segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Jaqueline Machado (Isadora de Pampa e Bahia) – Capítulo 22: Desobediência

Enila acordou bem disposta e com uma ideia fixa: “ - Hoje eu vou cavalgar. E ninguém vai me impedir.” E foi o que fez após o café. Correu até o estábulo, escolheu um baio já meio antigo, mas forte, robusto. E partiu para apreciar a paisagem, que já conhecia até os detalhes, mas que agora parecia mais bela. O céu, os campos, as flores, ganharam mais cor. Esse é o efeito das novidades que agradam: parecem cintilar tudo o que está acerca da pessoa. Às vezes, quase ofuscam o olhar e fazem enxergar além do infinito. Já, em outras ocasiões, cegam, colocando vidas em iminentes riscos. 

As novidades são como espelhos, portais mágicos, que podem libertar ou aprisionar. Mesmo assim, todos querem, porque rotina cansa. E não há problemas nisso, só não se pode esquecer dos perigos que podem surgir de algumas novidades... 

A cavalo, Enila percorreu toda a fazenda, e fora dela. Foi até o armazém do seu Feliciano, encheu uma sacola de doces, voltou para a estrada retomando a montaria. “- O que deu nessa guria?” – pensou o dono do armazém, que não lembrava ter visto a moça a cavalo, ainda mais desacompanhada, sorridente, comprando doces.

Enila foi até um vilarejo próximo, onde viviam famílias muito carentes para presentear as crianças. O lugar ficava um pouco afastado das atividades das fazendas... Algumas crianças estavam a brincar na rua... Os meninos a jogar futebol, e as meninas a se entreter com bonecas velhas. Ao vê-la se aproximar, a gurizada pausou as brincadeiras, já que não costumavam receber visitas com aparência de gente rica. 

Enila os cumprimentou, buscou saber quem eram as mães dos piazidos* e fez a distribuição dos doces, os quais receberam com brilho nos olhos e largo sorriso.  Um dos meninos disse para os outros: “Acho que faz quase um ano que não ganhava doces tão gostosos.” Enila escutou, e uma lágrima de emoção escapou do seu olhar, rolando ligeira em sua face cheia de ternura. Já ouvira falar daquelas famílias, a maioria descendentes de ex-escravos, sem trabalho, sem padrinhos, viviam apenas do pouco que podiam plantar no terreno de casa. Pedaços de chão que não lhes pertenciam de fato, mas que não comprometiam o espaço ocupado pelo gado ou pelas plantações. Todavia sabiam que a qualquer hora algum dono poderia pedir que se retirassem. Então, além de conviverem com a pobreza, com a falta de estudos, já que ali não havia escola para as crianças, ainda tinham de suportar o temor de irem parar na rua, sem terem para onde ir.  

De tempos em tempos algumas pessoas formavam mutirão para levar cobertores e cestas básicas aos necessitados, mas esse tipo de evento solidário era raro, portanto, pouco esperado pelos moradores do lugar. 

Enila ficou perplexa com o que viu. E pensou em aliar-se à Isadora para ajudar aquelas famílias.

Ao se despedir, uma senhora, aparentemente muito idosa, com suas frágeis mãos trêmulas tomou o rosto de Enila e beijou sua testa. - “Obrigada por lembrar da gente, ‘fia’!” – disse ela, baixinho. Aquela senhora escondia, entre rugas profundas, um olhar profundo... Um poço escuro que parecia conhecer todas as dores do mundo. Com o coração acelerado e nó na garganta, Enila montou o cavalo e tomou o caminho de volta para casa. Repentinamente o animal ficou arisco. E a moça, sem conhecer as artimanhas para contê-lo, precisou fazer algumas paradas. Teve que fazer parte do trajeto a pé. 

Em casa, deram por sua falta. Seus pais estavam tensos. E Vó Gorda pediu ao capataz que verificasse se todos os cavalos estavam na fazenda. 

- Vá depressa, Arlindo – disse ela. 

- Qual o porquê de tanta preocupação? - a patroazinha deve ter se perdido das horas conversando com a amiga, logo retorna. 

- Eu vi... – disse a Vó em tom de suspense.- 

– Viu o quê?  - perguntou o senhor Fiore. 

- A guria Enila ainda era pequena quando me veio a visão de que ela não poderia montar cavalos. Caso desobedecesse, poderia sofrer um grave acidente. 

– Bobagem, Vó, esses “presságios” são alucinações. Nada disso é verdade – retrucou o capataz Arlindo. 

- Isso não importa agora. O que interessa é que minha filha nunca some por longas horas. – disse dona Eliana. 

- De toda forma, vamos verificar se há algum cavalo ausente. – disse o senhor Fiore a Arlindo. 

Ao darem pela falta de um dos cavalos mais bravios, eles se entreolharam, pegaram o jipe e partiram em busca de Enila, que é encontrada sozinha caída no meio da estrada. 
-------------------------------------------------------
* Piazidos: termo usado no sul do Brasil, que significa meninos pequenos, moleques, piás. 
----------------------------------------------------------
continua…

Fonte: Texto enviado pela autora. 

domingo, 12 de novembro de 2023

Ademar Macedo (Ramalhete de Trovas) 14

 

Mensagem na Garrafa – 32 -


 Francisco Cândido Xavier
Pedro Leopoldo/MG, 1910 - 2002, Uberaba/MG

O Que é Solidão

Solidão não é a falta de gente para, conversar, passear, namorar ou fazer sexo… 
isto é carência.

Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar… 
isto é saudades.

Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe às vezes para realinhar os pensamentos…
isto é equilíbrio.

Tampouco é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente, para que revejamos a nossa vida… 
isto é um princípio da natureza.

Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado… 
isto é circunstância.

Solidão é muito mais que isto… 

Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma.

Silmar Böhrer (Croniquinha) 96

Música e poesia nasceram com o homem. São divindades absorvidas pelo espírito humano desde priscas eras, fundidas em prosa-verso-melodia.

Lembremos do poema lírico, do latim "lyricu", uma composição para ser cantada.

Recorde-se que na Idade Média "trovador"  e "menestrel" eram sinônimos de poeta.  Na Idade Moderna houve alguma distinção entre música e poesia, mas a música nunca abandonou a poesia, nem a poesia abandonou a música.  Grandes músicos e escritores jamais abandonaram essa dupla magistral.  A MELOPOÉTICA  (grego melos = canto + poética) é companhia eterna do ser humano.

É mais do que verdadeiro que o Brasil é um ninho imenso de musicalidade associada com poesia, e então vamos lembrar de nacos, lampejos, pedacinhos que são verdadeiros quase-poemas das músicas do sul da pátria.  Fragmentos preciosos.

Envolvem e encantam.  Assim :

Pagar para o tempo a usura dos dias.
Aroma das flores entrando nas frinchas.
Um açude de taipa arrombada. 
Essa luz que algumas mulheres têm por dentro.
Sinto ciúme do silêncio grande que mora comigo.

Na voz do vento geme a voz de uma saudade. 
Arranchei no campo e acaranchei no rancho.
São tão parecidas as almas e as plantas.
O açude vazou nos olhos.
O vigor vem da raiz que alimenta o ideal.  

São largas minhas penas como as noites são largas. 
Na voz do vento cantava um catavento.
Talvez as formigas me contem um segredo.
Nos teus olhos o regalo das aguadas.
Saudade é um silêncio guardado pela alma.

Fonte: Texto enviado pelo autor 

Luiz Damo (Trovas do Sul) LI

 Pode ter razões de sobra
pra fazer parte da história,
quem faz da vida uma obra
e ao lê-la a sua memória,
= = = = = = = = = 

O denso lençol bordado
que o céu na noite estendeu,
seja o teu lenço estrelado
que o sol, sem ônus te deu.
= = = = = = = = = 

Se ao mar tens a sensação,
de ondas tão descontroladas,
o que vês, nada mais são,
que as gotas acumuladas.
= = = = = = = = = 

Há quem fale com destreza
como um trovão ao chover
e há quem abra a boca à mesa
só quando senta a comer.
= = = = = = = = = 

Não vivamos de lamentos,
nem de sonhos tão banais,
tudo à vida são momentos,
momentos, ...e nada mais.
= = = = = = = = = 

Passa o tempo e acelera
o processo da chegada,
há quem depressa, exagera,
deixando a vida na estrada.
= = = = = = = = = 

O interesse pela ação
vela a chave do segredo,
alguns veem a solução
mas de agirem guardam medo.
= = = = = = = = = 

Não tem perfeição maior
que a plenitude da vida,
viver cada vez melhor
é missão a ser cumprida.
= = = = = = = = = 

A tempestade, no mar,
sequer aos peixes, assusta,
mas quem vive a navegar
sente à dor o quanto custa.
= = = = = = = = = 

Quem se perde à noite escura
ganha a chance de voltar
à origem, fim da aventura,
quando o sol volta a brilhar.
= = = = = = = = = 

Perder tempo ninguém quer,
nem com ele esmorecer,
sem um proveito qualquer
que faça algo enriquecer.
= = = = = = = = = 

O intelecto fulge mais
quanto menos sombra houver,
das carências sapienciais
em cada homem ou mulher,
= = = = = = = = = 

São tantos apontamentos
nos diários da memória,
lidos por muitos talentos
noutros momentos da história.
= = = = = = = = = 

Os bens que sonhas ou buscas,
não se encontram no alto-mar,
se ocultos é porque ofuscas
a luz que vem do teu lar.
= = = = = = = = = 

Sob o teu manto sagrado,
ó Mãe, guarda os filhos teus!
Preservando-os do pecado
e conduzindo-os a Deus.
= = = = = = = = = 

A imagem perde o sentido
se um borrão lhe for incluso
e o valor, antes mantido,
perde a cor, fica confuso.
= = = = = = = = = 

O homem, quando à lide opina,
julga-a mal ou se atrapalha,
mas a justiça divina
nunca tem postura falha.
= = = = = = = = = 

No caminho, rumo à paz,
lapidamos nosso ser,
o afã de crescer, nos faz
peregrinos do saber.
= = = = = = = = = 

Seja a vida o bem primeiro,
que deve ser preservado,
quem se vende por dinheiro
não vale o que tem comprado.
= = = = = = = = = 

Vejo à vida um nobre enredo
que a muitos causa revolta,
quem parte fica com medo
falta a passagem de volta.
= = = = = = = = = 

Tudo, hoje, do homem requer,
mais do que uma enciclopédia,
acaba, em lixo qualquer,
quem for inferior à média.
= = = = = = = = = 

Existem muitas estradas
que podemos palmilhar,
algumas pavimentadas
e outras faltam ladrilhar.
= = = = = = = = = 

Pode a criança não ter
a mais plena liberdade,
mas pode bem entender
o sentido da verdade.
= = = = = = = = = 

É na fonte da cultura,
manancial a efervescer,
que, sedento, o ser procura
a água viva do saber.
= = = = = = = = = 

A água da chuva, torrente,
carrega às margens da estrada
tudo e debaixo da ponte
passa como uma enxurrada.
= = = = = = = = = 
Fonte: Luiz Damo. As faces da trova. Caxias do Sul/RS: Ed. Do Autor, 2021. Enviado pelo trovador.

Amadeu de Queiroz (Chão de terra preta)

Antigamente, no tempo dos bugres, certo caçador que andava com outros pelo mato atirou a um macuco encontrado perto de um córrego sem nome. Daí por diante todas as vezes que os caçadores queriam se referir ao dito córrego, diziam: " O Córrego do Macuco". Por essa forma, o nome da ave passou para a água corrente, foi ficando e ficou até hoje.

Tempos depois, um roceiro, que veio de longe, comprou terras servidas pelo Córrego do Macuco, e ali fez uma casa - casa de pobre - para seu abrigo: a  companheira e mais cinco crianças. À beira do córrego, pai e mãe, criaram a família - os filhos na enxada, as filhas na enxada e no fogão, e logo que deram conta da tarefa, os dois velhos morreram. Os herdeiro repartiram a terrinha entre si e como tocou quase nada a cada um, cada um vendeu a sua parte e gastou o dinheiro para começar a vida. As filhas se casaram, os filhos saíram mundo afora, procurando trabalho e mulher; menos o Chico, que se casou com  com gente da vizinhança e ficou  teimando no seu pedaço de chão, até o dia em que lhe nasceu o segundo filho, um menino.

Nessa quadra da vida, deu-lhe tanta doença em casa, a ponto de passar um ano sem trabalhar, e gastando. Por fim, quando os doentes sararam, viu-se endividado até os cabelos e teve de vender o chão e o rancho, para  pagar os empréstimos.

Do pouco que possuía, só salvou o crédito, o mais  perdeu tudo, até o nome que o pai lhe deixou: o córrego  pegou-lhe, para sempre, o nome que, por sua vez, recebera de um macuco. A princípio era chamado - o Chico, do Macuco: - depois - Chico Macuco, e por fim, só Macuco....

Mas de seu, ficou ainda com muita coisa - ficou com a obrigação e com a necessidade. Então, passou a mão na enxada, arrastou a  família, foi morar em casa alheia e trabalhar no chão dos outros...Foi dar a troco de um jornal de miséria, toda a força dos braços e tudo que é tempo de luz no dia, só guardando para si as sombras da ave-maria e o escuro da noite.

E passaram muitas luzes e sombras, muita escuridão passou enquanto o jornal ia ficando no mesmo ser e a família nas mesmas privações. Mas, ao tempo que o camarada Macuco descansava um pouquinho, ia olhando à roda de si e, com o passar dos dias, foi à lavoura de todas as plantas, a conhecer a força das terras, a tirar proveito do ajutório do sol e da chuva.

O fazendeiro gostou do camarada, lhe deu casa, lhe deu serviço, e pagava pontual. A casa era de sapé, ficava na vertente, numa chapada da grota, à beira de uma terra preta, gorda, em que ninguém nunca plantou. Não tinha horta nem arvoredo nem cercado em torno, tinha a bica d'água à porta da cozinha, perto do mamoeiro velho esgalhado. O mamoeiro fazia as vezes de galinheiro, a galinha de pintos deitava-se debaixo dele; o ninho de jacá estava pendurado nele; toda a criação dormia empoleirado nos seus galhos e se abrigava do sol ou da chuva embaixo da sua folhagem.

A casa tinha dois quartos e cozinha; os quartos se encheram com as camas e com a canastra frasqueira, a cozinha ficou vazia, era maior, dava para o fogão e para se morar. Mas, porém, tudo era pobreza e pouquinho.

De manhã cedo, a menina e o menino iam à fazenda buscar o que era preciso - leite, couve, cebola de folha. Leite vinha por paga, o mais era dado; ovo, sempre havia algum em casa.  A fazenda não ficava longe, as crianças iam sozinhas, mas era tão pequenas, que se sumiam no meio da estrada. A menina ia indo, carregando o caldeirãozinho, parava, olhava para trás e andava outra vez, arrastando os pés, sem brincar, sem falar, o menino fazia a mesma coisa mascando a ponta dos suspensório de tira de pano...

Nestas aperturas, o roceiro Macuco entendeu de dar um jeito na vida para poder vestir a família. O ganho não lhe deixava sobra: na vila só comprava mantimentos para a semana e, as vezes, um doce para as crianças: três biscoitinho de amendoim, duros e velhos, mas o roceiro não perguntava a idade deles, perguntava o preço.

- Três por duzentos réis? Ota!

- ...Mãe, o que é que tem em riba do doce?

- Açucre.

- Açucre antão é duro? Boba...

Quando a precisão era grande, comprava também algum remédio, pouco porém. Se um bicho venenoso mordia as crianças e elas metiam as unhas, tostava um folha de mato chimango e punha em cima da inflamação: se as bichas alvoroçavam, aplicava na barriga das crianças um emplastro de erva mentruz; se a mulher sentia dor de cabeça amarrava na testa um lenço molhado em pinga com cânfora; se ele, Macuco, ficava mofino, amarrava só um lenço na cabeça e aguentava...Mas de qualquer jeito precisava vestir a família, então  pedia a Deus forças para trabalhar, mas a força brota da terra, entra pela boca, enche o peito, sai pelos braços, desce pelo cabo da enxada e entra na terra outra vez.

Ao anoitecer, o roceiro Macuco voltava para casa, com a enxada no ombro, carregando o peso da canseira aí se encontrava com a mulher, que também ia indo com as crianças, cada uma carregando o seu feixe de lenha, e todos seguiam, juntos sem dizer uma palavra...

De tanto maturar, teve uma ideia que dava esperança: plantar um fumo, na chapada da vertente, em redor da casa, de meias com o fazendeiro. Plantação alqueire de chão, pouco mais ou menos. Então, foi procurar o dono da terra, o fazendeiro, e explicou-lhe:

O chão é de boa face; a terra é própria; está em roda da minha casa; a mulher me ajudando, nós dois podemos tratar vinte a vinte e cinco mil pés de fumo, que é mais que pode levar o dito chão. O senhor me adianta as despesas e, no fim, nós partimos. O lucro é bom, mas o seu há de ser melhor porque o fumo dá soca e, a terra sendo boa, a soca também é - dá bem e serve bem o que dá. Ainda, por cima, a terra do fumal fica mais estercada, mais macia; as folhas velhas do fumo, a bagaceira dos talos, das velhas, que a planta vai largando, tudo engorda a terra que, depois, dá com fartura, sem trabalho. 

Macuco fez a sua proposta, explicou tudo muito bem, induzindo o fazendeiro a experimentar a meação na lavoura do fumo. O dono só entrava com a terra e abria um crédito ao meeiro; mesmo assim titubeou, imaginou, perguntou tanta coisa, e deixou a resposta para mais tarde. Mais tarde aceitou com uma dose de interesse e um pouquinho de desconfiança.

- O que for da fazenda, eu vou te fornecendo e assentando; para o que a família precisar - mantimento, remédio e roupa - eu te dou um crédito na vila; na apuração do negócio, você paga tudo o que comprou. Está combinado: é negócio a meias; tiradas as despesas, parte-se o lucro, a soca me pertence, fica de fora. Contrato escrito, não é preciso, nós somos de fiança um para o outro.

Acertaram. Macuco deu parte à mulher e como já era mês de agosto caiu, sem demora, em cima da terra. Primeiro, formou os canteiros para a semeadura, depois, colocou por cima deles uma camada fina de gravetos, folhas secas e lenha miúda; ateou fogo em tudo e, logo que a queima se acabou, os canteiros ficaram cobertos com uma camada de cinza. Deixou esfriar a cinza, espalhou esterco de curral por cima e revirou a terra na fundura de meio palmo. Assim, a terra ficou pronta para a semeadura, livre de pragas e das sementes do mato daninho.

Até chegar setembro - o que é o tempo de semear-se o fumo - Macuco voltou a capinar a roça, e capinou quatro semanas a fio. O tempo chegou, ele mexeu aplainou a terra, semeou a sementes nos canteiros, que a fechou a meia altura. para evitar o estrago das galinhas. Até passar dois meses - prazo que a planta pede para nascer e ficar no ponto de mudar-se - Macuco e a mulher levaram os dois meses no serviço da enxada, pois, quando iam chegando ao fim, voltava ao princípio, para repassar a capina.

O chão era grande, o tempo curto, mas o mato era maneiro e a paciência muita, para aguentar a mesma labuta todos os dias, e todos os dias o mesmo tempo: solão desde manhã até de tarde, sem chuva para refrescar a terra, sem nuvem para tapar o sol..

A noite já dava sinal, e o roceiro Macuco ainda lavrava a terra para a lavoura de meação. A mulher estava ao lado dele e batia enxada também, ajeitando a capina, ajuntando um monte num lugar, outro mais adiante. O menino e a menina trouxeram o fogo para queimar o cisco. O chão estava limpo em derredor, o céu também estava, a fumaça branca subia das fogueiras, acompanhando a viração.

O roceiro trabalhava calado, reparando; só existia para a enxada e para o silêncio; a vida se lhe concentrava em torno, não tinha olhares distantes...Tudo quanto lhe pertencia estava a seu lado: a mulher, os filhos, o cachorro, o fogo e as galinhas ciscando adiante da sua enxada - seu lar vinha trabalhar com ele, e se espalhava pela terra da sua lavoura.

Macuco suspendia o trabalho, deixava cair, a um lado do peito, o cabo da enxada na palma da mão - amarelo como cana de reino - cuspia na palma da mão - amarela e lustrosa - e olhava o ar... Todos os homens que trabalham a terra tem olhar sem vida;  os outros não. Uns tem olhar de espanto ou de mistério; outros de sonho ou da mágoa; outros de indiferença ou desengano; o trabalhador da terra tem olhar de espera...

Quando o sol se escondia, as galinhas era as primeiras a se recolherem ao seu mamoeiro, depois, a mulher com as criança e o cachorro, e por último, o roceiro Macuco. Pela terra, a tarde espalhava as sombras, e os últimos ventos do inverno espalhavam a fumaça branca das fogueiras de cisco.

A mulher acendia a lamparina de querosene, as crianças lavavam os pés na gamela d'água, comiam leite com farinha e iam se deitar na mesma cama, assim como vinham da capina; o roceiro e a mulher, lavavam os pés na mesma água, bebiam uma tigela de café com rapadura e farinha e iam dormir na mesma cama, assim com vinham da terra... O cachorro pulava para cima do fogão e ninguém ouvia o ressonar do homem nem o rosnar do cão, porque o roceiro cansado tem sono de pedra e o cachorro magro, esfomeado não rosna.

Daí a pouco clareava o dia; o roceiro Macuco abria a porta para a   luz entrar: as galinhas desciam do  mamoeiro; uma neblina rasteira cobria a terra preta da campina. O trabalhador bebia outra tigela de café com rapadura e farinha, batia a pedra, soprava na isca, acendia o cigarro, pegava na enxada e voltava para a terra. Ia sozinho, que os mais ficavam em casa - a mulher e as crianças - cada um com a sua a tigela, e o cachorro com um pedaço de angu frio; as galinhas, por sua conta, procuravam o que comer.

O tempo estava firme, o sol subia, rendia o serviço do roceiro, e a mulher mexia o almoço. A menina permanecia de cócoras ao pé da porta da cozinha, imóvel e calada, depois, se levantava, coçava a cabeça, espreguiçava e ia se  acocorar mais adiante. O menino cortava um gomo de mamoeiro para fazer um pito comprido; neste meio, um pássaro preto cantava no pinheiro seco, o menino tirava o pito da boca, assobiava, arremedando o passarinho, e os dois ficavam cantando juntos.

No caldeirão de ferro, desde cedinho, já se cozinhava o feijão, e a mulher punha ao lado dele a panela de barro, de fazer arroz. Mexia um pouquinho cada qual, dava uma voltinha, atiçava o fogo, espiava dentro das panelas e ia se encostar à porta do terreiro. Ficava olhando o Chico, parado no meio do terreno preto, descansando um pouco. O marido, com chapéu de palha rasgado, enfiado na cabeça, a roupa pendurada no corpo, mal comparando, imitava um judas de espantar passarinhos de arrozal...Voltava ao fogão, mexia outra vez a panela de arroz, picava as couves e ia buscar os torresmos.

Pouca panela, pouca comida, trabalho pouco - logo o almoço ficava pronto. A mulher dava mais uma voltinha, empilhava três pratos de folha, à beira do fogão, e gritava pelo Chico. E assim que o marido chegava, cada um recebia o seu prato, a sua colher, cada um ia se acocorar num canto da cozinha, e ninguém dizia uma palavra. A mulher servia o prato seu, dela, e ficava de pé, encostada ao fogão, comendo. O cachorro, sentado sem se mexer, olhava o prato do menino, depois, olhava a menina; por fim, olhava só para a mulher e ficava, com os olhos compridos, esperando.

Os pratos de folha se empilhavam de novo à beira do fogão; o roceiro Macuco puxava um tamborete, sentava-se, olhava a mulher e dizia:

- Agora, vamos descansar um pouco...

Lá fora, o joão-bobo cabeçudo vinha voando com a sua companheira, pousavam no mesmo galho da árvore e gritavam simultaneamente, um ao outro; " Currupiro!" "Currupiro!" Depois, se achegavam, corpo com corpo e ficavam imóveis, bem juntinhos...

O roceiro Macuco não afrouxou na labutação nem perdeu a hora do dia, afora os domingos, que tinha de ir à vila buscar mantimento e querosene, tudo fiado. O fazendeiro respondia pelos seus gastos, é certo, mas precisava ter sempre dinheiro para comprar uma ou outra coisa de necessidade. Então, vendia frangos, ovos, juás, pinhão, fruta e tudo quanto o fazendeiro deixava tirar do mato, sem apagar.

E foi indo nessa toada, até preparar a terra e chegar o tempo da plantação das mudas. Aí ele e a mulher não largaram mais o chão - abrindo cova e plantando, abrindo cova e plantando. Os dois ficaram tão mestres na abertura das covas, que conservavam, entre uma e outra, a distância certinha de cinco a seis palmos, o que era preciso ser feito, por via de ser a terra de boa qualidade.

O plantio pedia muito cuidado: só se aperta, na terra, a raiz e não a haste; portanto, para ajudar, eles ensinaram os filhos, e os filhos plantavam com delicadeza e perfeição, que as mãos das crianças não tinham tamanho nem força para machucar as plantas novas.

O tempo corria bem todos os dias, e assim que o campo ficou plantado, choveu uma chuva mansa, fresca, criadeira, as mudas se firmaram nas covas, as folhas se aprumaram e principiaram a crescer à vista dos olhos.

O roceiro e a mulher redobraram de cuidados e de interesse, tratando com enxada a terra da plantação, removendo a areia das covas e qualquer outra coisa que pudesse prejudicar o desenvolvimento da planta. Os filhos continuavam aprendendo e ajudando; sabiam apanhar as folhas que iam morrendo e secando, na parte inferir dos pés de fumo, a arrancar o mato com as mãos, sem ofender uma folha que fosse.

Toda a gente pensava só no fumal, e ninguém viu que o fumal tomou conta da terra, cresceu, cresceu gordo, mole, viçoso: tinha pé do tamanho de um homem, tinha folha larga, de mais de gêmeo. Nem um pé falhado, nem um folha praguejada. A terra preta, macia e boa, criava, por igual, o fumo, planta que quer força do chão para vingar.

O dono da terra foi ver a lavoura, andou abaixo e acima, espiando aqui e ali; calculou, com uma olhada, o valor da colheita, gostou do que viu mas não disse nada. O roceiro Macuco, que estava junto el, também e calava. Por fim, ao voltar para a fazenda, o homem disse isto:

- Como é que vai o seu gasto, na vila?

- Vai indo, eu compro só meizinha e mantimento...

- É isso mesmo. As coisas estão ficando ruins, a gente precisa minguar as despesas...

O fumal começou a apendoar; as flores tinham pressa de nascer; então, marido e mulher deixava o trabalho e se recolhiam, esperando que também os botões apontassem logo.

O pai, a mãe, os filhos, levantavam-se ao romper do dia e iam para a desponta; almoçavam e iam para a desponta; de noite, deitavam-se para dormir, com os dedos doloridos de tanto despontar, de tanto arrancar um botãozinho tão mole e tão mimoso!

E assim, despontaram muitos mil pendões; os dias foram passando, e chegou o tempo da desolha - que é o trabalho de se tirarem os brotos que nascem entre as folhas e a haste - trabalho incessante porque o fumo brota sempre. Enquanto o broto é novo, se quebra facilmente com os dedos por isso as mulheres e as crianças ajudam muito; mas é preciso se desolhar com cuidado, para não maltratar as folhas.

As crianças aprenderam o serviço, e cedinho já iam para a lavoura. O fumal mandou na casa; levou a gente do roceiro para o seio da sua folhagem; governou a boca e a força da família; mandou em toda a gente, e toda a gente lhe mostrava respeito e amizade, porque não parava nem se cansava.

A mulher e o marido já não trabalhavam pensando só no ganho, no lucro prometido; a ambição deles era também a ambição do pai que quer ver os filhos criados; do criador que quer criar o seu gado; do trabalhador que  deseja concluir sua obra. Macuco percorria o fumal, examinava pé por pé; todos eram irmãos, cresceram juntos, porque a força era igual naquela terra e tanto. E o roceiro quedava, olhando o chão preto, fincava no chão o dedo grande do pé e remexia, com ele, a terra fofa, como se fosse um porco foçando.

A terra, ao redor das plantas, estava coalhada de borboletas arrancadas. A mulher e as crianças tosquiava, tosquiavam, até ficaram com as mãos amortecidas, com um mau jeito nos pulsos, com as unhas descarnadas, doídas, de tanto quebrar o brotinho...

- Corta, gente! 

-  Dói, mãe...

- Corta, gente!

Dessa maneira foram arrancadas milhares e milhares de borbulhas, até se acabar o ano e começar o outro. Mas antes que viesse a colheita, o meeiro Macuco tratou de construir o rancho, livre de sol e de chuva, com os seis andaimes para a seca das folhas do fumo. O rancho era coisa simples: quatro esteios de pouca altura, um pau de cumeeira, uma coberta de sapé, dos dois lados, até o chão, e dentro, os varais para se estenderam as folhas colhidas. Como na fazenda não havia sapé para a coberta, o fazendeiro mandou cortar no vizinho, e pôs na conta das despesas: a madeira - meia dúzia de varas - foi tirada ali mesmo...

Chegou o mês de maio, As folhas da parte inferior dos pés de fumo começaram a amadurecer tomando uma cor amarelada ao mesmo tempo que a parte de cima - a feição da folha - ficava toda empipocada.

Principiou a colheita. Enquanto o roceiro limpava a cultura - que a colheita se deve fazer no limpo - a mulher apanhava as folhas de vez, que as crianças iam transportando para o rancho...

- Mãe, ocê é que nem formiga.

- Ocê é que nem formiga-carregadeira...

A colheita se faz aos poucos, e leva tempo - cada pé dá duas, três e mais apanhadas. As folhas vão sendo penduradas nos varais do rancho, onde ficam uns cinco dias, para depois se tirar, com todo o cuidado o talo de cada uma. O talo cai com facilidade, basta dobrar a folha sobre ele mesmo para logo se separar.

Então se faz a torcida, o cordão e, por fim, o rolo, que se entrega ao fabricante.

O fazendeiro foi passear na roça para ver a a colheita e, decerto gostou porque se mostrou conversando. Aí, o Macuco lhe disse que não podia dispensar o ajutório de camarada. O fazendeiro concordou, e resolveu mandar ver por conta da meação um prático no serviço de torcer e de encordoar o fumo.

Logo depois, veio um prático trabalhador e diligente. A apanha levou um avanço; as crianças aprenderam, também, a estender e destalar as folhas e, desse modo, todo o mundo trabalhava em tudo, e tanto trabalharam que um dia a colheita se acabou, todas as folhas foram torcidas, encordoados, enroladas e entregues ao fabricante.

O fumal ficou que era vara só...

No mês de julho, o fabricante deu conta do fumo, preparado e enrolado, A quadra era boa; o fazendeiro aproveitou e vendeu bem  num lote só. Mandou tirar as contas do Macuco tanto as da vila, com as da fazenda; descontou as despesas feita; apurou a rendição e acertaram o trato. A parte que tocou a cada um foi de um conto e muito, quase dois. A do fazendeiro saiu inteirinha, e a do roceiro. Macuco, descontadas todas as despesas, deu-lhe para salvar um jornal de cinco mil e quinhentos - não se contando o ajutório da mulher - com uma sobra de setenta e cinco mil réis...

O fumal produzira com abundância de compensar, mas o trabalhador ficou na mesma. A meação só lhe deu para viver um ano, com jornal um pouquinho melhor que jornal de enxadeiro... Está certo. A mulher e as crianças ficaram doentes, a família teve de comer e o dinheiro num ano subverte-se.

O fazendeiro não explorou trabalho de ninguém, com maldade ou com imposição, fez negócio limpo e tratado. Não lhe cabia culpa pelo sucedido; tanto que, vendo o meeiro desapontado, sem lucro no bolso e pior de miséria, ficou com dó e lhe deu uns cem mil-réis, do seu bolso.

- Mas olhe que este dinheirinho que estou te dando não tem nada com o trato da meação. Trato é trato.

O roceiro Macuco recebeu o dinheiro, com os olhos no chão, sem dizer uma   palavra; por fim, levantou a cabeça e disse:

- E agora, o que eu hei de fazer?

- Pois, uaí! você continua aí, vai trabalhando de jornal: cinco mil-réis a seco. E já pode pegar, amanhã, na corta do fumal, para a soca.

O trabalhador não disse nada a ninguém, nem permitiu que ninguém lhe dissesse nada. De tarde, foi à bica, amolou a foice e, no outro dia cedo, principiou a cortar as hastes desfolhadas do fumal colhido. O fumal velho, podado em agosto, torna a se enfolhar, dá boa soca e seve bem o que dá...

A poda se faz conservando cada pé na altura de três quartos, mais ou menos. A princípio, o roceiro não cortava na medida certa, depois, pegou a toada e a foice ia e vinha, cortando as plantas na mesma altura. O homem, sem se interromper, avançava para a frente, para a direita, para a esquerda, golpeando com braçadas largas. Olhando de longe, parecia um possesso, de foice em punho matando a torto e a direita. Dir-se-ia que o lavrador enfurecido se vingava da planta. Mas o roceiro Macuco não era homem para destruir os frutos da terra, ele reconstruía a sua obra de lavrador...

Acabou-se a poda. quando a última vara caiu, o roceiro parou na orla do campo arrasado, cruzou os braços e, apoiando-se no cabo da foice, ficou matutando e contemplando.

À sua frente estende-se o chão preto, a terra limpa, seca, ouriçada: nem um fiapo de capim, nem um olho de broto espiando; cada pé de fumo podado virou um estrepe agudo. Mas as raízes estão vivas no fundo da terra, esperando que voltem as chuvas criadeiras do tempo das brotas; então, tudo vai outra vez nascer e verdejar, crescer e ocupar a terra erma. A soca vai cumprir a promessa do roceiro Macuco...

De repente a tarde entristeceu.

Pelos ouvidos do roceiro passa zunindo o vento que vem trazendo de longe uma nuvem cor de chumbo. Macuco levanta a cabeça e acompanha com a vista a nuvem escura que vai lenta pelos ares...

A ventania invade os matos, balanceia os pinheiros duros, fustiga desde a graminha até a perobeira que sobe céu acima, enche o espaço e vai levando, para mostrar mais adiante, a todos os trabalhadores da terra, a nuvem escura cor de chumbo, que prenuncia o tempo fecundo das águas.

Fonte: Contos da Tita. Disponível em Domínio Público.

Lucy V. Hay (Como Escrever um Mistério de Assassinato) – 4, final

CONTANDO A HISTÓRIA

1 – Inclua interrogatórios com os suspeitos em locais diferentes e aos poucos. 

O texto vai ficar chato se todos os interrogatórios acontecerem no mesmo lugar. Portanto, coloque os personagens em ambientes diferentes: a cena do crime, a delegacia de polícia, a rua etc.

2 – Dê ao leitor a chance de solucionar o mistério aos poucos. 

Você pode até citar uma impressão digital ou pilha de lanterna esquecida no fim da narrativa, mas isso é injusto com o leitor. Mostre todas as pistas a ele ao longo da história.

Por exemplo: diga que o assassino esqueceu a lanterna na cena, mas que tinha levado todas as outras coisas do local; mostre também os testes com as impressões digitais no acessório.

3 – Despiste o leitor. 

As pistas podem apontar para uma ou várias pessoas que pareçam candidatas perfeitas para o crime, mas que acabem sendo reveladas como inocentes. Essa tática é muito comum e você pode usar e abusar dela.

Por exemplo: talvez um dos suspeitos goste de fazer trilha no meio do mato e haja pegadas de terra na cena do crime. Na verdade, pode ser que essas pegadas sejam de uma mulher que passou no local com as solas dos sapatos sujas.

4 – Atenha-se fielmente ao enredo. 

Deixe sempre um gosto de quero mais ao longo do livro para intrigar o leitor. Lembre-se de que a narrativa é a sua arma mais importante e não se perca. Siga essa história do início ao fim.

Traga um elemento novo para a história a cada capítulo. No fim de cada trecho do livro, fisgue o leitor para ele continuar explorando o que aconteceu: apresente novas pistas que levem a um suspeito diferente, por exemplo.

5 – Inclua uma reviravolta no fim do enredo. 

Todo bom suspense traz uma reviravolta que pega o leitor de surpresa no final. Não pense em nada abrupto ou injusto, e sim que tenha lógica e esteja ligado às pistas que você soltou ao longo da narrativa.

Por exemplo: talvez as pistas indiquem que o assassino é o filho único de um milionário porque era o único com motivo aparente; no entanto, a verdade vem à tona: o homem teve uma filha fora do casamento e que também receberia a herança. Nesse caso, ambos se encaixam no papel de suspeitos.

O clássico Assassinato no Expresso Oriente, de Agatha Christie, também tem um belo exemplo de reviravolta. No fim, o leitor descobre que todos os suspeitos agiram em conluio para cometer o crime.

6 – Pense na inversão e na resolução após o clímax. 

Depois que o assassino for pego, reflita se os personagens mudaram para melhor ou pior e mostre-os retomando a rotina.

Por exemplo: talvez o detetive extrapole a linha da ética e decida deixar a profissão. Nesse caso, a nova realidade dele vai ser buscar um emprego. Pode ser também que o detetive não tenha experiência, mas acabe sendo promovido por resolver um caso tão complicado.

DICAS

Trace uma meta todos os dias. Você pode pensar em termos de palavras, como escrever 500, ou tempo, como três horas. O importante é se ater a essa rotina.

Leia obras consagradas do gênero suspense para se familiarizar com ele.

Referências
http://www.writersdigest.com/tip-of-the-day/discover-the-basic-elements-of-settingin-a-story
https://www.dailywritingtips.com/how-to-structure-a-story-the-eight-point-arc/
https://www.esquireme.com/content/20250-how-to-write-a-murder-mystery
http://www.writing-world.com/mystery/clues.shtml
https://www.thebalancecareers.com/top-rules-for-mystery-writing-1277089
https://www.thecreativepenn.com/2014/01/17/writing-crime/
http://elizabethspanncraig.com/mystery-writing-tips/writing-cozy-mystery-suspects/
http://elizabethspanncraig.com/mystery-writing-tips/writing-cozy-mystery-suspects/
https://www.thebalancecareers.com/top-rules-for-mystery-writing-1277089
09/11/2023 00:43 Como Escrever um Mistério de Assassinato (com Imagens)
https://pt.wikihow.com/Escrever-um-Mistério-de-Assassinato 9/9
https://www.thebalancecareers.com/top-rules-for-mystery-writing-1277089
http://elizabethspanncraig.com/mystery-writing-tips/writing-cozy-mysterysuspects/
https://www.thecreativepenn.com/2014/01/17/writing-crime/
http://elizabethspanncraig.com/mystery-writing-tips/writing-cozy-mysterysuspects/
https://www.thebalancecareers.com/top-rules-for-mystery-writing-1277089
http://www.springhole.net/writing/things-about-death-dying-and-murder-writersneed-to-know.htm
http://elizabethspanncraig.com/mystery-writing-tips/writing-cozy-mysterysuspects/
http://www.writing-world.com/mystery/clues.shtml
http://www.writing-world.com/mystery/clues.shtml
https://www.esquireme.com/content/20250-how-to-write-a-murder-mystery
https://www.esquireme.com/content/20250-how-to-write-a-murder-mystery
https://www.dailywritingtips.com/how-to-structure-a-story-the-eight-point-arc/

sábado, 11 de novembro de 2023

Trova ao Vento – 004


 



Mensagem na Garrafa – 31 –

Criação JFeldman com Microsoft Bing

Aparecido Raimundo de Souza
Vila Velha/ES

COMPARAÇÕES

Gostar de alguém não é morar em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília ou qualquer outra cidade importante, mas morar com ela, de preferência dentro de seu coração.

Gostar de alguém é lhe dar as mãos estendidas de carinho, depois de lhe ofertar a vida com esperanças de um porvir melhor.

Gostar de alguém é participar ativamente do seu dia a dia, ouvir e entender sem fazer sombras, por menores que sejam, em suas ideias. 

Gostar de alguém é apoiar todos os seus planos sejam eles quais forem, mesmo os mais loucos e desconexos, incentivá-la dando-lhe o apoio moral necessário, perseverando juntos, como se fossem uma só pessoa e, sobretudo, não abandonar, jamais, a própria personalidade.

Gostar de alguém é chegar de mansinho, acompanhar, ver e sentir, compreender e não fazer perguntas desnecessárias, nem meter o nariz aonde não foi chamado.

Gostar de alguém é confiar plenamente nela e envolvê-la com doçura, com muita ternura. Fazê-la se sentir cativa da sua presença, prisioneira dos seus desejos, porém, sem querer saber se existe o lado contrário, a parte escura, o esconderijo secreto, porque amando e, consequentemente gostando de verdade, com a alma, nunca, durante esse tempo, será tão imensa a contrariedade.

Gostar de alguém é uma coisa muito sublime e por demais complexa. Algo que às vezes está longe e acima do alcance das nossas vontades e entendimentos.

Gostar de alguém é como buscar a Deus sem intermediários, sem meios termos.

Gostar de alguém é dar e doar a alma e não esperar calculadamente pelo espírito.

Gostar de alguém é passar a noite sonhando com ela, imaginando-a nos braços, gozar esses instantes como se fossem eternos e não se preocupar se dia seguinte, o sol quente ou o vento forte vierem interromper suas fantasias batendo forte nas vidraças da janela.

Gostar de alguém é tentar ser sempre o prometido, o príncipe encantado dos contos de fada. Aquele cavalheiro solitário que chegará de um momento para outro, montado num lindo cavalo alazão e depositará cheio de reverência, um beijo em meio a sua testa, como o Romeu buscando a sua Julieta eterna. 

Gostar de alguém é fazer o impossível dentro do possível para não quebrar o encanto e nunca — nunca cobrar as promessas que não vingaram.

Gostar de alguém é ter silêncio no instante exato, respostas firmes na hora precisa, no minuto derradeiro e, ainda, ter o sopro da vida em abundância, para tentar suprir o vazio, a lacuna deixada por alguém que o destino levou para longe, numa viagem por entre estrelas de primeira grandeza, mas que se sabe, não terá volta.

Gostar de alguém é gritar, pular e fazer sorrir a companheira de todas as horas. É transformar o feio numa flor perfumada e de rara beleza. É esculpir a amada num quadro indescritível, mesmo quando pintar em seu rosto o mau humor motivado pelas incoerências, ou pelas horas tristes de angústias e aflições. 

Gostar de alguém é ser como um anjo no momento que os dissabores insistirem em marcar presença constante ao seu lado.

Gostar de alguém é entender sempre e não querer ser o eterno entendido. É acompanhar a ilusão, passo a passo, enquanto ela existir, procurar vivê-la sem cogitações, e, como a uma fogueira, alimentá-la e intensificá-la sempre, ―ad eternum.

Gostar de alguém é saber a hora, o instante exato de se afastar antes do tédio e da monotonia baterem a porta, do copo transbordar todas as mágoas guardadas, e, ainda, das lágrimas brotarem por pequenas coisas fúteis que não foram ditas. 

Gostar de alguém é passar por cima dos problemas que ficaram sem solução. É saber como chegar ao minuto fatal de dizer adeus sem constrangimentos, e, ao fazê-lo, manter a cabeça erguida, sem a expectativa da volta ou de uma nova reconciliação.

Gostar de alguém é se render de corpo inteiro, sofrer por amor até a exaustão, mergulhar de cabeça, às cegas, num voo desconhecido, como Ícaro em busca do impossível, ou como o andarilho, cujo paradeiro ignora o desfecho que lhe aguarda no final da estrada incerta.

Gostar de alguém é dizer coisas lindas, é sussurrar juras de afeições profundas. É sentir as entranhas queimando, o corpo ardendo em febre acima de quarenta graus. É sentir a alma leve e solta, a vida fluindo como se fosse uma pluma na imensidão. É ter o coração batendo acelerado, descompassado, como se quisesse, de repente, saltar peito afora, criar asas e voar por espaços nunca imaginados.

Gostar de alguém é efetivamente nunca se arrepender, amanhã, depois, ou algum dia (sempre há um dia), por ter se entregue tanto, por ter anulado sonhos, ou deixado de fazer isto ou aquilo. Gostar de alguém é perder o rumo, o prumo, o pulso, a visão do que é certo ou errado, a ponto, inclusive, de não saber o caminho da volta, o porto amigo para tentar reconstruir a si mesmo dentro do vazio enorme que ficará martelando, pungente, como uma ferida aberta que se nega a cicatrizar.

Gostar de alguém é, por derradeiro, ter a coragem suficiente para correr atrás dela no instante exato em que ela tomar a decisão de sair porta afora, com as roupas do corpo, deixando, no ar, um vazio grande demais, uma inquietude intransigente, que logo se transformará em esquálida e intransponível solidão.

Fabiane Braga Lima (Clara)

Sou o nome dela por acaso! Clara, um lindo nome, daquela mulher que morava na frente da minha casa. Passava as manhãs tomando banho de sol, isto é quando tinha sol. Mas voltamos ao início, que é um bom lugar para se começar, ela passava as manhãs de sol ameno se banhando de luz solar. Fora assim por meses a fio, até a Maria das Saudades, minha conhecida do bairro, passou na frente da casa dela e simplesmente disse: — Bom dia professora Clara! Um mistério para se dissipar, um bem pequeno a bem da verdade.

Não me contive e fui ter uma conversa com Maria das Saudades e logo perguntei quem era  minha nova vizinha. E como ela foi parar na cadeira de rodas, eu estava afoita e queria detalhes atômicos. 

— Como ela foi parar na cadeira de rodas eu não sei dizer, ela foi a minha professora no jardim de infância! Simples assim! Ela me acompanhou por anos, uma excelente professora. Todos a amam, agora eu tenho que ir! 

Fui acompanhando com o olhar Maria das Saudades sumir rua abaixo, andava aos saltos, chamando a atenção de todos naquela rua bucólica. Mais tarde soube que a professora Clara, dedicou toda a vida à educação. Filha de família pobre, estudou, entrou na faculdade e dedicou toda a vida à educação. Casou tarde e teve três filhas. E o que a levou a decadência, eu não soube e nem queria saber. 

Aí veio a tormenta, os gritos, era Clara e seu marido, que discutiam e discutiam. Não tinha hora certa, só o turbilhão quebrando a rotina daquela rua, daquele pequeno bairro afastado. Porquê brigavam? Por tudo, creio eu! Mas o que mais me tocava eram as meninas, que raramente saíam da casa e sempre que saíam pareciam sempre tristes e assustadas. 

Um dia de sol ameno, vi o casal,  de olhar severo o elegante marido de Clara a empurrava, ela triste na cadeira de rodas. Para onde foram eu não sei dizer, só sei que o marido da professora Clara, voltara em poucos minutos, logo não foram muito longe. Vi o marido de Clara adentrar sorridente na casa de uma vizinha, quem era? Era uma jovem muito bonita, uma ave noturna, La belle de jour, era assim que a chamavam. O marido da professora Clara, ficou ali por pouco tempo, saiu e foi buscar a esposa sabe-se lá onde. Pois bem, o fato em si não chamou a atenção de ninguém. 

Um dia não me contive e fui ter uma conversa com o marido de Clara, Eu diante daquele homem alto e bem vestido: — E as crianças pequenas? Elas ficavam sozinhas por um bom tempo, também não frequentavam escola! Ele nada disse, mas o semblante assustado com a reação raivosa do senhor, eu foi embora. Tive que me afastar daqui. 

Não demorou para descobrir por vias tortas, que o motivo das brigas do casal, era porquê Clara dava aulas para as filhas. E, ali estava uma guerreira, que nunca se deixou levar, pela estupidez do esposo abusivo. Com as mãos ensanguentadas em dores, mas com alma tranquila e serena, nada impediu aquela mãe de alfabetizar as suas filhas, nem mesmo suas pernas paralisadas.

Um ano depois, fiquei sabendo que as filhas da professora Clara estavam estudando e vivendo como todas as crianças merecem. Quanto ao marido de Clara? Ele deixou a família, esposa em uma cadeira de rodas, debilitada, filhas ainda pequenas, homem amargurado, ele nunca quis aceitar a verdade. Toda criança merece um estudo adequado!

Fonte: Enviado por Samuel da Costa