Maria Santos Nascimento
Rio de Janeiro/RJ
Dilema
Eu que pensei ser livre como o vento,
não fraquejar em cada despedida,
aceitar meus fracassos sem lamento
e nunca me queixar das leis da vida…
Eu que pensei domar meu sentimento,
e ser, na luta, justa e destemida,
agora, com você no pensamento,
pouco importa vencer ou ser vencida…
O nosso bem-querer gera perigos,
mas, como só podemos ser amigos,
é fácil controlar as emoções…
Difícil é lutar contra a saudade
e acreditar que os elos da amizade
têm mais poder que a fúria das paixões!…
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UMA TROVA
Wandira Fagundes Queiroz
Curitiba/PR
Quando aos luzeiros da fama
se agregam luzes do Bem,
há um brilho, a mais, que se inflama
e imortaliza também.
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UM POEMA
Rui Knopfli
(Rui Manuel Correia Knopfli)
Inhambane/Moçambique, 1932 – 1997, Lisboa/Portugal
PRINCÍPIO DO DIA
Rompe-me o sono um latir de cães
na madrugada. Acordo na antemanhã
de gritos desconexos e sacudo
de mim os restos da noite
e a cinza dos cigarros fumados
na véspera.
Digo adeus à noite sem saudade,
digo bom-dia ao novo dia.
Na mesa o retrato ganha contorno,
digo-lhe bom-dia
e sei que intimamente ele responde.
Saio para a rua
e vou dizendo bom-dia em surdina
às coisas e pessoas por que passo.
No escritório digo bom-dia.
Dizem-me bom-dia como quem fecha
uma janela sobre o nevoeiro,
palavras ditas com a epiderme,
som dissonante, opaco, pesado muro
entre o sentir e o falar.
E bom dia já não é mais a ponte
que eu experimentei levantar.
Calado,
sento-me à secretária, soturno, desencantado.
(Amanhã volto a experimentar).
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UMA QUADRA
Fernando Pessoa
(Fernando António Nogueira Pessoa)
Lisboa/Portugal, 1888 – 1935
Tens um livro que não lês,
tens uma flor que desfolhas;
Tens um coração aos pés
e para ele não olhas.
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