sábado, 15 de junho de 2024

Vereda da Poesia = 34 =


Trova Humorística de Curitiba/PR

ROZA DE OLIVEIRA

Não cresceu... Ficou baixinha,
tem, da tesoura o viés
porque a língua, coitadinha,
corre mais do que os seus pés!...
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Soneto de Vila Velha/ES

EDY SOARES

A dor de um poeta

A dor de sentir a perda de alguém
é feito arrancar pedaços da gente…
Ferida profunda e tão permanente,
que não se conhece a cura em ninguém.

É tão singular em cada vivente
que não se compara a dor que se tem
àquela que fere o peito de quem
consegue escondê-la inerte e latente.

Quisera que o tempo andasse ao contrário,
nascer bem velhinho e rumo ao berçário
rejuvenescer, viver sem as pressas…

E a vida, ao final de um ciclo fraterno,
quem sabe voltasse ao corpo materno!…
Quisera viver a vida às avessas…
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Aldravia de Ipatinga/MG

MARÍLIA SIQUEIRA LACERDA

minh’alma
constrói
madrugadas
poéticas:
solitárias
palavras
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Soneto de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Lar… doce lar…

Volto à casa, que “era minha”,
risco a calçada e, feliz,
vou pular amarelinha
mas, o pranto apaga o giz!

Hoje, saudosa, eu volto ao lar antigo
e escancarando a porta semiaberta,
procuro em vão… vasculho o doce abrigo…
Nem pai… nem mãe… a casa está deserta!

E volto ao lar, que dividi contigo…
– Vaivém dos filhos, pela porta aberta…
– Visita alegre de um ou de outro amigo…
E, hoje, é a saudade que o meu peito aperta.

Mas, por deixar pegadas nos caminhos,
não fiquei só!… Cercada de carinhos,
eu sou feliz!… Se volta o sonho louco

do teu amor, acalmo o coração
pois, ao sentir que chega a solidão,
no amor dos filhos eu te encontro um pouco.
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Trova Premiada em Itanhaém/SP, 1999 

ELEN DE NOVAIS FELIX 
Rio de Janeiro/RJ

Mesmo numa noite triste
quando meu mar se encapela,
minha canoa resiste:
é que Deus vai dentro dela.
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Poema de Itajaí/SC

SAMUEL DA COSTA

Solitude ad aeturnus (teu silêncio em mim)

Só posso entender...
O teu silêncio como recusa
Do meu amor que declaro a ti!

Nessa hora de dor extrema
Fico a pensar nos beijos
Que ainda não te dei.
Penso no sofrimento
Que me condenas
Na vida vazia que tenho...
Sem a tua presença ao meu lado
Sem tu aqui e para sempre ao meu lado

Ouço o teu silêncio com angústia
Que me constrange
 
No meu desespero 
Penso no resplendor do teu sorriso
No teu belo rosto emoldurado 
Pelos longos e trigais cabelos.
São frutos dourados do sol
Nos teus belos olhos postados em mim
Que alegra os meus trágicos dias
Amenizam os dias cruéis
Sem a tua doce presença 
Ao meu lado.
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QUADRA POPULAR

Após um dia tristonho
de mágoas e agonias
vem outro alegre e risonho:
são assim todos os dias.
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Soneto de Porto Alegre/RS

IALMAR PIO SCHNEIDER

Soneto à mulher morena 

Linda manhã radiosa me convida
a prosseguir nos passos rumo ao mundo,
porque sonhar amando é tão profundo,
que mais e mais, também prolonga a vida !

Mas se eu pudesse ser um vagamundo,
sem conhecer a estrada percorrida,
com certeza, conceberia a lida
de procurá-la até em um submundo…

Eu sei que vou lhe amar a todo o instante,
com seu sorriso límpido e brilhante,
qual se fosse de Alencar – ´´A Iracema´´!…

E para consagrar meu preito à bela
morena, que não sai da minha tela,
eis o soneto que ainda é o poema !
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

No momento da partida,
o beijo cala um adeus
e uma lágrima incontida
vem molhar os lábios teus.
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Poema de Floriana/ Malta

OLIVER FRIGGIERI

Uma Estrofe Sem Título

Dá-me as palavras de teus olhos, a noite escreve
Uma estrofe purpúrea sobre teu bonito rosto,
Brilha o orvalho, tuas bochechas um branco universo
De onde nada dá um passo descalço sem dor,
Toca estas mãos e sente o despedaçado coração
E nota o sangue quente, o pranto solene.
Pomba, não voes distante  come de minhas mãos,
Este é o grão que não mata, água pura.
Monótono o sino que dá a hora
Para que te vás desta janela entreaberta
Por mim para ti, monótono o suspiro
Gravado como ilusão que vem e vai.
Não voes distante, e diga comigo esta oração:
“Há raios de luz de lanterna enfocados em mim,
Há uma humilde estrela que brilha só para mim,
Há uma flor selvagem que se abre em meu peito,
Há uma chama de vela vacilante só para mim.”

(Tradução:  José Feldman)
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Haicai de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Hai…tchim!!!

Filas nos postinhos.
Em meio a espirros e tosses,
velhinhos papeiam.
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Setilha de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA 

Somos três 
(Ao Francisco Pessoa e José Feldman, sobre a “mardita” diabetes)

De doce todos gostamos, 
seja de leite ou goiaba,
de caju, mamão ou coco,
até banana e mangaba;
para completar a vez,
agora somos os três, 
"doces" vítimas da "diaba"!
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Trova de Porto Velho/RO

JERSON LIMA DE BRITO

Sentindo o golpe certeiro
da paixão que me extasia
louvo teu sorriso, arqueiro
de notável pontaria.
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Glosa do Rio Grande do Sul

GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

Ruas do Céu

MOTE:
Este céu tem lindas ruas
e Deus, para enriquecê-las,
de prata pintou as luas
e bordou o chão de estrelas.
Sarah Rodrigues
Belém/PA

GLOSA:
Este céu tem lindas ruas,
cheias de encanto e harmonia,
de tristezas, estão nuas,
nelas, só existe alegria!

São as mais belas de todas
e Deus, para enriquecê-las,
deu-lhes luz de eternas bodas...
Impossível descrevê-las!

Pra não ver mais cores cruas,
com seu pincel de emoção,
de prata pintou as luas
com a mão do coração!

Quis belezas extasiantes
e, assim, para poder tê-las,
pintou as luas distantes
e bordou o chão de estrelas.
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Aldravia do Rio de Janeiro/RJ

MARIA BEATRIZ DEL PELOSO RAMOS

Mar
arado
pelos
olhos
colho
saudade
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Soneto de Belo Horizonte/MG

SÍLVIA ARAÚJO MOTTA

Segredo da despedida

Ao meio dia, alegres dois ponteiros,
cantaram juntos para a paz buscar;
o sol tornou dois corpos mais inteiros,
brilho no rio quis logo espelhar!

Testemunhou paixão febril, no olhar,
firmes mãos dadas, toques bem ligeiros
no tim-tim-tim que o copo fez cantar,
canção vibrante quis os tons primeiros.

Água que passa suja, leva tudo,
No entardecer, relógio, chama agora:
-Já são seis horas...tempo fica mudo.

Na despedida penso:-Quero tê-lo!
Tal qual criança sofre e vai embora...
Tristonha vou...não posso mais detê-lo.
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Trova Premiada em Natal, 2022

MARIA HELENA URURAHY
Angra dos Reis/RJ

O sabor do beijo ousado,
naquele adeus na estação,
deixou comigo, guardado,
o amargo da ingratidão...
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Poema de Fortaleza/CE

FRANCISCO JOSÉ PESSOA
1949 - 2020

No falado paraíso 
Onde nasceu a manhã 
Onde a primeira maçã 
Tirou do homem o juízo 
Extraído o dente ciso 
Com o velho boticão 
Da boca do velho Adão 
Fato que não se malogra 
Mas Adão foi sorteado 
E por Deus presenteado 
Pois nunca teve uma sogra!
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Triverso de Guarulhos/SP

ANTONIO LUIZ LOPES TOUCHÉ

A Maria-sem-vergonha 
Como a rosa e a margarida, 
Cumpre a sina: floresce. 
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Spina de São Paulo/SP

NEUMA TOLEDO

Recado

Soprando, o vento
me contou que
você roubou Deus.

Tirou todo azul do céu 
pôs nos seus lindos olhos,
esqueceu de tingir os meus
que são escuros como graúnas
lembram petróleo cheio de breus.
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Trova de Ribeirão Preto/SP

NILTON MANOEL ANDRADE TEIXEIRA
1945 – 2024

Cavalgando sem rodeios
por galáxias estreladas,
o poeta em seus anseios
tece trovas requintadas.
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Pantum de São José dos Campos/SP

MIFORI
(Maria Inez Fontes Rico)

Doa-se um coração

Doa-se um bom coração...
Muito afoito e destemido!
Já viveu tanta paixão,
apesar de ter sofrido...

Muito afoito e destemido,
um eterno sonhador.
Apesar de ter sofrido
da solidão tem horror.

Um eterno sonhador,
por muitos, manipulado.
Da solidão tem horror;
quer amar e ser amado.

Por muitos, manipulado
mas ainda em condição...
Quer amar e ser amado!
Doa-se um bom coração...
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Poetrix de Paranavaí/PR

RENATO FRATA

Manhã

Gemido de amor que se cala,
cão vadio que se deita:
– madrugada que se esvai…
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Soneto de Santo Amaro da Purificação/ BA

ERÁCLIO SALLES

Teu Presente
 
Pensei que a terra, por demais escura,
Manchasse o alvor de teus formosos braços.
E arrojei-me, quixótico, aos espaços,
Sorvendo aos tragos a amplidão da altura.

Penetrei mundos de celeste alvura,
Cansando o olhar, multiplicando os passos.
Venci desertos, esmaguei cansaços,
De um presente trazer-te, indo à procura.

Fiquei cego de ver tanta miragem,
Fitando estrelas, no ansiar profundo.
Nem só uma escolhi – tantos cuidados! -

Nada te posso dar dessa viagem.
Mas sei, no entanto, que te trouxe um mundo
Na memória dos olhos apagados.
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Trova de Juiz de Fora/MG

MAURO MACEDO COIMBRA

É magia que me encanta
e que a Deus mais enaltece:
a raiz sustenta a planta,
mas quase nunca aparece!
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Poema de Portugal

ANTÓNIO GEDEÃO
(Rómulo Vasco da Gama de Carvalho)
Lisboa, 1906 – 1997

Poema da malta das naus

Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do Sol.

Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo.
pelote* de vagabundo,
rebotalho** de gibão.

Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das praias
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros*** e zagaias****.

Chamusquei o pelo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me a gengivas,
apodreci de escorbuto.

Com a mão esquerda benzi-me,
com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.

Meu riso de dentes podres
ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.

Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.

Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
do sonho, esse, fui eu.

O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.
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* Pelote = Peça de vestuário antiga, de abas largas e grandes
** Rebotalho = refugo
* * * Peloiros = bala de metal
* * * * Zagaias = lança curta    

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