sexta-feira, 11 de outubro de 2024

A. A. de Assis (Banheiroteratura)

Neste mundo de gente apressada não sobra tempo livre para nada, muito menos para ler. Mal e mal se dá um jeito de olhar por alto alguns jornais e revistas, e só porque estar informado é ainda investimento. Livro quase ninguém mais abre.

Há, porém, dois derradeiros tipos de leitores inveterados: os que não conseguem dormir sem antes folhear um livro e os que fazem do banheiro seu gabinete cultural. Os adeptos da “sonoteratura” passam às vezes um ano com o mesmo volume, lendo duas ou três páginas por noite; os praticantes da “banheiroteratura”, idem.

Reza a medicina das vovós que ler no troninho pode prejudicar a saúde – sei lá se é verdade. Poucos, porém, parecem atentos a tais preocupações. Conheço gente que não entra no banheiro sem algo escrito. No mínimo como garantia para eventual carência de papel.

Um professor me disse que leu e releu a “Ilíada” e a “Odisseia” assim. Durante quase dois anos, dez minutos por dia. Outro aproveitou a ideia e está usando o mesmo processo para ler “Os sertões”, do Euclides. Depois pretende entrar no “Grande sertão – veredas”, do Rosa. Quem sabe algum dia chegue a Virgílio, Camões, Cervantes… 

Antigamente todo mundo curtia leitura. Sem televisão, sem rádio, sem cinema, sem celular, sem barzinho, a noite era vazia. O jeito era ler.

Gordos volumes de romances, contos, poemas. Minha mãe, embora tivesse feito na escola somente as primeiras séries, jamais ficava sem uma pilha de livros ao lado da cama. Leu toda a obra de Machado de Assis, de José de Alencar, e sabia de cor os versos da maioria dos poetas românticos e parnasianos.

Veio depois o que se costuma chamar de progresso, e com ele a necessidade de as pessoas trabalharem mais horas por dia. Veio também a maior variedade de programas.

E a leitura foi ficando de lado.

O jovem moderno lê apostilas e livros didáticos, sem os quais não consegue passar de ano na escola. O adulto lê o que interessa para o exercício de sua profissão. Literatura (arte literária) não tem mais vez. A não ser naqueles dez minutos diários a ela dedicados pelos que cultivam a “sono-“ ou a “banheiroteratura”.

O professor que leu a “Ilíada” e a “Odisseia” na “casinha” explica suas razões: dá aulas de manhã, de tarde e de noite, fica muitas vezes até de madrugada corrigindo trabalhos e provas ou preparando a matéria que ensinará no dia seguinte. Os únicos momentinhos sobrantes são mesmo aqueles em que se tranca para as urgências orgânicas. O bom e sábio Homero, lá do seu nobre assento etéreo, há de generosamente compreender e perdoar a irreverência. Afinal, neste agitado tempo de gente sem tempo, ler no banheiro já é uma grande homenagem prestada a quem escreve…

(Crônica publicada no Jornal do Povo em 10.10.2024)

Fonte: Texto enviado pelo autor 

Vereda da Poesia = 130 =


Poema de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Calçadão de Minha Rua…

Alvinegra passarela
em mosaicos definida…
sempre que passo por ela,
a repassar me convida.

Calçadão de minha rua,
a imitar ondas do mar…
à luz do sol ou da lua,
aonde irás me levar?!

Meu destino, irrelevante,
me fez boa caminheira
e assim vou seguindo adiante,
até quando Deus o queira!

Calçadão de minha rua,
talvez que em dia já breve,
minha vida, que se estua,
não te pise… nem de leve!

E, então, guardarás silente,
nos mosaicos desgastados,
passos meus… passos de ausente
… marcas de passos passados..
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

É no rosto da criança
que o sorriso é mais bonito:
- tem a força da Esperança
e o tamanho do Infinito!
= = = = = = 

Poema de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Num simples toque

Tu és pétala de rosa... me maltrata
Maltratar teu coração num simples toque...
Meu amor por teu amor é sem retoque
Como um rosto que o espelho não retrata.

Tens espinhos, mas ferir-me só me mostra
Que no fundo te proteges do que eu sinto;
Meu amor é inevitável, não te minto:
Só de ver-te, aos teus pés ele se prostra...

Se tu partes, teu perfume é que fica
No silêncio, percorrendo os sonhos meus;
É difícil te perder tão sem adeus,
Quando a dor do meu amor te identifica...

Fecho os olhos quando quero te sonhar,
Entretanto, como pétala de flor,
Tu te soltas pela luz do meu olhar
E te perdes numa lágrima... de dor.
= = = = = = 

Trova Humorística Premiada em Irati/PR, 2023
AILTO RODRIGUES 
Nova Friburgo / RJ

Bebum que arma cambalacho,
sem cascalho, apronta tanto,
que bebe pinga em despacho
na conta do pai de santo!
= = = = = = 

Glosa de
FABIANO WANDERLEY
Natal/RN

MOTE
Carrego o carro da sorte,
pelos caminhos da vida

GLOSA
Por onde quer que eu aporte,
não temo adversidades,
pra evitar temeridades,
carrego o carro da sorte.

E por ser o meu suporte,
meu destino consolida,
me protege, dá guarida,
me alerta, em todos momentos,
pra que encontre os acalentos,
pelos caminhos da vida.
= = = = = = 

Trova Popular

Amar e não ter ciúmes,
isso não é querer bem;
quem não zela o bem que ama,
muito pouco amor lhe tem.
= = = = = = 

Soneto de
RAUL DE LEONI
Petrópolis/RJ, 1895-1926

Artista

Por um destino acima do teu Ser,
Tens que buscar nas cousas inconscientes
Um sentido harmonioso, o alto prazer
Que se esconde entre as formas aparentes.

Sempre o achas, mas ao tê-lo em teu poder
Nem no pões na tua alma, nem no sentes
Na tua vida, e o levas, sem saber,
Ao sonho de outras almas diferentes...

Vives humilde e inda ao morrer ignoras
O Ideal que achaste... (Ingratidão das musas!)
Mas não faz mal, meu bômbix* inocente:

Fia na primavera, entre as amoras,
A tua seda de ouro, que nem usas
Mas que faz tanto bem a tanta gente...
= = = = = = 
* Bômbix = bicho-da-seda
= = = = = = = = = = = = = = 

Trova de
OLYMPIO COUTINHO
Belo Horizonte/MG

Creio que quem olha a Terra
sob o azul e branco manto
não acredita que a guerra
possa tingi-la de pranto.
= = = = = = 

Soneto de
HAROLDO LYRA
Fortaleza/CE

Coisificadas

Hoje é comum mulher tirar a roupa
pra revelar nas bancas de jornal,
despudoradamente o colossal
segredo da virtude, já tão pouca.

Desnuda-se, aos apelos do mural;
na crapulosa folha a pose louca
que a revista conduz de boca em boca
e faz dessa mulher coisa venal,

que assim exposta nua à sordidez;
dependurada à espreita do freguês,
nem percebe aonde e como vai chegar.

Mas chega ao pai, os sonhos carcomidos,
por ver da filha os garbos preteridos,
e oferecida a quem puder pagar.
= = = = = = 

Trova de
JANETE DE AZEVEDO GUERRA
Bandeirantes/PR

O cansaço… a consumindo…
numa cadeira, ela escora…
Levanta o guri sorrindo:
- Eu guardei para a Senhora!…
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Ser poeta

Fazer poesia é fácil, meu amigo,
basta um por cento só de inspiração,
e a conclusão do poema está contigo,
é só tirá-la na transpiração.

Isto é assim já desde o tempo antigo,
na liberdade e até na escravidão,
colocada a semente num abrigo,
o restante é cuidar da plantação...

Vale a pena o suor que tu verteres,
por tudo o que requerem os afazeres,
seja no campo, ou com papel e pena.

Seja a poesia, ou mesmo outra arte,
e quem com enxada faz a sua parte,
perante a Pátria jamais se apequena!
= = = = = = 

Trova de
CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

Olha! A noite é uma criança,
diz o refrão popular -
que se sacode e balança
presa às tranças do luar.
= = = = = = 

Poema de
PAULO LEMINSKI
Curitiba/PR, 1944 – 1989

Bem no fundo

No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto

a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo

extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais

mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Minha mãe, entre seus filhos,
se lembre de mim um dia,
que dos ramos que eles formam
eu sou a flor mais sombria.
= = = = = = 

Soneto de 
THALMA TAVARES
São Simão/SP

A um jovem suicida

Pela porta entreaberta o velho pai assoma.
Olha triste, em silêncio, a família e a casa,
E em soluços explode a dor que ele não doma,
o mal contido pranto, a lágrima que abrasa.

A todos, de um só golpe, o sofrimento arrasa.
Inconsolável mágoa a casa inteira toma.
Parece que a tristeza, enfim, deitou sua asa
sobre um lar onde a paz era único idioma.

Tempos depois passou a dor e o desconforto.
Mas do pai, que abraçou um dia o filho morto,
como eterno castigo a dor não se apartou.

Ficou-lhe na lembrança - e pela vida inteira -
a débil voz do filho e a queixa derradeira:
- Estou morrendo, pai!... A droga me matou!
= = = = = = 

Trova de
ELISABETE AGUIAR
Mangualde/Portugal

Há correntes que escravizam,
– essas é urgente quebrar!
Mas naquelas que humanizam
falta um elo restaurar!
= = = = = = 

Poema de 
ÓGUI LOURENÇO MAURI
Catanduva/SP

Retrato de Mulher

Pobre mãe-menina, marginalizada!
Sozinha, deu à luz debaixo da ponte
Um ser de paternidade ignorada...
Agora, mãe e filho sem horizonte!

Malvista, miserável e mãe solteira;
Retrato de mulher achado no lixo,
Pelo jeito, vai passar a vida inteira
Enfrentando do destino o seu capricho.

É "Socialite" às avessas no jornal...
Com um filho recém-nascido na vida.
Às vezes sai no noticiário geral:
Retrato de mulher pedindo comida!

Ah, se a cronista da página social
Não se preocupasse só com as madames!...
E mostrasse à sociedade por igual,
Outro retrato de mulher, das infames!...

Somente assim creio que seria possível
À camada rica se dar uma pista
Do tanto que ela se apresenta insensível,
Toda voltada para si, tão egoísta!

Retrato de mulher, foco de beleza!
Impróprio para propagar mendicância.
Não podemos contrariar a Natureza,
Retrato de mulher é só elegância! 
= = = = = = 

Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP


Por xeque-mate, em segundos,
perdeu tudo... e o que ele fez?
Pagou com cheque sem fundos
e foi parar... no “xadrez”!
= = = = = = 

Soneto do
Príncipe dos Poetas Piracicabanos
LINO VITTI
Piracicaba/SP, 1920 – 2016

Indelével retrato

Quando menino, sensações de vulto
não tive, sensações próprias da idade.
Sempre vivi desconhecido e oculto,
longe do vão bulício da cidade.

Fiz da vida campestre um quase culto,
da natureza, quase divindade.
E trago ainda (que felicidade!)
um coração silvestre em mim sepulto.

Um dia precisei deixar meu ninho
trocar o seu calor e o seu carinho
por outras contingências do viver.

Mas nem belas visões de outra paragem
puderam apagar a sua imagem
gravada tão profunda no meu ser.
= = = = = = 

Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Belo sonho o que aproxima 
estrelas e pirilampos... 
– Elas são eles lá em cima; 
eles são elas nos campos! 
= = = = = = 

Poema de
CECY BARBOSA CAMPOS
Juiz de Fora/MG

Desesperança

A boca vazia
os olhos grandes,
vazios…
O prato vazio,
panelas brilhantes,
vazias…
Menino vazio,
sem graça, sem jeito,
sem nada no mundo,
sem sonho, sem ânsias,
sem nada a esperar,
espera cansado
a vida seguir.
= = = = = = 

Trova de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

Sorrateira, foi chegando 
a danada da saudade;
meu coração machucando,
sem dó e sem piedade!
= = = = = = 

Hino de 
Sambaíba/MA

Sambaíba acordaste para a vida.
Do Maranhão a cidade mais querida.
Tua gente alegre, hospitaleira.
Paisagem atraente e brasileira.

És banhada pelo grande Rio Balsas.
Cristalino, deslizando noite e dia.
Suas águas lembram majestosa fita,
Que lhe serve na mais doce harmonia.

Nós te saudamos de coração.
E mais um aperto de mão.

Verdes campos acolhendo os rebanhos.
Teu lindo céu matizado de azul.
O teu povo enobrece os estranhos.
Premiando tanto o Norte como o Sul.

As montanhas dão um grande colorido,
Refletindo um postal, uma pintura.
O que chega sente-se um escolhido.
Dando graças pela feliz aventura.

Nós te saudamos de coração.
E mais um aperto de mão.

Uma prece ao nosso Criador.
Arquiteto desta obra incomparável.
Todos nós lhe queremos com ardor.
Nos deu vida e Pai adorável.

Tua bênção é a nossa esperança.
A bandeira que nos mantém de pé.
Dai-nos paz, com saúde e bonança.
Te pedimos com toda nossa fé.

Nós te saudamos de coração.
E mais um aperto de mão.
= = = = = = 

Trova Humorística de 
MILTON SEBASTIÃO SOUZA
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

De tão magro ele até poupa:
quando adoece, o infeliz
tira uma foto sem roupa
e usa como Raio X.
= = = = = = 

Poema de 
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964

Lua Adversa 

Tenho fases, como a lua 
Fases de andar escondida, 
fases de vir para a rua... 
Perdição da minha vida !
 Perdição da vida minha !
 Tenho fases de ser tua, 
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e que vêm,
 no secreto calendário
 que um astrólogo arbitrário
 inventou para meu uso. 

E roda a melancolia 
seu interminável fuso ! 

Não me encontro com ninguém 
(tenho fases, como a lua ...) 
No dia de alguém ser meu 
não é dia de eu ser sua ... 
E, quando chega esse dia, 
o outro desapareceu ...
= = = = = = 

Trova de
ROZA DE OLIVEIRA
Curitiba/PR

Pra minha Fé não existe
nem o menor subterfúgio.
Estando eu alegre ou triste
tenho Deus por meu refúgio.
= = = = = = 

Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

O horóscopo

Dissera um charlatão
Ao pai duma criança que nascia,
Que esta cruenta morte sofreria
Nas garras dum leão.

Cresce, temos rapaz,
E o pai lhe diz: «Não sairás dos lares,
Para uma vez leões não encontrares».
Se bem diz, melhor faz.

Tinha o pai, num painel,
Pintado um leão. Um dia o rapaz brada:
«Por causa desta fera aqui pintada,
Sofro eu sorte cruel!»

Forma um bom murro e — zás!
Investe com o painel, de raiva cego;
Porém a mão lhe rasga oculto prego
Que estava por detrás!
***

Ésquilo ouviu rosnar
Que havia de cair-lhe em cima a casa;
Crê no que ouve, o pateta, vê-se em brasa,
E vai dormir ao ar.

Mas — oh, caso fatal! —
Passa uma águia nas garras empolgando
Enorme tartaruga; e esta largando
Na cabeça do tal,
Um bolo pronto a faz!
***

Um adivinho em méritos realça?
Não, respondo. Sua arte é mais que falsa,
Apesar do que atrás
Acabo de contar.
Crer nessa arte é no juízo haver atraso:
Aqui só vejo acaso — e pode o acaso
Às vezes acertar.

Estante de livros (Madame Bovary; A Educação Sentimental; Bouvard e Pécuchet, de Flaubert)


As obras de Gustave Flaubert são marcos do realismo literário, cada uma abordando questões universais de modo profundo e provocativo. Através de sua prosa refinada e personagens complexos, o autor continua a ressoar com leitores contemporâneos, oferecendo reflexões sobre a condição humana e as contradições da sociedade.

1. Madame Bovary
Este livro narra a vida de Emma Bovary, uma mulher que se sente entediada e insatisfeita com sua vida provincial e seu casamento com Charles Bovary, um médico simples e bondoso. Emma anseia por paixão e emoção, inspirada por romances idealizados que leu em sua juventude. Ela busca escapar da monotonia através de relacionamentos extraconjugais com Rodolphe e Léon, além de gastar dinheiro em luxos que não pode pagar.

A busca incessante de Emma por uma vida ideal leva a consequências trágicas. Sua infidelidade e consumismo resultam em dívidas crescentes, e, ao perceber que seus sonhos permanecem inatingíveis, ela se desespera. No final, Emma toma a drástica decisão de se suicidar, deixando Charles devastado e os credores atrás de sua família.

"Madame Bovary" é uma crítica incisiva à sociedade burguesa do século XIX, explorando temas como o descontentamento, a busca por identidade e a ilusão do romance. Flaubert utiliza um estilo de realismo meticuloso, usando detalhes vívidos para retratar a vida cotidiana e as emoções de Emma. A estrutura do romance é notável, com uma narrativa que interliga os pensamentos íntimos de Emma e a percepção externa da sociedade.

O personagem de Emma é complexo; ela simboliza a luta entre a aspiração e a realidade. Sua insatisfação reflete não apenas uma crise pessoal, mas também uma crítica social à falta de opções para as mulheres da época. Flaubert desafia as convenções do romance romântico, subvertendo as expectativas do leitor e apresentando a tragédia de uma mulher que busca algo além do que a vida lhe oferece.

2. A Educação Sentimental
Esta obra acompanha a vida de Frédéric Moreau, um jovem de 18 anos que se muda para Paris em busca de amor e aventura. Frédéric se apaixona por Madame Arnoux, uma mulher casada que representa o ideal romântico que ele busca. Ao longo da narrativa, ele testemunha e participa de eventos políticos e sociais que moldam a França do século XIX, incluindo as revoluções de 1848.

A história explora as desilusões amorosas de Frédéric, suas amizades e seus encontros com uma variedade de personagens que representam diferentes aspectos da sociedade. Apesar de suas aspirações e sonhos, Frédéric acaba se sentindo perdido e incapaz de realizar suas ambições, levando a um sentimento de frustração e desilusão.

"A Educação Sentimental" é uma rica análise da juventude, do amor e das transformações sociais. Flaubert utiliza uma narrativa fragmentada e um estilo de prosa altamente detalhado para capturar a complexidade da vida parisiense e a confusão emocional de Frédéric. O romance é também uma crítica à superficialidade da sociedade burguesa e das convenções sociais que limitam a liberdade individual.

Os personagens de Flaubert são multifacetados, refletindo a diversidade da experiência humana. Frédéric, em particular, é um anti-herói que encarna a incerteza da geração que viveu durante períodos de grande mudança. Sua incapacidade de agir e sua busca por significado ressaltam a alienação e o desencanto que permeiam a obra.

3. Bouvard e Pécuchet
Segue a história de dois copistas, Bouvard e Pécuchet, que, após herdarem uma pequena fortuna, decidem buscar conhecimento e se aventurar em várias disciplinas, incluindo a medicina, a agricultura e a filosofia. No entanto, suas tentativas de aprender e aplicar novos conhecimentos são tratadas com um tom de ironia e sátira, pois eles rapidamente se tornam obcecados e desiludidos.

A história é marcada por uma série de fracassos e mal-entendidos, levando Bouvard e Pécuchet a perceber que o desejo de conhecimento muitas vezes é fútil. Ao final, eles retornam a suas vidas simples de copistas, sem realmente compreenderem as lições que tentaram aprender.

"Bouvard e Pécuchet" é uma crítica mordaz à superficialidade do conhecimento e ao entusiasmo irracional pela ciência e pela educação. Flaubert explora a ideia de que o saber não é suficiente para garantir a sabedoria ou a felicidade. A obra aborda as limitações do conhecimento humano e as armadilhas do empirismo.

O estilo de Flaubert é caracterizado por uma ironia sutil, e ele utiliza o humor para expor a tolice de seus personagens. Bouvard e Pécuchet representam a busca incessante da humanidade por compreensão e controle, enquanto suas falhas ilustram a fragilidade da condição humana. Flaubert, com seu olhar crítico, questiona a validade da aquisição de conhecimento sem entendimento profundo e reflexão.

Fonte: José Feldman. Estante de livros. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Recordando Velhas Canções (Os olhos dela)

(xote, 1906) 

Compositores: Catulo da Paixão Cearense e Irineu de Almeida

Eu sou capaz de confessar 
Aos pés de Deus 
Que eu nunca vi em mundo algum 
Uns olhos como os teus! 
Eu não sei mesmo 
Como os hei de comparar, não sei 
Eu já tentei cantar 
O teu divino olhar

Depois de tanto versejar 
Debalde em vão 
Depois de tanto apoquentar 
A minha inspiração 
Cheguei à triste conclusão 
De que eu só sei sofrer 
E o que teus olhos são 
Não sei dizer

Deixa-te estar que quando eu morrer 
Irei verter os prantos meus nos céus 
Hei de contar em segredo a Deus 
As travessuras desses olhos teus 
Hei de mostrar ao Senhor Jesus 
Ao Pai nos céus, apiedado 
Meu coração crucificado 
Nos braços teus de luz

Os olhos teus são lágrimas do amor 
Os olhos teus são dois suspiros de uma flor 
São dois soluços d’alma 
São dois cupidos de poesia 
Que sinfonia tem o teu olhar 
Que até às vezes já nos faz chorar! 
Ai, quem me dera me apagar assim 
À luz do teu olhar!

Os olhos teus 
Quando nos querem castigar 
Parecem dois astros de gelo 
Que nos vêm gelar 
Mas quando querem nos ferir 
Direito o coração 
Eu não te digo não 
O que os teus olhos são

Pois quando o mundo quiser 
De vez findar 
Basta acendê-lo com um raio 
Desse teu olhar 
Que os olhos todos das mulheres 
Que mais lindas são 
Dos olhos teus 
Não têm a irradiação

A Fascinação e o Mistério dos Olhos Dela
A música "Os Olhos Dela" é uma ode à beleza e ao mistério dos olhos de uma mulher amada. Desde o início, o eu lírico confessa que nunca viu olhos tão impressionantes em toda a sua vida, comparando-os a algo divino e inigualável. A dificuldade em descrever a profundidade e o impacto desses olhos é evidente, pois ele admite que, apesar de seus esforços poéticos, não consegue encontrar palavras adequadas para expressar o que sente.

A letra explora a dualidade dos olhos da amada, que podem tanto castigar quanto ferir o coração do eu lírico. Essa ambiguidade é uma metáfora para a complexidade das emoções humanas e a capacidade do olhar de transmitir sentimentos contraditórios. Os olhos são descritos como astros de gelo que podem gelar, mas também como algo que pode ferir profundamente, mostrando a intensidade do amor e da dor que eles podem causar.

No final, o eu lírico eleva os olhos da amada a um nível quase sagrado, comparando-os aos de Maria, a mãe de Jesus. Essa comparação não só exalta a pureza e a santidade dos olhos, mas também sugere um amor que transcende o mundano e se aproxima do divino. A música, portanto, é uma celebração da beleza, do mistério e da complexidade das emoções humanas, encapsuladas no olhar de uma mulher.
Fonte: https://www.letras.mus.br/vicente-celestino-musicas/os-olhos-dela/significado.html