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segunda-feira, 22 de maio de 2023
Olavo Bilac (Como a pescada)
Casados há três meses, — já o arrufo, já o ciúme, já a resigna... E Clélia quer que o marido, o Álvaro, lhe ponha já para ali toda a verdade: se foi de fato noivo de Laura, e porque é que foi expulso da casa de Laura, e porque não casou com Laura, e porque é que a família de Laura lhe tem tanta raiva...
— Mas, filhinha, sê sensata; Não nos casamos? Não somos felizes? Não te amo como um louco? Que queres mais? Beijemo-nos que me importa a mim a lembrança de Laura, se é a ti que amo, se te pertenço, se sou o teu maridinho carinhoso? — suspira Álvaro, procurando com os lábios ansiosos os lábios da arrufada Clélia...
— Não, senhor! Não, senhor! — diz a teimosa, repelindo-o — Não, senhor! quero saber tudo! vamos a isso! Foi ou não foi noivo de Laura?
— Ai! — geme o marido — Já que não há remédio... fui, queridinha, fui...
— Bem! E porque não casou com ela?
— Porque... porque o pai preferiu casá-la com o Borba, comendador Borba, sabes? Aquele muito rico e muito sujo, sabes?
— Sei... Mas isso não explica o motivo porque o pai de Laura tem tanto ódio ao senhor...
— É que... é que, compreendes... tinha havido tanta intimidade entre mim e a filha dele...
— Que intimidade? Vamos, diga tudo! O senhor costumava ficar sozinho com ela?
— Às vezes, às vezes...
— E abraçava-a?
— Às vezes...
— E beijava-a?
— Às vezes...
— E chegava-se muito para ela?
— Sim, sim... Mas não falemos nisso! Que temos nós com o passado, se nos amamos, se estamos casados, se...
— Nada! Nada! — insiste Clélia — Quero saber tudo, tudo! Vamos! E depois?
— Depois? Mais nada, filhinha, mais nada...
Clélia, porém, com um brilho singular da curiosidade maliciosa nos grandes olhos azuis, insiste ainda:
— Confesse! Confesse! Ela... ela não lhe resistiu? Não é assim?
— ...
— Diga-o! Confesse! — e abraça o marido, adulando-o...
— Pois bem! É verdade! — responde ele — Mas acabou, passou... Que importa o que houve entre mim e Laura, se nesse tempo ainda eu não te conhecia, a ti, tão pura, a ti, tão boa, a ti que, enquanto foste minha noiva, nem um só beijo me deste?
Clélia, muito séria, reflete... E, de repente:
— Mas, escuta, Álvaro! Como foi que o pai soube?
— Por ela mesma, por ela mesma! A tola contou-lhe tudo...
— Ah! Ah! Ah! — e Clélia ri como uma louca, mostrando todas as pérolas da boca — Ah! Ah! Ah! Então foi ela quem... que idiota! Que idiota! Ah! Ah! Ah! Ora já se viu que pamonha? Aí está uma coisa que eu não teria feito! — Uma asneira em que não caí nunca...
— Como? Como? — exclama o marido, aterrado — Uma asneira em que não caíste?!
— Mas, certamente, queridinho, certamente! Há coisas que se fazem, mas não se dizem...
E, enquanto Álvaro, acabrunhado, apalpa a testa — lá fora, na rua, ao luar, um violão tange o fado e a voz do fadista canta:
"Homem que casa não sabe
Qual o destino que o espera...
Há gente como a pescada,
Que antes de o ser já o era...”
Fonte:
Disponível em domínio público.
Olavo Bilac. Contos para velhos. Publicado originalmente em 1897.
(Quando publicado, o autor utilizou o pseudônimo "Bob").
George Abrão (Poemas Avulsos) 3
Assim como o belo arco-íris
que após a chuva enfeita o céu,
igual faz a lindíssima saíra
que com as suas penas coloridas
e também com sete cores,
enfeita as árvores do litoral
como se fosse uma joia preciosa
constantemente a dançar.
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BEM-ME-QUER?
Quanta ingenuidade havia
nos bons tempos de outrora
quando ainda se imaginava
que uma flor tinha poder.
E as pobres e belas margaridas
eram a todo dia, pelas moças,
romanticamente despetaladas
num afã de quererem saber
se seus pretendidos as amavam.
E era: mal-me-quer, bem-me-quer,
estraçalhando a tão bonita flor.
E eram gritos de felicidade e alegria
se a última pétala era bem-me-quer,
ou de tristes muxoxos se dizia não.
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CIRANDA DOS MUNDOS
Pendentes no espaço sideral
lá vamos nós perdidos
em meio à ciranda dos mundos.
Mundos maiores, menores,
que em enorme velocidade
e em perfeito sincronismo
não se cansam do seu giro eterno.
Em meio a planetas como o nosso,
estrelas, satélites, outras astros,
e cometas que velozmente passam.
E onde nos levará esta viagem?
Onde aportaremos ao final dela?
Quem é o exímio coordenador de tudo?
Questionamentos infundados
quando a resposta para tudo
resume-se a uma só Palavra: Deus!
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DECEPÇÃO
O belo pássaro frutívoro,
que passava voando alto,
viu um belo almoço servido
e ao seu encontro desceu
pousando sobre as frutas.
Mas quando deu a bicada,
quanta decepção...
eram frutas artificiais,
tão belas e perfeitas
que o conseguiram enganar!
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OLHAR DE MULHER
Ah! O olhar feminino
rutilante como a estrela,
plácido como um lago,
profundo como o oceano,
complicado como um teorema,
melancólico como crepúsculo,
misterioso como a noite,
ou veemente como uma fera.
O olhar feminino tudo revela:
o seu vigor espiritual,
a sua tranquilidade de ser,
a complexidade de sentimentos,
a dificuldade em se fazer entender,
a sua tristeza indefinida,
os segredos da sua alma,
ou a sua fúria às vezes incontida.
Mas se penetrarmos no seu olhar,
em sua profundidade encontraremos
uma mulher que quer amar e ser amada.
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SAUDADE I
Que imensa e dorida saudade
guarda tão pequeno gesto:
o beijo na bela rosa rosada.
Saudade do que já se foi;
saudade da feliz infância;
saudade do amor perdido;
saudade da grande felicidade;
saudade dos entes queridos;
saudade da vida que passou;
saudade do que nunca viveu.
Porque sempre há lembranças,
e lembranças trazem saudade!
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SAUDADE II
E se saudade não existisse?
Não a palavra “saudade”
que só existe no português,
mas do profundo sentimento,
que nos golpeia a alma
ou que nos traz felicidade.
Da saudade do que passou;
da saudade alegre, divertida;
da saudade triste, dolorida;
da que nos faz rir ou faz chorar;
da saudade de alguém ou de algo
que nos faz voltar no tempo;
das festas com muita alegria,
ou de encontros com amigos;
saudade dos bancos escolares
e dos colegas/amigos de classe;
saudade dos carinhos dos pais,
e essa é a saudade que dói mais;
saudade dos irmãos/amigos;
das coisas que deixamos passar;
de tudo o que eu deixamos de fazer.
Fonte:
Artur de Azevedo (contos em versos) Um passeio de bonde
— Psiu! Para onde
Segue este bonde? —
O cocheiro interrogado
— Para a Estação — me responde;
A tabuleta não vê? —
— Muito obrigado.
— Não há de quê.
Era um bonde fechado.
Sentei-me, carrancudo,
Pensando em nada ou em tudo,
Que tudo ou nada vem a dar no mesmo,
E eu penso em tudo e em nada
Todas as vezes que passeio a esmo,
Por dar alívio à mente atribulada.
O bonde parte. Eu estava só. Ninguém
Me fazia
Companhia.
Porém
Alguém
Lá vem:
Uma moça e uma velha entram no carro,
E eu, por ser cavalheiro,
Renuncio a fumar o meu cigarro inteiro,
E deito fora a ponta do cigarro.
A moça não é feia nem bonita.
Modesta no trajar, traz um vestido
De ramalhuda chita,
E um chapéu já muitíssimo batido.
A velha é magra, é alta,
E parece que chora quando ri.
Os dentes lhe fizeram muita falta...
Uma velha mais feia nunca vi!
Aquela hedionda cara
Muito pé de cabelo e muita ruga
Me depara,
Sem falar na verruga,
Coisa rara,
Que não sara,
No nariz,
De pingos de tabaco chafariz.
Pente descomunal, de tartaruga,
Lhe adorna a cabeleira, que tresanda
Ao tal sebo de Holanda.
Enquanto a velha enxuga
O pingo eternamente pendurado,
A moça o verbo namorar conjuga
Co’um janota caolho,
Que entrara há pouco e lhe piscara um olho,
O único olho que possui — coitado!
Fica a velha de orelha
Em pé, e logo enruga
A branca sobrancelha,
E incha, como incha a negra sanguessuga
Que o Zeferino aluga.
A moça não se importa,
E dirige ao rapaz, leviana e franca,
Pecaminoso olhar de enchova morta,
Que o enleva e transporta,
E suspiros estrídulos lhe arranca.
Mas as damas chegaram
Ao seu destino. Ambas se levantaram.
A moça faz um sinal
Ao condutor, que repara,
E, com o choque especial
Que produz sempre o bonde quando para,
Cai o moço sobre a velha,
Que estava olhando de esguelha;
Cai a velha sobre o moço;
Cai o moço sobre mim!
Que alvoroço!
Que chinfrim!
Saíram todos três. Fiquei pisado,
E ansioso por saber se o resultado
Daquela barafunda
Seria um casamento ou uma tunda.
Um casamento foi. Passado um mês,
Encontrei o caolho namorado
Na rua do Alecrim, de braço dado
À moça, e a tal velhota desta vez
Tinha em casa ficado.
(Maranhão, 1872)
Fonte:
Disponível em Domínio Público.
Arthur de Azevedo. Contos em verso (contos maranhenses). Publicado originalmente em 1909.
domingo, 21 de maio de 2023
Fábio Siqueira do Amaral (O Relógio)
Fora meu presente de aniversário, isso lá pelos idos de 1986. Jamais parou, nunca atrasou nem um minuto sequer. Rigoroso no horário. Implacável no momento de estrilar sua campainha pela manhã, fazia-me saltar da cama com os olhos ainda semicerrados e a boca toda babada...
Segundo as informações do Vicentinho, naquela tarde – logo após o festivo almoço de comemoração –, o relógio funcionava sem corda e sem pilha... Bastaria agitá-lo por uns momentos, de um lado para o outro, para pô-lo em movimento. Caso acontecesse esquecer-me dessa norma, e ele cessasse de “trabalhar” – sem problemas! –, que sacudisse mais um pouco o artefato e pronto... Silencioso... Não se ouvia nenhum tic-tac... Se apertasse aquele botãozinho preto, a luzinha azul acenderia e era possível ver o horário no escuro do quarto.
Casei-me, mudei de emprego, deixei minha pacata cidade, meus pais, meus amigos, fui para a Capital e o relógio foi junto, trazendo as lembranças do meu grande amigo.
Por telefone, mantinha contato com o Vicentinho.
Abandonou-me a mulher, quando, pela recessão, fui demitido, e alguns meses depois consegui novo ofício numa pequena firma, ganhando menos da metade do antigo ordenado. Ela levou tudo o que pôde... Só deixou meu relógio.
Vi-me obrigado a sair do ótimo apartamento, meu ninho de felicidade por alguns tempos. Aluguei a minúscula kitchenette com telefone, porém, miseravelmente mobiliada, num prédio decrépito, sujo e maltratado, numa das ruas mais do que vagabunda e mal falada da bela São Paulo.
Meus velhos, por várias cartas, chamaram-me de volta... Vicentinho, eterno amigo prestativo, muito querido, sincero e devotado, exigiu que voltasse... Ele conseguiria melhor ocupação para mim, na empresa dos pais dele. Agradeci muito, mas não retornaria. Não queria depender nem dever obrigação a ninguém.
O tempo foi passando. As ligações telefônicas foram rareando de minha parte por contenção de despesas. Vicentinho também deixou de ligar, acreditando, talvez, no meu desinteresse pela nossa antiga amizade.
Hoje, domingo, acordei antes do toque de despertar com muita saudade desse meu amigo. Uma nostalgia pesava-me, por assim dizer, quase sufocante. Poderia dormir mais, não era dia de trabalho mesmo. Vi pelas frestas da basculante que já raiara o sol. Peguei o relógio. O horário marcava três horas e treze minutos. Fui até a janela e a abri. A claridade ia alta... Eu dormira demais e o relógio estava parado. O relógio de pulso indicava ser quinze para o meio dia... Sacudi o relógio, presente de meu aniversário. Ele não funcionou... Sacudi com força e demoradamente... Nada...
Achei que àquela hora de almoço era apropriada para fazer surpresa ao Vicentinho.
Liguei para ele.
A demora ao atendimento causou-me alguma frustração. Finalmente a voz estranha deu o ar da graça:
— Alô...
— Alô... Quem fala? – perguntei.
— É a Nancy...
A Nancy, prima do Vicentinho.
— Oi, Nancy... Como vai...? Gostaria de falar com o Vicentinho...
— Infelizmente não será possível... Ele morreu nessa madrugada...
— Como?! Morreu?!
— Sim... Na última sexta-feira, Vicentinho sofreu um acidente de carro... Estava internado em estado gravíssimo. Hoje, às três e treze da madrugada, ele deixou de respirar.
Não respondi nada mais, ou, se respondi não me lembro... Desliguei o telefone e chorei como nunca havia chorado por um amigo.
O relógio – recordação do Vicentinho –, cristalizado naquele fatídico horário – 3h13min – nunca mais voltou a funcionar.
Fonte:
Jaqueline Machado (Quincas Borba humano / cão)
No romance Quincas Borba, de Machado de Assis, o leitor recebe uma cartilha, quase uma enciclopédia sobre o jogo de interesses humanos.
Rubião queria que sua irmã, Piedade, casasse com Quincas, que era um homem rico, assim, poderia ele se favorecer em parte, da vida luxuosa do amigo, que passaria a ser seu parente, mas a moça era muito tímida e rejeitou o matrimônio.
Rubião levava uma vida simples de professor. No entanto, apesar do golpe não ter dado certo, ficou rico. E vestido em seu chambre, de frente para uma janela de um imenso apartamento no Botafogo, orgulhava-se de si. Entusiasmava-se ao lembrar da vida simplória de seu passado recente e de tudo o que agora podia desfrutar, sendo bem servido pelos seus serviçais.
Rubião tinha um amigo chamado Cristiano Palha, também muito interesseiro, que o ensinava como ser um rico de verdade, que o aconselhou a contratar um novo serviçal que fosse estrangeiro e branco. ( Aqui a narrativa enfatiza a cruel questão do racismo de um Brasil que acabava de sair de um período escravocrata).
Mas afinal, por qual meio Rubião, que era um homem de vida simples, teria ficado rico?
Quincas era um mendigo filósofo, que estava para morrer de uma doença pulmonar. Tinha consigo um cãozinho que levava o seu nome. Rubião era o amigo que ouvia sobre as ideias de Humanitas de Quincas.
Humanitas é um sistema filosófico criado por Quincas para explicar o sentido da existência. A filosofia de Quincas Borba afirma que a substância da qual emanam e para a qual convergem todas as coisas é Humanitas. Portanto, Humanitas é o princípio único de tudo o que existe. E se esse princípio está em tudo, está também no seu cãozinho de estimação, que terá como herança o seu nome.
Humanitas, segundo sua filosofia, também significa que essa substância não se esvai com a morte do corpo. É uma espécie de célula da imortalidade, portanto, o fenômeno (matéria) se desfaz, mas a essência fica. Os que morrem em batalha, nas disputas pelas batatas na sobrevivência da vida, permanecem vivos em um outro estado de existência.
Quincas propôs a Rubião o seguinte: caso ele aceitasse cuidar do seu cãozinho, se tornaria seu herdeiro universal. Rubião, bajulador e interesseiro, aceitou. Logo que o velho morreu, tomou posse da herança e do cachorro.
Ele não conseguia nutrir muita estima pelo animal, que uma hora era cuidado, e instantes depois, desprezado por ele.
Rubião passou a desfrutar da chamada “Vida boa”. Vida essa a qual não conseguiu se adaptar, pois eram muitas normas e requintes a seguir para ser considerado um bom rico.
Ele era um homem atrapalhado, se apaixonou pela mulher do seu melhor amigo, e emprestava dinheiro para todo mundo que o enxergava como um bobo da corte.
Não suportando a falta de adaptação exigida pela sociedade e perdido de amor por uma mulher que o ignorava, aos poucos, foi enlouquecendo.
Ao ser dominado pelos sintomas da loucura, perdeu a herança. Com isso, os amigos sumiram e ele terminou seus dias sem família, sem amor, sem amigos, com fome e sozinho.
Fonte:
Texto enviado pela autora.
Ismael Garcia (Três elementos essenciais para o sucesso literário do novo escritor)
Em 2017, compartilhei o texto abaixo com milhares de escritores e muitos deles foram beneficiados em seus resultados de lá para cá.
Isso ocorreu porque esses escritores entenderam o recado por meio de uma experiência que eu vivi e que também me trouxe (e ainda me traz) excelentes resultados (E são mesmo excelentes!).
O texto é um pouquinho longo, mas como os benefícios que ele pode proporcionar são satisfatórios, o compartilho com você também, na expectativa de que você também compreenda que o seu livro realmente pode te trazer muitas realizações.
TRÊS ELEMENTOS ESSENCIAIS PARA O SUCESSO LITERÁRIO DO NOVO ESCRITOR
Eu não acredito que a simples publicação de um livro seja a realização de um sonho, pois, na minha opinião, para que o sonho se realize completamente, é necessário algo mais. Além de ser publicado, o livro tem que causar algum resultado, tanto na vida das pessoas que o compram quanto na vida do próprio escritor. Porém, para que esse resultado (seja ele qual for, desde que seja algo bom) possa realmente acontecer, é necessário que o escritor aprenda definitivamente a integrar os três elementos essenciais do sucesso literário, sendo que, o terceiro, é o mais importante de todos.
Para explicar quais são esses poderosíssimos elementos, vou usar um exemplo pessoal:
Quando meu primeiro livro estava em processo de publicação, eu sentia a euforia e a ansiedade que permeia o coração de todo novo escritor. Minha mente imaginava as mais diversas situações e, para mim, era como se um novo mundo estivesse para existir. Foram semanas de espera para que fossem realizados todos os serviços editoriais e, por fim a impressão. Até que, certo dia, fui surpreendido por um empregado de uma empresa de correio expresso italiana, a Bartolini, que tocava o interfone da minha casa na Itália, dizendo: “Spedizione per il signor Garcia”. Desci as escadas apressadamente, recebi aquela encomenda e voltei para a casa com as caixas, sabendo que eram meus lindos e maravilhosos livros. Fiquei muito feliz… Contudo, foi uma felicidade que durou apenas alguns minutos. Logo, essa felicidade foi sucumbida por uma pergunta que eu fiz a mim mesmo, para a qual, naquele momento, não havia nenhuma resposta: Quem vai comprar esses livros se os únicos que sabem da existência dele é você e a sua família?
Numa questão de segundos, percebi que, se realmente quisesse ter sucesso com aquele meu livro, precisaria fazer com que as pessoas passassem a saber da existência dele. E foi ali a partir dali que eu comecei a cultivar o
PRIMEIRO ELEMENTO ESSENCIAL DO SUCESSO LITERÁRIO:
A DIVULGAÇÃO.
Para mim, passou a ser de extrema importância que o meu livro fosse conhecido ou, pelo menos, visto pelo maior número de pessoas possível. Então, passei a divulgá-los por todos os meios imagináveis: facebook, site, marcadores, folhetos, boca a boca, revistas, jornais, blog e tudo mais o que encontrasse pela frente. Como a cidade onde eu morava era pequena, por onde as pessoas passassem elas tinham a possibilidade de almenos visualizar qualquer coisa a respeito do meu livro.
Ao mesmo tempo, surgiu o
SEGUNDO ELEMENTO ESSENCIAL DO SUCESSO LITERÁRIO:
OS CANAIS DE VENDA.
Eu imaginava que, se algumas daquelas pessoas que vissem meu livro quisessem comprá-lo, então ele deveria estar disposto para a venda em algum lugar, além de simplesmente no site da editora, visto que, sendo uma editora nova, que estava nascendo com a publicação daquele livro, era totalmente desconhecida. As ações que pratiquei foram: visitei pessoalmente cada uma das livrarias da cidade pedindo que eles vendessem meu livro (muitas não aceitaram, mas a maioria concordou em firmar uma parceria comigo, mesmo sabendo que eu era um escritor desconhecido). Fiz parceria com uma instituição e consegui colocar meu livro à venda nos principais distribuidores onlines da Itália (Fazendo uma busca no google - Le lacrime della felicita, Ismael Garcia - ainda é possível encontrar alguns canais que vendem meu livro, mesmo tendo já passado 13 anos). Intensifiquei a divulgação do site, onde o livro estava sendo vendido. Coloquei o livro à venda em diversas bancas de revistas. Lembro que teve até um restaurante que aceitou vender meus livros ao seus clientes!!! E ainda, fiz acordo com algumas pessoas para que vendessem meu livro no boca a boca em troca de uma comissão.
OBS: Hoje, para auxiliar neste ponto crucial, que é o segundo elemento essencial para o sucesso do escritor, estamos tendo a oportunidade de conceder a alguns escritores a possibilidade de divulgar o seu livro não só no Brasil, mas também no exterior, em 24 países.
Fazendo a divulgação de uma forma ampla e tendo vários canais de vendas, o meu desejo era que ele agora fosse vendido na maior quantidade possível. De alguma forma eu entendia que para isso era necessário algum impulso a mais. Foi então que identifiquei o
TERCEIRO ELEMENTO ESSENCIAL DO SUCESSO LITERÁRIO:
O INTERESSE DO LEITOR PELO LIVRO.
Um leitor só compra um livro quando o acha interessante, mas no conteúdo do meu livro não tinha nada de interessante que pudesse convencer alguém a comprá-lo. Não desanimei porque sabia que existiam outros livros que também não tinham conteúdo interessante, mas que eram bem vendidos. E fui perceber que eram bem vendidos porque, de alguma forma, os leitores se interessavam por eles, ou por causa da editora que era famosa, ou por causa do escritor que era influente, ou por causa da capa e por vários outros motivos.
E, pelos comentários das primeiras pessoas que compraram meu livro, notei que, o que o tornava interessante, era o fato dele ter sido escrito diretamente em italiano, por um brasileiro, e por ter sido publicado pela minha editora que, na concepção da maioria, era uma coisa impossível de acontecer, visto que eu era um estrangeiro.
Então comecei a divulgar amplamente essa situação, despertando curiosidade nas pessoas, que por sua vez se dirigiam aos diversos canais de venda, comprando meu livro, dando assim, início ao sucesso da editora Garcia.
Portanto, o meu conselho é:
1) Divulgue amplamente o seu livro, por todas as formas imagináveis. Nunca se canse de fazer isso, pois o maior número de pessoas possível precisa saber que seu livro existe.
2) Coloque seu livro à venda no maior número de canais de venda possível: livrarias, bancas de revista, lojas, distribuidores e livrarias online, facebook, Instagram, marketplaces, etc. Onde você souber que vende livros, tente colocar seu livro lá. Vai por mim, você não vai se arrepender pelo esforço realizado.
Os canais de venda que estão á nossa disposição no momento é uma excelente oportunidade para isso. Leia a página com calma, reflita e entenda os benefícios.
3) Acima de tudo, descubra você primeiro o que torna seu livro interessante. Faça-se a pergunta: Por que alguém se interessaria pelo meu livro? E divulgue isso. Pare de perder tempo divulgando o que não vai despertar os interesses nos leitores.
INTERESSE DO LEITOR - DIVULGAÇÃO - CANAIS DE VENDAS
INTERESSE DO LEITOR - DIGULGAÇÃO - CANAIS DE VENDAS
INTERESSE DO LEITOR - DIGULGAÇÃO - CANAIS DE VENDAS
É um ciclo que se repete.
Se faltar um desses elementos, o trabalho é todo perdido!
Faça acontecer e realize seu sonho!
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SOBRE O AUTOR/EDITOR:
Ismael Garcia atua há mais de 10 anos no mercado editorial como escritor, editor e empresário de sucesso. É consultor editorial para novos escritores e editores iniciantes e idealizador de diversos projetos editoriais. Já assessorou diretamente mais de 2000 escritores e apoiou indiretamente (por meio da realização de serviços editoriais, impressão e venda de livros) mais de 5000 obras.
Viveu na Itália por 10 anos, onde formou-se em Economia Empresarial pela Università degli Studi di Torino (Itália). Formado em Direito pelas Faculdades Doctum de Juiz de Fora (Brasil). Faz MBA em Gestão Empresarial.
Fonte:
Enviado pelo autor, proprietário da Garcia Editorial Ltda, em Juiz de Fora/ MG. https://www.editoragarcia.com.br, em 26 fevereiro de 2023.
sábado, 20 de maio de 2023
Monsenhor Orivaldo Robles* (Um inculto e nobre amigo)
Nenhum professor de História poria no filho o nome de Teglatfalasar, Vercingétorix ou Nabucodonosor. Na certa compraria briga com a mulher e pretexto para o divórcio. Contudo, de vez em quando, nos assustam nomes que mais parecem palavrões. Onde os pais os descobriram? E por que marcaram assim os filhos para o resto da vida?
Em Jales (SP), no meu segundo ano escolar, em 1949, transferido não sei de onde, entrou em minha sala um colega chamado Heliobas (com “o” fechado). Bizarro, sem dúvida, o nome; mais bizarro o dono. Não se via, entretanto, no grupo escolar inteiro, um estudante que lhe negasse a mais rasgada simpatia. Era uma figura rústica, quase selvagem. Ao mesmo tempo, de uma doçura ingênua e um coração tão puro que se tornava impossível não amá-lo. Não revelava preocupação alguma de ocultar sua procedência de uma família com recursos mais limitados até do que as nossas. E olhe que nós já éramos pobres o suficiente para atender à categoria socioeconômica de classe D. Até inferior, se houvesse. Para ele, no entanto, pobreza não constituía problema. Nela nascera e com ela se acertava muito bem, desde o berço. Ela era como um componente natural de sua vida.
Taludo, de compleição física superior à nossa, era também mais velho. Ainda assim, acompanhar a classe custava-lhe indisfarçável esforço. Não tinha sido boa sua escola anterior, se é que acaso tivesse frequentado uma. Possivelmente trabalhasse duro na roça. Na certa, residia longe do amontoado de casas a que dávamos o pomposo nome de cidade. Com paciência de pai, o professor Oscar Aidar cuidava de lhe respeitar a lentidão do ritmo. De certa feita, observando que toda a classe tinha copiado as dez questões do quadro, mandou um aluno apagá-lo. Lá do fundo, irrompeu a voz grossa de Heliobas: –“Pera um pouco, professor. Ainda tô na novena”. Ninguém riu. Não fosse ele, a reação teria sido outra. Mas dele ninguém caçoava. Era puro demais para sofrer atos de “bullying”, do qual nem ainda tínhamos ouvido falar.
Numa das caminhadas dominicais – atrás de frutas silvestres e banho nas águas cristalinas do riacho que corria pelo matagal ao fundo da chácara do tio Vito –, meu irmão Eraldo, alguns vizinhos e eu nos aventuramos além das vezes anteriores. De súbito, demos com um rancho. Naquela área nunca tínhamos pisado. Nem visto pobreza igual. Heliobas aceitou bem nossa presença anunciada pelos cachorros. Não demonstrou constrangimento pela choupana em que sua família morava. No meio do mato. Literalmente.
Passado pouco tempo, nos mudamos. Nunca depois consegui dele sequer notícia. Estará ainda vivo? Em que parte deste Brasilzão rico, desigual e injusto? Melhorou a dura vida que suportava sem queixa? Desfruta de saúde e de uma boa aposentadoria? Goza de paz interior e vive feliz, rodeado de bastantes amigos? Criou uma linda família, com filhos e netos que lhe confortam a velhice? Seria o mínimo para compensar-lhe a infância (e juventude?) tão sofrida(s).
Ah, caro amigo Heliobas, sabe Deus quantos, como você, arrastam a nosso lado a sua cruz. Em silêncio. Nós desviamos o rosto. Como se não nos dissessem respeito. Nem revestissem a mesma dignidade que para nós reivindicamos. Deus queira que um dia, tremendo de pavor, não tenhamos que ouvir: “Tive fome e não me destes de comer, sede e não me destes de beber…” (Mt 25,42).
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* Biografia do autor:
Filho de Antônio Robles (1914-1982) e de Luzia Gonsales Robles (1916-2010), monsenhor Orivaldo nasceu em Polôni (SP) em 6 de maio de 1941. Estudou em Jales e Poloni e ingressou no Seminário Nossa Senhora da Paz, em São José do Rio Preto, em 1953. Com a mudança da família para o Paraná (1957), veio concluir o antigo segundo grau no Seminário São José, em Curitiba. Cursou Filosofia no Seminário Rainha dos Apóstolos, em Curitiba (PR), graduando-se na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, de Mogi das Cruzes SP), com diploma reconhecido pela USP, São Paulo. Graduou-se em Teologia no Studium Theologicum de Curitiba, afiliado à Pontifícia Universidade Lateranense, de Roma.
Lecionou no Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, e no Instituto de Educação, em Maringá (PR) (1967-1969). No Colégio Estadual e na Escola Normal de Paranacity (PR) (1970-1972). Por quase onze anos trabalhou como pároco de Marialva, de onde saiu no início de 1983 para assumir, por seis anos, o cargo de reitor do Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora da Glória – Instituto de Filosofia de Maringá. Em 22 de janeiro de 1989 assumiu a Paróquia Santa Maria Goretti, em Maringá, onde trabalhou por mais de 20 anos. Desde 2009, trabalhou na Catedral Metropolitana de Maringá, exercendo a função de vigário paroquial.
Foi palestrante convidado a discorrer, em colégios ou outros núcleos humanos, sobre temas ligados à cidadania, formação pessoal e sobre ética pessoal ou pública.
Por ocasião do cinquentenário da Diocese de Maringá, em 2007, publicou o livro “A Igreja que Brotou da Mata – Os 50 anos da Diocese de Maringá”, com 352 páginas, sobre a presença da Igreja Católica na região de Maringá.
Em 2012 teve publicado o livro “Celeiro Desprovido”, com 270 páginas, contendo 118 crônicas e artigos escritos desde 1995. Em 2017, foi publicado o livro dos 60 anos da Diocese de Maringá, também de sua autoria.
Foi articulista mensal ou semanal, por mais de quinze anos, de jornais editados em Maringá, além de ter matérias reproduzidas em revistas ou blogs da região.
Faleceu de enfisema pulmonar. Há vários anos o presbítero estava com a saúde debilitada, realizando tratamento médico por problemas pulmonares.
Fontes:
Crônica
Biografia
Luiz Damo (Trovas do Sul) XLII
nos encanta enquanto cai,
de noite faz serenata
de dia encantando vai…
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A fauna se torna escassa
porque flora já não tem,
aos homens, grave ameaça,
de não resistir também.
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A tenda vende banana,
outras frutas e verduras,
às vezes, caldo de cana
e as gostosas rapaduras.
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A vida, quando imatura,
mais parece uma comédia,
começa numa aventura
e acaba numa tragédia.
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Escuto o choro do vento
na vidraça a se ferir,
mais se parece ao lamento
vendo um sonho sucumbir.
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Faltando água na banheira
banho não dá pra tomar,
pior se for na torneira
nem as mãos podes lavar.
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Mesmo rude sendo a estrada
que vamos seguir na vida,
se tiver porta de entrada
também deve ter saída.
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Muitos momentos vivemos
de augusta felicidade,
mas a plena, só teremos,
um dia na eternidade.
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Na cadência dos meus passos
vou traçando o meu caminho,
nele vão ficando os traços
de quem nunca o fez sozinho.
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Não faça do preconceito
um conceito descabido,
se o fizer fere o direito
pela lei reconhecido.
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Ninguém pague um alto preço
por ser morador de rua,
vive mudando o endereço
mas sem teto continua.
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Nos caminhos da existência
temos medo de encontrar,
a intrigante decadência
sem poder nos levantar.
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Nunca aceitamos perder,
ganhar também não sabemos,
bem pior que não saber
é culpar quando perdemos.
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O mundo vive com sede
de justiça e liberdade,
jamais deve haver parede
que divida a humanidade.
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Parte da população
deita sem se alimentar,
sobre a mesa falta o pão
e o leite suplementar.
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Qualquer água sendo pura
é inodora e não tem cor,
totalmente sem mistura
também não guarda sabor.
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Quando a vida em oração
parece se transformar,
nosso humilde coração
se transforma num altar.
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Quem somente planta ventos
pelos campos das vontades,
pode estar entre lamentos
colhendo só tempestades.
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Se à vida ficas a olhar
frutos não puderes ver,
é porque no teu lugar
alguém passou pra colher.
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Seguindo sem direção
tal um trem fora dos trilhos,
os pais, na separação,
quem mais sofrem são os filhos.
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Se na rocha construir
o vento pode soprar,
que jamais fará ruir
a casa, nem abalar.
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Tem o ferro, com certeza,
grande aplicabilidade,
contendo por natureza
'dureza e tenacidade'.
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Temo na vida, somente,
os que dizem ser amigos.
Também a Deus sou temente:
vem livrar-me dos perigos!
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Toda construção desaba
se não tem planejamento,
e o seu construtor acaba
tendo um aborrecimento.
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Tudo de bom acontece
quando o bem for cultivado
e o ramo que mais floresce,
não se chamasse 'pecado'.
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Tudo o que formos comprar
neste mundo consumista,
temos um preço a pagar,
seja a prazo, seja à vista.
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Um túnel em linha reta
dispensa qualquer sinal,
tem no começo uma seta
e uma luz no seu final.
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Fonte:
Luiz Damo. A Trova Literária nas Páginas do Sul. Caxias do Sul/RS: Palotti, 2014.
Enviado pelo autor.
Aparecido Raimundo de Souza (Pontos e sinais)
QUANDO OLHEI para a moça que acabara de subir e cruzar a catraca dentro do coletivo e que depois de pagar a passagem viera se sentar frente a mim, não pude deixar de olhar para seu corpo escultural, suas pernas longas e bem-feitas metidas num vestidinho azul extremamente curto. Imaginei, em pensamento, aquele pedaço de mau caminho totalmente despido de um leve pedacinho de pano que resguardava o mais delicioso de todo o conjunto: a sua nudez.
Desde que a bela se acomodara, notei que colocara a mão esquerda no rosto, tampando o parcialmente. Esse gesto ligeiro, meio que opressivo, me chamou mais ainda a atenção, e, então, eu me dei conta do real motivo daquilo que para ela deveria permanecer oculto. Longe das vistas de todos, escondido mesmo, como algo que não carecesse de estar ao exposto de terceiros. O desencanto da sua desdita: ele se constituía num ponto medonho que ela não queria mostrar à curiosidade de terceiros, possivelmente por vergonha. Esse lado da sua mágoa se fixava na sua abertura oral. Era totalmente desconexa e torta, o que deformava o encanto da sua magia e colocava um tremor mórbido em seus lábios. Os olhos de um azul muito claro pareciam extremamente tristes. O aleijo, talvez de nascença, ou quem sabe causado por alguma enfermidade mal curada, deixara à sanha do desvairo público uma consternada sequela.
Um desfecho que ela, por ser jovem, não conseguia engolir. E isso, visivelmente gritava alto e em som manifesto. Constrangia, sobremaneira, aquela boneca impecavelmente linda e inimitável. Obcecada pela vergonha, horrorizada pelo fato de não se sentir à vontade, deduzi que ela não se ponderava feliz, embora o albor da sua juventude dissesse exatamente o contrário. O tempo todo da viagem, quase duas horas e meia, ela seguiu de rosto tapado. Vez em quando trocava de mão, sempre escondendo o pejo da cicatriz malvada que lhe tirava o viço e a diminuía na dor e na agonia, o que evidentemente a levava a se sentir feia ou talvez, por essa razão, se via excluída das pessoas ao seu redor. Que desdita!
Olhei para ela com ternura. Com um carinho especial. Tão linda e perfeita, todavia atormentada, no âmago da sua insatisfação, por uma deformidade inverossímil. Apesar disso, seja qual for o nosso problema, não devemos sentir vergonha de certos desconfortos, por mais feios e sinistros que possam parecer. Todos nós temos pequenos mutilos. Alguns desses amputos, visíveis. Outros nem tanto. Entretanto, quero crer, e, em verdade abono piamente o que agora penso e escrevo. Não importa onde o nosso ponto fraco, o nosso aleijo, ou a nossa flagelação esteja manifesta, ou, via outra, onde a nossa desgraça se faça estropiada.
O fato de sabermos que alguma anormalidade, por menor que seja, nos diminui e tira o nosso viço, bem ainda, atormenta a nossa alma, apavora o nosso espírito e afasta a nossa sensibilidade do sermos felizes (e entenda aqui felicidade) na sua melhor forma de expressão, não devemos nos preocupar. Mesmo norte, jamais nos deixarmos ser levados pela leviandade de quem nos julga e nos coloca numa visão dúbia e desconfigurada do que entendemos por dentro da “normalidade”. Por conta de pequenas ou grandes cissuras, por levarmos em conta opiniões infames e ignóbeis, ficamos divorciados de nós mesmos, e, sobretudo, deixamos de viver a plenitude casta e honrável da verdadeira razão de sermos completamente realizados.
Fonte:
Texto enviado pelo autor.
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