quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Luís Coelho (Ninguém mais se perderá por Luba)

A história de Luba Soares é difícil de contar, mormente depois do crime, desde que se queira contá-la de uma maneira interessante. Eu conheci bem o caso e, por isso, vou tentar.

Luba, antes de ser Soares, fora Luchesi e, antes de Luchesi, Veletch. Filha de imigrante lituano, desde cedo trabalhou duro para ajudar o pai. Mas, Luba era bonita demais para continuar trabalhando daquele jeito. Foi eleita rainha dos comerciários e, no ano seguinte, a mais bela do Estado. Assediada pelos “gaviões”, a pobrezinha andou às tontas com as ofertas, preferindo, Sandro Luchesi, um fabricante de torneiras que ganhava dinheiro como água. Luchesi financiou a "política" do concurso, porém um senador do Nordeste fechou a questão em torno de sua pupila.

Foi-se o título de "Miss Brasil", mas Luba ganhou um marido e tanto. Sim, porque Luchesi se casou com Luba. Ela saiu do mercado por uns tempos, até que certo dia um avião enfiou o nariz numa montanha do Rio Grande, tornando Luba a viúva mais bela e mais rica deste meu torrão natal. Eu, quando falo de Luba, me entusiasmo, porém preciso tomar cuidado, porque aos outros interessa apenas sua história.

Começou de novo a luta dos “gaviões”, mas dessa vez Luba tinha outro interesse: entrar para a sociedade. Casou-se com o pobretão Dorival Soares, herdeiro de um bom nome e de apreciáveis relações.

Um dia apareceu o marido, cheio de dedos, no meu escritório. (Esqueci-me de informar que sou detetive particular, mas não desses que anunciam: "O olhar de Lince", "O farol", e outras coisas. Fui bem educado, visto-me com esmero, freqüento lugares respeitáveis. Pouca gente conhece minha verdadeira profissão).

- Desconfiava Dorival que a mulher o traía; então, me contratou para esclarecer o caso. É desnecessário relatar os métodos que emprego, mas alguns dias depois eu conhecia a história da pomba-rola como a palma de minha mão. A gente pensa que uma mulher extraordinariamente bela, amada de todos os homens, tem prazer em alimentar paixões, mas não se apaixona por ninguém. Com Luba, pelo menos, não aconteceu assim. Perdeu-se de amores por um jovem bonitão, que trabalhava no interior. Vejam o que Luba chegou a fazer: alugou uma pequena chácara no começo da estrada de Lavínia, para se encontrar com o amante, que, dessa maneira, nem entrava na cidade.

Agora, o mais triste da história: Luba foi assassinada. Encontraram-na estrangulada no quarto da chácara, estendida na cama em desalinho. Os dedos do assassino ficaram marcados no pescoço níveo, assinalados em roxo, confundindo-se os polegares na garganta. De um lado havia uma escoriação acima da marca do mínimo e do anular e as duas outras manchas eram menos nítidas.

* * *

Quando o investigador abriu a porta de meu escritório, percebi que Dorival tinha dado com a língua nos dentes. Também não era para menos: haviam encontrado uma cigarreira de prata com as iniciais dele embaixo de um dos móveis do quarto. Além disso, as pontas de cigarro, de uso recente, depositadas nos cinzeiros, eram de duas marcas: "Lucky Strike", preferida por Luba, e "Continental", pelo marido. O negócio ficou preto para ele. E o extraordinário é que narrou à policia uma história comprometedora! Já vi criminosos fazerem coisas admiráveis: escondem a verdade, por exemplo, confessando uma versão perigosa, mas não suficientemente perigosa para levá-los à grade. Não sabia se esse era o caso de Dorival, mas o certo é que contou tudo à polícia: suas dúvidas quanto ao comportamento da mulher, o contrato que fez comigo, as informações por mim prestadas. Na noite do crime, segundo ele, Luba saiu às 8 horas, dizendo, apenas e como sempre, que ia jogar "pif-paf". Quando eu, pelo telefone, lhe comuniquei o endereço do ninho da pomba, Dorival pôs-se a matutar no que ia fazer. Nesse momento, chega ao apartamento Gregório Veletch, irmão e único parente de Luba, pois já lhe havia morrido o pai.

Esqueci-me de apresentar esse malandro. Fingia que trabalhava na fábrica de torneiras, mas, na verdade, vivia à custa da irmã.

Continuando, informou Dorival que pôs o cunhado a par da situação; envenenou-se a tal ponto com a própria narrativa que, de repente, abandonou o apartamento para acertar contas com a mulher, segundo declarou. Tomou o automóvel, rumou em direção à chácara, mas durante o trajeto esfriaram os propósitos do marido desonrado. Afirmou Dorival então que parou o carro nas imediações da chácara, no largo Ferreira de Sá, entrou num bar e lá ficou a beber para criar coragem. A coragem não passou dos primeiros vagidos, morrendo afogada no uísque. De lá voltou para casa, num meio pifão que o levou para a cama imediatamente.

Confirmei, no meu depoimento, as informações que prestara a Dorival, completando-as com os dados sobre o amante de Luba. Eu havia descoberto que se tratava de um engenheiro, Ernesto Azambuja, a quem o governo confiara parte das construções de uma usina em Iguatemi. Era o felizardo de quem Luba gostou de verdade. Morava em Caiapó com a família, ou melhor, com a esposa, que é completamente cega.

Certa noite, logo depois do casamento, Azambuja bebera demais numa festa. Apesar da insistência da esposa para que não guiasse o automóvel, ele teimou e acabou metendo o carro em cima de uma árvore; além de ter o rosto deformado, a mulher perdeu a vista no desastre.

Prenderam o pássaro no mesmo dia. Azambuja a princípio quis negar suas relações com Luba, mas em face de minhas informações sobre o automóvel, o lugar onde o colocava na chácara, os dias em que lá esteve ultimamente, o "Romeu" acabou entregando os pontos. É ocioso dizer: negou terminantemente a autoria do crime e declarou ter passado aquela noite no acampamento, na sua barraca.

Caso intrincado esse da morte de Luba. Sim, intrincado porque Gregório Veletch meteu-se nele também. O zelador do prédio informou que na noite do crime Gregório desceu do apartamento logo depois do cunhado, perguntou por ele, mas Dorival já havia ido. Explicou o irmão de Luba, ao depor, que não se impressionara com o planejado acerto de contas por parte do cunhado, pois já assistira a diversas brigas do casal. Informou, afinal, que saíra do prédio e perambulara pela cidade até entrar num cinema para assistir à última fita de Betty Grable (aliás, muito parecida com Luba).

Mas há cada uma neste mundo! Imaginem que naquela noite um operário andava pelos arredores da chácara, quando viu, escondido entre árvores, um automóvel abandonado, com as luzes traseiras acesas. Essa gente simples, em geral, é muito boa. Aproximou-se o rapaz do automóvel e desligou o contato, para que a bateria não se estragasse. Era o carro de Gregório Veletch. O operário reconheceu-o com segurança. Gregório negou de pé junto que o automóvel fosse o dele.

Procuro não falar em Luba, mas que vou fazer, se ela é o centro de toda esta história? Ela usava na noite em que morreu um vestido de linho azul que combinava com a cor de seus olhos. Sob o vestido, uma combinação branca, que chamou a atenção da polícia quando examinou o cadáver: estava vestida de trás para diante.

Sinto que me meti numa empresa difícil, esta de contar a história de Luba Veletch Luchesi Soares, mas agora vou até o fim.

Quando o mistério se instalou no caso, a policia recorreu ao velho Leite, especialista em deslindar enigmas criminais. Trata-se, sem dúvida, de uma autoridade excepcional, não só pelos dotes de argúcia e inteligência, como também porque sabe reconhecer o mérito alheio. É muito comum o pessoal da polícia desprezar e humilhar os detetives amadores ou particulares. A mim, por exemplo, chamam "Oito Dedos", estabelecendo, com perversidade, uma relação entre este honesto detetive e o célebre ladrão "Sete Dedos"!

Não é desses o velho Leite. Prestigia o trabalho da gente e às vezes, solicita com franqueza a nossa colaboração. Quando me telefonou, pedindo para passar na Delegacia, conclui que desejava trocar idéias sobre o caso de Luba. Dito e feito: a primeira coisa que perguntou foi a minha opinião, considerando os conhecimentos por mim adquiridos na investigação que fizera por conta de Dorival. Fiquei vaidoso, porque não confessar? Eu estava preparado para falar, pois meditara muito sobre o crime. Comecei logo a responder:

- Conhecidas as circunstâncias e as pessoas envolvidas num crime, se elas, por si sós, não proporcionam a solução ou não a proporcionam satisfatoriamente, deve o detetive consagrar a sua atenção ao exame dos motivos que poderiam ter levado cada suspeito a delinqüir. No nosso caso, por exemplo, Dorival tinha duplo interesse em sacrificar a esposa: vingava-se da traição e empolgava a fortuna. A Gregório interessava a morte da irmã, porém a herança só lhe chegaria às mãos se Dorival morresse também ou se ficasse impedido de herdar. O senhor sabe muito bem que ao marido, assassino da esposa, a lei nega o direito de receber a herança.

- E o motivo do amante, qual seria?

- Azambuja é o responsável pela cegueira da mulher. Por isso, desfaz-se em carinhos e cuidados com a esposa, procurando assim compensar a sua existência empobrecida e amenizar o próprio sentimento de culpa. Luba amava de verdade. Pela primeira vez, quem sabe. Era voluntariosa, até então tinha feito o que queria. Estava disposta a deixar Dorival para casar-se com Azambuja. Insistiu a princípio - exigiu depois - em que o amante procedesse da mesma forma e, por fim, ameaçou falar pessoalmente com a rival, a quem faltava o direito de prender um homem moço que gostava de outra mulher.

O velho Leite sorriu e disse com simpatia:

- Vai indo bem... continue.

- Pesam contra Dorival as provas colhidas no local do crime. O senhor há de concordar comigo que uma cigarreira de prata faz barulho quando cai ao chão e escorrega para debaixo de um móvel. Dorival teria notado. Mas que não notasse. É admissível que um homem dotado de mediana inteligência deixasse no cinzeiro, depois de cometer o crime, as pontas dos cigarros fumados por ele?

Assentindo com a cabeça, o delegado reconhecia a força do argumento. Prossegui:

- Vejamos, agora, o ponto central de nossos raciocínios. O fato de se ter encontrado a combinação de seda de trás para frente demonstra que alguém, pouco dado a esse mister, vestiu Luba. Uma mulher não se engana na prática desse gesto cotidiano. Se assim é, Luba estava nua quando foi assassinada. Vestiram-na depois. Não havia sinal de luta no quarto, podendo-se conseqüentemente supor que o criminoso lá se achava, num momento de intimidade com Luba. Isto exclui Gregório Veletch, mas não o afasta da cena: quando, à procura de Dorival, chegou ao quarto da chácara, Luba estava morta. Sentindo no bolso a cigarreira que o cunhado esquecera e que ele tentou entregar assim que desceu do apartamento, Gregório imaginou inculpar Dorival ou aumentar os indícios, caso fosse ele o assassino, largando no local a cigarreira, não sem antes fumar dois cigarros, abandonando as pontas no cinzeiro. Criminoso o cunhado, Gregório seria o herdeiro da fortuna.

- Admirável. Gregório, no novo depoimento, confessou exatamente isso.

- Restam Dorival e Azambuja. Jamais Dorival podia encontrar-se na situação do criminoso. Luba já não tinha mais interesse algum por ele, nem admitiria a sua presença na chácara. Não existe o menor indicio de violência ou de reação, como seria natural da parte de Luba se o marido surgisse inopinadamente pelo quarto adentro. O assassino gozava, naquele momento, da intimidade da vítima; passou de repente, do carinho para o estrangulamento. Somente Azambuja - Dr. Leite - poderia ter essa oportunidade e só ele tinha interesse em ocultar a nudez de Luba, presente que ela lhe dava com exclusividade, nos últimos tempos. O horror de que a amante fosse enfrentar a esposa cega levou Azambuja ao crime.

Eu me lembro até hoje. O velho Leite sorriu, movimentou-se na cadeira e falou com voz pausada:

- Meus parabéns, Luís Antonio, pela precisão dos raciocínios. Estou de pleno acordo com eles, exceto com a conclusão. E você tinha, como tem, todos os elementos para dar a solução absolutamente exata. Algumas vezes, um pormenor ilumina o mistério, desfazendo-o por inteiro.

Fez uma pausa e continuou:

- O criminoso deixou sua assinatura no pescoço de Luba. Com exceção dos polegares, confusamente marcados, as equimoses dos demais dedos são perfeitas, menos duas: a do indicador e a do médio da mão direita, mais raras e irregulares que as outras. Isso me faz crer, Luís Antonio, que o criminoso não tinha aqueles dois dedos. Notando, depois do crime, que deixara no corpo de Luba sua marca pessoal, o assassino imprimiu com os dedos da mão esquerda as equimoses complementares, mas sem a força e o jeito necessários para igualá-las, às outras manchas.

Olhei para as minhas mãos, como se não soubesse que, há dez anos, me faltam dois dedos da mão direita!

Luba, lindíssima Luba, vítima de minha paixão desvairada, vítima de minha chantagem, vitima de minhas mãos alucinadas contra a frieza com que resgatava o meu silêncio!

 Fonte:
Obras-Primas do Conto Policial

Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa (Guiné-Bissau) Parte final

Guiné Bissau

1. A Lírica

Estamos perante o capítulo menos expressivo do espaço literário africano de expressão portuguesa. Praticamente até antes da independência nacional não foi possível ultrapassar a fase da literatura colonial. E esta mesmo de reduzida extensão. Um homem que ali viveu por largos anos, Artur Augusto, escritor dotado, de origem cabo-verdiana, colaborador do primeiro número de Claridade, em Portugal e com larga vivência na Guiné-Bissau, ficou-se, ao que sabemos, por escassos contos publicados n'0 Mundo Português (1935 a 1936). A obra romanesca de Fausto Duarte (1903-1955): Auá, 1934; O negro um alma, 1935; Rumo ao degredo, 1939; A revolta, 1945; Foram estes os vencidos, 1945, cabo-verdiano por dilatados anos radicado na Guiné-Bissau, merece uma palavra especial. Mas é difícil, não obstante o seu empenhamento humanístico e de certa objectividade social, libertá-lo do peso colonial e credenciá-lo como verdadeiro escritor guineense. Deixou um romance inédito sobre cabo-verdianos. Testemunhará ele uma nova face da romanesca de Fausto Duarte? (Benjamin Pinto-Bull defendeu ultimamente na Sorbonne tese de doutoramento, que desconhecemos, sobre Fausto Duarte).

Com efeito, da Guiné-Bissau, durante a dominação portuguesa, não veio um poeta ou um romancista de mérito. Ali foram edificadas durante esse período as condições suficientes ao entrave do desenvolvimento criativo.

Com um índice altíssimo de analfabetismo, até há cerca de duas décadas sem ensino secundário, e só nos últimos anos abrangendo o sétimo ano dos liceus, o seu primeiro jornal (Pró-Guiné) surgido apenas em 1924, as suas infra-estruturas não possibilitaram o aparecimento de gerações letradas de onde poderiam ter saído vocações capazes de se responsabilizarem pelo surto de uma literatura guineense de expressão portuguesa num país de cerca de meio milhão de habitantes.

Nas duas últimas décadas do domínio colonial apenas uma actividade cultural oficial se fez sentir, orientada, porém, para os sectores da investigação histórica e etnográfica (Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, 1946-1973), e sempre marcada, é evidente, pelo espírito oficial. Em nada ou pouco alteram este quadro empobrecido.

O livro de Carlos Semedo (Poemas, 1963) também não modifica os dados desta análise, até porque se trata de obra de modesta qualidade estética. Amilcar Cabral, o fundador da nacionalidade, autor de alguns poemas mas de substância cabo-verdiana, optámos por incluí-lo na parte dedicada a Cabo Verde [119].

Ainda em plena guerra colonial tinha surgido, no ano de 1973, em português, o folheto de poesia Poilão, iniciativa do Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino. Alguns dos poetas incluídos são guineenses. As suas vozes, necessariamente resguardadas, ou desviadas, ficam insignificativas. Embora durante a guerra colonial, nas áreas libertadas pelo P. A. I. G. C, se tivesse procedido a uma profunda alfabetização, compreende-se que a sua juventude, essencialmente empenhada na luta da libertação nacional, ou então retraída que vivia na capital (Poi/ão, em certa medida, pode ser um exemplo), só agora encontre os meios necessários para se revelar no plano da criação e construir a autêntica literatura do seu país.

O primeiro sinal é dado em Janeiro de 1977, com Mantenhas para quem luta! — a nova poesia da Guiné-Bissau. Iivrinho de cento e três páginas, que reúne catorze jovens poetas, onde o mais novo tem dezanove anos e o mais velho trinta. Acompanha-o um breve prefácio onde se diz: «Hoje, somos jovens trabalhadores no campo da poesia: esta não se define para nós, em termos puramente estéticos. A forma, destinando-se a garantir a eficácia da obra, a fazê-la atingir os objectivos visados, impõe-se como elemento manifestamente importante, mas o que lhe determina a qualidade é a função, pelo valor social que possa representar». A seguir uma questão que tem a ver com o espaço linguístico da Guiné-Bissau, povoado pelas línguas-mãe, pelo crioulo e ainda pela língua oficial, o português: «Se é verdade que esta poesia se escreve actualmente em crioulo e em português, cabe-nos a tarefa da sua fixação nas línguas nacionais, enquanto depositárias dos verdadeiros valores africanos».

Agnelo Augusto Regalia desenvolve um tema comum a outros poetas africanos, como, por exemplo, Costa Andrade e Henrique Guerra: o tema do assimilado. «Fui levado/A   conhecer   a   nona   Sinfonia/Beethoven   e Mozart/Na música/Dante, Petrarca e Bocácio/Na literatura,/Fui levado a conhecer/A sua cultura...» para depois colocar a interrogação:

Mas ti, Mãe África?
Que conheço eu de ti?
Que conheço eu de ti?
A não ser o que me impingiram?
E a fome e a miséria
Como complementos...[120]

António Cabral (Mores Djassy), o tema de constância revolucionária:

Somos crianças do tempo da Revolução
Frutos das sementes de séculos de angústias
Somos crianças da luta
Restos da soma do napalm
Restos da soma do napalm e fósforo [121]

Hélder Proença, o da identidade poeta-povo:

Poema que será a arma dos oprimidos! Poema que confunde com os anseios do povo O MEU POEMA SERÁ A VOZ DO POVO [122]

E deste modo se definem algumas das linhas essenciais que nesta jovem poesia guineense se contêm. Por um lado, os poetas reencontram-se como cidadãos verdadeiramente africanos, por outro a Revolução está em marcha e a poesia (a arte), «arma dos oprimidos!», «voz do povo» vai assumir-se como parte integrante da Revolução.

Daí a denúncia, a determinada acusação: «Para onde vão/Estes troncos de íizmzo/estendidos em caixotes/Como se fossem cargas de porão» (António Sérgio Maria Davyes = Tony Davyes) [123].

«Pelo colonialista/Fui chamado Terrorista.../Como Digno Defensor da minha existência» mas «Pela história/o colonialista é o terrorista/Eis a crua verdade e realidade» (Jorge Ampla Cumelerbo = Jorge António da Costa) [124].

«Não sei quando começaste a bater-me/Em que idade/Em que eternidade/Em que revolução astral/Talvez no ventre da minha mãe» (Kôte = Norberto Tavares de Carvalho) [125].

Ou em Tomás Paquete: «A fome torcia-se, como as velas/dos barcos,/Onde os pais, por um punhado de peixe,/Deixavam viúvas/As jovens mães solteiras.../Onde os irmãos, por uma sorte de ilusão,/deixavam orfãos/os sobrinhos...» [126].

Acusação que tem como alvo imediato o colonialismo, a longa era da escravidão, feita «de dor e lágrimas», como diz António Lopes Jr.: «Prisões! Sacrifícios!/O peso da fome.../Da subalimentação/O peso da História/História de dor e lágrimas/Imposta pela violência repressiva».[127]

Ao contrário do que acontece, não só com a poesia de Cabo Verde, de S. Tomé e Príncipe como também com a de Angola e Moçambique, esta poesia da Guiné-Bissau toda ela nasce em pleno período da luta armada ou então já no período pós-libertação nacional. E natural, portanto, que alguns destes poetas se reencontrem na exaltação da «ÁFRICA MÁRTIR», dos chefes revolucionários e, sobretudo, de Amilcar Cabral. E daí também um profundo sentido gregário, uma real consciência colectiva, como em José Pedro Sequeira:

Encontramo-nos em toda a parte, / Em toda a parte irmãos: / Nos arrozais e no dendém / Nas savanas e nas hortas / Na tabanca e nos pântanos [128]

Ou ainda um largo sentido ecuménico, universal, na voz de Nagib Said:

«Quando o som do tam-tam/Levar o grito d'África/Ao cume mais alto das consciências/E os    processos    mentais    superiores    se conjugarem/Traduzidos      no      código      puro      da fraternidade» então O eco da revolução propagar-se-á Através das mil montanhas do Mundo [129]

Ou em Carlos Almada:

«Porque o sol que hoje arde/Brilha p'ra todos nós/E p'ra toda a África» [130].

Numa luta de libertação fatalmente há os que hesitam ou se destróem, mas a história o registará. Será isso mesmo que o verbo repousado, mas liricamente impressivo de José Carlos significa: «E vi na tabanca queimada devastada/As mesmas botas calcar o sangue, o corpo a morte inocente/De crianças da tua cor, do teu credo perdido/E soube que na terra em pranto pela tua afronta/Tu terias uma morte desenraizada» [131].

«[...] Contribuição militante a todo um processo de desenvolvimento cultural que decorre no nosso País», como se afirma no Prefácio, ela não podia deixar de ser também a expressão da libertação, da esperança, de uma colagem ao futuro, e aqui vem a propósito citar dois nomes, Armando Salvaterra: «Qu'importa que eu não venha/A saborear os frutos da própria árvore?/Que é isso/Ao pé da inabalável certeza desse dia admirável?!...[132]

E Justino Nunes Monteiro (fusten):

Libertar a África, / Libertar o Homem / Libertar o tam-tam e o Korá / Libertar o canto das crianças e o grito sufocado da esperança. / Uma esperança vermelho-sangue / Temperada na luta e na morte / Abrindo um caminho novo [133]

Em resumo,

«arma de combate, ferramenta de construção, ela [a poesia] forja-se no quotidiano árduo mas exaltante da Nação emergente, contribuição modesta no património da Humanidade, por uma Revolução Cultural», são ainda palavras do citado Prefácio.


2.    A EXPRESSÃO EM CRIOULO

Entre as várias etnias circula o dialecto crioulo (semelhante ao de Cabo Verde: criado na Guiné ou levado para lá?) [133] e parece cada vez mais, a esse nível, tender a funcionar como língua de contacto, sobrepondo-se às línguas de várias etnias, até porque progressivamente aumenta o seu número de utentes. Só recentemente as tentativas poéticas em dialecto crioulo começam a ganhar o espaço textual. Não só nas canções, nos cantos revolucionários, gravados em disco, como também na lírica que desponta. Curiosamente, no entanto, em Mantenhas para quem luta! há apenas duas poesias em crioulo, e subscreve-as José Carlos.
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Notas:

119 Amílcar Cabral nasceu na Guiné-Bissau, filho de pais cabo-verdianos. Viveu em Cabo Verde desde criança e ali concluiu o curso dos liceus. Isto explica a natureza da sua poesia.

120 Agnelo Augusto Regalia, «Poema de um assimilado» in Conselho Nacional de Cultura (Guiné-Bissau), Mantenhas para ai, 1977, p. 15.

121    António Cabral, «Somos crianças», idem, p. 22.

122    Hélder Proença, «Escreverei mais um poema», idem, p.51.

123    Tony Davyes, «Desespero», idem, p. 26.

124    Jorge Ampla Cumelerbo, «O julgar pertence à história», idem, p. 55.

125    Kôte, «Soba Quinty», idem, p. 86.

126    Tomás Paquete, «Ao acaso... no mar ...», idem, p. 93.

127    António Simões Lopes Jr. «Abusivamente», idem, pp. 29-30.

128    José Pedro Sequeira, «A vida real dos homens nossos irmãos, idem, p. 67.

129    Nagib Said «A agonia dos impérios», idem, p. 80.

130    Carlos Almada, «Geba», idem, p. 46.

131    José Carlos, «Morte desenraizada», idem, p. 61.

132    Armando Salvaterra, «Depois de mim», idem, p. 39.

133    Justen, «Poema», idem, p. 73.

134 Foi sempre considerável a comunidade cabo-verdiana na Guiné-Bissau. Tenhamos presente que esta ex-colónia portuguesa esteve administrativamente vinculada a Cabo Verde até 1879.


FIM

BIBLIOGRAFIA PASSIVA
(selectiva)

Nota:
Dada a impossibilidade de irmos além de uma bibliografia selectiva, aceitamos correr o risco de qualquer omissão discutível ou involuntária.

Aconselhamos, porém, aos que estiverem interessados, a consulta com destaque para Alfredo Margarido, Mário Pinto de Andrade, Jaime de Figueiredo, António Aurélio Gonçalves, Mário António, Pires Laranjeira, Serafim Ferreira e Manuel Ferreira. Útil poderá ser também a leitura de prefácios a algumas das obras mencionadas, como as de Agostinho Neto, Costa Andrade, Manuel Rui, Bobella-Mota.

Por certo que a Bibliografia africana de expressão portuguesa de Gerald Moser e de Manuel Ferreira, no prelo, será um guia indispensável.

GERAL

BURNESS, Donald
Fire: Six Writers from Angola, Moçambique, and Cape Verde. Prof. Manuel Ferreira. Washington, Three Continents Press, 1977.

CABRAL, Amilcar
«O papel da cultura na luta pela independência» [Texto apresentado à UNESCO, em Paris, na reunião de 3-7 de julho de 1972].

Também in Obras escolhidas de Amilcar Cabral, vol. 1 (A arma da teoria/ unidade e luta I), textos coordenados por Mário de Andrade. Lisboa, Seara Nova, 1976, p. 234-247.

CÉSAR, Amândio
Parágrafos de literatura ultramarina. Lisboa, 1967. 346 p. Novos parágrafos de literatura ultramarina. Lisboa, 1971. 511 p.

HAMILTON, Russel G.
Voices from an Empire. A History of Afro-Portuguese Uterature. University of Minnesota Press, 1975. 450 p.

HERDECK, Donald E.
African Authorr. a campanion to black African wtiting, vol. 1, 1300-1973. Washington, Black Orpheus Press, 1973. XII+605 p. [Inclui a biografia de 58 escritores africanos de língua portuguesa].

MARGARIDO, Alfredo
«Incidences socio-économiques sur Ia poésie noire d'expression portugaise». In Diogène, n.° 37. Paris, janeiro-março, 1962, pp. 53-80.

«Panorama». In C. Barreto, Estrada larga, vol. 3. Porto [1962], pp. 482-491. [Sobre a poesia de «S. Tomé, Angola e Moçambique» integrada no tema geral «A poesia post-Orpheu»].

Negritude e humanismo. Lisboa, Casa dos Estudantes do Império, 1964. 44 p.

MOISÉS, Massaud
Literatura portuguesa moderna. Guia biográfico, crítico e bibliográfico. Ed. Cultrix. S. Paulo, Universidade de S. Paulo, 1973. 202 p. [Contém a bibliografia de vários autores africanos e o cap. «Literatura do Ultramar», p. 102-105].

MOSER, Gerald
Essays in Portuguese-Afiican Uterature. Col. The Pennsylvania State University Studies, 26. University Park (Pensilvania). Universidade do Estado da Pensilvânia, 1969. (8) + 88 p. [Contém um ensaio sobre Castro Soromenho].

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Vários artigos e críticas literárias in suplemento literário do Estado de S. Paulo (Brasil) e na revista Anhembi, cerca de 1960 a 1968.

PINTO BULL, Benjamim
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Folclore caboverdeano. Porto, Edições Maranus, 1933. 120 p.
Carreira, António

Cabo Verde. Formação e extinção de uma sociedade escravocrata (1460-1878). Lisboa, Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, 1972. 580 p. Extensa bibliografia. II.

DUARTE, Manuel
«Cabo-verdianidade e africanidade». in Vértice, xn, n.° 134. Coimbra, 1954, p. 639-644. [O primeiro ensaio sobre este tema].
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«As ilhas crioulas na sua poesia moderna». In C. Barreto, listrada larga, vol. 3. Porto, Porto Editora, [1962], pp. 448-454.

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Notas sobre poesia e ficção cabo-verdianas. Praia, Cabo Verde, 1962. 23 p. Sep. Cabo Verde (nova fase), n.° 1-157, outubro 1962.

GÉRARD, Albert S.
«The literature of Cape Verde». In Afiican ArtslArts d'Afiique, vol. 1, n.° 2. Los Angeles, inverno 1968, p. 66-70.

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Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe. Esquema de uma evolução conjunta. In Cabo Verde, ano W, n.° 76. Praia, Cabo Verde, janeiro 1956, p. 12-17.

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Textos crioulos cabo-verdianos por Sérgio Frusoni. Lisboa, Silvas, C. T. G. scarl, 1975, Sep. Miscelânea Luso-Africana, Junta de Investigações do Ultramar, pp. 165-203. [Contém algumas poesias e um conto em crioulo com tradução em português de M. Valkhoff, que prefaciou a obra].

S. TOMÉ E PRÍNCIPE

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«De Costa Alegre a Francisco José Tenreiro». In Estudos Ultramarinos, n.° 3. Lisboa, Instituto Superior dos Estudos Ultramarinos, 1959, p. 93-107.

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REIS, Fernando
Povo flogâ. «O povo brinca». Folclore de São Tomé e Príncipe. Edição da Câmara Municipal de São Tomé e Príncipe. Lisboa, Tip. Bertrand (Irmão), Lda., 1969. 241 p. [Além do mais contém as peças O «Tchiloli» ou a tragédia do Marquês de Mântua e do imperador Carloto Magno e o Auto de Floripes].

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«O tchiloli ou as tragédias de São Tomé e Príncipe». In Espiral, vol. 1, n.° 6-7. Lisboa, 1965, p. 70-77.

GUINÉ -BISSAU

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«O Guineense». In Revista Lusitana, vol. II, pp. 166 e 268; vol. V, pp. 174 e 271; vol. VI, p. 300; vol. X, pp. 306-310.

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Le créole de Ia Guiné-Bissau. Structures grammaticales, philosophie et sagesse à travers ses surnoms, ses proverbes et ses expressions. Université de Dakar, Centre de Hautes Études Afro-Ibero-Americaines. Faculte des Lettres & Sciences Humaines, 1975. 55 p.+l folha err.

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«Aspectos marginais da literatura da Guiné Portuguesa». In Estudos Ultramarinos, n.° 3. Lisboa, Instituto Superior dos Estudos Ultramarinos, 1959, 93-107.
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Fonte:
Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa I Biblioteca Breve / Volume 6 – Instituto de Cultura Portuguesa – Secretaria de Estado da Investigação Científica Ministério da Educação e Investigação Científica – 1. edição — Portugal: Livraria Bertrand, Maio de 1977

Concurso de Trovas Literárias José Barros de Vasconcellos (Resultado Final)

- TEMA: “EXEMPLO”
CATEGORIA ESTADUAL
1º Lugar: Milton Sebastião Souza, de Porto Alegre – RS
2º Lugar: Wilson Tubino, de Porto Alegre – RS
3º Lugar: Ialmar Pio Schneider, de Porto Alegre – RS
4º Lugar: Delcy Canalles, de Porto Alegre – RS
5º Lugar: Sebastião Teixeira Corrêa, de Caxias do Sul – RS

Comissão Avaliadora: A cargo da UBT – Coordenador Flávio Stefani (Porto Alegre)
Luiz Carlos Abritta (Belo Horizonte); Elizabeth Souza Cruz (Nova Friburgo); Gisele Bueno Pinto (Dom Pedrito); Maurício Friedrich (Curitiba) e Alice Brandão (Caxias do Sul)


CATEGORIA NACIONAL
1º Lugar: Wandira Fagundes Queiroz, de Curitiba – PR
2º Lugar: Darly O. Barros, de São Paulo – SP
3º Lugar: José Ouverney, de Pindamonhangaba – SP
4º Lugar: Darly O. Barros, de São Paulo – SP
5º Lugar: Olympio da Cruz Simões Coutinho, de Belo Horizonte – MG

Comissão Avaliadora: A cargo da UBT – Coordenador Flávio Stefani (Porto Alegre)
Luiz Carlos Abritta (Belo Horizonte); Elizabeth Souza Cruz (Nova Friburgo); Gisele Bueno Pinto (Dom Pedrito); Maurício Friedrich (Curitiba) e Alice Brandão (Caxias do Sul)


Fonte:
http://www.ocariucho.com.br/?p=7992
Http://concursos-literarios.blogspot.com 

Concurso de Contos Alcides Maya (Resultado Final)

1º Lugar: Juarez Nunes da Silva, de Caxias do Sul – RS
Conto: “A Rádio Mamangava”

2º Lugar: Gilney Muñoz Braz, de Curitiba – PR
Conto: “Seu Ayres”

3º Lugar: Leandro de Araújo, de Esteio – RS
Conto: “Respeito”

4º Lugar: Quatro autores: Antônio Cândido de Azambuja Ribeiro, de Santa Maria – Athos Ronaldo Miralha da Cunha, de Santiago – Tânia Lopes, de Itaqui e Vitor Biasoli, de Pelotas
Conto: “Cancha reta”

5º Lugar: Jurema Chaves, de São Leopoldo – RS
Conto: “O vento, o menino e as pandorgas”

Comissão Avaliadora: Sidnei Azambuja, José Machado Leal e Danci Ramos

Fonte:
http://www.ocariucho.com.br/?p=7992
Http://concursos-literarios.blogspot.com 

Concurso de Poesias Taveira Junior (Resultado Final)

1º Lugar: Luis César Soares, de Gravataí – RS
Poema: “Tributo a memória de um carreteiro”

2º Lugar: Augusto César Brasil, de Canoas – RS
Poema: “Sou Rio Grande”

3º Lugar: Gargione Ávila, de Rio Grande – RS
Poema: “O silêncio das guitarras”

4º Lugar: Rômulo Chaves, de Palmeira das Missões – RS
Poema: “Don’ Ana, o tempo e a bandeira”

5º Lugar: Otavio Geraldo Reichert, de Santo Ângelo – RS
Poema: “Das lendas do sul… Hogaraitai ”

Comissão Avaliadora: Léo Ribeiro de Souza, Cristiano Ferreira e Agenor de Mello Coelho

Fonte:
http://www.ocariucho.com.br/?p=7992
Http://concursos-literarios.blogspot.com 

Concurso Literário Cristóvão Pereira de Abreu (Resultado Final)

TEMA: “TROPEIRISMO”

CATEGORIA PESQUISA HISTÓRICA


1º Lugar: Adilar Signori, de Canoas – RS
Obra: “O Tropeiro Francisco Pinto Bandeira”

2º Lugar: Paulo Gonçalves, de Porto Alegre – RS
Obra: “Tropeirismo – Início e fim de um ciclo”

3º Lugar: Carlos Eugênio da Costa Silva, de Pelotas – RS
Obra: “O legado das tropeadas”

Comissão Avaliadora: Francisco Pereira Rodrigues, Dilmar Paixão e Paulo Roberto de Fraga Cirne

CATEGORIA POESIA

1º Lugar: Alberto Sales, de Caxias do Sul – RS
Poema: “De pouso e estrada”

2º Lugar: Sebastião Teixeira Corrêa, de Caxias do Sul – RS
Poema: “Quando a tropa perde um centauro”

3º Lugar: Ari Pinheiro, de Florianópolis – SC
Poema: “Desafiando agosto”

Comissão Avaliadora: Léo Ribeiro de Souza, Norberto Castro e Cristiano Ferreira

CATEGORIA TROVA LITERÁRIA

1º Lugar: Sebastião Teixeira Corrêa, de Caxias do Sul – RS

2º Lugar: Cleomar Brasil, de Nova esperança do Sul – RS

3º Lugar: Pedro Junior da Fontoura, de Bento Gonçalves – RS

Comissão Avaliadora: A cargo da UBT – Coordenador Flávio Stefani (Porto Alegre)
Gisele Bueno Pinto (Dom Pedrito); Clênio Borges (Porto Alegre) e Alice Brandão (Caxias do Sul)

Fonte:
http://www.ocariucho.com.br/?p=7992
Http://concursos-literarios.blogspot.com 

XV Concurso de Contos Alípio Mendes (Resultado Final)


André Luís Soares
O MEDALHÃO


Alberto Moby Ribeiro da Silva
ALAMEDA O’HIGGINS


Diego César Soares Ribeiro
AS BROINHAS DO CONHECIMENTO


Renato Alves
NOSSO NATAL COM PAPAI


André Telucazu Kondo
A MÁSCARA


Marcos Eduardo Neves
A VIÚVA FELIZ


Antônio Roberto de Carvalho
HUMBERTO E LINDALVA


Rejane Maria dos G. Paschoal
MULHER CO MCHAPÉU INVISÍVEL


Thoshio Katsurayama
DOCINHO DE CÔCO


Sarah de Oliveira Passarella
A CONTADORA DE HISTÓRIA


Benedito Paulo Corrêa
O CONTO DO VIGÁRIO


Luciana Conde Rodrigues Maia
SINESTESIA

Fontes:
http://concursos-literarios.blogspot.com
http://www.ateneuangrense.com.br/contos/15ccam.htm

Concurso de Poesia “Os Cem Anos do Gonzagão” (Resultado Final)

A Comissão Organizadora do I CONPOZAGÃO – Concurso de Poesia “Os Cem Anos do Gonzagão”, Prêmio “A Coroa do Rei”, promovido pelo Grupo União São Francisco, em homenagem aos “Cem Anos” de Luiz Gonzaga anuncia os vencedores da promoção.

A entrega dos prêmios será feita no próximo sábado, 18, a partir das 19:00 horas, na Comunidade São Francisco (Fazenda Cidade), município de São João do Rio do Peixe – PB, por ocasião do V FESMUZA – Festival de Músicas Gonzagueanas.

Os três vencedores são os seguintes:

1º Lugar - Sergio Bernardo - Nova Friburgo/RJ

2º Lugar - Erivaldo da Silva Nascimento - Belém/PA

3º Lugar - Maria Alda Oliveira - Iguatu/CE

Fonte:
Http://concursos-literarios.blogspot.com

II Concurso de Poesias 'Professor Aparecido Roberto Tonellotti' (Resultado Final)

ADULTO

Primeiro Lugar
Richardson Silva de Santa Bárbara –
“O nome da palavra” –
Ubaitaba/BA

Segundo Lugar
Hernany Luiz Tafuri Ferreira Júnior –
“Passario” –
Juiz de Fora/MG

Terceiro Lugar
Tatiana Alves Soares Caldas –
“Risco” –
Humaitá/RJ

Menções Honrosas

Tiago Henrique Cardoso –
“Poesia” –
Francisco Morato/SP

Robison Silva Alves –
“Descaminhos” –
Coaraci/BA

Reginaldo Costa de Albuquerque –
“Cadeira de Balanço” –
Campo Grande/MS

Felipe Cattapan –
“Letras sós, só letras” –
Rueschlikon/Suiça

André Telucazu Kondo –
“Passo” –
Jundiaí/SP

André Luiz Alves Caldas Amóra –
“Ao fim” –
Rio de Janeiro/RJ

JUVENIL

Primeiro Lugar
Rebeca Lorena Mendes Lima –
“Ser” –
Cajamar/SP

Segundo Lugar
Carolina Olgado Freitas –
“Culpado” –
Guarujá/SP

Terceiro Lugar
Luciana Fidalgo Ramos Nogueira –
“Já não te amo” –
Santos/SP

Menções Honrosas
Taylor Ferreira dos Santos –
“Conflito com o real” –
Francisco Morato/SP

Nicole Kimberly Batista –
“O que posso ser” –
Francisco Morato/SP

Fernando Celso Petri –
“Erudição” –
São Gonçalo/RJ

Susan Ferreira da Silva –
“Coveiro” –
Francisco Morato/SP

Ingrid Duim Ferreira da Silva –
“Um sonho meu” –
Francisco Morato/SP

INFANTIL

Primeiro Lugar
Gisele Oliveira dos Santos –
“A mãe” –
Franco da Rocha/SP

Segundo Lugar
Tamires Cristina Rosa de Araújo –
“O amor” –
Franco da Rocha/SP

Terceiro Lugar
Stefani Silva dos Santos –
“Um amor infinito” –
Franco da Rocha/SP

Menção Honrosa

Ellen Beatriz Silva Lima –
“Aqui falo do meu amor” –
Franco da Rocha/SP

Fonte:
http://concursos-literarios.blogspot.com 

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 645)

Uma Trova de Ademar 

Numa beleza suprema,
por entre o céu e entre o mar,
Deus escreveu um poema
nas entranhas do Luar...
–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional 


Num privilégio exclusivo,
vejo a serra, verde e bela,
exposta, num quadro, ao vivo
na moldura da janela...
–Élbea Priscila de Souza/SP–

Uma Trova Potiguar 


Cansei de ser conformado
ao responder, sempre, “sim”,
ficando meio engasgado,
deixando um “não” preso em mim.
–Tarcísio Fernandes/RN–

Uma Trova Premiada 


1985  -  Porto Alegre/RS
Tema  -  CORAGEM  -  9º Lugar

Coragem! Ergue teu rosto,
desamarra esta carranca,
porque o sol, depois de posto,
nos mostra a lua mais branca.
–Flávio Roberto Stefani /RS–

...E Suas Trovas Ficaram 


O brilho da lua cheia
cai suave nos caminhos,
dando a impressão que receia
acordar os passarinhos.
–Aurolina de Castro/AM–

U m a P o e s i a 

MOTE :
MORRE DE FOME OU DE SEDE,
NO INVERNO MORRE AFOGADO.

GLOSA :
Um velho homem numa rede,
sem comida e sem bebida,
no Nordeste é esta a vida,
morre de fome ou de sede,
Enroscado na parede,
de palha ou barro amassado,
como que desesperado,
molha os seus lábios com a língua;
na seca ele morre à mingua,
no inverno morre afogado.
–Bob Mota/RN–

Soneto do Dia 

SOLIDÃO.
–Luiz Antonio Cardoso/SP–

Propensos a quereres semelhantes,
tendo a poesia inata em nossas mentes,
tínhamos o infinito... e como amantes
seríamos estrelas reluzentes.

Mas eis que seus desejos, tão arfantes,
fizeram dos meus sonhos, tão descrentes,
migalhas de lembranças arquejantes,
fenecendo em processos deprimentes.

Recusaste o poeta que há em mim,
e todos os meus versos, que sem fim,
esculpiram o amor que eu quis te dar...

e decretaste enfim, a solidão,
para me acompanhar à imensidão...
onde hei de eternamente te esperar!

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Ademar Macedo (O Vírus da Poesia)

Poesia é a minha paz,
meu mundo, meu universo;
um mar de sabedoria
onde eu vivo submerso;
é minha alimentação,
é meu sustento, é meu pão
feito de rima e de verso...

A partir da madrugada
é esse o meu dia a dia:
já de caneta na mão
recebo uma epifania,
cuja manifestação
é trazer-me inspiração
pra eu fazer minha poesia...

A poesia é minha luz,
é meu santo e meu altar,
feijão puro com farinha
que eu tenho para almoçar;
ela é minha própria vida
é meu lar, minha guarida
meu sol, meu céu e meu mar!

Ao ver poesias aos montes
nascendo em minha vertente,
tive um “derrame” de rimas
nas veias da minha mente
e um maravilhoso “infarto”
eu tive ao fazer o parto
do derradeiro repente!...

Quero então no meu jazigo,
feito em letras garrafais,
aquela minha poesia
que me deu nome e cartaz;
e escrito, seja onde for:
- eis aqui um trovador
que morreu feliz demais!

Quem carrega, como nós,
o vírus da poesia,
tem no sangue uma plaqueta
que se altera todo dia,
aumentando a quantidade
e pondo mais qualidade
nos versos que a gente cria.

Fonte:
http://www.recantodasletras.com.br/cordel/2102054

Florbela Espanca (Cavalgada de Poemas) v.2

IN MEMORIAM
Ao meu morto querido


Na cidade de Assis, "Il Poverello"
Santo, três vezes santo, andou pregando
Que o sol, a terra, a flor, o rocio brando,
Da pobreza o tristíssimo flagelo,

Tudo quanto há de vil, quanto há de belo,
Tudo era nosso irmão! - E assim sonhando,
Pelas estradas da Umbria foi forjando
Da cadeia do amor o maior elo!

"Olha o nosso irmão Sol, nossa irmã Água..."
Ah, Poverello! Em mim, essa lição
Perdeu-se como vela em mar de mágoa

Batida por furiosos vendavais!
Eu fui na vida a irmã dum só Irmão,
E já não sou a irmã de ninguém mais!

OUTONAL

Caem as folhas mortas sobre o lago;
Na penumbra outonal, não sei quem tece
As rendas do silêncio... Olha, anoitece!
- Brumas longínquas do País do Vago...

Veludos a ondear... Mistério mago...
Encantamento... A hora que não esquece,
A luz que a pouco e pouco desfalece,
Que lança em mim a bênção dum afago...

Outono dos crepúsculos doirados,
De púrpuras, damascos e brocados!
- Vestes a terra inteira de esplendor!

Outono das tardinhas silenciosas,
Das magníficas noites voluptuosas
Em que eu soluço a delirar de amor...

MOCIDADE

A mocidade esplêndida, vibrante,
Ardente, extraordinária, audaciosa.
Que vê num cardo a folha duma rosa,
Na gota de água o brilho dum diamante;

Essa que fez de mim Judeu Errante
Do espírito, a torrente caudalosa,
Dos vendavais irmã tempestuosa,
- Trago-a em mim vermelha, triunfante!

No meu sangue rubis correm dispersos:
- Chamas subindo ao alto nos meus versos,
Papoilas nos meus lábios a florir!

Ama-me doida, estonteadoramente,
O meu Amor! que o coração da gente
É tão pequeno... e a vida, água a fugir...

NOSTALGIA

Nesse País de lenda, que me encanta,
Ficaram meus brocados, que despi,
E as jóias que p'las aias reparti
Como outras rosas de Rainha Santa!

Tanta opala que eu tinha! Tanta, tanta!
Foi por lá que as semeei e que as perdi...
Mostrem-me esse País onde eu nasci!
Mostrem-me o Reino de que eu sou Infanta!

O meu País de sonho e de ansiedade,
Não sei se esta quimera que me assombra,
É feita de mentira ou de verdade!

Quero voltar! Não sei por onde vim...
Ah! Não ser mais que a sombra duma sombra
Por entre tanta sombra igual a mim!

AMBICIOSA

Para aqueles fantasmas que passaram,
Vagabundos a quem jurei amar,
Nunca os meus braços lânguidos traçaram
O vôo dum gesto para os alcançar...

Se as minhas mãos em garra se cravaram
Sobre um amor em sangue a palpitar...
- Quantas panteras bárbaras mataram
Só pelo raro gosto de matar!

Minha alma é como a pedra funerária
Erguida na montanha solitária
Interrogando a vibração dos céus!

O amor dum homem? - Terra tão pisada!
Gota de chuva ao vento baloiçada...
Um homem? - Quando eu sonho o amor dum deus!...

CRUCIFICADA

Amiga... noiva... irmã... o que quiseres!
Por ti, todos os céus terão estrelas,
Por teu amor, mendiga, hei-de merecê-las,
Ao beijar a esmola que me deres.

Podes amar até outras mulheres!
- Hei de compor, sonhar palavras belas,
Lindos versos de dor só para elas,
Para em lânguidas noites lhes dizeres!

Crucificada em mim, sobre os meus braços,
Hei de poisar a boca nos teus passos
Pra não serem pisados por ninguém.

E depois... Ah! depois de dores tamanhas,
Nascerás outra vez de outras entranhas,
Nascerás outra vez de uma outra Mãe!

ESPERA...

Não me digas adeus, ó sombra amiga,
Abranda mais o ritmo dos teus passos;
Sente o perfume da paixão antiga,
Dos nossos bons e cândidos abraços!

Sou a dona dos místicos cansaços,
A fantástica e estranha rapariga
Que um dia ficou presa nos teus braços...
Não vás ainda embora, ó sombra amiga!

Teu amor fez de mim um lago triste:
Quantas ondas a rir que não lhe ouviste,
Quanta canção de ondinas lá no fundo!

Espera... espera... ó minha sombra amada...
Vê que pra além de mim já não há nada
E nunca mais me encontras neste mundo!...

INTERROGAÇÃO
A Guido Batelli

Neste tormento inútil, neste empenho
De tornar em silêncio o que em mim canta,
Sobem-me roucos brados à garganta
Num clamor de loucura que contenho.

Ó alma de charneca sacrossanta,
Irmã da alma rútila que eu tenho,
Dize pra onde vou, donde é que venho
Nesta dor que me exalta e me alevanta!

Visões de mundos novos, de infinitos,
Cadências de soluços e de gritos,
Fogueira a esbrasear que me consome!

Dize que mão é esta que me arrasta?
Nódoa de sangue que palpita e alastra...
Dize de que é que eu tenho sede e fome?!

VOLÚPIA

No divino impudor da mocidade,
Nesse êxtase pagão que vence a sorte,
Num frêmito vibrante de ansiedade,
Dou-te o meu corpo prometido à morte!

A sombra entre a mentira e a verdade...
A nuvem que arrastou o vento norte...
- Meu corpo! Trago nele um vinho forte:
Meus beijos de volúpia e de maldade!

Trago dálias vermelhas no regaço...
São os dedos do sol quando te abraço,
Cravados no teu peito como lanças!

E do meu corpo os leves arabescos
Vão-te envolvendo em círculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças...

FILTRO

Meu Amor, não é nada: - Sons marinhos
Numa concha vazia, choro errante...
Ah, olhos que não choram! Pobrezinhos...
Não há luz neste mundo que os levante!

Eu andarei por ti os maus caminhos
E as minhas mãos, abertas a diamante,
Hão de crucificar-se nos espinhos
Quando o meu peito for o teu mirante!

Para que corpos vis te não desejem,
Hei de dar-te o meu corpo, e a boca minha
Pra que bocas impuras te não beijem!

Como quem roça um lago que sonhou,
Minhas cansadas asas de andorinha
Hão-de prender-te todo num só vôo...

MAIS ALTO

Mais alto, sim! mais alto, mais além
Do sonho, onde morar a dor da vida,
Até sair de mim! Ser a Perdida,
A que se não encontra! Aquela a quem

O mundo não conhece por Alguém!
Ser orgulho, ser águia na subida,
Até chegar a ser, entontecida,
Aquela que sonhou o meu desdém!

Mais alto, sim! Mais alto! A Intangível!
Turris Ebúrnea erguida nos espaços,
A rutilante luz dum impossível!

Mais alto, sim! Mais alto! Onde couber
O mal da vida dentro dos meus braços,
Dos meus divinos braços de Mulher!

NERVOS D'OIRO

Meus nervos, guizos de oiro a tilintar
Cantam-me n'alma a estranha sinfonia
Da volúpia, da mágoa e da alegria,
Que me faz rir e que me faz chorar!

Em meu corpo fremente, sem cessar,
Agito os guizos de oiro da folia!
A Quimera, a Loucura, a Fantasia,
Num rubro turbilhão sinto-as passar!

O coração, numa imperial oferta.
Ergo-o ao alto! E, sobre a minha mão,
É uma rosa de púrpura, entreaberta!

E em mim, dentro de mim, vibram dispersos,
Meus nervos de oiro, esplêndidos, que são
Toda a Arte suprema dos meus versos!

A VOZ DA TÍLIA

Diz-me a tília a cantar: "Eu sou sincera,
Eu sou isto que vês: o sonho, a graça,
Deu ao meu corpo, o vento, quando passa,
Este ar escultural de bayadera...

E de manhã o sol é uma cratera,
Uma serpente de oiro que me enlaça...
Trago nas mãos as mãos da Primavera...
E é para mim que em noites de desgraça

Toca o vento Mozart, triste e solene,
E à minha alma vibrante, posta a nu,
Diz a chuva sonetos de Verlaine..."

E, ao ver-me triste, a tília murmurou:
"Já fui um dia poeta como tu...
Ainda hás de ser tília como eu sou..."

NÃO SER

Quem me dera voltar à inocência
Das coisas brutas, sãs, inanimadas,
Despir o vão orgulho, a incoerência:
- Mantos rotos de estátuas mutiladas!

Ah! arrancar às carnes laceradas
Seu mísero segredo de consciência!
Ah! poder ser apenas florescência
De astros em puras noites deslumbradas!

Ser nostálgico choupo ao entardecer,
De ramos graves, plácidos, absortos
Na mágica tarefa de viver!

Ser haste, seiva, ramaria inquieta,
Erguer ao sol o coração dos mortos
Na urna de oiro duma flor aberta!...

Fonte:
Florbela Espanca. Charneca em Flor.

Eça de Queiróz (A Rainha e a Escrava)

Era uma vez um rei, moço e valente, senhor de um reino abundante em cidades e searas, que partira a batalhar por terras distantes, deixando solitária e triste a sua rainha e um filhinho, que ainda vivia no seu berço, dentro das suas faixas.

A lua cheia que o vira marchar, levado no seu sonho de conquista e de fama, começava a minguar, quando um dos seus cavaleiros apareceu, com as armas rotas, negro do sangue seco e do pó dos caminhos, trazendo a amarga nova de uma batalha perdida e da morte do rei, trespassado por sete lanças entre a flor da sua nobreza, à beira de um grande rio.

A rainha chorou magnificamente o rei. Chorou ainda desoladamente o esposo, que era formoso e alegre. Mas, sobretudo, chorou ansiosamente o pai, que assim deixava o filhinho desamparado, no meio de tantos inimigos da sua frágil vida e do reino que seria seu, sem um braço que o defendesse, forte pela força e forte pelo amor.

Desses inimigos o mais temeroso era seu tio, irmão bastardo do rei, homem depravado e bravio; consumido de cobiças grosseiras, desejando só a realeza por causa dos seus tesouros, e que havia anos vivia num castelo sobre os montes, com uma horda de rebeldes, à maneira de um lobo que, de atalaia no seu fojo, espera a presa. Ai! a presa agora era aquela criancinha, rei de mama, senhor de tantas províncias, e que dormia no seu berço com seu guizo de ouro fechado na mão!

Ao lado dele, outro menino dormia noutro berço. Mas era um escravozinho, filho da bela e robusta escrava que amamentava o príncipe. Ambos tinham nascido na mesma noite de verão. O mesmo seio os criara. Quando a rainha, antes de adormecer, vinha beijar o principezinho, que tinha o cabelo louro e fino, beijava também, por amor dele, o escravozinho, que tinha o cabelo negro e crespo. Os olhos de ambos reluziam como pedras preciosas. Somente, o berço de um era magnífico, de marfim entre brocados, e o berço de outro, pobre e de verga. A leal escrava, porém, a ambos cercava de carinho igual, porque, se um era o seu filho, o outro seria o seu rei.

Nascida naquela casa real, ela tinha a paixão, a religião dos seus senhores. Nenhum pranto correra mais sentidamente do que o seu pelo rei morto à beira do grande rio. Pertencia, porém, a uma raça que acredita que a vida da terra se continua no céu. O rei seu amo, decerto, já estaria agora reinando em outro reino, para além das nuvens, abundante também em searas e cidades. O seu cavalo de batalha, as suas armas, os seus pajens tinham subido com ele às alturas. Os seus vassalos, que fossem morrendo, prontamente iriam, nesse reino celeste, retomar em torno dele a sua vassalagem. E ela, um dia, por seu turno, remontaria num raio de lua a habitar o palácio do seu senhor, e a fiar de novo o linho das suas túnicas, e a acender de novo a caçoleta dos seus perfumes; seria no céu como fora na terra, e feliz na sua servidão.

Todavia, também ela tremia pelo seu principezinho! Quantas vezes, com ele pendurado do peito, pensava na sua fragilidade, na sua longa infância, nos anos lentos que correriam, antes que ele fosse ao menos do tamanho de uma espada, e naquele tio cruel, de face mais escura que a noite e coração mais escuro que a face, faminto do trono, e espreitando de cima do seu rochedo entre os alfanges da sua borda!

Pobre principezinho da sua alma! Com uma ternura maior o apertava nos braços. Mas o seu filho chalrava ao lado, era para ele que os seus braços corriam com um ardor mais feliz. Esse, na sua indigência, nada tinha a recear a vida. Desgraças, assaltos da sorte má nunca o poderiam deixar mais despido das glórias e bens do mundo do que já estava ali no seu berço, sob o pedaço de linho branco que resguardava a sua nudez. A existência, na verdade, era para ele mais preciosa e digna de ser conservada que a do seu príncipe, porque nenhum dos duros cuidados com que ela enegrece a alma dos senhores roçaria sequer a sua alma livre e simples de escravo. E, como se o amasse mais por aquela humildade ditosa, cobria o seu corpinho gordo de beijos pesados e devoradores, dos beijos que ela fazia ligeiros sobre as mãos do seu príncipe.

No entanto, um grande temor enchia o palácio, onde agora reinava uma mulher entre mulheres. O bastardo, o homem de rapina, que errava no cimo das serras, descera à planície com a sua horda, e já através de casais e aldeias felizes ia deixando um sulco de matança e ruínas. As portas da cidade tinham sido seguras com cadeias mais fortes. Nas atalaias ardiam lumes mais altos. Mas à defesa faltava disciplina viril. Uma roca não governa como uma espada. Toda a nobreza fiel perecera na grande batalha. E a rainha desventurosa apenas sabia correr a cada instante ao berço do seu filhinho e chorar sobre ele a sua fraqueza de viúva. Só a ama leal parecia segura, como se os braços em que estreitava o seu príncipe fossem muralhas de uma cidadela que nenhuma audácia pode transpor.

Ora uma noite, noite de silêncio e de escuridão, indo ela a adormecer, já despida, no seu catre, entre os seus dois meninos, adivinhou, mais que sentiu, um curto rumor de ferro e de briga, longe, à entrada dos vergéis reais. Embrulhada à pressa num pano, atirando os cabelos para trás, escutou ansiosamente. Na terra areada, entre os jasmineiros, corriam passos pesados e rudes. Depois houve um gemido, um corpo tombando molemente, sobre lajes, como um fardo. Descerrou violentamente a cortina. E além, ao fundo da galeria, avistou homens, um clarão de lanternas, brilhos de armas...

Num relance tudo compreendeu: o palácio surpreendido, o bastardo cruel vindo roubar, matar o seu príncipe! Então, rapidamente, sem uma vacilação, uma dúvida, arrebatou o príncipe do seu berço de marfim, atirou-o para o pobre berço de verga, e, tirando o seu filho do berço servil, entre beijos desesperados, deitou-o no berço real que cobriu com um brocado.

Bruscamente um homem enorme, de face flamejante, com um manto negro sobre a cota de malha, surgiu à porta da câmara, entre outros, que erguiam lanternas. Olhou, correu o berço de marfim onde os brocados luziam, arrancou a criança como se arranca uma bolsa de ouro, e, abafando os seus gritos no manto, abalou furiosamente.

O príncipe dormia no seu novo berço. A ama ficara imóvel no silêncio e na treva.

Mas brados de alarme atroaram, de repente, o palácio. Pelas janelas perpassou o longo flamejar das tochas. Os pátios ressoavam com o bater das armas. E desgrenhada, quase nua, a rainha invadiu a câmara, entre as aias, gritando pelo seu filho! Ao avistar o berço de marfim, com as roupas desmanchadas, vazio, caiu sobre as lajes num choro, despedaçada. Então, calada, muito lenta, muito pálida, a ama descobriu o pobre berço de verga... O príncipe lá estava quieto, adormecido, num sonho que o fazia sorrir, lhe iluminava toda a face entre os seus cabelos de ouro. A mãe caiu sobre o berço, com um suspiro, como cai um corpo morto.

E nesse instante um novo clamor abalou a galeria de mármore. Era o capitão das guardas, a sua gente fiel. Nos seus clamores havia, porém, mais tristeza que triunfo. O bastardo morrera! Colhido, ao fugir, entre o palácio e a cidadela, esmagado pela forte legião de arqueiros, sucumbira, ele e vinte da sua horda. O seu corpo lá ficara, com flechas no flanco, numa poça de sangue.

Mas, ai! dor sem nome! O corpozinho tenro lá ficara também envolto num manto, já frio, roxo ainda das mãos ferozes que o tinham esganado! Assim tumultuosamente lançavam a nova cruel os homens de armas, quando a rainha, deslumbrada, com lágrimas entre risos, ergueu nos braços, para lhes mostrar, o príncipe que despertara.

Foi um espanto, uma aclamação. Quem o salvara? Quem?... Lá estava junto do berço de marfim vazio, muda e hirta, aquela que o salvara! Serva sublimemente leal! Fora ela que, para conservar a vida ao seu príncipe, mandara à morte o seu filho... Então, só então, a mãe ditosa, emergindo da sua alegria extática, abraçou apaixonadamente a mãe dolorosa, e a beijou, e lhe chamou irmã do seu coração... E de entre aquela multidão que se apertava na galeria veio uma nova, ardente aclamação, com súplicas de que fosse recompensada magnificamente a serva admirável que salvara o rei e o reino.

Mas como? Que bolsas de ouro podem pagar um filho? Então um velho de casta nobre lembrou que ela fosse levada ao Tesouro real, e escolhesse de entre essas riquezas, que eram como as maiores dos maiores tesouros da Índia, todas as que o seu desejo apetecesse...

A rainha tomou a mão da serva. E esta, sem que a sua face de mármore perdesse a rigidez, com um andar de morta, como um sonho, foi assim conduzida para a Câmara dos Tesouros.

Senhores, aias, homens de armas, seguiam, num respeito tão comovido, que apenas se ouvia o roçar das sandálias nas lajes.

As espessas portas do Tesouro rodaram lentamente. E, quando um servo destrancou as janelas, a luz da madrugada, já clara e rósea, entrando pelos gradeamentos de ferro, acendeu um maravilhoso e faiscante incêndio de ouro e pedrarias! Do chão de rocha até às sombrias abóbadas, por toda a câmara, reluziam, cintilavam, refulgiam os escudos de ouro, as armas marchetadas, os montões de diamantes, as pilhas de moedas, os longos fios de pérolas, todas as riquezas daquele reino, acumuladas por cem reis durante vinte séculos. Um longo “ah!” – lento e maravilhado, passou por sobre a turba que emudecera. Depois houve um silêncio ansioso. E no meio da câmara, envolta na refulgência preciosa, a escrava não se movia... Apenas os seus olhos, brilhantes e secos, se tinham erguido para aquele céu que, além das grades, se tingia de rosa e de ouro. Era lá, nesse céu fresco de madrugada, que estava agora o seu menino. Estava lá, e já o Sol se erguia, e era tarde, e o seu menino chorava decerto, e procurava o seu peito!... E então sorriu e estendeu a mão.

Todos seguiam, sem respirar aquele lento mover da sua mão aberta. Que jóia maravilhosa, que fio de diamantes, que punhado de rubis ia ela escolher?

A aia estendia a mão, e sobre um escabelo ao lado, entre um molho de armas, agarrou um punhal. Era um punhal de um velho rei, todo cravejado de esmeraldas, e que valia uma província.

Agarrara o punhal, e com ele apertado fortemente na mão, apontando para o céu, onde subiam os primeiros raios do Sol, encarou a rainha, a multidão, e gritou:

– Salvei o meu príncipe, e agora... vou dar de mamar ao meu filho!

E cravou o punhal no coração.

Fonte:
Eça de Queiróz. A Aia.