domingo, 31 de agosto de 2025

Asas da Poesia * 84 *


Trova de
CEZAR AUGUSTO DEFILIPPO 
Astolfo Dutra / MG

Deita exausto e ao despertar,
o "peão da construção",
só sente a aurora chegar
no aperto da lotação.
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/Portugal

Etéreo momento
(métrica livre)

Entreabrem-se os lábios em provocação 
cintila o desejo na promessa dos olhos
momento por demais aguardado 
em suspiros de desvelada antecipação 

a palavra exerce o dom da quietude
sobre a vontade em espera impaciente
aprisiona-se a magia do momento
não visível ao olhar, apenas se sente

nos passos que caminham em harmonia
o pensamento ganha a leveza da pluma
a felicidade presa entre os dedos entrelaçados
rasga o ar impregnado de quentes odores

os corpos saúdam-se sem pudores
cheios de significados que se revelam
na plenitude da entrega que vai descobrindo
a verdadeira e pura essência do poema

etéreo é o momento glorificado
das almas bafejadas em sopro de magia
enquanto os corpos se exploram livremente
por entre desvendados rasgos de poesia.
= = = = = = = = =  

Trova de
ABIGAIL RIZZINI +
Nova Friburgo/RJ 

Olhar triste, é o da criança,
que olha a vitrina, e em segredo,
chora a morte da esperança
ante o preço de um brinquedo!
= = = = = =

Poema de 
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964

Dia de chuva
 
As espumas desmanchadas
sobem-me pela janela,
correndo em jogos selvagens
de corça e estrela.
 
Pastam nuvens no ar cinzento:
bois aéreos, calmos, tristes,
que lavram esquecimento.
 
Velhos telhados limosos
cobrem palavras, armários,
enfermidades, heroísmos...
 
quem passa é como um funâmbulo,
equilibrado na lama,
metendo os pés por abismos...
 
Dia tão sem claridade!
só se conhece que existes
pelo pulso dos relógios...
 
Se um morto agora chegasse
àquela porta, e batesse,
com um guarda-chuva escorrendo,
e com limo pela face,
ali ficasse batendo
 
- ali ficasse batendo
àquela porta esquecida
sua mão de eternidade...
 
Tão frenético anda o mar
que não se ouviria o morto
bater à porta e chamar...
 
E o pobre ali ficaria
como debaixo da terra,
exposto à surdez do dia.
 
Pastam nuvens no ar cinzento.
Bois aéreos que trabalham
no arado do esquecimento.
= = = = = =

Trova de
ARI SANTOS CAMPOS
Balneário Camboriú/SC

Do que vale o meu canteiro
de bom trigo, de primeira,
se joio dá mais dinheiro
na “cultura” brasileira ?!
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Soneto de
FLORBELA ESPANCA
(Flor Bela de Alma da Conceição Espanca)
Viçosa/Portugal, 1894 – 1930, Matosinhos/Portugal

Alma perdida

Toda esta noite o rouxinol chorou,
Gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma de rouxinol, alma da gente, 
Tu és, talvez, alguém que se finou!
 
Tu és, talvez, um sonho que passou,
Que se fundiu na dor, suavemente...
Talvez sejas a alma, alma doente
De alguém que quis amar e nunca amou!
 
Toda a noite choraste... e eu chorei
Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
Que ninguém é mais triste do que nós!
 
Contaste tanta coisa à noite calma,
Que eu pensei que tu eras a minh'alma
Que chorasse perdida em tua voz!
= = = = = = = = =  

Trova do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A liberdade do poeta,
está num verso... Num grito...
No equilíbrio se completa,
vencendo o próprio infinito!
= = = = = = 

Poema de 
REGINA MÉRCIA
Novo Horizonte/SP

 Desilusão

É o maior mal a desilusão
Pois perdi o amor que
Tinha no coração
Perdi a esperança
Que decepção!
Ela demora passar
É um gosto amargo
Na boca que
Que demora passar!
O tempo não passa
Apesar dele ser
Meu aliado
Não sei como fazer
As horas passarem
Não sei como vou trabalhar
No dia-a-dia
Um dia a esperança
Voltou e trouxe me
Muita alegria
Ai comecei a relembrar
Os bons momentos
Que já vivi!
Eu me dei conta
Como fui boba
Em pensar que
A ilusão perduraria
Para sempre mas como
Um passo de mágica!
Mandei a desilusão
Embora e hoje
Sou muito feliz
Porque fui perseverante
E venci a desilusão!
= = = = = = 

Trova de 
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte/MG

De um amor que é só miragem
finjo agora ter o assédio,
para escapar da engrenagem
dessa moenda que é o tédio.
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

“Idem”

Se alguém me diz: “eu gosto de você”,
eu digo “idem”.  Mas, bem ao contrário,
se outro me disser que sou otário,
lhe digo “um tudo bem”, sabe por que?

Porque por natureza eu sou hilário!
Jamais dei bola para “quelelê”...
Tenho este jeito por pura mercê
de Deus que à briga me fez refratário!

Nasci para viver só na amizade,
sem distinção..., com toda a sociedade.
Nem ligo à propensão de cada um...

Felicidade é o que desejo a todos,
para não ver ninguém vivendo em lodos...
mas com amor fadado ao bem comum!
= = = = = = 

Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

Passei a vida cantando
minhas canções que eram dela...
e a ingrata, mesmo escutando,
nunca me abriu a janela!
= = = = = = 

Hino de 
SANTA INÊS / MA

Outrora no vale do Pindaré
Antes das vilas e dos canaviais
Predominava o Índio Amanajé
Em meios às sombras dos babaçuais.

Logrou após, o lugar mais projeção
Pela pesca, lavoura e pecuária
E pelo exemplo de dona Inez Galvão
Entre outras mestras extraordinárias.

Brava gente, terra amada!
Lar de paz hospitaleiro
Ó Santa Inês, prestigiada
Neste solo brasileiro.

Sua cultura é tradicional
Do bumba-boi ao folguedo junino
E do terreiro ao brio do carnaval
Da vaquejada a festa do divino.

Hoje, esbelta e tão modelar cidade,
Com o eixo rodoviário ativo
E a ferrovia dando prosperidade
Com o comércio a esse povo altivo.
= = = = = = 

Trova de
RITA MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Busquei-O além do horizonte,
nas águas do mar sem fim,
mas curvando a minha fronte
senti Deus dentro de mim.
= = = = = = 

Recordando Velhas Canções
SÚPLICA CEARENSE
Waldeck Artur de Macedo

Oh! Deus, perdoe este pobre coitado
Que de joelhos rezou um bocado
Pedindo pra chuva cair sem parar

Oh! Deus, será que o Senhor se zangou
E só por isso o sol se arretirou
Fazendo cair toda chuva que há

Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedi pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão

Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração

Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar

Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará

Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho
Pedi pra chover, mas chover de mansinho
Pra ver se nascia uma planta no chão

Meu Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe,
Eu acho que a culpa foi
Desse pobre que nem sabe fazer oração

Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água
E ter-lhe pedido cheinho de mágoa
Pro sol inclemente se arretirar

Desculpe eu pedir a toda hora pra chegar o inverno
Desculpe eu pedir para acabar com o inferno
Que sempre queimou o meu Ceará

Que sempre queimou o meu Ceará
Que sempre queimou o meu Ceará
Que sempre queimou o meu Ceará
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Trova de
NEI GARCEZ
Curitiba/PR

Machucando a natureza,
sem pensar numa enxaqueca,
paga, o homem, na represa,
a imprudência pela seca.
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Soneto de
SÍLVIA ARAÚJO MOTTA
Belo Horizonte/MG

A folha caída

Aquela “Folha” quis mostrar caída
que era o momento certo para amar...
Quem sabe até, por ser também sofrida
quis dar a chance para a luz brilhar.

A folha seca pela dor vencida,
envelhecida veio às mãos, lembrar:
-Terceira idade pode ser querida
para envolver quem quer beijar, sonhar.

Beijos nas mãos selou adeus, que a lua
pode antever, por sua vez, soluços,
da alma, que também foi quase sua.

Fim da viagem, folha foi ao chão...
Quanta saudade! Sento e me debruço!
Computador já pode ver lição.
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Trova de
RACHEL SANTO ANTONIO 
São Gonçalo/RJ

A aurora com seus matizes,
tem brilho enternecedor
Remete a tempos felizes,
de sol, de graça e de amor.
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Poema de
CARLOS LÚCIO GONTIJO
Santo Antônio do Monte/MG

Apassarado

Não quero conforto de mar
Ser porto de espera não quero
Nem pacífico nem mar morto
Absorto, voo na paisagem
Sou viagem, corro atrás
Ainda que seja fugaz o sonho
Eu me ponho a procurar …
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Trova de
HENRIQUE EDUARDO ALVES PEREIRA 
Ocara / CE

O dia chega, enfim, lindo,
e no esplendor do arrebol,
vem com a aurora sorrindo,
nos braços áureos do sol!
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José Feldman (A Melodia está no Ar)

(Menção Honrosa no V Concurso Literário Foed Castro Chamma 2025, de Irati/PR - tema: Melodia)

Em uma pequena cidade, perdida entre montanhas verdejantes e rios caudalosos vivia Edilene, uma jovem apaixonada por música. Desde pequena, ela acreditava que o mundo ao seu redor era uma sinfonia invisível, repleta de melodias que poucos conseguiam ouvir.
 
Certa manhã, enquanto caminhava pelo parque, ela parou para escutar o canto dos pássaros que se misturava ao sussurro das folhas, formando um suave prelúdio. Inspirada, pegou seu caderno e começou a escrever as notas que sentia no ar.
 
Conforme os dias passavam, ela explorava diferentes lugares da cidade. No mercado, o tilintar das moedas e o riso das crianças criavam um ritmo alegre. Na beira do rio, o gorgolejar da água formava um solo tranquilo. Cada ambiente trazia uma nova melodia, e ela se dedicava a capturar cada uma delas.
 
Um dia, quando caminhava pelo parque, encontrou um músico idoso tocando violão. As cordas vibravam com uma profundidade que parecia conversar com a alma de quem passava. Edilene se aproximou, encantada. O homem, percebendo seu interesse, sorriu e disse:
 
— A música está em tudo, menina. Basta ouvir.
 
Ela sorriu de volta, entendendo que suas anotações não eram apenas notas, mas a essência da vida que a cercava. Ele, com seu violão, começou a tocar a melodia que ela havia coletado em suas andanças e anotara em seu caderno A cidade parou para ouvir. Os rostos se iluminaram, e pessoas começaram a dançar. A melodia que antes era invisível agora se manifestava em cada coração. Edilene percebeu que a música não era apenas algo que se tocava, mas uma experiência compartilhada.
 
A partir daquele dia, ela e o músico se tornaram inseparáveis. Juntos, eles continuaram a explorar a cidade, capturando novas melodias, unindo vidas e espalhando alegria. E assim, a pequena cidade se transformou em um grande concerto, onde cada som e silêncio contavam uma história. E, enquanto a vida seguia seu curso, Edilene aprendeu que a verdadeira magia da música está na capacidade de conectar as pessoas e fazer com que cada um ouça a melodia única que existe á sua volta.
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JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor, professor e gestor cultural. Formado em patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas de São Paulo. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais. Morou na capital de São Paulo, em Taboão da Serra/SP, em Curitiba/PR, em Ubiratã/PR, em Maringá/PR. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras, como Confraria Brasileira de Letras, Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Academia de Letras Brasil/Suiça, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia de Letras de Teófilo Otoni, etc, possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, e Pérgola de Textos, um blog com textos de sua autoria, Voo da Gralha Azul (com trovas do mundo). Assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em poesias e trovas no Brasil e exterior. Publicações de sua autoria “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); “Canteiro de trovas”; “Pérgola de textos” (crônicas e contos), “Caleidoscópio da Vida” (textos sobre trovas) e “Asas da poesia”.

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Tia Célia (O palhacinho triste)

Guilherme aproveitara muito bem suas lições na escola e passara de ano, com louvor. Seus pais, muito amorosos, lhe proporcionaram, então, alguns dias de férias numa conhecida cidade litorânea naquela região.

Eufórico, Guilherme arrumou a mala e, juntamente com seus pais e o irmãozinho, num dia muito bonito, saíram em viagem.

Ao chegar, logo à entrada da cidade, viram um circo cheio de luzes coloridas, jaulas com belos animais selvagens, elegantes cavalos e macacos engraçados. Com os olhos estatelados de emoção, Guilherme ouviu seu pai prometer que no dia seguinte iriam assistir ao espetáculo.

No outro dia, à hora aprazada, deram entrada no circo e logo começou a função. Bailarinas, equilibristas, mágicos e trapezistas, alternavam-se com palhaços, macacos engraçados, elefantes enfeitados com pedrarias, domadores de animais e muitas outras coisas...

Com um pacote de pipocas nas mãos, Guilherme acompanhava tudo rindo e batendo palmas, satisfeito.

De repente, olhou um dos palhaços que faziam piruetas e davam cambalhotas no picadeiro. Seu ar, embora o riso aberto, era triste. Quando ele se aproximou mais, Guilherme percebeu que duas lágrimas brilhavam em suas faces pintadas.

Daquele momento em diante, nada mais teve graça, e a figura do palhaço triste não lhe saiu mais da cabeça.

Na manhã seguinte acordou e, em vez de ir à praia, voltou ao circo. As imagens agora eram bem diferentes. Não havia mais belas luzes coloridas e a impressão de luxo e riqueza desvaneceu-se inteiramente. Algumas pessoas faziam a limpeza do local, enquanto outras lavavam e tratavam dos animais.

O garoto perguntou a alguém onde poderia encontrar o palhaço triste e informaram-lhe que ele estava no picadeiro.

Adentrando a enorme lona do circo, agora totalmente vazio, Guilherme parecia ainda ouvir os aplausos e os gritos da plateia.

Logo o viu. Uma pequena figura, sentada no chão, tendo a cabeça entre as mãos.

- Olá! - disse, à guisa de cumprimento.

O palhaço ergueu a cabeça, ao ouvir a voz estranha.

- Olá! - respondeu - O que o traz aqui, garoto?

- Bem, é que eu gostaria de ver um palhaço de perto.

- Ah! Com certeza vai se decepcionar. Sou apenas um homem como qualquer outro.

- Estranho! Sempre pensei que os palhaços deveriam levar vida alegre, sempre sorrindo e brincando, como se a existência fosse uma festa! - exclamou o menino.

- Puro engano, meu filho. Muitas vezes rimos para não chorar - disse, com pesar.

- Agora entendo isso. Ontem mesmo, durante o espetáculo, percebi que você estava triste, por quê?

- Deu para notar?!... A verdade é que estou com problemas muito graves.

E o palhaço lhe contou que estava com a filhinha doente e não tinha recursos para levá-la ao médico. Contente por poder ajudar, Guilherme lhe assegurou:

- Ora, não se aflija! Meu pai é médico e poderá examinar sua filha.

Saiu correndo e, pouco depois, voltou acompanhado pelo pai.

Ficaram impressionados com a miséria do local. O carro em que viajavam, e que lhes seria de moradia, era muito pobre e sem conforto.

O médico examinou a criança e afirmou que ela, além de pneumonia, estava também muito desnutrida, precisando se alimentar melhor.

- Eu sei, doutor. - disse o palhaço - Mas não tenho dinheiro. Ganho pouco e mal dá para as despesas mais urgentes.

- Não se preocupe. Sua filhinha deverá ser hospitalizada, mas ficará boa logo, com a ajuda de Deus.

O médico conduziu a menina para o hospital, onde ela foi medicada. Em seguida, levou uma cesta contendo gêneros alimentícios que dariam para muitos dias e entregou também, ao palhaço, um envelope contendo certa importância em dinheiro.

- Mas, doutor, não sei quando poderei lhe pagar!...

- Não se preocupe. Quero apenas vê-lo fazer as crianças sorrirem.

Depois de alguns dias, a garotinha voltou para casa contente e saudável.

Era o último espetáculo do circo. Iriam levantar acampamento no dia seguinte. Guilherme e seus familiares estavam na primeira fila.

O palhaço aproximou-se, trazendo nas mãos um lindo balão vermelho, amarrado com um cordão. Chegando junto a Guilherme entregou-lhe o balão, com sorriso aberto e feliz.

- Você agora não é mais um palhacinho triste - disse Guilherme.

- Não. Graças a você, posso sorrir novamente. Não sei como lhes agradecer tudo o que fizeram por mim.

O médico, bem-humorado, afirmou:

- É fácil! Faça um espetáculo bem alegre para deixar as crianças contentes.

Com um último olhar agradecido, o palhaço afastou-se dando cambalhotas e fazendo palhaçadas, acompanhado pelo riso das crianças.

Guilherme suspirou, satisfeito. O pai olhou para o menino, com carinho:

- Muitas vezes, o sofrimento e a dor estão onde menos esperamos, meu filho. E é preciso ter sensibilidade para descobrir onde está a necessidade das pessoas. Se não fosse você, ninguém teria descoberto o problema do palhaço. Muito bem, meu filho, Jesus certamente está contente com você.

E completou;

- A verdade é que onde estivermos podemos ajudar alguém. Basta que tenhamos boa-vontade para isso.
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Célia Xavier de Camargo (Tia Célia) é natural de Gália/SP, espírita, escritora com 23 livros publicados. É formada em Direito, sendo atualmente professora aposentada. Casada com 4 filhos. Reside em Rolândia – PR. Residiu por muitos anos na cidade de Marília (SP), onde participou ativamente do movimento espírita. Em 1980 iniciou-se na psicografia, publicando 15 livros de diversos autores espirituais, disponíveis nas livrarias espíritas. Tendo atuado por muitos anos na área infanto-juvenil de educação espírita, desde o ano de 1985, é responsável por uma página inteiramente dedicada à criança no mensário O Imortal, de Cambé/PR. Palestrante por todo o Brasil divulgando o Espiritismo. O livro “Um anjo em nossas vidas”, faz parte do Clube do Livro do Instituto Chico Xavier.

Fontes:
Jornal O Imortal. n. 552. Cambé/PR: Janeiro de 2000
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

A. A. de Assis (À moda de haicais) – 1


01 
As rosas no cio.
Sedutoramente abertas 
para o beija-flor.

02 
Poeta no parque.
Enquanto caminha ao sol 
vai catando haicais.

03
Rosas, lírios, dálias 
competem na exposição. 
Continua o empate.

04 
Uma flor silvestre
no jardim do shopping-center. 
Êxodo rural.

05 
Agregada ao cedro,
agrega-lhe graça a orquídea: 
dá-lhe encanto e aroma.

06 
Caminhão de flores.
Da roça para a cidade, 
perfumando as trilhas.

07 A prece da tarde.
Em coro cantam as aves 
as Ave-Marias.

08 
De moto, a cavalo, a pé.
As romarias movidas 
pelo dom da fé.

09 
Um raio de lua
deita no colo da rosa. 
Namorinho antigo.

10
Pousa um passarinho 
na imagem de São Francisco. 
Os irmãos se entendem.

11 
Chocados os ovos,
há o choque dos seres novos. 
E a vida prossegue.

12 
Corações em rede,
uns em prece pelos outros. 
Noite de Natal.

13 
Festa da Virada.
Volta à estaca zero o sonho 
de um planeta em paz.

14 
Shorts e bonés
prontos pra descer a serra. 
Alegria em alta.

15 
Nobre flamboyant.
Só ele no vasto pasto 
dando sombra aos bois.

16 
Chuva levezinha.
Meu pai dizia: chuvinha 
de plantar feijão.

17 
Futebol na areia.
Quem sabe algum dia um deles 
será rei também.

18
Três dias de samba, 
tamborim, ziriguidum. 
Momento Brasil.

19 
Da folha de amora
para o lencinho da amada. 
Mágico tear.

20
Outrora cantavam 
de tardezinha as cigarras. 
Onde mora o outrora?

21
Bem-te-vi se esbalda 
na bica do chafariz. 
Se sacode, voa.

22
Bebê brinca ao sol. 
De pressinha a vó repassa 
pra família as fotos.

23
Levinhas, levinhas, 
voam as garças em V. 
Vitória da paz.

24 
De repente o rio
cai no precipício e explode. 
Vira catarata.

25
Bisos na varanda 
contemplando a lua cheia. 
Tão longe a de mel.
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continua…
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A. A. DE ASSIS (Antonio Augusto de Assis), poeta, trovador, haicaísta, cronista, premiadíssimo em centenas de concursos nasceu em São Fidélis/RJ, em 1933. Radicou-se em Maringá/PR desde 1955. Lecionou no Departamento de Letras da Universidade Estadual de Maringá, aposentado. Foi jornalista, diretor dos jornais Tribuna de Maringá, Folha do Norte do Paraná e das revistas Novo Paraná (NP) e Aqui. Algumas publicações: Robson (poemas); Itinerário (poemas); Coleção Cadernos de A. A. de Assis - 10 vol. (crônicas, ensaios e poemas); Poêmica (poemas); Caderno de trovas; Tábua de trovas; A. A. de Assis - vida, verso e prosa (autobiografia e textos diversos). Em e-books: Triversos travessos (poesia); Novos triversos (poesia); Microcrônicas (textos curtos); A província do Guaíra (história), À moda de haicais, etc.
Fontes:
Ebook enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

Aparecido Raimundo de Souza (Nosso Adeus ao Mestre do Humor Luiz Fernando Veríssimo)


MEUS CARÍSSIMOS e amados leitores, ontem, 30 de agosto, o Brasil perdeu um dos maiores cronistas e escritores de sua história: Luiz Fernando Veríssimo, que faleceu aos 88 anos em Porto Alegre, vítima de complicações de uma pneumonia. 

Com a sua partida, se encerra uma era de inteligência afiada, humor refinado e crítica social embalada em ironia elegante — marcas que fizeram de Luiz Fernando Veríssimo uma referência imprescindível da literatura brasileira.

Uma Vida Entre Letras, Jazz e Ironia

Nascido em 26 de setembro de 1936, em Porto Alegre, Veríssimo era filho do renomado escritor Érico Veríssimo, e cresceu cercado por livros e discussões intelectuais. Passou parte da infância e adolescência nos Estados Unidos, onde estudou em San Francisco, Los Angeles e Washington, e desenvolveu uma paixão duradoura pelo jazz, chegando a tocar saxofone em bandas como o grupo “Renato e seu Sexteto”.

Casou-se em 1963 com Lúcia Helena Massa, com quem teve três filhos: Fernanda, jornalista; Mariana, escritora e Pedro, músico. 

A vida familiar sempre esteve presente em suas crônicas, muitas vezes retratando com humor os dilemas cotidianos da classe média brasileira.

Veríssimo começou sua carreira como revisor no jornal Zero Hora, em 1967, e logo passou a assinar colunas em veículos da imprensa como O Estado de S. Paulo, O Globo e Jornal do Brasil. Seu primeiro livro, “O Popular”, foi publicado em 1973. A partir daí, a sua produção literária se tornou prolífica - mais de 70 livros publicados e 5,6 milhões de exemplares vendidos.

Personagens criados que entraram para a História:

“Ed Mort”: Um detetive atrapalhado e sarcástico, inspirado no cinema noir, que virou símbolo da crítica bem-humorada à vida urbana.

“O Analista de Bagé”: Um psicanalista gaúcho que mistura Freud com bombacha e “joelhaços terapêuticos”.

“A Velhinha de Taubaté”: A última brasileira que ainda acreditava no governo, uma sátira mordaz à ingenuidade política.

“Família Brasil”: Uma série de crônicas que retratam os conflitos e absurdos da vida doméstica.

“Comédias da Vida Privada", uma de suas obras mais populares, foi adaptada para a televisão pela TV Globo, alcançando milhões de espectadores e consolidando Veríssimo como um dos autores mais lidos e queridos do país.

Últimos anos e legado

Nos últimos anos, Luiz Fernando Veríssimo (internado na UTI do Hospital Moinhos de Ventos desde 11 de agosto), enfrentou problemas de saúde, incluindo O Mal de Parkinson, doenças cardíacas e um AVC em 2021, que afetou sua mobilidade e comunicação. 

Mesmo afastado da vida pública, sua obra continuou a ser celebrada por leitores de todas as idades.

Luiz Fernando Veríssimo foi mais do que um escritor, foi um intérprete sagaz da sociedade brasileira, capaz de transformar o cotidiano em literatura com humor, ternura e crítica. 

Sua morte inesperada deixa um vazio difícil de preencher, mas seu legado permanece vivo — nas páginas que escreveu, nas risadas que provocou e nas reflexões que inspirou.

Que a sua literatura continue sendo a principal porta de entrada para novos leitores e inspiração para quem acredita que o humor é uma forma poderosa de resistência.

Luiz Fernando Veríssimo era mestre em transformar o cotidiano em literatura com humor, inteligência e sensibilidade. Tomei a liberdade de enumerar alguns trechos curtos e marcantes de suas crônicas, que mostram bem seu estilo inconfundível:

Sobre fé e pudim
“O pudim de laranja é a única prova convincente da existência de Deus. Além da Patrícia Pillar, claro.” (“Veríssimas”).

Sobre política e ingenuidade
“A Velhinha de Taubaté’ era a última brasileira que ainda acreditava no governo.” (“A Velhinha de Taubaté”), personagem recorrente em suas crônicas.

Sobre o cotidiano e o absurdo
“Digamos que eu fique preso num elevador com a Luana Piovani. Depois de dez, quinze minutos, ela diz ‘Calor, né?’, e desabotoa a blusa…” (“A Cláusula do Elevador”) – crônica sobre acordos conjugais e tentações.

Sobre futebol e paixão
“E fiquei pensando que, quando for a nossa vez de novo, teremos certamente a torcida mais dedicada, fiel, convicta e feliz do Brasil. Porque será a torcida dos que resistiram.” (“Não me acordem”), crônica sobre o título mundial do Internacional em 2006.

Sobre o espelho da vida
“O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos.” (Frase citada pelo governador do Rio Grande do Sul,  Eduardo Leite em homenagem ao autor).

Esses trechos, meus caros leitores são somente uma pequena amostra do talento de Luiz Fernando Veríssimo para provocar sorrisos e reflexões com poucas palavras.

O velório de Luiz Fernando Veríssimo teve início as 14h e aconteceu no Salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, localizado no centro de Porto Alegre. A cerimônia se estendeu até as 16h45. 

Indubitavelmente vimos uma despedida marcada por homenagens emocionadas de familiares, amigos, artistas e admiradores da obra do escritor, que faleceu (repetindo o que mencionei acima), aos 88 anos em decorrência de complicações de uma pneumonia. 

O sepultamento ocorreu no Cemitério São Miguel e Almas, em Porto Alegre.

Fonte:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem de LF Veríssimo da CNN Brasil