Maria Lúcia Daloce
No boteco o aviso: - "Vem
e ao sair tem que pagar!"
E o bêbado: - Ainda bem,
eu só quero mesmo é entrar...!
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Um Poema de Balneário Camboriú/SC
Pedro Du Bois
VOCÊ
Rasgo a página não inscrita que da perda
não ficarão registros
do passado lavado
em novos passos imundos
de soberbos ataques
na chuva miúda
intermitente
sobre guarda-chuvas
abertos em proteção
e escudo: raios e trovões
não acontecidos na sequência
do desencontro
sim
você estava ali
seu perfume permanece
sobre o cheiro dos temperos e alguém cita
seu nome
e me volto em incertezas
página rasgada do que não escrevi no dia
que seria da chegada e não houve o tempo
seco das histórias de memórias difundidas
lendas sacramentadas em perdões e profecias
a chuva miúda aos poucos alaga a rua
em descaminhos
como os fins e os meios
repetidos em sangue não doado
sim
você esteve lá
seu perfume oferta
temperados pratos
insossos para sempre.
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Uma Quadra Popular
Ó lua que vais tão alta
Redonda como um tamanco!
Ó Maria traz a escada
Que não chego lá co’o banco!
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Um Soneto de Caucaia/CE
José Riomar De Melo
MEU VERSO
Se meu verso te agrada, te conforta,
Faz lembrar-te emoções que já viveste,
Com algum deles talvez te comoveste,
Ativando a esperança quase morta!
É sinal que choveu na minha horta,
Na emoção que a mim tu concedeste,
Ao sentir que no verso que tu leste
De euforia e de paz teu peito aborta;
Entretanto se um deles não ressoa,
Na fiel sintonia e te magoa,
Na palavra ou na frase te feriu...
Eu te peço perdão em tom profundo,
Porque mesmo agradar a todo mundo,
Jesus Cristo também não conseguiu...
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Uma Aldravia do Rio de Janeiro/RJ
Maria Beatriz Del Peloso Ramos
Saudade
amuleto
líquido
usado
no
peito
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Uma Setilha de Crato/CE
Adauberto Amorim
Ao som do mar eu relembro
Um momento eternizado,
Um trinta e um de dezembro
Consumido e consumado.
As ondas molhando a areia
E eu beijando uma "sereia"
Num sonho bem acordado.
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Um Epigrama de Fortaleza/CE
Antônio Sales
Fortaleza/CE, 1868 – 1940
– A fealdade é um direito;
Por isso ninguém a acusa.
Mas ser feia desse jeito…
Perdão: a senhora abusa!
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Uma Glosa de Porto Alegre/RS
Gislaine Canales
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS
RIMA E GRAÇA
MOTE:
Eu sinto o vento que passa
portador de boa nova
enchendo de rima e graça
os quatro versos da trova.
Antônio José Barradas Barroso
(Parede/Portugal)
GLOSA:
Eu sinto o vento que passa
a beijar , com seu carinho,
todas as flores da praça,
que encontra no seu caminho.
Esse vento é benfazejo,
portador de boa nova,
pois traz, a todos um beijo
de maneira sempre inova.
Mostra a sua força e raça
numa escala de alegria,
enchendo de rima e graça
a nossa amada poesia.
Esse vento acaricia
e a cada instante renova,
melhorando na poesia
os quatro versos da trova.
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Um Haicai de Miguel Couto/RJ
Edmar Japiassú Maia
Ao ver no jardim
tua beleza e a da rosa
desejei as duas!
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Um Poema do Maranhão
Gonçalves Dias
Caxias/MA, 1823 - 1864, Guimarães/MA
CANÇÃO DO EXÍLIO
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas tem mais flores,
Nossos bosques tem mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
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Uma Trova de Santos/SP
Carolina Ramos
Nós somos duas tipoias
na ajuda às forças escassas
- quando fracasso, me apoias,
te apoio, quando fracassas!...
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Uma Endecha* de Portugal
Luís Vaz de Camões
Coimbra, 1524 – 1580, Lisboa
ENDECHAS À BÁRBARA ESCRAVA
Aquela cativa
Que me tem cativo,
Porque nela vivo,
Já não quer' que viva.
Eu nunca vi rosa
Em suaves molhos,
Que para meus olhos
Fosse mais formosa.
Nem no campo flores,
Nem no céu estrelas
Me parecem belas
Como os meus amores.
Rosto singular,
Olhos sossegados,
Pretos e cansados,
Mas não de matar.
Uma graça viva,
Que neles lhe mora,
Para ser senhora
De quem é cativa.
Pretos os cabelos,
Onde o povo vão
Perde opinião
Que os louros são belos.
Pretidão de Amor,
Tão doce a figura,
Que a neve lhe jura
Que trocara a cor.
Leda mansidão,
Que o siso acompanha;
Bem parece estranha,
Mas Bárbara não.
Presença serena,
Que a tormenta amansa;
Nela, enfim, descansa
Toda minha pena.
Esta é a cativa
Que me tem cativo
E, pois nela vivo,
É força que viva.
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Endecha, termo derivado do latim indicta, declaração das virtudes dos mortos, designa a composição poética que tem origem no epicédio grego, canto fúnebre, variante da elegia e do treno ou trenodia, termos com que entre os gregos se cunhavam as ladainhas ou cantos fúnebres. A trenodia e o epicédio podem considerar-se variantes do encômio já que a lamentação fúnebre era antes de mais um hino elogioso. A distinção entre trenodia e epicédio resulta da primeira ser cantada junto ao corpo do defunto ao passo que tal podia não suceder com a segunda composição. A trenodia possui a variante monódia, canto triste e solitário de tom fúnebre. O epicédio, a trenodia e a monódia correspondem às nênias latinas, ladainhas ou orações cantadas pelas carpideiras em memória dos defuntos durante as procissões funerárias em Roma. O epicédio foi cultivado, por exemplo, por Catulo e Ovídio e a trenodia por Píndaro e Propércio. Estas composições poéticas foram introduzidas no Cristianismo estando presentes nas lamentações bíblicas de Jeremias. Na Idade Média, os poetas ligaram a forma latina aos temas cristãos no canto de devoção aos mortos.
A endecha seguiu na Europa esta tradição elegíaca como na Inglaterra ilustram a «Exequy» (Poems, Elegies, Paradoxes and Sonnets, 1657) de Henry King e a canção de Ariel à morte do pai de Ferdinand em The Tempest (1611) de William Shakespeare. A endecha distingue-se da elegia por ser um poema mais curto e, na sua origem, destinado a ser cantado.
Em Portugal, a endecha foi cultivada do séc. XVI ao séc. XVIII e não possui o fundo fúnebre originário. Trata-se antes de uma composição de tom melancólico e triste em versos de cinco ou seis sílabas geralmente agrupados em quadras segundo os esquemas rimáticos ABCB, ABAB ou ABBA. O plural endechas deve-se ao fato de que a cada quadra se atribuir a designação de endecha e o poema ser constituído por mais de uma estrofe. A famosa composição de Camões , Endechas à Bárbara Escrava”, uma cativa com quem andava de amores na Índia, chamada Bárbara é exemplo de endechas apesar de em algumas edições da Lírica também ser designada de trovas. As endechas foram ainda cultivadas por outros poetas tais como Rodrigues Lobo ou Correia Garção. (Fonte: CEIA, Carlos. E-Dicionário de Termos Literários)
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