quinta-feira, 27 de junho de 2024

A. A. de Assis (Jardim de Trovas) 49

 

Figueiredo Pimentel (A alma do outro mundo)

Zeneida tinha um namorado com quem queria a todo o modo casar-se. Sendo ele, porém, um homem do povo, conquanto honrado e trabalhador, a família dela, orgulhosa, com fumaças de fidalguia, e rica, não o consentiu, e tratou de lhe arranjar outro casamento.

Apresentando-se como pretendente um velho, que enriquecera no comércio, o pai obrigou-a a aceitá-lo por noivo. A moça obedeceu, a seu pesar, não gostando daquele marido que lhe ofereceriam, e não se tendo esquecido do seu apaixonado.

Realizadas as bodas, os noivos partiram para uma longa viagem que devia durar três meses.
***

Uma vez estavam jornadeando, e tiveram que passar um rio, largo e fundo, sobre uma estreita ponte de madeira. Zeneida, alegando muito medo, fez o marido passar adiante, e, quando se viram no meio, atirou-o à água.

Na ocasião em que estava prestes a se afogar, o velho ricaço, antes de desaparecer submergindo, exclamou:

– Deixe estar malvada, que minha alma te há de perseguir!...

Desde esse dia, uma voz invisível acompanhou-a sem cessar, noite e dia repetindo todas as palavras que ela pronunciava.

A rapariga foi obrigada a se fingir muda, receosa que viessem a descobrir o seu crime.
***

Continuando a viagem sozinha, Zeneida foi ter a um grande país, a cuja capital chegou.

Aí, passeando pelos arredores, foi vista por um príncipe, que dela se apaixonou, dirigindo-lhe declarações de amor, e terminando por pedi-la em casamento.

Por meio de gestos mímicos, ela fez compreender que aceitava, mas que não podia falar por ser muda.

O príncipe ficou sentidíssimo, porque a lei vedava-o casar com qualquer moça que não fosse absolutamente perfeita. Todavia mandou levá-la para o paço, confiando-a aos cuidados dos mais notáveis médicos do reino, que a examinaram, desenganando-se de curá-la.

Quando se achava a sós, Zeneida tentava falar. Mas, à menor palavra, que pronunciasse, a alma do seu marido a repetia, e mesmo conversavam.

Um dia soube que o príncipe ia casar-se, vendo que ela não ficava boa. A noiva devia chegar nessa manhã, e todos os criados do palácio tinham ido ver o seu desembarque.

Zeneida, ficando sozinha, dirigiu-se à cozinha real, também abandonada, onde se preparava o banquete. Destampou uma panela, e provando o guisado, exclamou:

– Oh! como está gostoso!

– Oh! como está gostoso, repetiu a alma.

– Queres um bocadinho?

– Quero.

– Então, chega-te aqui, para a ponta de meu dedo!

A alma chegou-se, e, assim que a sentiu bem na extremidade do indicador, Zeneida estalou o dedo no fogão.

Ouviu-se um grande estrondo, e ela disse com um suspiro de alívio:

– Uff! Felizmente estou livre!

Falou, cantou, recitou, e não ouviu mais a voz da alma que a importunava.

Foi se vestir deslumbrantemente.

O cortejo da nova princesa já havia chegado ao palácio.

Zeneida dirigiu-se para o salão, onde viu a noiva sentada num trono, junto ao príncipe.

Ao avistá-la, a noiva, querendo fazer espírito, perguntou:

– Esta é muda mudona?

A outra retorquiu:

– E esta é a noiva noivona, que já está tão sabichona?

Admirado de ouvi-la falar, o príncipe desmanchou o casamento com a primeira, vindo a se casar com Zeneida.

Fonte: Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado em 1896. Disponível em Domínio Público.

Vereda da Poesia = 46 =


Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

- Canta mal, essa "coroa"...
- Pois saiba que é minha tia.
- Se a música fosse boa...
- Pois é de minha autoria!
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Poema de Lisboa/Portugal

ANTERO JERÓNIMO

Descarnar a impoluta palavra
Até à chama viva da carne
Como sílex que golpeia o marasmo
Dos dias bocejados e estéreis

Expor-se à pudica avidez
Sangue ígneo renegando a venosidade
Correndo em disseminado apelo
Como um simples ato de sobrevivência

Revolver a cegueira
Guardada em redoma ilusória
Numa vontade insofismável
De extrair da forma disforme
Os contornos invisíveis ao olhar

Por fim sopesar o rosto nas mãos
Em breve e maravilhado apelo
Frestas de compreensão que se agitam
Onde o sal do cansaço rejubila.
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Aldravia de Belo Horizonte/MG

CLEVANE PESSOA

Perfume 
floral
alcança
espíritos 
adoça 
sonhos
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Soneto de Santos /SP

VICENTE DE CARVALHO
1866-1924

A um poeta moço

Desanimado, entregas-te, sem norte,
Sem relutância, à vida; e aceitas dessa
Torrente que te arrasta — a só promessa
De ir lentamente desaguar na morte.

Que pode haver, em suma, que te impeça
De seguir o teu rumo contra a sorte?
Sonha! e a sonhar, e assim armado e forte,
Vida e mágoas, incólume, atravessa.

Ouve: da minha extinta mocidade
Eu, que já vou fitando céus desertos,
Trouxe a consolação, trouxe a saudade,

Trouxe a certeza, enfim, (se há sonhos certos)
De ter vivido em plena claridade
Dos sonhos que sonhei de olhos abertos.
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Trova Vencedora em Astolfo Dutra/MG, 2024

ARTHUR THOMAZ
Campinas/SP

O velho ator, alquebrado,
da realidade fugindo,
ainda sonha acordado,
com a plateia o aplaudindo.
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Poema de Americana/SP

IZABEL RODRIGUES

Renúncias 

Toda renuncia gera dor
Por menor que seja 
O sonho sonhado
Deixar para trás e seguir
Pode acontecer
E acontece diariamente
Mas causa danos
Contornáveis ou irreversíveis 
Marcam ficando indeléveis cicatrizes
E cada um conhece as suas profundamente
Embora sigam 
Uns expondo-as agressivamente 
Outros caminhando disfarçadamente
Pela vida
Apesar da carga pesada 
Mas invisível 
Carregada...
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Quadra Popular de Paredes/Portugal

TIAGO
(António José Barradas Barroso)

Nosso querer tão velhinho,
cheio de ternuras e afetos,
se deu, aos filhos, carinho,
mais ainda deu aos netos.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

RONALD DE CARVALHO
(Ronald Arthur Paula e Silva de Carvalho)
1893 – 1935

Vida

Para um destino incerto caminhamos,
Tontos de luz, dentro de um sonho vão;
E finalmente, a glória que alcançamos
Nem chega a ser uma desilusão!

Levanta-se da sombra, entre altos ramos,
Como um fumo a subir, lento, do chão,
A distância que tanto procuramos,
E os nossos braços nunca atingirão...

Mas um dia, perdidos, hesitantes,
A alma vencida e farta, as mãos tateantes,
De repente, paramos de lutar;

E ao nosso olhar, cansado de amargura,
As montanhas têm muito mais altura,
O céu mais astros, e mais água o mar!
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Trova de Belo Horizonte/MG

ALMIRA GUARACY REBÊLO

Já não combato a ansiedade
que me consome e angustia;
a dor da minha saudade
eu a transformo em poesia.
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Poema Do Rio de Janeiro/RJ

CASSIANO RICARDO
(Cassiano Ricardo Leite)
São José dos Campos/SP, 1895 – 1974, Rio de Janeiro/RJ

Canção para poder viver

Dou-lhe tudo do que como,
e ela me exige o último gomo.
Dou-lhe a roupa com que me visto
e ela me interroga: só isto?

Se ela se fere num espinho,
O meu sangue é que é o seu vinho.

Se ela tem sede eu é que choro,
no deserto, para lhe dar água:

E ela mata a sua sede,
já no copo de minha mágoa

Dou-lhe o meu canto louco; faço
um pouco mais do que ser louco.

E ela me exige bis, "ao palco"!
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Haicai de Irati/PR

SÍLVIA MARIA SVEREDA 

Plena madrugada.
O olhar ainda reflete
o brilho da lua.
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Sextilha de São Simão/SP

THALMA TAVARES

É feliz quem vê mais o lado bom
e o poeta está sempre com a razão.
Apesar de que o estro tudo enxerga;
e olha o triste e o que alegra o coração.
Há, no entanto, quem vê somente a lama
sem ter olhos pra ver a imensidão.
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Trova de Santos/SP

CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

Que esta trova seja um hino,
que ouças o pobre a gemer
e, ouvindo o planger do sino,
saibas o irmão socorrer.
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

MOTE:
Vejo o mar beijando a areia 
no raiar de um novo dia, 
ouço o canto da sereia, 
com promessas de alegria! 
José Feldman
 (Campo Mourão/PR)

GLOSA: 
Vejo o mar beijando a areia 
e me agarro ao corpo dela; 
pra muitos, ela era a feia, 
para mim, era a mais bela! 

Sozinhos, nós dois na praia, 
no raiar de um novo dia; 
ficar ali na gandaia 
era tudo o que eu queria! 

Porém veio a maré cheia, 
e, bem de longe, do mar, 
ouço o canto da sereia, 
querendo nos naufragar! 

Me amarrei, que nem Ulisses, 
ao ouvir a cantoria 
da Ligeia, em meio aos Sirtes, 
com promessas de alegria!
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Aldravia de Porto Alegre/RS

ALCIONE SORTICA

Lembranças
e
saudades
são
velhas
comadres
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

AFONSO CELSO
(Afonso Celso de Assis Figueiredo Júnior)
Ouro Preto/MG, 1860 – 1938, Rio de Janeiro/RJ

Senhorita

Ela, às vezes, nas rendas da mantilha,
Com a esbelteza audaz de uma espanhola,
A trança negra, onde áureo pente brilha,
E o busto altivo donairosa enrola;

E provocante, lânguida, casquilha,
Desferindo fragrâncias de corola,
Cativa muito orgulho, que se humilha
Pedindo amor, como quem pede esmola!

Então, os seus olhares atrevidos,
Não sei por que, recordam dois bandidos,
Armados de punhais longos e finos,

Que entre as moitas floridas da alva estrada,
Traiçoeiramente, ficam de emboscada
Para assaltar incautos peregrinos!
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Trova Humorística Premiada em Astolfo Dutra/MG, 2024

PAULO R. O. CARUSO
(Paulo Roberto Oliveira Caruso)
Niterói /RJ

Ela traiu o marido
pelo celular... Que cena!
E um mistério irresolvido:
nasceu chifre ou uma antena?
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Poema de Santo André/SP

PAM ORBACAM
(Paula Miasato)

O fio

Tudo o que calo ou falo
Constitui a significância de tudo o que vivo e pereço
É o que arde aos ouvidos quando calo
Que faz morada no meu peito enquanto morro
E é o que voa ao vento enquanto falo
Que se desfaz, dilui e evapora.
De que importa o som que ecoa sem resposta....
De que vale o silêncio, perante tamanha lacuna...
Vivo e morro no silêncio ardente do que calo
Enquanto mato e vivifico, proferindo a secura da boca.
Alienada no pensamento que cala
Enfastiada no movimento que fala
Nesse ouvido meu que ouve
Mil palavras, mil palavras...
É tudo que calo ou falo 
que me gela as mãos, o peito e a alma.
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Triverso de Osório/RS

SUELY BRAGA

Entro no meu eu
Olho o meu eu.
Só enigmas.
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Setilha de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

Ao médico, eu consultei 
para saber a razão 
desta dor que me atormenta, 
dia e noite, o coração: 
sabe o que ele receitou, 
e a dor, ligeiro, passou? 
Xarope de trovação!
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Trova de Angra dos Reis/RJ

JESSÉ NASCIMENTO

Sinto uma grande alegria 
e o alvo sempre persigo: 
conquistar a cada dia 
um novo e leal amigo.
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Hino de Curitiba/PR

Letra: Ciro Silva

I
Cidade linda e amorosa da terra de Guairacá.
Jardim luz, cheio de rosa Capital do Paraná.
Pela ridente paisagem
Pela riqueza que encerra,
Curitiba tem a imagem
Dum paraíso na terra.

II
Viver nela é um privilégio
Que goza quem nela está.
Jardim luz, cheio de rosa.
Capital do Paraná.

Pérola deste planalto
Toda faceira e bonita.
Na riqueza e na opulência
Vive, resplande, palpita

III
Subindo pela colina
Altiva sempre será.
Jardim luz cheio de rosa
Coração do Paraná.
Salve! cidade querida
Glória de heróis fundadores.
Curitiba, linda joia
Feita de luz e de flores.
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Poetrix de Salvador/BA

GOULART GOMES

A$$alariado

vende a vida inteira
pelo pão de cada dia
a liberdade boia, fria
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Soneto de Portugal

GONÇALVES CRESPO
(Antônio Cândido Gonçalves Crespo)
Rio de Janeiro/RJ, 1846 – 1883, Lisboa/Portugal

Quimeras

O mar já me tentou: aspirações fogosas
Fizeram-me idear fantásticas viagens;
Eu sonhava trazer de incógnitas paragens
Notícias imortais às gentes curiosas.

Mais tarde desejei riquezas fabulosas,
Um palácio escondido em múrmuras folhagens,
Onde eu fosse ocultar as cândidas imagens
Das virgens que evoquei por noites silenciosas.

Mas, tudo isso passou: agora só me resta
Das quimeras que tive, uma visão modesta,
Um sonho encantador, de paz e de ventura.

É simples: uma alcova, um berço, um inocente,
E uma esposa adorada, envolta, a negligente!
De um longo penteador na imaculada alvura...
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Trova de Caicó/RN

MARA MELINNI
(Mara Melinni de Araújo Garcia)

Nas noites de solidão...
— Lua, que embala os amores,
és, em tua mansidão,
a musa dos trovadores!
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O leão velho

Decrépito o leão, terror dos bosques,
E saudoso da antiga fortaleza,
Viu-se atacado pelos outros brutos,
Que intrépidos tornou sua fraqueza.

Eis o lobo com os dentes o maltrata,
O cavalo com os pés, o boi com as pontas,
E o mísero leão, rugindo apenas,
Paciente digere estas afrontas.

Não se queixa dos fados; porém vendo
Vir o burro, animal de ínfima sorte:
«Ah! vil raça — lhe diz — morrer não temo,
Mas sofrer-te uma injúria é mais que morte!»

(tradução: Bocage)

Célio Simões (“Bater pernas”)

A expressão significa andar por aí com a intenção apenas de se distrair, sem compromisso de horário, sem destino certo, ou como diz Caetano Veloso na música “Alegria Alegria”, “caminhando contra o vendo, sem lenço e sem documento”. Observação oportuna: para muitos, o lenço é um dos últimos vestígios do cavalheirismo, pois os homens os carregam para as mulheres, quando elas choram... 

Ou seja, “bater pernas” é sair sem objetivo definido, podendo ser uma ida às compras, visitar um amigo ou passear nos recantos da cidade, em lugares bonitos que ela tem, que jamais são notados quando a pessoa está ao volante do carro, atento à buraqueira das ruas ou tentando escapar das loucuras do trânsito, cada vez mais caótico e incivilizado. 

Não existe registro de como ou quando surgiu essa expressão, que é meramente figurativa, de puro contexto popular. Pode até mesmo ser considerada uma gíria, uma expressão idiomática, visto que o sentido literal dos termos - "bater” e “pernas" - não é exatamente o que ocorre na prática, pois ninguém caminha batendo uma perna na outra.

Em muitos lugares do Brasil é comum ouvir frases do tipo: “Já vai bater perna por ai”? “Vamos bater perna no shopping hoje”? “Estou de folga do trabalho e vou tirar o dia para bater pernas” ou “nas minhas férias, vou viajar e bater pernas pelo mundo”. Mas o que isso significa exatamente? Em resumo, essa expressão coloquial quer dizer andar a esmo ou como diz a turma mais jovem, dar um ‘rolê’ pelos lugares mais badalados.

A verdade é que a origem certa dessa expressão permanece desconhecida. Pode-se especular que ela pode ter surgido a partir da observação sobre o ato mecânico de caminhar, quando alguém movimenta as pernas - só que, ressalve-se novamente – no ato de caminhar ninguém bate as pernas uma na outra. Outra versão propala que sua origem seria  uma possível analogia com o movimento repetitivo dos pássaros ao “baterem as asas”. Mas como os humanos se locomovem com os membros inferiores, “bater perna” passou a ser usada para representar figurativamente o deslocamento sem objetivo pré-definido.

“Batendo perna nas bibliotecas”, é o nome de um Projeto de Extensão da Escola de Biblioteconomia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, tão emblemática é a expressão para conceituar quem perambula sem rumo, em busca de alguma coisa. Entretanto, sendo um recurso linguístico, expressões idiomáticas como “bater perna” não se confundem com os conhecidos “ditados populares”, considerando que a característica destes, é serem frases curtas e de efeito, que passam um ensinamento, uma lição, uma advertência. 

Um exemplo: “O sujo falando do mal lavado” - para enfatizar a contradição de alguém sabidamente desonesto, que exige honestidade de outrem. E qual o ensinamento ou advertência que “bater pernas” transmite? Nenhum. Tampouco pode ser considerada como uma metáfora, que são figuras de linguagem que também utilizam o verbo bater, com vários significados, como: bater de frente, bater o pé, bater o martelo, bater boca, bater as botas, bater em retirada, bater papo, etc.

Ana Cristina da Costa e Jorge Fernando Ribeiro Trindade compuseram o excelente samba intitulado “Batendo Perna”, cujo trecho aqui transcrito bem traduz o espírito despreocupado de quem segue sem rumo, livre de compromissos: “Já bati de frente // Perdi e ganhei // Também teve gente // Que incomodei // Mas de mão beijada // Juro ganhei nada // Por qualquer parada eu não me curvei // Por isso tô batendo perna // Tô batendo perna // Tô batendo perna...”. 

O poeta, ficcionista, tradutor e crítico literário gaúcho Carlos Nejar, membro da Academia Brasileira de Letras, na conversa que teve com André Argolo (participação no PublishNews), fala da sua solidão, de seus livros e da sua enorme vontade de “bater pernas pelo país e falar o quanto puder, de poesia, assunto de sua vida inteira, em conferências, palestras, onde for”. No caso, tanto os dois compositores, como o imortal da ABL, usaram a expressão com o mesmo e intencional sentido: sair por aí sem preocupações, para fazer o que lhes der vontade...
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(*) O autor é advogado, escritor, palestrante, poeta e memorialista. É membro da Academia Paraense de Letras, da Academia Paraense de Letras Jurídicas, da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Artística e Literária de Óbidos, da Confraria Brasileira de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós.

Fonte: Texto enviado pelo autor

Recordando Velhas Canções (Estúpido Cupido)


Compositores: Howard Greenfield / Neil Sedaka

Oh, Cupido, vê se deixa em paz
(Oh-oh, Cupido) meu coração que já não pode amar
(Oh-oh, Cupido) eu amei há muito tempo atrás
(Oh-oh, Cupido) já cansei de tanto soluçar
(Oh-oh, Cupido) hei, hei, é o fim
Oh-oh, Cupido, vá longe de mim
(Oh-oh, Cupido)

Eu dei meu coração a um belo rapaz
(Oh-oh, Cupido) que prometeu me amar e me fazer feliz
(Oh-oh, Cupido) porém, ele me passou pra trás
(Oh-oh, Cupido) meu beijo, recusou, e meu amor, não quis
(Oh-oh, Cupido) hei, hei, é o fim
Oh-oh, Cupido, vá longe de mim
(Oh-oh, Cupido)

Não fira um coração cansado de chorar
A flecha do amor só traz a angústia e a dor (oh-oh, Cupido)

Mas, seu Cupido, o meu coração
(Oh-oh, Cupido) não quer saber de mais uma paixão
(Oh-oh, Cupido) por favor, vê se me deixa em paz
(Oh-oh, Cupido) meu pobre coração já não aguenta mais
(Oh-oh, Cupido) hei, hei, é o fim
Oh-oh, Cupido, vá longe de mim

(Oh-oh, Cupido) mas, seu Cupido, o meu coração
(Oh-oh, Cupido) não quer saber de mais uma paixão
(Oh-oh, Cupido) por favor, vê se me deixa em paz
(Oh-oh, Cupido) meu pobre coração já não aguenta mais
(Oh-oh, Cupido) hei, hei, é o fim
Oh-oh, Cupido, vá longe de mim

(Oh-oh, Cupido) hei, hei, é o fim
Oh-oh, Cupido, vá longe de mim
(Oh-oh, Cupido)
(Oh-oh, Cupido)
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Desilusões Amorosas ao Som do Rock dos Anos 60
A música "Estúpido Cupido", interpretada por Celly Campello, é um clássico do rock brasileiro dos anos 60 que aborda as desilusões amorosas de uma forma leve e descontraída. A letra da música faz uma referência direta ao Cupido, a figura mitológica responsável por fazer as pessoas se apaixonarem. No entanto, a narradora da canção pede que o Cupido a deixe em paz, pois seu coração já está cansado de sofrer por amor.

Através de uma narrativa pessoal, a protagonista conta que já amou e se entregou a um relacionamento no passado, mas foi traída e seu amor não foi correspondido. A repetição do refrão "Hei, hei, é o fim / Oh, oh, cupido / Vá longe de mim" enfatiza o desejo de se libertar das amarras do amor que só trouxe dor e angústia. A música reflete um sentimento comum a muitas pessoas que, após experiências amorosas negativas, preferem se fechar para novos relacionamentos.

A canção se tornou um hino para aqueles que já se sentiram enganados ou cansados de procurar o amor. Celly Campello, com sua voz marcante e interpretação carismática, conseguiu capturar a essência de um coração partido que busca paz e a cura das feridas emocionais. "Estúpido Cupido" é um retrato da juventude da época, mas continua a ressoar com ouvintes de todas as idades que já passaram por desventuras amorosas. (https://www.letras.mus.br/celly-campello/45016/

quarta-feira, 26 de junho de 2024

Vanice Zimerman (Tela de versos) 39


 

Eduardo Affonso (Dialetos)


– Amiga, cansei de sororidade.

– Eu também. Desapeguei.

– Ficou tão quarta-feira passada…

– Nem me fale. Quando comecei a usar, ninguém usava. Agora…

– Daqui a pouco está sendo usada até em novela bíblica da Record.

– Junto com empoderamento. Lembra do pré-lançamento?

– Lindo. Só para convidadas. Evento VIP, garçons étnicos, música autossustentável. Depois…

– Depois virou arroz de festa, que nem empatia.

– Comigo foi saberes.

– Você foi no lançamento de saberes?

– Fui, menina! Usei saberes quando só aparecia em tese de Humanas.

– Que luxo! Quando saberes chegou, eu já estava na fase da objetificação e achei que não ia combinar.

Objetificação tem que ter muito critério, ou fica over.

– Acho que cai bem com cultura do estupro e micromachismo, e olhe lá.

– Super cai bem!  E olha que micromachismo não é pra qualquer uma.

– Não mesmo. Tem que saber dosar. Tipo gaslighting.

Gaslighting era tudo, né? Uma coisa de louco!

– Mas sabe que eu era mais o combo mansplaining, manspreading e manterrupting? Porque tinha uma leitura, dialogavam.

– Diferente de patriarcado e androcentrismo

– Totalmente. Androcentrismo pede, sei lá, uma atitude com mais conceito.

– Bem na vaibe da misoginia e do feminicídio.

– Isso. Se bem que eu fique mais à vontade na disparidade de gênero, sabe como? Uma coisa light, cool, fim de tarde, apperol.  Nessa linha.

– E qual é a tendência para hoje? Fiquei vendo laive da Katy Perry até de madrugada, acordei tarde e nem tive tempo de me atualizar.

Interseccionalidade.

– Jura? Amei!

– E dá pra usar com tudo.

– Amiga, só vou tirar essa máscara de avocado orgânico e começar a interseccionalizar agora mesmo.

– Mas interseccionaliza logo, porque acabei de ver que já estão usando no UOL. E quando isso acontece, já sabe, né?

– Sim. Daqui a pouco vira gratiluz.

– Vai lá. Beijo no coração, amiga! Gratiluz!

Gratiluz, amada!

Vereda da Poesia = 45 =


Trova Humorística, de São Paulo/SP

JAIME PINA 
 
Só três?! (o paizão lamenta),
vendo os bebês no bercinho.
Ah, se a rede não rebenta,
"nóis" enchia esse quartinho!
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Soneto de São Paulo/SP

ÁLVARES DE AZEVEDO
(Manuel Antônio Álvares de Azevedo)
1831 – 1852, Rio de Janeiro/RJ

Soneto do anjo

Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!

Era a virgem do mar! na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!

Era mais bela! o seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...

Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti — as noites eu velei chorando,
Por ti — nos sonhos morrerei sorrindo!
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Aldravia de Mesquita/MG

CIDA PINHO

colo
de
mãe
cantinho
de
céu
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Soneto de São Luís/MA

ARTHUR* DE AZEVEDO
(Arthur Nabantino Gonçalves de Azevedo)
1855 – 1908, Rio de Janeiro/RJ

Infantilidade

Que reboliço vai em casa de Marieta!
É que fugiu Mignonne, a gata favorita,
E tanto chora e chora a pobre pequenita,
Que o papai manda pôr anúncio na gazeta.

Da vizinhança alguém, com olho na gorjeta,
A trânsfuga encontrou, que andava de visita
Ao demo de um maltês filósofo que habita
De um canto de fogão a cálida saleta.

Marieta, ao ver Mignonne, estende-lhe os bracinhos.
Dá-lhe um banho de amor em beijos e carinhos,
Nervosa, a soluçar, e, ao mesmo tempo, a rir.

E entre afagos lhe diz: "Senhora, foi preciso
Pôr um anúncio! Veja o que é não ter juízo!"
E todo o anúncio lê para Mignonne ouvir...
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* Segundo registrado na Biblioteca Nacional, o correto é Arthur (com h após o t)
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Trova Premiada  em Nova Friburgo/RJ, 2004

ELISABETE SOUZA CRUZ 
(Nova Friburgo/RJ)

Este amor, mal necessário,
que a insensatez fez surgir,
é o erro mais arbitrário
que eu não quero corrigir! 
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Poema de Recife/PE

EDLA FEITOSA
(Edla Feitosa Costa)

Órion
 
Não está escuro!
Existe um jogo de luz e sombra
E um certo silêncio.
Órion muda de lugar
E me confunde ….
Um cão ladra ao longe
Um gato ágil escala telhados
A taça enche e esvazia
Como a maré que sussurra ao longe.
As nuvens cobrem as estrelas ….
E dói a solidão.
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Quadra Popular de Faro/Portugal

ISIDORO CAVACO
(António Isidoro Viegas Cavaco)

Destino que me condenas
a viver da dor tão perto,
não sendo ave de penas
de penas estou coberto.
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Soneto de Portugal

FILINTO DE ALMEIDA
(Francisco Filinto de Almeida)
Porto, 1847 – 1955, Rio de Janeiro/RJ

Cansaço

A velhice é cansaço... E esse cansaço
Não nos vem de trabalho ou movimento...
O que ora faço é demorado e lento
E acho mal feito o pouco que ainda faço.

Tudo me cansa: — até o pensamento!
Já pouquíssimo ando e arrasto o passo...
Quase sempre dorminte ou sonolento,
Vivo uma triste vida de madraço.

Nunca fui mandrião nem calaceiro,
Nem também muito ativo, é bem que o diga,
Mas domei sempre a inércia, sobranceiro.

Agora, a própria inércia me castiga,
Pois se acaso repouso um dia inteiro
Esse mesmo repouso me fatiga!
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Trova do Rio Grande do Sul

LISETE JOHNSON
Butiá/RS, 1950 – 2020, Porto Alegre/RS

Às vezes, da terra bruta
e de um par de pés no chão
que vêm o exemplo de luta
e ânsias de superação!
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Poema de Ribeirão Preto/SP

ELISA ALDERANI

As maritacas

No alto do ipê, com galhos ressequidos,
chegaram de repente
duas maritacas multicoloridas.
Pararam para conversar
e, encantaram meu olhar.

O ipê tão despido de flores,
agora é rico de vagens,
cheias de sementes.
Espera as visitas das aves,
que alegram o final das tardes.

O casal de maritacas, rodeando os galhos.
Mostravam os belos trajes,
abriam as asas avermelhadas.
Enchiam o peito esverdeado,
para gorjear com mais vaidade.

Com a janela aberta, apreciando a dança,
entrei no ritmo da fotografia.
Elas observavam, arranjavam pose,
haviam percebido
uma presença amiga…
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Haicai de Ilhéus/BA

ABEL PEREIRA

O Ocaso

No rio profundo,
o sol parece outro sol
a emergir do fundo.
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Sextilha Do Rio Grande do Norte

ADEMAR MACEDO
Santana do Matos, 1951 – 2013, Natal+

Eu sempre passo o domingo
sentindo e dando alegrias,
visitando meus amigos
que não vejo há vários dias;
e caçando inspiração
pra fazer minhas poesias…
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Trova de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Sozinho na madrugada,
cabelos brancos ao vento,
canta o boêmio... e a toada
é um triste e doce lamento!
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

MOTE 
Chamaste meu pai de otário? 
Repete-o, se és homem... vem! 
- Chamei não, pelo contrário... 
Mas que ele tem cara, tem!
A. A. de Assis 
(Maringá/PR) 

GLOSA 
Chamaste meu pai de otário? 
Pois saiba..., mexeu comigo! 
Puxe logo o seu "rosário" 
pois vou furar teu umbigo! 

Cabra, não fale besteira! 
Repete-o, se és homem... vem! 
Pois comigo é na peixeira; 
não dou sopa pra ninguém! 

- Se eu chamei teu pai de otário? 
- Isto é pergunta que faça? 
- Chamei não, pelo contrário... 
acho-o até um "boa praça"! 

Eu juro, por Cristo, o Rei, 
e por São José, também, 
que, nem na "mente" eu falei.. 
Mas que ele tem cara, tem!
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Aldravia de Juiz de Fora/MG

CECY BARBOSA CAMPOS

árvores
alpinistas
escalam
montanhas
cumprimentando
nuvens
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Soneto de São Paulo/SP

ELISA BARRETO
(Elisa Virgínia Kirsten Barreto Rolim de Moura)
1919 – 2005

Soneto Trágico III

É o fingido, o mentiroso
com olhos desmesurados
num sofrimento horroroso,
tributo dos seus pecados.

É o ladrão, o usurpador,
que sem dó nem piedade
fez de um puro e santo amor
um campo de crueldade.

É o opressor que suplica
aflito, desesperado,
comutação para a pena.

Minha alma em dúvida fica:
Que caos desesperançado
que sufoca e que envenena!
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Trova Premiada  em Natal/RN, 2010

MARISA VIEIRA OLIVAES 
(Porto Alegre/RS) 

Inspiração, não me deixes 
neste mundo imerso em dor! 
– Sem ti, sou rio… sem peixes… 
Sou coração… sem amor…!
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Poema de São Paulo/SP

FILEMON FRANCISCO MARTINS

Prefiro ser...

Prefiro ser a flor
Que perfuma, ainda que fira com seus espinhos...

Prefiro ser o orvalho da noite
Que cai, aos poucos, umedecendo a terra
E deixando as plantas e flores com seiva e vida...

Prefiro ser o pássaro, em algazarra,
Pulando de galho em galho
No cantar das manhãs.

Prefiro ser a água que corre pelos rios
Entre serras e vales, contornando obstáculos
Até chegar ao oceano...

Prefiro ser o mar imenso e forte, 
que apesar de belo,
Traz na valentia a marca da morte...

Prefiro ser a praia com areia branca e fina
Beijando as ondas que vão e vêm... Inconstantes...
Como se fossem inquietos amantes.

Prefiro ser um sonho bom cheio de cores e sons
De quem ama e sonha... 
De quem nunca sonhou...

Prefiro ser a lua que vagarosamente ilumina a todos
E emociona os casais de namorados
Inspirando-lhes idílios de amor...

Prefiro ser o sol que brilha intensamente para todos
E até empresta sua luz à lua 
para iluminar a noite...

Mas prefiro ser mesmo
A esperança no rosto da criança que, infelizmente,
O mundo nunca viu e sempre a abandonou...
Mas traz, dentro de si, 
o futuro, a paz, o amor e o perdão!
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Triverso de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS
(Antônio Augusto de Assis)

Na fila de idosos,
troca-troca de sintomas.
Quem não tem inventa.
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Setilha de Natal/RN

MARCOS MEDEIROS

A chuva mal começava,
a meninada partia
pra debaixo das biqueiras,
por onde a água escorria
e, depois na enxurrada,
morria de dar risada
extravasando alegria.
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Trova de Bauru/SP

ERCY MARIA MARQUES DE FARIA

A insônia que vai além
das horas da madrugada,
por teimosia mantém
minha saudade acordada...
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HINO DE PINHALÃO/PR

Letra e Música: Lairton Trovão de Andrade

Sob a crista altaneira da serra,
proliferas febril Pinhalão.
Do humilde recanto da terra
surges meiga na imensa nação.

Bis: Nas sombras dos teus bosques
brilhou o céu de anil,
profundo desafio
a virgem selva em flor.

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.

Verdes campos de reses mimadas,
tremulantes jardins de cereais,
enobrecem tuas mãos calejadas
sobre o solo de mil minerais.

Bis: As ondas das colinas,
Planícies, serranias,
emitem melodias
do ouro vegetal.

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.

Terra amada de eterna bonança,
com firmeza aderiste ao Brasil.
Turbilhões em caudais de esperança
Revigoram-te o ardor varonil

Bis: "Rio Cinzas"!... "Boa Vista"!
"Triângulo" e "Serrinha"!
"Campina" e "Lavrinha"!
Oh! Salve! Salve! Salve!

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.
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Poetrix de Belo Horizonte/MG

ÂNGELA TOGEIRO

Leitura

Os dedos do cego
captam detalhes mais íntimos
nas rugas, leem o ego
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

DOM PEDRO II
(Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga)
1825 – 1891, Paris/França

A Vida e o Barco

Andar e mais andar é a vida a bordo;
Mal estudo, e apenas eu vou lendo;
A noite com a música entretendo;
Deito-me cedo, e mais cedo acordo.

Saudosíssimo a pátria eu recordo,
E, pra consolo versos lhe fazendo,
Desenho terras só aquela vendo,
E para não chorar os lábios mordo.

Enfim há de chegar, eu bem o sei,
Que o Brasil eu reveja jubiloso;
E, se outrora eu servi-lo só pensei,

Muito mais forte e muito mais zeloso,
Para ainda mais servi-lo, voltarei
‘Té que nele encontre o último repouso.
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Trova de Niterói/RJ

PAULO R. O. CARUSO
(Paulo Roberto Oliveira Caruso)

Fogueira em festa junina...
Eu me queimei um bocado!
Na quadrilha eu vi menina
e saí de lá casado!
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Poema de Vila Velha/ES

APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA

Introspecção

MEU SER
Vou confessar-te agora
A distância me apavora
Sinto-me mal sem amor
Sem carinho, sem ternura...
Caminho na desventura
D’uma senda de amargor

Sou barco vagando ao léu
Nas ondas deste escarcéu
Que se acercam de mim...
Estou quase soçobrando
Triste batel esperando
Chegar afinal meu fim

Marinheiro sem guarida
Tão só, ilha perdida,
Sou proscrito de amor
Sinto sede de afeto
Este vil e pobre feto
Neste mar de amargor

E, quem eu não queria
Que fizesse companhia
Junto ao meu coração,
Antes da sua estada,
Deu seu nome na entrada:
“– Eu me chamo “SOLIDÃO”

SOLIDÃO
“...– Eu trouxe também comigo
Alguém pra ficar contigo
Com quem terás amizade
Vai falar-te no passado
Do que tenhas mais gostado
Seu nome é “SAUDADE...”

SAUDADE
“... Serei tua amiga inglória
Narrarei muitas histórias
De amor, de incertezas
Mas, se eu tiver que ir
Há de me substituir
Minha irmã – a TRISTEZA...”

TRISTEZA
“... Serei o teu destino
E também teu desatino
Quando estiveres a sós
Principalmente agora
Que o teu coração chora
Embargando tua voz...”

EU
Ah, meu ser, que loucura
Tamanha a desventura
Pela qual tenho passado...
Quisera morrer agora
Exatamente nesta hora
Estou abatido, acabado!

DOR
“... Espere, eu sou a Dor
Sinto imenso desamor
A corroer tua alma
Quero ao teu lado ficar
Te dar a paz e a calma
Mas preciso contigo morar"

EU
Assim falou-me a dor
Resoluta, com dulçor
Implorando pra ficar
Mas, ah, minha doce amada
Não te posso dar pousada
Se o meu amor regressar

Quisera ter em verdade
Comigo a Felicidade
Que se foi sem um adeus...
Deixou-me há muito tempo
Dando lugar ao Tormento,
Um dos parentes teus.

TORMENTO
"Também quero me aconchegar,
Ao teu lado, ser teu amigo,
Fazer parte do teu mundo...
Se não me deixares ficar,
Posso até vir a soçobrar,
Devido a desgosto profundo."

EU
"Não, Tormento, não te quero
Fica bem longe, peço que vá
Hoje, bem sei, estou perdido
Mas não me pilhei,
De todo, vencido,
Minha Amada breve retornará"

AMADA
"Que bom que acreditastes
Na minha volta, paixão
Se magoei teu coração
Perdoa, eis-me aqui
Acabou tua infelicidade
Sou tua Felicidade: voltei pra ficar."