo dos objetos de sua competência. O governo devia tomar isto em consideração e regular melhor as obrigações da diretoria, ou então acabar com ela e substituí-la por outro qualquer meio de administração.

Entretanto, apesar do mau estado das ruas, meu leitor, se já não estais fatigado e não me abandonastes na viagem, vamos sair a passeio, e dar uma vista de olhos àquilo que nos parecer mais interessante e mais digno de atenção. Quereis ir ao Palacete, ver o jardim que se está concluindo? Quereis subir às colônias, e dar um giro a cavalo até a cascata de Itamarati? Ou preferis arruar sem destino, onde vos levar a fantasia?

Como quiserdes; mas, se estás disposto a seguir o meu conselho, não deixai de fazer uma visita aos dois colégios Kopke e Calógeras. O primeiro tem a grande vantagem de ser uma casa construída de propósito para o fim a que foi destinada, e reúne por conseguinte todas as condições econômicas e higiênicas. Assim, o que se nota logo neste estabelecimento é o asseio, a limpeza, a claridade dos aposentos, a facilidade  com que o ar se renova nos dormitórios, e finalmente as cores sadias, o vigor, a boa disposição que mostram os colegiais. A par disto, a regularidade dos trabalhos, a acertada divisão das classes e a vigilância ativa do diretor, tornam este colégio muito útil para a educação não só dos meninos filhos da corte, como daqueles que vêm das províncias, e que por conseguinte ainda mais necessitam do clima saudável de Petrópolis.

No estudo das primeiras letras, o Sr.Kopke adotou o método do ensino repentino com algumas modificações, e tem tirado deles grandes vantagens. Nos outros ramos, os seus alunos apresentam igualmente muitos progressos; e quando observamos que, apesar do adiantamento geral dos alunos, eram justamente que, apesar do adiantamento geral dos alunos, eram justamente os meninos de menor idade os que respondiam com mais acerto e maior segurança, confirmamo-nos na idéia de que isto era devido ao sistema de estudo seguido pelo diretor.

O Colégio Calógeras é um estabelecimento montado em grande escala, mas cujo edifício não foi construído com a idéia de adapta-lo à instrução primária e secundária. Possui alguns professores muito hábeis, começando pelo seu diretor e proprietário. Sobre os seus trabalhos nada posso dizer, porque apenas corri o edifício, e em horas destinadas ao repouso dos alunos.

Já temos viajado muito; portanto montemos a cavalo, e desçamos a serra com as primeiras claridades do dia, quando o sol mal desponta entre os cabeços da montanha. Correi os olhos por essas quebradas da serrania, por essa névoa da manhã docemente esclarecida pela frouxa luz da aurora, e não tenhais receio que, como Horácio, os cuidados montem na garupa para seguir-vos: Post equitem sedit atra cura.

Quatro horas de caminho – e eis-nos de novo no Rio de Janeiro, restituídos aos nossos penates e às obrigações esquecidas durante três dias. Recomecemos a vida interrompida, voltamos a falar de teatros, de jornais, a criticar, palestrar, estudar a questão das carnes verdes, e a preparar-nos para a fome que nos ameaça se não tomarmos prontas providências e se não cuidarmos seriamente deste objeto, procurando quanto antes os meios de evitar a escassez dos gêneros alimentícios.

Se bem me lembro, o Sr. Marquês de Abrantes iniciou a sessão passada no senado um projeto a respeito de pescarias, que era em minha opinião um dos grandes recursos a lançar mão para o futuro. Cumpre que o governo e as câmeras tomem a peito aquele projeto, que vem satisfazer uma grande necessidade e produzir um benefício que de há muito se devia ter realizado.

Com estas medidas e outras tendências a favorecer a criação de gados, isentando-a dos direitos de passagem e de barreiras, é de esperar que o governo consiga prevenir essas faltas de gêneros alimentícios, que não se deviam dar num país novo, de grandes recursos, e extraordinariamente produtivo, como é o nosso.

Estes fatos, porém, servem de despertar ainda mais a nossa atenção para a colonização, para a navegação de grandes rios, principalmente do Amazonas, cujas várzeas imensas estão aí incultas, e encerram nas suas matas virgens um manancial de riquezas, que convém quanto antes ser explorado.

Ultimamente, um moço destemido, sem recursos, sem meios, que penetrou por estes ínvios sertões, e desceu o grande rio desde o Chile até o Pará, escreveu um itinerário de sua viagem, que provavelmente há de conter observações novas e de muito interesse. Este moço é o Sr. Dutra. 2.º tenente da nossa armada, e que os leitores já devem conhecer pelo curioso artigo que publicou sexta-feira no Jornal do Comércio a respeito das origens da língua tupi.

É de crer que o Sr. Dutra publique oportunamente o relatório de sua viagem, e então o nosso governo não deixará sem remuneração os serviços prestados por ele, durante essa longa travessia cheia de tantos perigos e de tantos incômodos, que só um homem de gênio empreendedor se animaria a tenta-la com os mesquinhos recursos pecuniários que tinha à sua disposição. São serviços deste quilate, quase espontâneos, que é mister gratificar generosamente, para excitar em nossa mocidade esse espírito de louvável ambição, que é o móvel das grandes empresas.

Porém, quando ainda convém estimular os nossos oficiais a empreender coisas desta ordem, de tanta utilidade para o pais, visto que não temos, como têm a França e a Inglaterra no Oriente, um campo vasto onde se está ilustrando o seu exército e a sua marinha, batendo-se com toda a galhardia contra o colosso inabalável do Império Russo.

Apesar, porém, de todos os seus esforços, Sebastopol, a sentinela avançada da Rússia, continua a resistir com firmeza. Os franceses e ingleses, que a princípio olhavam com desdém para essas massas de granito, cuja bruta resistência contavam vencer pela perícia de suas armas, viram de repente surgir de dentro das muralhas soldados em vez de homens indisciplinados, e conheceram no momento preciso que a defesa era digna do ataque.

Com efeito, quando marinheiros franceses, ao ler a ordem do dia do Almirante Hamelin – A França vos contempla – se  arrojaram às muralhas e recusaram deixando mais de seiscentos mortos e feridos, é que a coisa era impossível, e que a Rússia, embora houvesse perdido a alma, defendia o seu corpo a todo transe.

Todas estas notícias, e muitos outros detalhes importantes a respeito das operações dos dois exércitos inimigos, vieram-nos pelo Severn, entrando quinta-feira. O Sr. Conselheiro Paulo Barbosa, que era esperado neste paquete, chegou dois dias depois num navio procedente do Havre. Tendo ido à Europa incumbido de uma missão importante pelo nosso governo, demorou-se para restabelecer a sua saúde gravemente alterada.

Sempre que um cidadão como o Sr. Paulo Barbosa volta à sua pátria, não são unicamente os seus amigos que têm motivos de felicitar-se, mas sim todo o país, todos aqueles que conhecem a honradez do seu caráter e a distinção de seu trato e de suas maneiras.

Como deveis estar fatigado da viagem que fizemos, e por conseguinte com muito pouca disposição para conversar, faço-vos os meus cumprimentos, meu caro leitor, até o próximo domingo, em que voltarei a fazer-vos a minha visita habitual. Good bye.

Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Clevane Pessoa (Idade)


Olivaldo Junior (Trovas sobre Loucura)


A Loucura tem mania
de não dar continuidade:
vai quebrando, dia a dia,
toda a dura realidade.

Ser estranho é ser doente,
diz a mídia que nos ata...
Mas o “louco inteligente”
faz a vida menos chata.

Todo louco que se preza
não despreza seu caminho:
seja à força, seja à reza,
todo mundo volta ao ninho.

Fonte:
O Autor

Eliana Jimenez (Participe da Trova-Legenda até 20 de novembro)



Trova-legenda até 20/11/2012

Participe!!! Envie sua trova sobre a imagem acima.

Todos podem participar com sua trova.

Envie para elianarjz@gmail.com

Veja as trovas legendas anteriores em

http://poesiaemtrovas.blogspot.com.br/

Antonio Brás Constante (Pois é, Voltei, Depois de Morrer...)



Pois é, voltei. Acho que morri por uns tempos, me despi de toda roupagem de autor e desisti, resistindo aos primeiros impulsos de respirar novamente a escrita, esmoreci a vontade de voltar, até sentir que tinha me libertado da liberdade de escrever. Cheguei a virar a página, a apagar a luz, a esquecer como é a sensação de ordenar aos dedos que dedilhassem meus pensamentos em algo que se pudesse ler...

Escrever é como nadar contra a correnteza, sem qualquer certeza de onde se quer chegar. O que eu fiz foi apenas parar de dar braçadas nas águas dos acontecimentos, me deixei afundar, sem qualquer resistência ou insistência. Por isso que digo que morri, me afoguei nas profundezas do esquecimento, e a cada dia ia ficando mais fácil, mais cômodo, mais tranqüilo, mais... Etc. A cada dia mais eu via menos de mim mesmo como escritor. 

Outro dia, logo após publicar meu primeiro texto de retorno “A CANDIDATA E O BDSM”, recebi algumas mensagens de boas-vindas, entre elas a de um amigo que ainda não conheço pessoalmente, mas com quem já tive a oportunidade de conversar algumas vezes por telefone, e-mails e redes sociais, o jornalista e também escritor Aparecido Raimundo de Souza (a quem estou devendo já há um bom tempo a criação de um vídeo com seus textos para ser lançado no Youtube). Da troca de mensagens com o Aparecido veio o embrião da ideia deste novo texto. 

Descobri que parar de escrever até que não é tão difícil. Basta por na balança o alto custo de algo tão precioso quanto o tempo gasto em algo como a escrita. Quando se pesa o custo e o beneficio de escrever, percebemos que se dedicar à escrita é um péssimo negócio.

Escrever, assim como viver, dá trabalho, cansa, esgota as energias. Aborrece às vezes. Fazendo-nos querer ser nada, sombras livres para vagar sem chamar a atenção para si. Deixar de ser vidraça, deixar de levar pedradas, deixar de juntar os cacos sempre que refletimos o brilho de nossas idéias na cara dos outros, isso muitas vezes irrita-os, tirando-lhes da comodidade de suas concepções prontas, e despertando a selvageria latente naqueles que são forçados a ter que pensar, mesmo que através da leitura de bobagens sem muito sentido.

Mas o que é o sentido? Quando vemos uma seta apontando em uma direção, achamos que aquilo faz sentido, que ela aponta para algo à frente, mas e se ela estiver apontando para o mais à frente, ou para o mais à frente ainda, vamos seguindo sua direção e encontrando tantas coisas, até chegar a um ponto em que ela vai apontar para o nada e nos perderemos em seu rumo, sem rumo.

O engraçado é que após minha volta, muitos já me perguntaram porque parei, mas ninguém perguntou porque voltei, ninguém mesmo, nem eu, pois confesso que ainda não saberia responder a essa pergunta...

Fonte:
O Autor

Francisco Pessoa (Meu irmão, se morreres vou contigo!)


Para Ademar Macedo

Confissão de um amor que agora faço
um amor que surgiu tão de repente
e que mais de repente, renitente,
apossou-se de nós em passo a passo
Mirian e Dalvinha são o laço
que apertando nós dois num nó amigo,
cada um se sentindo num abrigo
do outro, em total cumplicidade,
mesmo crendo na nossa eternidade
meu irmão, se morreres, vou contigo!

Fonte:
O Autor

Jornais e Revistas do Brasil (Revista A Bomba)


A Bomba
Período disponível: 1913 a 1913 
Local: Curitiba, PR 
Pesquisa no acervo:
  

A Bomba: Revista ilustrada, humoristica e literaria foi uma publicação trimestral de Curitiba, a capital paranaense. De periodicidade trimestral – saía nos dias 10, 20 e 30 de cada mês –, tratava de temas variados, entre os quais a política, sobretudo local, e o esporte. Sua tônica, porém, era a crítica de costumes, tema que, na virada para o século XX – marcada por grandes mudanças, como a implantação da República e a intensificação da modernização urbana – predominava em grande parte da imprensa brasileira. 

O humor, a ironia, a piada eram a principal marca da publicação, como anunciava a apresentação do primeiro número: “Declaramos positivamente que ‘A Bomba’ é inteiramente independente em suas feições religiosas politicas. É por esta razão que todos os dias filamos café no palacio Rio Branco, o chá no tugurio do Caio, o almoço em casa do Bispo, e o jantar no honrado lar do pastor protestante da Egreja Evangelica Persbyteriana Independente. (…) (A Bomba, nº 3, 1 jul. 1913) 

Mario Rezende, um dos colunistas do jornal, ironizava o burguês: 

“(...) E assim metido no seu egoismo, nesse egoismo muito natural em gente rica, passa horas e horas de olhos esbugalhados para a tela e para o palco. E que tortura horrivel, si se lhe depara uma repetição de fitas. Immediatamente vem rosnar aos emprezarios, que está sendo victima de uma extorsão, que aquella fita, ellle já a vira na vespera ou na antevespera. E os emprezarios lhe não deixam tambem de distribuir um punhado de getilezas temperadas com doçura simuladamente maliciosa de um sorriso fino e ironico.
 E assim vai o burguez passando a vida, gordurento e lerdo, com muita saudade e com muitas patacas, sempre a fingir que é moço e que é feliz. (A Bomba, 10 set.1913, Ano I, nº 10)

A revista se interessou por retratar o novo papel da mulher no início de século XIX. Como, por exemplo, no seguinte quadrinho de humor sobre mães solteiras: “- Está fazendo uma touca... é para seu filho? – Não, Cazuza, eu não sou casada. – Isso não quer dizer nada...” (A Bomba – 10 de Dezembro de 1913 – Ano I, n.º 19)

Algumas das colunas permanente do jornal eram: “Portico”, “Notas Sportivas”, “Coisas da Política (mas coisas... serias)”, “O Batates”, “Paraná Intellectual”, “Notas elegantes”, entre outras.

Marcelo Bittencourt era o proprietário, Rodrigo Junior e Clemente Ritz os redatores e Félix cuidava das artes. A redação funcionava na rua Marechal Deodoro, nº 36. A assinatura anual custava 14$000, semestral 8$000, avulso $400 e o numero atrasado $500.

A Bomba, até onde foi possível comprovar, desapareceu no mesmo ano em que foi criada, 1913.

Fonte:
http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/bomba